TJRN - 0817739-81.2024.8.20.0000
2ª instância - Câmara / Desembargador(a) Cornelio Alves
Polo Ativo
Polo Passivo
Advogados
Nenhum advogado registrado.
Assistente Desinteressado Amicus Curiae
Partes
Advogados
Nenhum advogado registrado.
Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
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14/05/2025 00:00
Intimação
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL Processo: AGRAVO DE INSTRUMENTO - 0817739-81.2024.8.20.0000 Polo ativo VERA LUCIA CARDOSO DA SILVA Advogado(s): GABRIEL SORRENTINO BAENA DE SOUZA Polo passivo ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE Advogado(s): EMENTA: DIREITO PROCESSUAL CIVIL.
AGRAVO DE INSTRUMENTO.
TUTELA DE URGÊNCIA.
SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE (SUS).
PROCEDIMENTO CIRÚRGICO.
INCLUSÃO EM LISTA DE REGULAÇÃO.
PROVIMENTO EM PARTE.
I.
CASO EM EXAME: Agravo de Instrumento interposto contra decisão que indeferiu tutela de urgência para realização de procedimento cirúrgico pelo Sistema Único de Saúde (SUS) ou custeio pelo Estado do Rio Grande do Norte na rede privada.
II.
QUESTÃO EM DISCUSSÃO: A questão em discussão consiste em determinar se a agravante tem direito à tutela de urgência para a realização do procedimento cirúrgico, considerando a necessidade de inclusão em lista de regulação do SUS e a alegação de urgência da medida.
III.
RAZÕES DE DECIDIR 1.
O direito à saúde é constitucionalmente garantido, impondo ao Estado a obrigação de adotar medidas para sua efetivação. 2.
A análise da tutela de urgência deve considerar os requisitos do art. 300 do CPC e as especificidades do caso concreto, incluindo a urgência e o risco de dano irreparável. 4.
A jurisprudência orienta que, sempre que possível, decisões liminares sobre saúde devem ser precedidas de evidências científicas e relatórios médicos circunstanciados. 5.
Ainda que se reconheça a urgência do procedimento cirúrgico, a organização do SUS impõe a necessidade de inclusão em lista de regulação para garantir o acesso equânime e otimizado aos serviços de saúde.
IV.
DISPOSITIVO E TESE 6.
Agravo de Instrumento conhecido e parcialmente provido para determinar que o Estado do Rio Grande do Norte inclua a agravante em lista de regulação para a realização do procedimento cirúrgico prescrito.
Tese de Julgamento: 7.
Ainda que o direito à saúde seja garantido, a realização de procedimentos cirúrgicos pelo SUS está condicionada à inclusão do paciente em lista de regulação, ressalvadas situações de excepcional urgência que justifiquem a desconsideração da ordem cronológica.
Dispositivos Relevantes Citados: CF/1988, art. 196; CPC, art. 300.
Jurisprudência Relevante Citada: Enunciados nº 18, 19, 51, 62, 69 e 92 das Jornadas de Direito da Saúde do CNJ.
ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos em que são partes as acima identificadas: Acordam os Desembargadores que compõem a Primeira Câmara Cível deste Tribunal de Justiça, à unanimidade de votos, em conhecer e dar provimento, em parte, ao Agravo de Instrumento interposto por Vera Lúcia Cardoso da Silva, nos termos do voto do Relator, parte integrante deste.
RELATÓRIO Trata-se de Agravo de Instrumento, com pedido de efeito ativo, interposto por Vera Lúcia Cardoso da Silva em face de decisão proferida pelo Juízo da 1ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Parnamirim/RN que, nos autos do processo de nº 0819798-93.2024.8.20.5124, por ela ajuizado em seu desfavor do Estado do Rio Grande do Norte, indeferiu a tutela provisória de urgência, fundamentando as razões de decidir na ausência de negativa administrativa do Ente ou a indisponibilidade da prestação requerida (Id. 138380579).
Sustenta em suas razões recursais que: a) a decisão agravada deve ser reformada, sob o argumento de que o indeferimento da tutela de urgência se baseou na ausência de prova da negativa administrativa ou de indisponibilidade da prestação do serviço pelo Sistema Único de Saúde, o que a agravante considera "prova diabólica"; b) todas as diligências realizadas para obter o encaminhamento para o Hospital Onofre Lopes, nosocômio responsável pela realização de procedimentos oftalmológicos pelo SUS, restaram infrutíferas; c) caso tivesse conseguido o atendimento pelo SUS, não haveria necessidade de ajuizar a demanda; d) o direito à saúde é fundamental e deve ser aplicado de forma imediata, sendo dever do Estado garantir o acesso à saúde e; e) a urgência na realização do procedimento cirúrgico requerido, sob pena de perda permanente da visão, justifica a concessão da tutela antecipada recursal.
Requer, ao final, a concessão de tutela recursal para determinar que “o Estado do Rio Grande do Norte forneça o procedimento, com custeio da equipe médica, hospital e material necessários à realização da cirurgia” e, no mérito, sua confirmação.
Liminar recursal concedida em parte por esta Relatoria ao Id. 28641187.
Intimado, o Estado do Rio Grande do Norte deixou transcorrer o prazo sem apresentar contrarrazões (Certidão preclusiva de Id. 29789969).
Intimado, o Órgão Ministerial opinou pelo conhecimento e provimento, em parte, do Agravo de Instrumento “para reformar a decisão de primeiro grau, a fim de que a agravante seja incluída em lista de regulação para a realização do procedimento cirúrgico, confirmando-se a antecipação da tutela recursal de Id. 28641187” (Id. 29842151). É o relatório.
VOTO Presentes os requisitos de admissibilidade, conheço do instrumental e passo a sua análise.
Na situação em exame, pretende a agravante a reforma da decisão de origem que indeferiu pedido de tutela de urgência, para determinar a realização de procedimento cirúrgico no Sistema Único de Saúde ou imputar que o Estado do Rio Grande do Norte assuma os custos na rede privada de saúde.
Por oportuno, que em se tratando de Agravo de Instrumento, a sua análise limitar-se-á, apenas e tão somente, ao preenchimento dos requisitos aptos à concessão da antecipação dos efeitos da tutela antecipada sem, contudo, adentrar à questão de fundo da matéria, nos termos do que dispões o art. 300 do CPC1.
De início, pontuo que a saúde é um direito constitucional, que obriga a Administração Pública a tomar medidas para sua concretização, tanto através de políticas sociais e econômicas, em caráter programático.
No entanto, a discussão recursal não se concentra no direito à saúde em abstrato ou na urgência geral que afeta a todos, mas sim na análise de elementos específicos que permitam a concessão antecipada da tutela jurisdicional pretendida.
Sobre o tema, importa trazer a lume os Enunciados nº 51, 62 e 92, das Jornadas de Direito da Saúde, realizadas pelo CNJ (grifos não originais): ENUNCIADO Nº 18 – Sempre que possível, as decisões liminares sobre saúde devem ser precedidas de notas de evidência científica emitidas por Núcleo de Apoio Técnico do Judiciário - NatJus e/ou consulta do banco de dados pertinente. (Redação dada pela III Jornada de Direito da Saúde – 18.03.2019) ENUNCIADO Nº 19 – As iniciais das demandas de acesso à saúde devem ser instruídas com relatório médico circunstanciado para subsidiar uma análise técnica nas decisões judiciais. (Redação dada pela III Jornada de Direito da Saúde – 18.03.2019) Enunciado nº 51: Nos processos judiciais, a caracterização da urgência/emergência requer relatório médico circunstanciado, com expressa menção do quadro clínico de risco imediato.
ENUNCIADO Nº 69: Nos casos em que o pedido em ação judicial seja a realização de consultas, exames, cirurgias ou procedimentos especializados, recomenda-se consulta prévia ao ente público demandado sobre a existência de lista de espera organizada e regulada pelo Poder Público para acessar o respectivo serviço, de forma a verificar a inserção do paciente nos sistemas de regulação, de acordo com o regramento de referência de cada Município, Região ou Estado, observados os critérios clínicos e de priorização.
Enunciado nº 92: Na avaliação de pedido de tutela de urgência, é recomendável levar em consideração não apenas a indicação do caráter urgente ou eletivo do procedimento, mas também o conjunto da condição clínica do demandante, bem como as repercussões negativas do longo tempo de espera para a saúde e bem-estar do paciente.
Com efeito, além da indicação médica pela necessidade de submissão da autora ao procedimento cirúrgico prescrito – vitrectomia; endolaser e; troca de fluido gasosa, em olho direito –, extrai-se do referido documento o risco imediato de vida ou lesões irreparáveis caso não realizado imediatamente, com possibilidade de perda total e irreversível da visão caso prorrogada sua realização, razão pela qual, pelo menos dentro da superficialidade do momento processual, infere-se a existência dos requisitos necessários à antecipação dos efeitos da tutela.
Corroborando a probabilidade do direito e o perigo de dano, concluiu o parecer técnico do NATJus de forma favorável à pretensão autoral, confirmando a existência de evidências científicas quanto ao procedimento em discussão ao caso em específico, com expressa menção do quadro clínico de risco imediato pormenorizado caso negada sua realização e a impossibilidade de espera razoável.
Veja-se: “Tecnologia: 0405030177 – VITRECTOMIA POSTERIOR COM INFUSÃO DE PERFLUOCARBONO/ÓLEO DE SILICONE/ENDOLASER Conclusão Justificada: Favorável Conclusão: CONSIDERANDO que a paciente apresenta opacidade vitrea, com baixa importante da acuidade visual no olho direito, conforme os dados acostados ao processo.
CONSIDERANDO que a ausência do tratamento com a cirurgia de Vitrectomia, pode pode ocasionar danos irreversíveis à função visual no olho afetado.
Considerando-se que o SUS oferece o tratamento de Vitrectomia Via Pars Plana.
CONCLUI-SE que há elementos técnicos favoraveis aos procedimentos solicitados de Vitrectomia associada no olho afetado, com urgência.
Há evidências científicas? Sim Justifica-se a alegação de urgência, conforme definição de Urgência e Emergência do CFM? Sim Justificativa: Com risco de lesão de órgão ou comprometimento de função”.
Em que pese os argumentos, todavia, não há como desconsiderar a justificativa utilizada na decisão de origem quanto à necessidade de demonstração de negativa prestacional pelo Ente Público, requisito imprescindível à análise da própria existência de interesse de agir à espécie.
Informa a autora, contudo, a impossibilidade de obtenção de documento formal sobre a negativa de atendimento, relatando que mesmo após tentativa, a declaração só poderia ser disponibilizada pelo nosocômio responsável pelo procedimento oftalmológico, após encaminhamento do Hospital Walfredo Gurgel, circunstância que, no momento, permite inferir o respectivo interesse processual.
De certo, eventual impossibilidade na obtenção do documento não pode obstar o acesso da parte à prestação jurisdicional, especialmente quando demonstrada a situação de urgência e perigo de dano irreversível, sob pena de negativa ao próprio direto fundamental à saúde.
Feitas as considerações, embora o direito à saúde constitua disposição constitucional programática, com dever efetivo de concretação, não há como ignorar, apesar do desconforto decisório, a finitude dos recursos públicos na sua organização orçamentária, devendo a análise ponderar os valores axiológicos de modo a compatibilizá-los, garantido-se o cumprimento da garantia fundamental de forma sustentável sem o excessivo comprometimento do orçamento público e prejuízo a consecução prestacional a sociedade.
Portanto, num primeiro momento, o direcionamento à realização do procedimento cirúrgico deve ser, prioritariamente, a rede pública de saúde, pela respectiva inclusão da autora/paciência no sistema de regulação, para agendamento, dentro da ordem de prioridade/gravidade da situação.
Sobre o tópico, ressalto que a regulação por meio de setor específico da Administração Pública tem como propósito organizar e conferir, além da prestação dos serviços de forma equânime e justa pelo Sistema Único de Saúde, o acesso de forma ordeira e otimizada, com graduação de ordem que leva em conta a gravidade dos pacientes e o tempo de espera na lista, priorizando-se o acesso à saúde em seu viés material – que pressupõe a priorização daqueles que se encontram em estado mais grave –, obstaculizando a ocorrência de preferências indevidas ou mesmo fraudulentas.
Assim, embora seja garantido o acesso à saúde, a dicção do art. 196 da Constituição da República Federativa do Brasil não autoriza a imediata desconsideração dos sistemas regulatórios existentes, tendo em vista a imensa demanda e a deficitária capacidade do Estado de concretizar de modo amplo e geral os procedimentos médicos requeridos pela população.
Assim, somente de forma excepcional é que cabe ao Poder Judiciário, como última instância a dar a palavra em conflitos sociais, determinar a providência em caráter forçoso e com possibilidades de custeios alternativos em relação ao tratamento na esfera pública.
No referido contexto, não havendo evidência que indique situação de excepcionalidade suficiente a alterar a ordem estabelecida na regulação, especialmente quando sequer foi oportunizado ao ente público a concretização da pretensão, não se afigura razoável a ingerência pelo Poder Judiciário, sem o aprofundamento da situação, na ordenação referida, em prejuízo do direito de outras pessoas que estão, igualmente, à espera de procedimento idêntico e que não ingressaram em Juízo.
Esclareço que a conclusão adotada, não contradiz a situação de urgência do caso, porquanto, a ordem de inclusão na fila de regulação pressupõe a avaliação do paciente, sendo sua classificação na fila ordenada após consideração quanto a situação e gravidade do paciente, inclusive com a possibilidade de reclassificação da ordem em caso de agravamento ulterior.
Nesse cenário, entendo não ser possível, num primeiro momento, o deferimento desarrazoado de medidas dessa natureza, desrespeitando a fila de regulação, repito, organizada através de avaliação e critérios médicos, sob pena do dano causado àqueles que não dispõem de assistência jurídica e não ingressam em juízo buscando a realização de um direito.
A conclusão adotada nesse momento processual não impede sua reanálise caso alterado o contexto fático dos autos, assim, mesmo após a regulação, se demonstrada circunstância excepcional apta a justificar eventual desconsideração da ordem/lista de espera, poderá o Juízo de origem garantir a prestação do serviço em rede complementar de saúde ou, subsidiariamente, de forma privada, com o custeio respectivo pelo Ente Público. À vista do exposto, DEFIRO, em parte, a concessão do efeito recursal pretendido Pelo exposto, conheço e dou provimento, em parte, ao Agravo de Instrumento interposto por Vera Lucia Cardoso da Silva, reformando-se a decisão de origem para determinar que o Estado do Rio Grande do Norte adote as providências necessárias para a inclusão da autora, Vera Lúcia Cardoso da Silva, em lista de regulação para a realização do procedimento cirúrgico prescrito.
Confirmo os efeitos da tutela recursal parcialmente deferida ao Id. 28641187 É como voto.
Natal/RN, data do registro no sistema.
Desembargador Cornélio Alves Relator 1 art. 300.
A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.
Natal/RN, 5 de Maio de 2025. -
23/04/2025 00:00
Intimação
Poder Judiciário do Rio Grande do Norte Primeira Câmara Cível Por ordem do Relator/Revisor, este processo, de número 0817739-81.2024.8.20.0000, foi pautado para a Sessão VIRTUAL (Votação Exclusivamente PJe) do dia 05-05-2025 às 08:00, a ser realizada no Primeira Câmara Cível (NÃO VIDEOCONFERÊNCIA).
Caso o processo elencado para a presente pauta não seja julgado na data aprazada acima, fica automaticamente reaprazado para a sessão ulterior.
No caso de se tratar de sessão por videoconferência, verificar o link de ingresso no endereço http://plenariovirtual.tjrn.jus.br/ e consultar o respectivo órgão julgador colegiado.
Natal, 22 de abril de 2025. -
19/03/2025 16:06
Conclusos para decisão
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12/03/2025 12:36
Juntada de Petição de parecer
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10/03/2025 14:28
Expedição de Outros documentos.
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10/03/2025 14:28
Decorrido prazo de Estado do Rio Grande do Norte em 07/03/2025.
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08/03/2025 01:19
Decorrido prazo de ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE em 07/03/2025 23:59.
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08/03/2025 00:32
Decorrido prazo de ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE em 07/03/2025 23:59.
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12/02/2025 01:39
Decorrido prazo de VERA LUCIA CARDOSO DA SILVA em 11/02/2025 23:59.
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12/02/2025 00:31
Decorrido prazo de VERA LUCIA CARDOSO DA SILVA em 11/02/2025 23:59.
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22/01/2025 09:25
Publicado Intimação em 21/01/2025.
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22/01/2025 09:25
Disponibilizado no DJ Eletrônico em 19/12/2024
-
22/01/2025 09:25
Disponibilizado no DJ Eletrônico em 19/12/2024
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22/01/2025 06:40
Publicado Intimação em 21/01/2025.
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22/01/2025 06:40
Disponibilizado no DJ Eletrônico em 19/12/2024
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23/12/2024 00:00
Decorrido prazo de SECRETARIA DE SAÚDE - RN em 22/12/2024 14:11.
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23/12/2024 00:00
Decorrido prazo de SECRETARIA DE SAÚDE - RN em 22/12/2024 14:11.
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20/12/2024 14:11
Mandado devolvido entregue ao destinatário
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20/12/2024 14:11
Juntada de devolução de mandado
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19/12/2024 00:00
Intimação
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE Gab.
Des.
Cornélio Alves na Câmara Cível Avenida Jerônimo Câmara, 2000, -, Nossa Senhora de Nazaré, NATAL - RN - CEP: 59060-300 Agravo de Instrumento nº 0817739-81.2024.8.20.0000 Agravante: Vera Lúcia Cardoso da Silva Agravado: Estado do Rio Grande do Norte Relator: Desembargador Cornélio Alves.
Processo de origem nº 0819798-93.2024.8.20.5124, em trâmite na 1ª Vara da fazenda Pública da Comarca de Parnamirim/RN DECISÃO Trata-se de agravo de instrumento, com pedido de efeito ativo, interposto por Vera Lúcia Cardoso da Silva em face de decisão proferida pelo Juízo da 1ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de Parnamirim/RN que, nos autos do processo de nº 0819798-93.2024.8.20.5124, por ela ajuizado em seu desfavor do Estado do Rio Grande do Norte, indeferiu a tutela provisória de urgência, fundamentando as razões de decidir na ausência de negativa administrativa do Ente ou a indisponibilidade da prestação requerida (Id. 138380579).
Sustenta em suas razões recursais que: a) a decisão agravada deve ser reformada, sob o argumento de que o indeferimento da tutela de urgência se baseou na ausência de prova da negativa administrativa ou de indisponibilidade da prestação do serviço pelo Sistema Único de Saúde, o que a agravante considera "prova diabólica"; b) todas as diligências realizadas para obter o encaminhamento para o Hospital Onofre Lopes, nosocômio responsável pela realização de procedimentos oftalmológicos pelo SUS, restaram infrutíferas; c) caso tivesse conseguido o atendimento pelo SUS, não haveria necessidade de ajuizar a demanda; d) o direito à saúde é fundamental e deve ser aplicado de forma imediata, sendo dever do Estado garantir o acesso à saúde e; e) a urgência na realização do procedimento cirúrgico requerido, sob pena de perda permanente da visão, justifica a concessão da tutela antecipada recursal.
Requer, ao final, a concessão de tutela recursal para determinar que “o Estado do Rio Grande do Norte forneça o procedimento, com custeio da equipe médica, hospital e material necessários à realização da cirurgia”. É o que importa relatar.
Decido.
De acordo com o que preceitua a regra insculpida no art. 1.019, inciso I, c/c o art. 932, inciso II, ambos do Código de Processo Civil, em sede de agravo de instrumento, o Relator poderá atribuir suspensividade ou deferir, em antecipação de tutela, total ou parcialmente, a pretensão recursal: “Art. 932.
Incumbe ao relator: [...] II - apreciar o pedido de tutela provisória nos recursos e nos processos de competência originária do tribunal; [...] Art. 1.019.
Recebido o agravo de instrumento no tribunal e distribuído imediatamente, se não for o caso de aplicação do art. 932, incisos III e IV, o relator, no prazo de 5 (cinco) dias: I - poderá atribuir efeito suspensivo ao recurso ou deferir, em antecipação de tutela, total ou parcialmente, a pretensão recursal, comunicando ao juiz sua decisão; [...]” Para tal concessão, imprescindível a presença dos requisitos constantes do artigo 995, parágrafo único, do diploma processual em vigor, quais sejam: risco de dano grave, de difícil ou impossível reparação, além da probabilidade de provimento do recurso.
In verbis: “Art. 995.
Os recursos não impedem a eficácia da decisão, salvo disposição legal ou decisão judicial em sentido diverso.
Parágrafo único.
A eficácia da decisão recorrida poderá ser suspensa por decisão do relator, se da imediata produção de seus efeitos houver risco de dano grave, de difícil ou impossível reparação, e ficar demonstrada a probabilidade de provimento do recurso.” Por oportuno, ressalto que, em se tratando de agravo de instrumento, sua análise limitar-se-á, nesse momento processual, tão somente, aos requisitos imprescindíveis à concessão do efeito recursal pretendido, quais sejam, a existência concreta de risco de dano grave, de difícil ou impossível reparação caso mantida a eficácia da decisão recorrida, bem assim, a demonstração a probabilidade dos fundamentos levantados no instrumental, consubstanciada na possibilidade concreta de êxito recursal.
Pois bem, como sabido, a prestação da saúde é dever do Estado, compreendido nas suas três esferas de atuação, que deve, para tanto, se valer de políticas sociais e econômicas, a fim de oferecer os medicamentos/tratamentos de que necessitam os cidadãos e com os quais não têm condições de arcar, como está evidenciado nos autos.
Em sendo o direito à saúde indissociável do direito à vida, registro que o art. 196 da Constituição da Republica de 1988 (CR/88), ao dispor que "a saúde é direito de todos e dever do Estado", consagrou tal direito como fundamental, devendo, o Poder Público, efetivá-lo.
Feita essas considerações, cinge-se a análise recursal em aferir, além do direito em abstrato à saúde – necessidade de submissão ao procedimento cirúrgico pretendido –, a existência de elementos aptos a autorizarem sua efetivação, de forma antecipada.
Sobre o tema, importa trazer a lume os Enunciados nº 51, 62 e 92, das Jornadas de Direito da Saúde, realizadas pelo CNJ (grifos não originais): ENUNCIADO Nº 18 – Sempre que possível, as decisões liminares sobre saúde devem ser precedidas de notas de evidência científica emitidas por Núcleo de Apoio Técnico do Judiciário - NatJus e/ou consulta do banco de dados pertinente. (Redação dada pela III Jornada de Direito da Saúde – 18.03.2019) ENUNCIADO Nº 19 – As iniciais das demandas de acesso à saúde devem ser instruídas com relatório médico circunstanciado para subsidiar uma análise técnica nas decisões judiciais. (Redação dada pela III Jornada de Direito da Saúde – 18.03.2019) Enunciado nº 51: Nos processos judiciais, a caracterização da urgência/emergência requer relatório médico circunstanciado, com expressa menção do quadro clínico de risco imediato.
ENUNCIADO Nº 69: Nos casos em que o pedido em ação judicial seja a realização de consultas, exames, cirurgias ou procedimentos especializados, recomenda-se consulta prévia ao ente público demandado sobre a existência de lista de espera organizada e regulada pelo Poder Público para acessar o respectivo serviço, de forma a verificar a inserção do paciente nos sistemas de regulação, de acordo com o regramento de referência de cada Município, Região ou Estado, observados os critérios clínicos e de priorização.
Enunciado nº 92: Na avaliação de pedido de tutela de urgência, é recomendável levar em consideração não apenas a indicação do caráter urgente ou eletivo do procedimento, mas também o conjunto da condição clínica do demandante, bem como as repercussões negativas do longo tempo de espera para a saúde e bem-estar do paciente.
Com efeito, além da indicação médica pela necessidade de submissão da autora ao procedimento cirúrgico prescrito – vitrectomia; endolaser e; troca de fluido gasosa, em olho direito –, extrai-se do referido documento o risco imediato de vida ou lesões irreparáveis caso não realizado imediatamente, com possibilidade de perda total e irreversível da visão caso prorrogada sua realização, razão pela qual, pelo menos dentro da superficialidade do momento processual, infere-se a existência dos requisitos necessários à antecipação dos efeitos da tutela.
Corroborando a probabilidade do direito e o perigo de dano, concluiu o parecer técnico do NATJus de forma favorável à pretensão autoral, confirmando a existência de evidências científicas quanto ao procedimento em discussão ao caso em específico, com expressa menção do quadro clínico de risco imediato pormenorizado caso negada sua realização e a impossibilidade de espera razoável.
Veja-se: “Tecnologia: 0405030177 – VITRECTOMIA POSTERIOR COM INFUSÃO DE PERFLUOCARBONO/ÓLEO DE SILICONE/ENDOLASER Conclusão Justificada: Favorável Conclusão: CONSIDERANDO que a paciente apresenta opacidade vitrea, com baixa importante da acuidade visual no olho direito, conforme os dados acostados ao processo.
CONSIDERANDO que a ausência do tratamento com a cirurgia de Vitrectomia, pode pode ocasionar danos irreversíveis à função visual no olho afetado.
Considerando-se que o SUS oferece o tratamento de Vitrectomia Via Pars Plana.
CONCLUI-SE que há elementos técnicos favoraveis aos procedimentos solicitados de Vitrectomia associada no olho afetado, com urgência.
Há evidências científicas? Sim Justifica-se a alegação de urgência, conforme definição de Urgência e Emergência do CFM? Sim Justificativa: Com risco de lesão de órgão ou comprometimento de função”.
Em que pese os argumentos, todavia, não há como desconsiderar a justificativa utilizada na decisão de origem quanto à necessidade de demonstração de negativa prestacional pelo Ente Público, requisito imprescindível à análise da própria existência de interesse de agir à espécie.
Informa a autora, contudo, a impossibilidade de obtenção de documento formal sobre a negativa de atendimento, relatando que mesmo após tentativa, a declaração só poderia ser disponibilizada pelo nosocômio responsável pelo procedimento oftalmológico, após encaminhamento do Hospital Walfredo Gurgel, circunstância que, no momento, permite inferir o respectivo interesse processual.
De certo, eventual impossibilidade na obtenção do documento não pode obstar o acesso da parte à prestação jurisdicional, especialmente quando demonstrada a situação de urgência e perigo de dano irreversível, sob pena de negativa ao próprio direto fundamental à saúde.
Feitas as considerações, embora o direito à saúde constitua disposição constitucional programática, com dever efetivo de concretação, não há como ignorar, apesar do desconforto decisório, a finitude dos recursos públicos na sua organização orçamentária, devendo a análise ponderar os valores axiológicos de modo a compatibilizá-los, garantido-se o cumprimento da garantia fundamental de forma sustentável sem o excessivo comprometimento do orçamento público e prejuízo a consecução prestacional a sociedade.
Portanto, num primeiro momento, o direcionamento à realização do procedimento cirúrgico deve ser, prioritariamente, a rede pública de saúde, pela respectiva inclusão da autora/paciência no sistema de regulação, para agendamento, dentro da ordem de prioridade/gravidade da situação.
Sobre o tópico, ressalto que a regulação por meio de setor específico da Administração Pública tem como propósito organizar e conferir, além da prestação dos serviços de forma equânime e justa pelo Sistema Único de Saúde, o acesso de forma ordeira e otimizada, com graduação de ordem que leva em conta a gravidade dos pacientes e o tempo de espera na lista, priorizando-se o acesso à saúde em seu viés material – que pressupõe a priorização daqueles que se encontram em estado mais grave –, obstaculizando a ocorrência de preferências indevidas ou mesmo fraudulentas.
Assim, embora seja garantido o acesso à saúde, a dicção do art. 196 da Constituição da República Federativa do Brasil não autoriza a imediata desconsideração dos sistemas regulatórios existentes, tendo em vista a imensa demanda e a deficitária capacidade do Estado de concretizar de modo amplo e geral os procedimentos médicos requeridos pela população.
Assim, somente de forma excepcional é que cabe ao Poder Judiciário, como última instância a dar a palavra em conflitos sociais, determinar a providência em caráter forçoso e com possibilidades de custeios alternativos em relação ao tratamento na esfera pública.
No referido contexto, não havendo evidência que indique situação de excepcionalidade suficiente a alterar a ordem estabelecida na regulação, especialmente quando sequer foi oportunizado ao ente público a concretização da pretensão, não se afigura razoável a ingerência pelo Poder Judiciário, sem o aprofundamento da situação, na ordenação referida, em prejuízo do direito de outras pessoas que estão, igualmente, à espera de procedimento idêntico e que não ingressaram em Juízo.
Esclareço que a conclusão adotada, não contradiz a situação de urgência do caso, porquanto, a ordem de inclusão na fila de regulação pressupõe a avaliação do paciente, sendo sua classificação na fila ordenada após consideração quanto a situação e gravidade do paciente, inclusive com a possibilidade de reclassificação da ordem em caso de agravamento ulterior.
Nesse cenário, entendo não ser possível, num primeiro momento, o deferimento desarrazoado de medidas dessa natureza, desrespeitando a fila de regulação, repito, organizada através de avaliação e critérios médicos, sob pena do dano causado àqueles que não dispõem de assistência jurídica e não ingressam em juízo buscando a realização de um direito.
A conclusão adotada nesse momento processual não impede sua reanálise caso alterado o contexto fático dos autos, assim, mesmo após a regulação, se demonstrada circunstância excepcional apta a justificar eventual desconsideração da ordem/lista de espera, poderá o Juízo de origem garantir a prestação do serviço em rede complementar de saúde ou, subsidiariamente, de forma privada, com o custeio respectivo pelo Ente Público. À vista do exposto, DEFIRO, em parte, a concessão do efeito recursal pretendido para determinar que o Estado do Rio Grande do Norte adote as providências necessárias para a inclusão da autora, Vera Lúcia Cardoso da Silva, em lista de regulação para a realização do procedimento cirúrgico prescrito.
NOTIFIQUE-SE, com cópia do laudo médico apresentado e dos documentos de identificação da autora/agravante, o Secretário Estadual de Saúde para efetivação da ordem judicial, no prazo de 48h, comprovando-se o cumprimento nos autos do processo nº 0819798-93.2024.8.20.5124.
Comunique-se com urgência ao Juízo a quo para que adote as providências necessárias ao cumprimento da presente decisão.
Intime-se a parte agravada para oferecer contrarrazões, no prazo legal, sendo-lhe facultado juntar a documentação que entender necessária.
Ultimadas as providências acima, remetam-se os autos à Procuradoria de Justiça para o parecer de estilo, no prazo de 15 dias, nos termos do art. 1.019, III do CPC.
Cumpridas as diligências, voltem-me conclusos.
Publique-se.
Cumpra-se.
Natal, data de registro no sistema Desembargador Cornélio Alves Relator -
18/12/2024 15:23
Expedição de Mandado.
-
18/12/2024 13:38
Juntada de documento de comprovação
-
18/12/2024 13:16
Expedição de Ofício.
-
18/12/2024 08:50
Expedição de Outros documentos.
-
18/12/2024 08:49
Expedição de Outros documentos.
-
18/12/2024 08:24
Concedida em parte a Antecipação de Tutela
-
11/12/2024 16:56
Conclusos para decisão
-
11/12/2024 16:56
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
11/12/2024
Ultima Atualização
09/05/2025
Valor da Causa
R$ 0,00
Documentos
Acórdão • Arquivo
Acórdão • Arquivo
Decisão • Arquivo
Decisão • Arquivo
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