TJRN - 0801839-13.2022.8.20.5114
2ª instância - Câmara / Desembargador(a) Amilcar Maia
Processos Relacionados - Outras Instâncias
Polo Ativo
Partes
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Polo Passivo
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Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
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20/11/2023 00:00
Intimação
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE TERCEIRA CÂMARA CÍVEL Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0801839-13.2022.8.20.5114 Polo ativo MUNICIPIO DE CANGUARETAMA Advogado(s): Polo passivo MARIA JOSE LUIZ DA SILVA Advogado(s): JANAINA RANGEL MONTEIRO EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL.
AÇÃO ORDINÁRIA.
CONHECIMENTO DE OFÍCIO DA REMESSA NECESSÁRIA.
SENTENÇA CONDENATÓRIA ILÍQUIDA PROFERIDA EM DESFAVOR DA FAZENDA PÚBLICA.
SERVIDORA PÚBLICA DO MUNICÍPIO DE CANGUARETAMA/RN.
SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA DA PRETENSÃO AUTORAL.
CONDENAÇÃO DO ENTE PÚBLICO AO PAGAMENTO DO FGTS DURANTE O PERÍODO CONTRATUAL.
IMPUGNAÇÃO À JUSTIÇA GRATUITA FORMULADA EM GRAU RECURSAL.
ALEGAÇÃO DE JULGAMENTO ULTRA PETITA.
REJEIÇÃO.
BENEFÍCIO CONCEDIDO EM PRIMEIRO GRAU ANTES DA CITAÇÃO.
AUSÊNCIA DE IMPUGNAÇÃO DA GRATUIDADE DA JUSTIÇA JUNTAMENTE COM A CONTESTAÇÃO.
INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 100, CAPUT, DO CPC.
PRECLUSÃO TEMPORAL.
REJEIÇÃO.
INÉPCIA DA INICIAL.
REJEIÇÃO.
MÉRITO.
NULIDADE DA CONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA FIRMADA ENTRE AS PARTES.
OBRIGAÇÃO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA DE PAGAR EVENTUAIS SALDOS SALARIAIS NÃO PAGOS, SOB PENA DE ENRIQUECIMENTO ILÍCITO, BEM COMO DE EFETUAR O DEPÓSITO DAS PARCELAS REFERENTES AO FGTS.
ENTENDIMENTO FIRMADO, COM REPERCUSSÃO GERAL, NOS JULGAMENTOS DOS RECURSOS EXTRAORDINÁRIOS No 596.478/RR E 765.320/MG.
DIREITO, AINDA, À PERCEPÇÃO DAS FÉRIAS, ACRESCIDAS DO TERÇO CONSTITUCIONAL, E 13º SALÁRIO, COM BASE NO RECENTE JULGAMENTO PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO Nº 1.066.677, SOB A SISTEMÁTICA DA REPERCUSSÃO GERAL (TEMA 551).
AUSÊNCIA DE PEDIDO AUTORAL SOBRE AS REFERIDAS VERBAS.
IMPOSSIBILIDADE DE APRECIAÇÃO PELO JUDICIÁRIO, SOB PENA DE JULGAMENTO EXTRA PETITA E DA OCORRÊNCIA DE REFORMATIO IN PEJUS.
AUSÊNCIA DE PRESCRIÇÃO NO CASO CONCRETO.
SENTENÇA MANTIDA.
CONHECIMENTO E DESPROVIMENTO DA REMESSA NECESSÁRIA E DA APELAÇÃO.
ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos em que são partes as acima identificadas: Acordam os Desembargadores que integram a 3ª Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, por unanimidade de votos, em conhecer e negar provimento ao recurso e a remessa necessária, nos termos do voto da relatora que integra o presente acórdão.
RELATÓRIO Trata-se de Apelação Cível interposta pelo MUNICÍPIO DE CANGUARETAMA/RN contra sentença proferida pela Juíza de Direito da 2ª Vara da Comarca de Canguaretama/RN, que julgou parcialmente procedente a pretensão formulada nos autos da ação ordinária promovida por MARIA JOSÉ LUIZ DA SILVA, nos seguintes termos: DISPOSITIVO Ante o exposto, com resolução do mérito (art. 487, I, do CPC), julgo procedente em parte o pedido deduzido da exordial e condeno o Município de Canguaretama/RN ao pagamento dos valores relativos ao FGTS do período trabalhado pelo autor.
Sobre a condenação serão acrescidos juros de mora, a contar da citação, e de correção monetária desde quando devida a parcela, os juros de mora tomados por base na taxa referencial da caderneta de poupança (art. 1º-F, da Lei nº 9.494/97, alterada pela Lei nº 11.960/09) e a correção monetária deve se dar pela incidência do IPCA-E.
Condeno a parte requerida em honorários advocatícios que arbitro em 10% (dez por cento) do valor da condenação, sopesados os requisitos do art. 85 do CPC.
Sem custas. (...) Sentença que não está sujeita à remessa necessária, nos termos do disposto no art. 496, § 4º, I e II, do CPC. (...) Publique-se.
Registre-se.
Intimem-se.
CANGUARETAMA /RN, 9 de maio de 2023.
Em suas razões, o município impugna o pedido de justiça gratuita concedido pelo juízo de origem, por sentença ultra petita, uma vez que não houve requerimento formulado na inicial, além de “(...) que o Autor se encontra assistido por patrono judicial particular, o que somente corrobora a afirmação ora trazida para o indeferimento da justiça gratuita”.
Afirma, ainda, que a petição inicial é inepta, nos termos do art. 330, I, do CPC, eis que não houve pedido de condenação do ente público em relação ao FGTS.
Sustenta a ocorrência de prescrição das parcelas vencidas antes do quinquênio que antecede o ajuizamento da ação, nos termos da Súmula 443/STF e Súmula 85/STJ.
No mérito, relata que o FGTS é vantagem estranha à relação jurídica funcional de natureza estatutária estabelecida entre as partes, sustentando, em seguida, que o contrato em exame é nulo de pleno direito e, por isso, insuscetível de produzir efeitos.
Ao final, pugna pelo conhecimento e provimento do recurso, nos termos formulados nas suas razões.
Contrarrazões apresentadas nos autos.
Com vista dos autos, a Procuradoria de Justiça deixou de intervir no feito, por ausência de interesse público primário. É o relatório.
VOTO Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço do recurso interposto.
De igual modo, embora não determinado pelo juízo de origem, tratando-se o caso em apreço de sentença ilíquida proferida em desfavor da Fazenda Pública, torna-se obrigatória sua remessa necessária por esta Corte de Justiça, nos termos da Súmula nº 490 do Superior Tribunal de Justiça, razão pela qual não tem aplicabilidade as disposições encartadas nos §§ 3º e 4º, do artigo 496, do CPC/2015 à espécie.
Assim, conheço de ofício da remessa necessária.
Verificada a similitude nos temas tratados tanto na remessa necessária como no recurso interposto, por critério de melhor exegese jurídica, recomendável se mostra promover seus exames conjuntamente.
Antes de aprofundar sobre o mérito propriamente dito, passo a analisar as questões prejudiciais arguidas pela parte apelante.
De início, diversamente do que alegou o município, não houve julgamento ultra petita, eis que o juízo de origem deferiu os benefícios da justiça gratuita nos termos formulados pela parte apelada em sua exordial.
Além disso, sendo impugnada a justiça gratuita que foi deferida com base na declaração de hipossuficiência e na prova dos autos, passou a ser da parte impugnante, no caso o município, o ônus de provar uma realidade fática diversa daquela que foi declarada e comprovada pelo apelado, nos termos do artigo 373, inciso II, do CPC.
Compulsando os autos, verifica-se que o pleito de justiça gratuita foi concedido no despacho acostado no ID 20898800 - Pág. 1.
Ocorre que, apesar de oferecido contestação, o município não apresentou impugnação ao deferimento do benefício, em desrespeito ao que dispõe o art. 100, caput, do CPC, que assim dispõe: Art. 100.
Deferido o pedido, a parte contrária poderá oferecer impugnação na contestação, na réplica, nas contrarrazões de recurso ou, nos casos de pedido superveniente ou formulado por terceiro, por meio de petição simples, a ser apresentada no prazo de 15 (quinze) dias, nos autos do próprio processo, sem suspensão de seu curso. (...) [destaquei].
Logo, operou-se a preclusão temporal sobre o tema, de modo que rejeito o pedido arguido no presente recurso.
Desse modo, rejeito a impugnação.
No que tange a arguição de inépcia da inicial, cumpre destacar que jurisprudência desta Corte, os pedidos autorais devem ser extraídos a partir da interpretação lógico-sistemática da petição inicial.
Veja-se: AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL.
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL.
AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER E INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL.
LOTEAMENTO IRREGULAR.
EMPREENDEDOR QUE NÃO PROPICIOU A INFRAESTRUTURA NECESSÁRIA AO ABASTECIMENTO DE ÁGUA PELA CONCESSIONÁRIA DO SERVIÇO.
PEDIDO DE REPARAÇÃO MORAL JULGADO PROCEDENTE NA ORIGEM EM FAVOR DOS MORADORES.
JULGAMENTO EXTRA PETITA.
INEXISTÊNCIA.
QUANTUM INDENIZATÓRIO.
VALOR RAZOÁVEL.
ACÓRDÃO MANTIDO.
AGRAVO INTERNO DESPROVIDO. 1.
Não há julgamento extra petita quando os pedidos e a causa de pedir são interpretados pelo método lógico-sistemático, tendo o julgador extraído da peça inicial toda a pretensão da parte. 2. 'É firme a jurisprudência desta Corte no sentido de que a interpretação lógico-sistemática da petição inicial, com a extração daquilo que a parte efetivamente pretende obter com a demanda, reconhecendo-se pedidos implícitos, não implica julgamento extra petita.' (EDcl no REsp 1.331.100/BA, Rel.
Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, DJe de 10.8.2016). 3.
Somente é admissível o reexame do valor fixado a título de danos morais quando for verificada a exorbitância ou a natureza irrisória da importância arbitrada, em flagrante ofensa aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. 4.
No caso, o Tribunal de origem reduziu o valor do dano moral de R$750.000,00 (setecentos e cinquenta mil reais) para R$ 250.000,00 (duzentos e cinquenta mil reais) - sendo R$ 5.000,00 (cinco mil reais) para cada unidade de loteamento -, o qual não se mostra excessivo nem desproporcional aos danos sofridos pelos moradores, que ficaram privados do fornecimento de água em razão da ausência da infraestrutura necessária. 5.
Agravo interno desprovido. (AgInt no AREsp n. 445.765/SP, relator Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 26/9/2022, DJe de 4/10/2022.) [destaquei].
PROCESSUAL CIVIL.
ADMINISTRATIVO.
CONCURSO PÚBLICO.
AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL.
AÇÃO RESCISÓRIA EM MANDADO DE SEGURANÇA.
PEDIDO DE NOVO JULGAMENTO.
EXISTÊNCIA.
INTERPRETAÇÃO LÓGICO-SISTEMÁTICA DA PETIÇÃO INICIAL.
POSSIBILIDADE. 1.
Na forma da jurisprudência desta Corte, "o pedido da ação não corresponde apenas ao que foi requerido em um capítulo específico ao final da petição inicial, mas àquele que se extrai da interpretação lógico-sistemática da inicial como um todo" (AgInt no REsp 1.708.683/PR, Rel.
Ministra REGINA HELENA COSTA, PRIMEIRA TURMA, DJe 1º/3/2019). 2.
Também como já decidido por este Superior Tribunal, "em ação rescisória, a ausência de formulação do pedido relativo ao juízo rescisório não deve acarretar, obrigatoriamente, o indeferimento da petição inicial por inépcia, especialmente na hipótese em que, do exame da peça, constate-se que o pedido rescisório é uma decorrência lógica do pedido rescindente" (REsp 1.942.682/RS, Rel.
Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, DJe 1º/10/2021). 3.
No caso concreto, o provimento do recurso especial decorreu da conclusão de que o pedido de novo julgamento efetivamente pode ser extraído da petição inicial da subjacente ação rescisória, ainda que não explicitamente elencado no capítulo final destinado aos requerimentos finais.
Isso porque a pretensão da parte autora, ora agravada, é que, ao fim, seja rescindida a sentença e concedida a própria segurança, de modo a garantir-lhe o direito de nomeação e posse no cargo público almejado. 4.
Agravo interno não provido. (AgInt no REsp n. 1.950.396/MG, relator Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 21/2/2022, DJe de 24/2/2022.) [destaquei].
No caso dos autos, resta nítido que houve na peça exordial pedido voltado à condenação do ente público ao pagamento do FGTS durante o período de janeiro de 2000 até 31/12/2020, quando a parte apelada teria exercido a função de merendeira da Secretaria de Educação do Município de Canguaretama/RN, de modo que rejeito a arguição de inépcia da inicial.
No que tange a suscitação da prescrição quinquenal, deixo para analisá-la somente após a apreciação meritória da natureza jurídica do vínculo contratual havido entre as partes, o que impede o seu exame em sede de prejudicial.
Pois bem.
O cerne meritório da remessa necessária e do recurso ora interposto repousa na análise da sentença que, após declarar a nulidade do vínculo contratual firmado entre as partes, julgou procedente a pretensão autoral, condenando o ente público ao pagamento dos valores referentes ao FGTS do período em que perdurou a relação jurídico-administrativa entre as partes.
A Constituição da República estabelece, em seu artigo 37, incisos I e II, respectivamente, o princípio da ampla acessibilidade aos cargos públicos e o princípio do concurso público; assim, a investidura em cargos, empregos e funções públicas pressupõe, via de regra, aprovação em concurso.
Há, entretanto, exceções estabelecidas pelo legislador constituinte para adequar o princípio do concurso público com a dinâmica da máquina administrativa e do serviço público.
Assim, são permitidas duas formas de investidura em que se dispensa o concurso: a) o cargo em comissão declarado de livre nomeação e exoneração (CF, art. 37, V); e b) a contratação por tempo determinado, para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público (CF, art. 37, IX).
Desse modo, pode-se dizer que o vínculo jurídico existente entre a Administração e o agente público pode ser estatutário, celetista ou jurídico-administrativo.
O primeiro se dá pela investidura decorrente de aprovação em concurso público, em que o servidor é nomeado para ocupar cargo efetivo, ou, em alguns casos, em virtude da nomeação para exercício de cargo comissionado; o segundo ocorre pela investidura, também decorrente de aprovação em concurso público, para ocupação de emprego público; o terceiro, por sua vez, se perfaz por contratação temporária, proveniente de necessidade temporária de excepcional interesse público, nos termos do artigo 37, inciso IX, in verbis: Art. 37. (...) IX - a lei estabelecerá os casos de contratação por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público; (...) Para esse tipo de contratação, a lei local deve definir qual a contingência fática emergencial apta a ensejá-la.
Não há como se admitir possa a lei abranger serviços permanentes de incumbência do Estado, tampouco aqueles de natureza previsível, para os quais a Administração Pública deva criar e preencher, de forma planejada, os cargos públicos suficientes ao adequado e eficiente atendimento às exigências públicas.
Portanto, a transitoriedade das contratações de que trata o artigo 37, inciso IX, da Constituição Federal, não se coaduna com o caráter permanente de atividades que constituem a própria essência do Estado.
Devem existir situações excepcionais e transitórias (como seria o caso de calamidade pública, surtos endêmicos que tenham atingido os profissionais da educação, demissões ou exonerações em massa, situações de greve dos profissionais da educação que perdurem por tempo irrazoável ou de greve que tenha sido considerada ilegal pelo Poder Judiciário etc).
O Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE nº 658.026 (STF, Relator: Min.
DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno, julgado em 09/04/2014), em sede de repercussão geral, estabeleceu a necessidade de preenchimento de alguns pressupostos para a validade da contratação por tempo determinado para atendimento de necessidade temporária de excepcional interesse público contida na Carta da República, quais sejam: i) os casos excepcionais estejam previstos em lei; ii) o prazo de contratação seja predeterminado; iii) a necessidade seja temporária; iv) o interesse público seja excepcional; e v) a contratação seja indispensável, sendo vedada a contratação para os serviços ordinários, permanentes do Estado que estejam sob o espectro das contingências normais da Administração.
Ausentes os requisitos acima enumerados, deve-se decretar a nulidade do contrato.
Dito isso, volvendo-se ao caso concreto observa-se pelos documentos anexados aos autos que a parte demandante foi contratada temporariamente pela Administração Pública, sem aprovação prévia em concurso público, durante vários períodos distintos, que se iniciou em 13/2/2003 e se encerrou em 30/12/2020 (ID 20898799 - Págs. 1/5).
Não obstante, a julgadora sentenciante condenou o ente público ao pagamento do FGTS em favor da parte apelante somente durante o período de janeiro a dezembro de 2020, e como não houve insurgência recursal da parte autora, deve ser mantido o capítulo da sentença tal como estabelecido.
Diante desse cenário, observa-se que a referida contratação da parte demandante afigura-se flagrantemente contrária ao artigo 37, incisos II e IX, da Constituição Federal de 1988, por ausência de prévia aprovação em concurso público para o desempenho de serviços ordinários permanentes do Estado, bem como justificativa para a contratação por tempo determinado para atendimento de necessidade temporária de excepcional interesse público.
Por via de consequência, o artigo 19-A da Lei Federal nº 8.036/1990 dispõe que é devido o depósito na conta vinculada do trabalhador cujo contrato de trabalho seja declarado nulo nas hipóteses previstas no artigo 37, § 2º, da Constituição Federal, quando mantido o direito ao salário.
A constitucionalidade desse dispositivo foi assentada pelo Plenário desta Corte no julgamento do Recurso Extraordinário nº 596.478 (Rel.
Min.
ELLEN GRACIE, Rel. p/ acórdão Min.
DIAS TOFFOLI, DJe de 1º/3/2013, Tema 191), submetido ao regime do artigo 543-B do CPC/1973, cuja ementa é a seguinte: EMENTA Recurso extraordinário.
Direito Administrativo.
Contrato nulo.
Efeitos.
Recolhimento do FGTS.
Artigo 19-A da Lei nº 8.036/90.
Constitucionalidade. 1. É constitucional o art. 19-A da Lei nº 8.036/90, o qual dispõe ser devido o depósito do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço na conta de trabalhador cujo contrato com a Administração Pública seja declarado nulo por ausência de prévia aprovação em concurso público, desde que mantido o seu direito ao salário. 2.
Mesmo quando reconhecida a nulidade da contratação do empregado público, nos termos do art. 37, § 2º, da Constituição Federal, subsiste o direito do trabalhador ao depósito do FGTS quando reconhecido ser devido o salário pelos serviços prestados. 3.
Recurso extraordinário ao qual se nega provimento (STF, RE 596478, Relator(a): Min.
ELLEN GRACIE, Relator(a) p/ Acórdão: Min.
DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno, julgado em 13/06/2012, REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-040 DIVULG 28-02-2013 PUBLIC 01-03-2013 EMENT VOL-02679-01 PP-00068).
Na apreciação do Recurso Extraordinário nº 705.140 (Rel.
Min.
Teori Zavascki, Tribunal Pleno, DJe de 05/11/2014, Tema 308), submetido à sistemática da repercussão geral, assentou-se a aplicação do artigo 19-A da Lei Federal nº 8.036/1990 aos contratos de trabalho nulos firmados pela Administração Pública.
Na ocasião, firmou-se a seguinte tese: Ementa: CONSTITUCIONAL E TRABALHO.
CONTRATAÇÃO DE PESSOAL PELA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA SEM CONCURSO.
NULIDADE.
EFEITOS JURÍDICOS ADMISSÍVEIS EM RELAÇÃO A EMPREGADOS: PAGAMENTO DE SALDO SALARIAL E LEVANTAMENTO DE FGTS (RE 596.478 - REPERCUSSÃO GERAL).
INEXIGIBILIDADE DE OUTRAS VERBAS, MESMO A TÍTULO INDENIZATÓRIO. 1.
Conforme reiteradamente afirmado pelo Supremo Tribunal Federal, a Constituição de 1988 reprova severamente as contratações de pessoal pela Administração Pública sem a observância das normas referentes à indispensabilidade da prévia aprovação em concurso público, cominando a sua nulidade e impondo sanções à autoridade responsável (CF, art. 37, § 2º). 2.
No que se refere a empregados, essas contratações ilegítimas não geram quaisquer efeitos jurídicos válidos, a não ser o direito à percepção dos salários referentes ao período trabalhado e, nos termos do art. 19-A da Lei 8.036/90, ao levantamento dos depósitos efetuados no Fundo de Garantia por Tempo de Serviço - FGTS. 3.
Recurso extraordinário desprovido (STF, RE 705140, Relator(a): Min.
TEORI ZAVASCKI, Tribunal Pleno, julgado em 28/08/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-217 DIVULG 04-11-2014 PUBLIC 05-11-2014).
Ademais, a validade jurídico-constitucional do artigo 19-A da Lei Federal nº 8.036/1990 foi também proclamada pelo Supremo Tribunal Federal em sede de controle concentrado de constitucionalidade (ADI 3.127, Rel.
Min.
Teori Zavascki, Tribunal Pleno, DJe de 05/08/2015).
Ementa: TRABALHISTA E CONSTITUCIONAL.
MP 2.164-41/2001.
INCLUSÃO DO ART. 19-A NA LEI 8.036/1990.
EMPREGADOS ADMITIDOS SEM CONCURSO PÚBLICO.
CONTRATAÇÃO NULA.
EFEITOS.
RECOLHIMENTO E LEVANTAMENTO DO FGTS.
LEGITIMIDADE CONSTITUCIONAL DA NORMA. 1.
O art. 19-A da Lei 8.036/90, incluído pela MP 2.164/01, não afronta o princípio do concurso público, pois ele não infirma a nulidade da contratação feita à margem dessa exigência, mas apenas permite o levantamento dos valores recolhidos a título de FGTS pelo trabalhador que efetivamente cumpriu suas obrigações contratuais, prestando o serviço devido.
O caráter compensatório dessa norma foi considerado legítimo pelo Supremo Tribunal Federal no RE 596.478, Red. p/ acórdão Min.
Dias Toffoli, DJe de 1º/3/2013, com repercussão geral reconhecida. 2.
A expansão da abrangência do FGTS para cobrir outros riscos que não aqueles estritamente relacionados com a modalidade imotivada de dispensa – tais como a própria situação de desemprego e outros eventos socialmente indesejáveis, como o acometimento por doença grave e a idade avançada – não compromete a essência constitucional do fundo. 3.
A MP 2.164/01 não interferiu na autonomia administrativa dos Estados, Distrito Federal e Municípios para organizar o regime funcional de seus respectivos servidores, uma vez que, além de não ter criado qualquer obrigação financeira sem previsão orçamentária, a medida em questão dispôs sobre relações jurídicas de natureza trabalhista, dando nova destinação a um valor que, a rigor, já vinha sendo ordinariamente recolhido na conta do FGTS vinculada aos empregados. 4.
Ao autorizar o levantamento do saldo eventualmente presente nas contas de FGTS dos empregados desligados até 28/7/2001, impedindo a reversão desses valores ao erário sob a justificativa de anulação contratual, a norma do art. 19-A da Lei 8.036/90 não acarretou novos dispêndios, não desconstituiu qualquer ato jurídico perfeito, nem investiu contra nenhum direito adquirido da Administração Pública, pelo que não há falar em violação ao art. 5º, XXXVI, da CF. 5.
Ação direta de inconstitucionalidade julgada improcedente (STF, ADI 3127, Relator(a): Min.
TEORI ZAVASCKI, Tribunal Pleno, julgado em 26/03/2015, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-153 DIVULG 04-08-2015 PUBLIC 05-08-2015).
Portanto, como se vê, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, até então, havia pacificado no sentido de que o entendimento firmado nos julgamentos acima referidos aplica-se aos servidores contratados por tempo determinado, quando nulo o vínculo com o Poder Público, por inobservância às disposições previstas no artigo 37, inciso IX, da Constituição Federal, não gerando, assim, quaisquer efeitos jurídicos válidos em relação aos servidores contratados, com exceção do direito à percepção dos salários referentes ao período trabalhado e, nos termos do artigo 19-A da Lei Federal nº 8.036/1990, ao levantamento dos depósitos efetuados no Fundo de Garantia por Tempo de Serviço – FGTS, sem o pagamento da multa de 40% (quarenta por cento) sobre os depósitos.
Todavia, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, na sessão virtual ocorrida no período de 15/05/2020 a 21/05/2020, julgando o Tema nº 551, alterou o anterior entendimento, fixando a seguinte tese: STF.
Repercussão Geral.
Tema 551: “Servidores temporários não fazem jus a décimo terceiro salário e férias remuneradas acrescidas do terço constitucional, salvo (I) expressa previsão legal e/ou contratual em sentido contrário, ou (II) comprovado desvirtuamento da contratação temporária pela Administração Pública, em razão de sucessivas e reiteradas renovações e/ou prorrogações" (STF.
RE 1066677/RG.
Repercussão geral, Tema 6551. Órgão Julgador: Tribunal Pleno.
Relator: MIN.
MARCO AURÉLIO.
Redator do acórdão: MIN.
ALEXANDRE DE MORAES.
Plenário, Sessão Virtual de 15.5.2020 a 21.5.2020.
Ata de Julgamento n.º 15, de 22/05/2020.
DJE nº 131, divulgado em 27/05/2020) [destaquei].
Desse modo, uma vez constatada a nulidade de pleno direito da contratação firmada entre as partes, faz jus o servidor demitido, além da percepção de eventuais salários e do FGTS inadimplidos, ao recebimento também das férias simples, acrescidas do terço constitucional, e do 13º salário.
Contudo, não são devidas quaisquer outras verbas trabalhistas, tais como a multa de 40% (quarenta por cento) do FGTS.
Contudo, apesar de o Supremo Tribunal Federal tenha reconhecido o direito às férias simples, acrescidas do terço constitucional, e do 13º salário na hipótese de desvirtuamento das contratações temporárias (Tema nº 551), observa-se que a parte demandante não requereu expressamente na sua inicial a condenação do ente público nessas verbas, de modo que o Judiciário não pode considerar implicitamente tais pleitos, sob pena de julgamento extra petita e da ocorrência de reformatio in pejus.
Para melhor analisar o instituto de prescrição, ressalto o julgamento do Recurso Extraordinário com Agravo nº 709.212/DF[1], momento em que foi discutido a definição do prazo prescricional aplicável à cobrança judicial dos valores devidos ao Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS).
Neste julgado ficou assentado que: O art. 7º, XXIX, da Constituição de 1988 contém determinação expressa acerca do prazo prescricional aplicável à propositura das ações atinentes a “créditos resultantes das relações de trabalho”.
Eis o teor do referido dispositivo constitucional: Art. 7º (...): XXIX - ação, quanto aos créditos resultantes das relações de trabalho, com prazo prescricional de cinco anos para os trabalhadores urbanos e rurais, até o limite de dois anos após a extinção do contrato de trabalho.
Como visto, percebe-se que o julgado referido alhures se ateve a discussão referente ao prazo prescricional aplicável à propositura das ações atinentes a créditos resultantes das relações de trabalho, se quinquenal ou trintenária, tendo o Supremo Tribunal Federal reconhecido a inconstitucionalidade do prazo trintenário, motivo pelo qual persiste a incidência da disciplina prevista no artigo 7º, inciso XXIX, da Constituição Federal.
Na ocasião, o relator propôs a modulação dos efeitos da decisão da seguinte forma que, inclusive, está em vigor: (i) Para aqueles casos cujo termo inicial da prescrição – ou seja, a ausência de depósito no FGTS – ocorra após a data do julgamento, aplica-se, desde logo, o prazo de cinco anos; e, (ii) para os casos em que o prazo prescricional já esteja em curso, aplica-se o que ocorrer primeiro: 30 anos, contados do termo inicial, ou cinco anos, a partir deste julgamento, conforme item II, da Súmula 362 do TST.
Assim, a Suprema Corte, modulando os efeitos da declaração de inconstitucionalidade do artigo 23, § 5º, da Lei Federal nº 8.036/1990, que seriam, em regra, ex tunc, determinou a aplicação da prescrição quinquenal das pretensões trabalhistas relativas ao FGTS apenas para o futuro (efeito ex nunc), como forma de se resguardar a segurança jurídica, devendo, em quaisquer das hipóteses, respeitar também o limite de dois anos após a extinção do contrato de trabalho para ingressar com a ação.
Sobre o referido tema, destaco o entendimento do Ministro Marco Aurélio, do Supremo Tribunal Federal, que no julgamento do ARE nº 709.212 manifestou-se da seguinte forma: “É preciso interpretar o texto normativo, principalmente a partir da norma primária, que é revelada no art. 7º, inciso XXIX, da Constituição Federal, considerando o sistema, considerando o todo [...] Não tenho a menor dúvida de que prevalece o prazo decadencial de dois anos e, uma vez observado, ajuizando-se a ação nos dois anos seguintes à ruptura do vínculo, pode recuperar o autor as prestações dos últimos cinco anos.
Aplico-os, também, no tocante ao Fundo de Garantia por Tempo de Serviço, que é um acessório, considerando o principal”.
Destarte, atualmente temos diferentes hipóteses para a prescrição dos depósitos fundiários sem olvidar, todavia, a prescrição bienal para a propositura da ação, prevista no artigo 7º, XXIX, da Constituição Federal, vejamos: (i) Para os contratos de trabalho que o início se deu até 13/11/1989, a prescrição trintenária permanece inalterada; (ii) Para os contratos de trabalho em que o início ocorreu entre 13/11/1989 e 13/11/2014 temos o seguinte: (a) para se pleitear os depósitos fundiários de todo o contrato de trabalho (prescrição trintenária) o empregado deverá ingressar com a ação até o prazo limite de 13/11/2019; e (b) se o empregado continuar laborando e optar por distribuir a ação após 13/11/2019, a prescrição dos recolhimentos fundiários será a quinquenal; e, (iii) Para os contratos de trabalho iniciados após 13/11/2014, a prescrição dos recolhimentos fundiários será a quinquenal (destaquei).
Portanto, cumpre observar que, antes da apreciação da prescrição quinquenal/trintenária para a cobrança dos créditos trabalhistas, deve ser analisado primeiramente se houve a prescrição bienal.
Dito isso, e conforme já ressaltado, a parte demandante foi contratada temporariamente pela Administração Pública, sem aprovação prévia em concurso público, para exercer a função de porteiro escolar, sem interrupção contratual.
Com efeito, considerando que demanda foi ajuizada em 1º/11/2022, enquanto a condenação do ente público ao pagamento do FGTS se restringiu ao período de janeiro a dezembro de 2020, é de observar que não houve prescrição bienal prevista no artigo 7º, inciso XXIX, da Carta Magna, nem tampouco a prescrição quinquenal estabelecida no item (iii) acima.
Ante o exposto, nego provimento ao recurso e a remessa necessária.
Considerando o desprovimento do recurso e, por tratar-se de sentença ilíquida, a fixação do percentual em favor do causídico da parte adversa somente ocorrerá quando da liquidação do julgado, nos termos do artigo 85, § 4º, inciso II, do CPC/2015, determinando-se, ainda, que seja levado em consideração, para efeito de majoração, o trabalho realizado em grau de recurso, em atendimento ao disposto no artigo 85, § 11, do mesmo diploma legal. É como voto. [1] Recurso extraordinário.
Direito do Trabalho.
Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS).
Cobrança de valores não pagos.
Prazo prescricional.
Prescrição quinquenal.
Art. 7º, XXIX, da Constituição.
Superação de entendimento anterior sobre prescrição trintenária.
Inconstitucionalidade dos arts. 23, § 5º, da Lei 8.036/1990 e 55 do Regulamento do FGTS aprovado pelo Decreto 99.684/1990.
Segurança jurídica.
Necessidade de modulação dos efeitos da decisão.
Art. 27 da Lei 9.868/1999.
Declaração de inconstitucionalidade com efeitos ex nunc.
Recurso extraordinário a que se nega provimento. (ARE 709212, Relator(a): Min.
GILMAR MENDES, Tribunal Pleno, julgado em 13/11/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-032 DIVULG 18-02-2015 PUBLIC 19-02-2015) Natal/RN, 6 de Novembro de 2023. -
13/09/2023 10:08
Conclusos para decisão
-
13/09/2023 09:04
Juntada de Petição de parecer
-
08/09/2023 13:29
Expedição de Outros documentos.
-
08/09/2023 13:27
Proferido despacho de mero expediente
-
15/08/2023 11:54
Recebidos os autos
-
15/08/2023 11:54
Conclusos para despacho
-
15/08/2023 11:54
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
15/08/2023
Ultima Atualização
09/11/2023
Valor da Causa
R$ 0,00
Detalhes
Documentos
ACÓRDÃO • Arquivo
DESPACHO • Arquivo
DESPACHO • Arquivo
SENTENÇA • Arquivo
DESPACHO • Arquivo
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