TJRN - 0802697-76.2024.8.20.5113
2ª instância - Câmara / Desembargador(a) 3ª Turma Recursal
Processos Relacionados - Outras Instâncias
Polo Ativo
Polo Passivo
Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
-
24/07/2025 00:00
Intimação
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE 3ª TURMA RECURSAL Processo: RECURSO INOMINADO CÍVEL - 0802697-76.2024.8.20.5113 Polo ativo BANCO BRADESCO S/A Advogado(s): CARLOS AUGUSTO MONTEIRO NASCIMENTO Polo passivo ANTONIA FONTES DO NASCIMENTO SILVA Advogado(s): KEYLA SOARES DE SOUZA PINTO RECURSO CÍVEL INOMINADO Nº 0802697-76.2024.8.20.5113 ORIGEM: JUIZADO CÍVEL, CRIMINAL E DA FAZENDA PÚBLICA DA COMARCA DE AREIA BRANCA RECORRENTE(S): BANCO BRADESCO S/A.
ADVOGADOS: CARLOS AUGUSTO MONTEIRO NASCIMENTO RECORRIDO(S): ANTONIA FONTES DO NASCIMENTO SILVA ADVOGADO(S): KEYLA SOARES DE SOUZA PINTO JUIZ RELATOR: PAULO LUCIANO MAIA MARQUES EMENTA: RECURSO INOMINADO.
DIREITO CIVIL.
COBRANÇA DE TARIFAS E/OU PACOTES DE SERVIÇOS BANCÁRIOS NÃO CONTRATADOS.
ILEGALIDADE DOS DESCONTOS.
RESTITUIÇÃO EM DOBRO.
DANOS MORAIS NÃO CARACTERIZADOS.
AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA VIOLAÇÃO AOS DIREITOS DA PERSONALIDADE.
RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.
ACÓRDÃO Decidem os Juízes da Terceira Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis, Criminais e da Fazenda Pública do Rio Grande do Norte, à unanimidade de votos, conhecer e dar parcial provimento ao recurso, reformando a sentença apenas para julgar improcedentes os danos morais, mantidos os demais termos.
Sem custas e honorários advocatícios, em razão do parcial provimento do recurso.
Além do relator, participaram do julgamento o juiz José Undário de Andrade e a juíza Welma Maria Ferreira de Menezes.
PAULO LUCIANO MAIA MARQUES Juiz Relator SENTENÇA I – RELATÓRIO Relatório dispensado, nos termos do artigo 38 da Lei nº 9.099/1995.
II - FUNDAMENTAÇÃO Nos termos do art. 355, I, do CPC, passo a julgar antecipadamente a lide, porquanto os elementos de prova contidos nos autos são suficientes à análise do mérito, bem como pelo fato de, indagadas as partes sobre a necessidade de produção de provas, quedaram ambas inertes.
Inicialmente, verifico se tratar de uma relação de consumo, tendo em vista que a autora e réu se encaixam perfeitamente no conceito de consumidor e fornecedor estabelecidos nos artigos 2º e 3º da Lei nº 8.078/90, respectivamente, devendo este Diploma Legal ser considerado neste julgamento, para o que lhe for aplicável.
Vejamos: Art. 2° Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final.
Parágrafo único.
Equipara-se a consumidor a coletividade de pessoas, ainda que indetermináveis, que haja intervindo nas relações de consumo.
Art. 3° Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.
A autora é consumidora, pois é usuária, como consumidora final, do serviço prestado pela demandada.
A demandada é fornecedora, pois é pessoa jurídica de direito privado que fornece serviços aos seus consumidores, mais especificamente serviços bancários.
Inclusive, possível a aplicação do CDC às relações bancárias, senão, vejamos: o Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras (Súm. 297 STJ).
Antes de adentrar ao mérito, cumpre analisar as preliminares suscitadas pelo réu em sede de contestação.
II.1 - PRESCRIÇÃO A parte requerida argumentou que a pretensão autoral teria sido fulminada pela prescrição por incidência do art. 206, §3º, inciso V, do Código Civil.
Alega que descontos dos quais requer a reparação iniciaram em 2018 e que, como a prescrição começa a correr a partir da incidência do evento danoso, já não haveria mais a pretensão autoral.
A alegação não merece prosperar.
Com relação à declaração da nulidade dos descontos e repetição do indébito, entendo que não ocorreu a prescrição.
Em primeiro lugar, porque o prazo prescricional aplicável ao caso não é aquele do Código Civil, mas o prazo decenal previsto no Código Civil, em seu art. 205.
Assim é o entendimento dos Tribunais: DIREITO DO CONSUMIDOR - APELAÇÃO CÍVEL - CONTRATO BANCÁRIO - DESCONTOS DE TARIFA DE SERVIÇOS NÃO CONTRATADA - PRESCRIÇÃO - NÃO OCORRÊNCIA - PRAZO DECENAL – PRECEDENTES DESTA CORTE - RELAÇÃO DE CONSUMO - SÚMULA N.º 297/STJ - INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA - AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA CIÊNCIA DA CONSUMIDORA - VIOLAÇÃO AO ART. 373, INCISO II, DO CPC - MÁ-FÉ - RESTITUIÇÃO NA FORMA DOBRADA - SENTENÇA MANTIDA. - De acordo com o entendimento pacífico deste Sodalício, aplica-se a regra geral prevista no artigo 205 do Código Civil, em que o prazo prescricional é decenal, para os casos de repetição de indébito de tarifas bancárias ilegalmente descontadas do consumidor - Afiguram-se abusivos os descontos efetuados pela instituição financeira à título de tarifa bancária de cesta de serviços, na medida em que a consumidora não contratou o aludido serviço; - Diante da inversão do ônus da prova, o banco deixou de demonstrar que a consumidora detinha conhecimento das peculiaridades da contratação, inclusive dos serviços e as tarifas cobradas em virtude do serviço celebrado; - O desconto indevido e abusivo, sem a devida comunicação, de valores referentes ao serviço não contratado, ao longo de cinco anos, reduzindo a capacidade financeira da consumidora, é sim uma conduta ilícita, voluntária, e suscetível do dever de indenizar e de declarar a inexigibilidade do débito; - Quanto à repetição do indébito, a consumidora não pagou as tarifas de forma voluntária, eram em verdade subtraídas de sua conta de forma automática, razão pela qual ressai evidente a má-fé da instituição financeira, incidindo a regra do parágrafo único, do art. 42, do Código de Defesa do Consumidor. - RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJ-AM - AC: 07646130220208040001 AM 0764613-02.2020.8.04.0001, Relator: Dra.
Mirza Telma de Oliveira Cunha, Data de Julgamento: 20/07/2021, Terceira Câmara Cível, Data de Publicação: 20/07/2021) Rejeito, portanto, a preliminar de prescrição arguida.
II.2 - ILEGITIMIDADE PASSIVA A apreciação da legitimidade nas ações em que se postula direitos disponíveis é matéria simples, pois não demanda juízo de valor, mas de mera causalidade.
Assim, para saber se a parte demandada é legítima, isto é, se ela figura na relação jurídica de direito material deduzida, deve-se indagar apenas se o dano alegado teria ocorrido mesmo sem a conduta imputada ao réu.
Se a resposta a esse questionamento for positiva, então o réu é efetivamente parte ilegítima, pois não contribuiu para a ocorrência do dano; do contrário, é evidente a sua legitimidade.
Ora, para a realização do serviço bancário, é indispensável a presença da instituição demandada na cadeia de prestação do serviço ao destinatário final, bem como, imprescindível a presença de quem se beneficia do desconto do qual se discute.
Portanto, em uma análise superficial, sem adentrar no mérito, entendo devida a presença dos demandados no polo passivo da ação, razão pela qual rejeito a preliminar por ambos suscitada.
II.3 - AUSÊNCIA DE PRETENSÃO RESISTIDA Não merece prosperar a preliminar suscitada pelo réu, uma vez que a ausência de submissão prévia da questão à seara administrativa não é fator que obste o acesso do demandante à jurisdição.
O objeto de controvérsia em apreço não é uma das exceções ao Princípio da Ampla Inafastabilidade da Jurisdição (art. 5º, XXXV da CF/88), de modo a não ser exigível do consumidor que primeiramente enfrente a seara administrativa para só então lhe ser disponível o campo jurisdicional.
Interpretar dessa forma seria obstar o acesso à Justiça.
Rejeitada, portanto, a preliminar supra.
Sem mais preliminares arguidas, sigo à análise do mérito.
II.4 - MÉRITO Em sede de petição inicial, alega a parte autora possuir conta bancária junto ao Banco Bradesco S/A (Ag. 3226 - conta nº 82021-0), e a utiliza para receber benefício previdenciário.
Todavia, aduz que vem sendo descontada mensalmente tarifas bancárias sob as seguintes nomenclaturas: 1- PACOTE DE SERVIÇOS PADRONIZADO PRIORITÁRIOS I, no valor de R$15,95 (quinze reais e noventa e cinco centavos) 2 - PAGTO ELETRON COBRANÇA PAULISTA SERVIÇOS, no valor de R$59,90 (cinquenta e nove reais e noventa centavos) Entretanto, informa que desconhece a sua origem, posto que nunca contratou qualquer serviço que justificasse os descontos.
Diante disso, pugna a parte autora pela declaração da inexistência de relação jurídica frente ao Banco Bradesco S/A no que toca aos descontos realizados sem sua autorização, a condenação do banco demandado à abstenção dos descontos mensais ora discutidos, indenização por danos morais no valor de R$20.000,00 (vinte mil reais), e restituição dos valores pagos indevidamente, em dobro.
Pois bem.
Dos autos é possível constatar a existência de descontos a título de “PACOTE DE SERVIÇOS PADRONIZADO PRIORITÁRIOS I” e “PAGTO ELETRON COBRANÇA PAULISTA SERVIÇOS”, conforme extratos de ID 136955068.
Em sua inicial, a parte autora aduz que desconhece a origem dos descontos, explicitando que jamais contratou os serviços, utilizando a conta-corrente com fim de recebimento de seu benefício previdenciário.
Nesses termos, em processos como o presente, cabe à instituição financeira produzir prova cabal de que as tarifas debitadas na conta-corrente do consumidor decorrem de serviço contratado ou autorizado, observando rigorosamente as disposições regulatórias.
Conforme se depreende dos autos, vislumbro que se tratam de descontos de distintas naturezas, sendo um a título de tarifa bancária e outro de seguro, motivo pelo qual cada desconto será analisado isoladamente. - DA TARIFA BANCÁRIA "PACOTE DE SERVIÇOS PADRONIZADO PRIORITÁRIOS I" É certo que nos contratos bancários, conforme o Art. 1º da Resolução 3.919/2010 do Banco Central do Brasil, as instituições financeiras são obrigadas a fornecer serviços bancários essenciais a pessoas naturais relativos a conta de depósitos à vista e conta de depósitos de poupança, nos termos do art. 2º da mesma Resolução.
Isso porque, nas contas de depósito a vista, é vedado a instituição financeira cobrar tarifas por serviço, com possibilidade de, em contas gratuitas, “a) fornecimento de cartão com função débito; b) fornecimento de segunda via do cartão referido na alínea "a", exceto nos casos de pedidos de reposição formulados pelo correntista decorrentes de perda, roubo, furto, danificação e outros motivos não imputáveis à instituição emitente; c) realização de até quatro saques, por mês, em guichê de caixa, inclusive por meio de cheque ou de cheque avulso, ou em terminal de autoatendimento; d) realização de até duas transferências de recursos entre contas na própria instituição, por mês, em guichê de caixa, em terminal de autoatendimento e/ou pela internet; e) fornecimento de até dois extratos, por mês, contendo a movimentação dos últimos trinta dias por meio de guichê de caixa e/ou de terminal de autoatendimento; f) realização de consultas mediante utilização da internet; g) fornecimento do extrato de que trata o art. 19; h) compensação de cheques; i) fornecimento de até dez folhas de cheques por mês, desde que o correntista reúna os requisitos necessários à utilização de cheques, de acordo com a regulamentação em vigor e as condições pactuadas; e j) prestação de qualquer serviço por meios eletrônicos, no caso de contas cujos contratos prevejam utilizar exclusivamente meios eletrônicos.”, nos termos do art. 2º, I da referida Resolução.
Nesses termos, em processos como o presente, cabe à instituição financeira produzir prova cabal de que a tarifa debitada na conta-corrente do consumidor decorre de serviço contratado ou autorizado, observando rigorosamente as disposições regulatórias, ou ainda que o consumidor movimente a conta-corrente de maneira a justificar o pagamento da tarifa, superando os limites definidos no art. 2º, I, da Resolução 3.919/2010 acima elencados. É o que dispõe o Enunciado 5 das Turmas Recursais do III FOJERN: “A cobrança de tarifa pertinente à Pacote de Serviço bancário é abusiva se inexistir contratação escrita e formal, conforme a regulamentação do Banco Central do Brasil, estabelecida no art.8º da Resolução nº 3.919/2010, o que não se estende a outras modalidades de tarifas, condicionadas, apenas, à comprovação da efetiva prestação do serviço, a exemplo de cobrança de TED, emissão de talão de cheque e saque em caixa 24h”.
O demandado, em sua contestação, argumentou pela validade dos descontos, sob a justificativa de que a parte autora contratou os serviços em comento e realiza movimentações do pacote, colacionando aos autos Termo de Opção à Cesta de Serviços de ID 139895231.
Do referido termo, tenho que não existe qualquer assinatura aposta da demandante, mas tão somente suposta assinatura eletrônica genérica, desprovida das devidas validações necessárias.
Ainda, de análise dos únicos extratos, juntados pela autora no ID 136955068, tenho que no período exposto, não houve superação do limite de quatro saques, duas transferências e dois extratos por mês, o que vai de encontro à argumentação do réu, posto que a referida só é usada para movimentações básicas de qualquer conta bancária.
E, ainda que assim o fosse, é descabido que a instituição financeira, forçadamente, firme contratação onerosa de pacote do qual não anuiu o usuário, posto que a simples movimentação acima do limite estabelecido não enseja na autorização de firmamento de negócio, podendo o banco, tão somente, cobrar isoladas tarifas extras às movimentações que extrapolem o permitido nos serviços essenciais.
Desta feita, torna-se imperioso o reconhecimento de que a movimentação da conta sempre se deu em patamar inferior aos limites previstos para serviços bancários essenciais previstos no Art. 2º da Resolução 3.919/2010 e, inexistindo instrumento formal que autorize a cobrança da referida tarifa bancária, seu desconto caracteriza-se como ato ilícito. - DO SEGURO PAULISTA SERVIÇOS DE RECEBIMENTOS E PAGAMENTOS (PSERV) Sobre o desconto supra, tenho que o banco réu é responsável pela manutenção da conta autoral, devendo possuir meios de validação para as autorizações de descontos a serem realizados na conta corrente de seus clientes, seja através de um contrato físico ou cláusula de adesão ao seguro que ensejou os descontos nos proventos da demandante.
Tal situação não ocorre nos autos, posto que o requerido se limita a afirmar que não detinha responsabilidade sobre o seguro discutido, o que já foi fartamente rebatido por este Juízo, não logrando êxito em demonstrar a origem/autorização para débito em comento.
Diante de tal situação, deve prevalecer a tese da parte autora no sentido de que o serviço nunca fora contratado, não havendo razão para justificar os descontos em seus proventos sob a nomenclatura “PSERV”.
Ademais, a fim de evitar o levantamento de quaisquer embargos por omissão deste Juízo, pontuo que o recurso processual de denunciação à lide não é cabível no âmbito dos Juizados Especiais, conforme delimita o art. 10 da Lei 9.099/95, havendo a responsabilidade recair ao banco réu, legitimamente responsável, não havendo o que se falar em imputação de culpa a terceiros estranhos à lide.
Assim, por não existir prova da legitimidade dos descontos realizados, declaro a sua nulidade e a ilicitude dos descontos efetuados sob as rubricas “PACOTE DE SERVIÇOS PADRONIZADO PRIORITÁRIOS I” e “PAGTO ELETRON COBRANÇA PAULISTA SERVIÇOS”.
Prosseguindo aos demais pedidos, de fato, segundo o art. 42, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor, o consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável, o que não representa a hipótese ora em análise.
Contudo, valho-me da pontuação de que, no caso em discussão, existem dois descontos dos quais fora atestada a nulidade, o que é plenamente válido e revela, sobretudo, a boa-fé da autora em solucionar, em um único processo, o ilícito ocorrido quanto aos dois débitos.
Mas, tenho que, embora o banco réu seja, de fato, legítimo em estar no polo passivo, importante a delimitação de até onde pode ir a sua responsabilização, tendo em vista que, em que pese a falha da prestação do seu serviço ter contribuído para as cobranças indevidas (o que incide do dano moral), não poderá ser compelido a arcar com a devolução de quantia da qual jamais se beneficiou materialmente.
Assim, no que diz respeito ao seguro “PAGTO ELETRON COBRANÇA PAULISTA SERVIÇOS”, delimito aqui a declaração tão somente de sua ilicitude e eventual compensação moral que a autora deverá receber, posto que, como dito, incorreria em injustiça a determinação de restituição de valores não recebidos pela parte demandada.
No que diz respeito à tarifa "PACOTE DE SERVIÇOS PADRONIZADO PRIORITÁRIOS I", essa sim cobrada e recebida pelo próprio banco réu, passo a delimitar sobre o dano material sobre ela incidente.
Nos autos, a autora comprovou, através do seu extrato bancário, o desconto de quatro parcelas nos valores de R$15,95 cada, sendo devidas as suas restituições, conforme requerido na inicial.
Em relação à repetição do indébito, ao interpretar o art. 42, parágrafo único, do CDC, a Corte Especial do STJ, alterou o entendimento anterior no sentido de que para a devolução em dobro não precisa mais demonstrar o elemento volitivo da má-fé, bastando a conduta contrária à boa-fé objetiva.
Todavia, modulou a aplicação dessa decisão vinculativa aos indébitos posteriores à publicação do acórdão, em 30 de março de 2021, conforme se extrai do EAREsp 676.608/RS, e, por não se presumir a má-fé, a falta de provas de sua existência impede a repetição em dobro do tempo anterior à publicação do acórdão proferido.
Tendo em vista que as datas das cobranças indevidas remetem a 2024, e em atenção à modulação instruída no EAREsp 676.608/RS, entendo que a devolução deve ser dada de forma dobrada.
Quanto aos danos morais, diante da situação fática, vislumbro que a parte demandante sofreu abalo moral indenizável.
No que tange aos danos morais, a responsabilidade civil é regida pelos artigos 186 e 927 do Código Civil, que dispõe que aquele que comete ato ilícito, seja por violação à lei, seja por violação ao contrato, imputável a si, por culpa ou por força da Lei, gerando dano (nexo causal), ainda que exclusivamente moral, tem obrigação de indenizar.
A instituição financeira deve velar pela legitimidade dos negócios jurídicos com ela pactuados, correndo os riscos inerentes à sua atividade, devendo ser responsabilizada na ocasião de descontos ilegítimos nos proventos da parte autora, ainda mais quando o próprio fornecedor do serviço é, também, o beneficiário.
Assim, ocorrendo erro, torna-se responsável pelo contrato firmado e pelas suas consequências, porque, a teor do art. 14 do Código de Defesa do Consumidor, o tipo de responsabilidade a ser suportada é a objetiva, independente da constatação de culpa para sua responsabilização, estando satisfeita com a ocorrência na falha dos serviços que fornece, os danos suportados pelo consumidor e o nexo de causalidade existente.
Constatada a falha na prestação dos serviços, em especial a ocorrência de contratação indevida, sem qualquer amparo documental, descontos indevidos diretamente sobre os proventos, em valor expressivo quando comparado ao seu rendimento mensal e despesas mensais, está configurada a ocorrência do dano moral, já que esta ficou desguarnecido de parcela de valores indispensáveis ao custeio de suas necessidades diárias, afetando sua tranquilidade.
Por essa razão, levando-se em consideração as peculiaridades do caso, a extensão do dano (art. 944 do Código Civil), e o princípio de que é vedada a transformação do dano em enriquecimento sem causa, fixo-a em R$4.000,00 (quatro mil reais).
III – DISPOSITIVO: Por tais considerações, com fundamento no art. 487,I, do CPC, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados por Antonia Fontes do Nascimento Silva em desfavor do Banco Bradesco S/A para: a) DECLARAR a inexistência de relação jurídica entre as partes, referente a cobrança da Tarifa PACOTE DE SERVIÇOS PADRONIZADO PRIORITÁRIOS I; b) DECLARAR a inexistência de relação jurídica entre as partes para desconstituir o contrato de seguro identificado pela rubrica de descontos “PGTO ELETRON COBRANCA PSERV”. c) DEIXO DE CONDENAR a ré ao pagamento de danos materiais quanto ao desconto de rubrica "PGTO ELETRON COBRANCA PSERV", pelos motivos já fartamente delineados. d) CONDENAR a título de indenização por danos materiais, a parte ré a restituir os valores descontados tão somente quanto à rubrica "PACOTE DE SERVIÇOS PADRONIZADO PRIORITÁRIOS I" dos proventos da autora, em razão da tarifa não contratada, a ser dada de forma dobrada, referente aos quatro descontos, no valor de R$15,95, comprovados no ID 136955068.
Sobre esse valor, incidem juros de 1% a.m. e correção monetária pelo INPC desta a data do efetivo prejuízo, isto é, desde cada desconto indevido, até a data de 27/08/2024.
A partir de 28/08/2024 (início dos efeitos da Lei 14.905/2024), os juros ficam na forma do artigo 406, § 1º e 2º, e a e correção monetária nos termos do artigo 389, parágrafo único, ambos do Código Civil. e) CONDENAR a parte ré a pagar a parte autora a quantia de R$4.000,00 (quatro mil reais) a título de indenização por danos morais.
Sobre esse valor, incidem juros de 1% a.m. a partir do evento danoso e correção monetária pelo INPC a partir do arbitramento (Súmula 362 do STJ), até a data de 27/08/2024.
A partir de 28/08/2024 (início dos efeitos da Lei 14.905/2024), os juros ficam na forma do artigo 406, § 1º e 2º, e a e correção monetária nos termos do artigo 389, parágrafo único, ambos do Código Civil.
Sem condenação em custas e em honorários (art. 55 da Lei no 9.099/95).
Havendo pagamento voluntário da quantia, expeça-se alvará para levantamento dos valores em favor da demandante.
Decorrido o prazo recursal, arquivem-se.
Cumpra-se.
Areia Branca/RN, data do sistema.
ANDRESSA LUARA HOLANDA ROSADO FERNANDES Juíza de Direito (documento assinado digitalmente na forma da Lei n°11.419/06) RECURSO: reformar a sentença de 1º Grau, reconhecendo a validade da contratação e julgando totalmente improcedente os pedidos da parte Recorrida, com a devida uniformização jurisprudencial com a SÚMULA 39 DA TUJ.
Requer que a atualização dos valores e os juros moratórios referentes aos danos morais se dê a partir da prolação da sentença, aplicando-se, por analogia a Súmula 362 do Superior Tribunal de Justiça.
Bem como a restituição dos valores debitados da conta da Recorrida na forma simples, haja vista a ausência de comprovação de má-fé por parte desta Instituição Financeira.
CONTRARRAZÕES: requer manutenção da sentença e improvimento do recurso.
VOTO Presentes os pressupostos de admissibilidade, necessário o conhecimento do Recurso Inominado.
Trata-se de ação em que a autora afirma desconhecer descontos feitos pelo réu no seu benefício de aposentadoria, alegando não ter feito qualquer contratação sob a rubrica "“PACOTE DE SERVIÇOS PADRONIZADO PRIORITÁRIOS I” e “PAGTO ELETRON COBRANÇA PAULISTA SERVIÇOS".
A sentença julgou parcialmente procedente os pedidos do autor.
Compulsando atentamente os autos, observa-se que há parcial razão nos argumentos da recorrente.
No sistema de distribuição do ônus da prova previsto pelo Código de Processo Civil, cabe ao autor comprovar os fatos constitutivos do direito alegado (CPC, art. 373, I) e ao réu, na sua resposta, impugnar o pedido do autor, especificando as provas que pretende produzir (CPC, art. 336), ou, caso alegue o réu algum fato em sua própria defesa, sobre si recairá o ônus de prová-lo (CPC, art. 373, II).
Houve comprovação da ilegalidade dos descontos, diante da ausência de contratação, com a necessidade de restituição do indébito, que, nos termos do art. 42, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor, deve ser realizada em dobro, em razão da quebra da boa-fé objetiva, a qual independe da comprovação de má-fé ou culpa, em consonância com o entendimento firmado pela Corte Especial do STJ em EAREsp nº 676.608, objeto de julgamento em 21/10/2020.
Ressalta-se que, para as parcelas cobradas durante o período anterior a 21/10/2020, a má-fé fica está comprovada pela própria inexistência de contrato válido.
Por fim, com relação ao pedido de indenização por danos morais, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, por meio de sua Turma de Uniformização de Jurisprudência, aprovou o enunciado da Súmula n.º 39, nos seguintes termos: NÃO GERA DANO MORAL PRESUMIDO A MERA COBRANÇA DE TARIFAS E/OU PACOTES DE SERVIÇOS BANCÁRIOS NÃO CONTRATADOS, DEVENDO-SE DEMONSTRAR A AFETAÇÃO A DIREITOS DA PERSONALIDADE QUE EXTRAPOLEM O ÂMBITO ORDINÁRIO DA COBRANÇA DE DÍVIDA.
Como consequência, o pedido de condenação do banco ao pagamento de indenização por danos morais deve ser julgado improcedente uma vez que não foram demonstrados danos que ultrapassem a esfera patrimonial do autor, nem violação a direitos da personalidade.
Nesse sentido, já decidiu esta Turma Recursal: EMENTA: RECURSO INOMINADO.
DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR.
DESCONTOS DESCONHECIDOS.
RESOLUÇÃO 3.919/2010 DO BACEN.
USO DA CONTA QUE EXCEDIA OS LIMITES NÃO TARIFÁVEIS.
INEXISTÊNCIA DE CONTRATAÇÃO VÁLIDA.
RESTITUIÇÃO EM DOBRO DOS VALORES.
AUSÊNCIA DE DANO MORAL.
RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. (RECURSO Nº 0801693-41.2024.8.20.5133.
Relator: PAULO LUCIANO MAIA MARQUES.
Publicado em: 27/05/2025).
Assim, voto pelo conhecimento do recurso e parcial provimento, reformando a sentença apenas para julgar improcedentes os danos morais, mantidos os demais termos.
Sem custas e honorários advocatícios, em razão do parcial provimento do recurso. É como voto.
Natal/RN, data do sistema.
PAULO LUCIANO MAIA MARQUES Juiz Relator Natal/RN, 8 de Julho de 2025. -
06/05/2025 12:57
Recebidos os autos
-
06/05/2025 12:57
Conclusos para julgamento
-
06/05/2025 12:57
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
06/05/2025
Ultima Atualização
22/07/2025
Valor da Causa
R$ 0,00
Documentos
Acórdão • Arquivo
Sentença • Arquivo
Despacho • Arquivo
Despacho • Arquivo
Informações relacionadas
Processo nº 0806674-78.2025.8.20.5004
Carlos Roberto Pinto
Antonio da Silva
Advogado: Carlos Roberto Pinto
1ª instância - TJRN
Ajuizamento: 16/04/2025 19:42
Processo nº 0841592-20.2025.8.20.5001
Liceu Luis de Carvalho
Municipio de Natal
Advogado: Manoel Matias Filho
1ª instância - TJRN
Ajuizamento: 06/06/2025 15:22
Processo nº 0800336-47.2024.8.20.5126
Zacarias Balbino Jorge
Banco Itau Consignado S.A.
Advogado: Eny Ange Soledade Bittencourt de Araujo
1ª instância - TJRN
Ajuizamento: 18/01/2024 09:23
Processo nº 0800065-81.2024.8.20.5144
Clenilson Macedo Pessoa
Servico Notorial e Registral de Brejinho...
Advogado: Mathews Leao de Medeiros Lima
1ª instância - TJRN
Ajuizamento: 24/01/2024 18:21
Processo nº 0827179-02.2025.8.20.5001
Jose Nascimento da Silva
Departamento Estadual de Transito do Rio...
Advogado: Aldenir Gomes Falcao Junior
1ª instância - TJRN
Ajuizamento: 28/04/2025 09:39