TJAP - 6017451-35.2024.8.03.0001
1ª instância - 6ª Vara Civel e de Fazenda Publica de Macapa
Polo Ativo
Assistente Desinteressado Amicus Curiae
Advogados
Nenhum advogado registrado.
Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
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21/07/2025 00:00
Intimação
Poder Judiciário Tribunal de Justiça do Amapá 6ª Vara Cível e de Fazenda Pública de Macapá Avenida FAB, 1749 Fórum de Macapá, 1749, Fórum de Macapá, Central, Macapá - AP - CEP: 68900-906 Balcão Virtual: Número do Processo: 6017451-35.2024.8.03.0001 Classe processual: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) AUTOR: L.
R.
P.
REU: BENEFICENCIA CAMILIANA DO SUL SENTENÇA I.
RELATÓRIO L.
R.
P., menor impúbere, representado por seu genitor, ajuizou a presente Ação de Obrigação de Fazer cumulada com Revisão de Cláusula Contratual e Indenização por Danos Morais em face de BENEFICÊNCIA CAMILIANA DO SUL (Plano de Saúde São Camilo).
Alega o autor, em síntese, que é beneficiário do plano de saúde operado pela ré e foi diagnosticado com Transtorno do Espectro Autista (TEA), necessitando de tratamento multidisciplinar contínuo.
Sustenta que a ré tem efetuado cobranças a título de coparticipação em valores excessivos, que superam múltiplas vezes o valor da mensalidade do plano, o que inviabiliza a continuidade do tratamento indispensável ao seu desenvolvimento.
Requereu, em sede de tutela de urgência, a limitação das cobranças de coparticipação e a autorização e custeio integral das terapias prescritas.
Ao final, pugnou pela confirmação da tutela, a declaração de nulidade ou a revisão da cláusula de coparticipação para fixar um teto razoável, e a condenação da ré ao pagamento de indenização por danos morais.
A petição inicial (ID 7603711) veio acompanhada de documentos.
A tutela de urgência foi deferida (ID 8002434), para determinar à ré que autorizasse e custeasse os tratamentos multidisciplinares indicados e, ainda, que os valores cobrados a título de coparticipação ficassem limitados ao percentual máximo de 50% do valor da mensalidade paga pelo autor.
A ré interpôs Agravo de Instrumento (ID 13480737) contra a decisão liminar, ao qual foi negado o efeito suspensivo (ID 1185374).
A ré apresentou contestação (ID 12867929).
Em sua defesa, arguiu, preliminarmente, a necessidade de revogação da tutela de urgência.
No mérito, defendeu a legalidade da cláusula de coparticipação, prevista em contrato e em conformidade com a Lei nº 9.656/98 e as normas da ANS.
Afirmou que não houve negativa de cobertura para o tratamento e que os valores cobrados estão de acordo com a modalidade contratual escolhida pelo próprio beneficiário.
Sustentou a inexistência de abusividade e a necessidade de manutenção do equilíbrio contratual.
Ao final, requereu a improcedência dos pedidos e a revogação da liminar.
Houve réplica à contestação (ID 13737898).
As partes não especificaram outras provas a produzir, pugnando a ré pelo julgamento antecipado (ID 16150616).
O Ministério Público, em seu parecer (ID 18370537), opinou pela confirmação da tutela de urgência e pela procedência dos pedidos, destacando a abusividade das cobranças que inviabilizam o tratamento de criança com deficiência e a aplicação da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça sobre a matéria.
II.
FUNDAMENTAÇÃO O processo comporta julgamento antecipado do mérito, nos termos do art. 355, I, do Código de Processo Civil, uma vez que as questões de fato e de direito estão suficientemente demonstradas nos autos, não havendo necessidade de produção de outras provas.
A controvérsia central da lide reside na análise da legalidade e da razoabilidade da cláusula contratual que estabelece a cobrança de coparticipação em plano de saúde para tratamento multidisciplinar e contínuo de beneficiário menor, diagnosticado com TEA.
A relação jurídica entre as partes é de consumo, aplicando-se, portanto, as normas do Código de Defesa do Consumidor, conforme entendimento consolidado na Súmula 608 do Superior Tribunal de Justiça.
Isso implica a interpretação das cláusulas contratuais de maneira mais favorável ao consumidor, bem como o reconhecimento de sua vulnerabilidade na relação contratual.
Além disso, importa destacar que a Lei nº 12.764/2012, que instituiu a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista, equipara, para todos os efeitos legais, a pessoa com TEA à pessoa com deficiência.
Tal equiparação atrai a incidência do Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei nº 13.146/2015), que visa assegurar e promover, em condições de igualdade, o exercício dos direitos e das liberdades fundamentais, incluindo o direito à saúde.
A cláusula de coparticipação, por si só, não é ilegal, encontrando amparo no art. 16, VIII, da Lei nº 9.656/98.
Trata-se de um fator moderador que busca o equilíbrio financeiro do contrato e o uso consciente dos serviços.
Todavia, sua aplicação não é irrestrita e deve ser analisada à luz dos princípios da boa-fé objetiva, da função social do contrato e, sobretudo, da dignidade da pessoa humana.
No caso dos autos, os documentos apresentados com a inicial demonstram que os valores cobrados a título de coparticipação superaram, em diversos meses, o valor da própria mensalidade do plano.
Essa prática, para um tratamento de caráter contínuo e essencial ao desenvolvimento de uma criança, representa um ônus excessivo que, na prática, inviabiliza o acesso aos serviços de saúde contratados, desvirtuando a própria finalidade do contrato.
A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, em casos anólogos, tem se posicionado no sentido de coibir a abusividade de tais cobranças.
No julgamento do Recurso Especial nº 2.001.108/MT, a Terceira Turma firmou o entendimento de que a cobrança de coparticipação não pode ser superior ao valor da mensalidade paga pelo beneficiário.
Além disso, estabeleceu que o percentual por procedimento não pode ultrapassar 50% do valor contratado entre a operadora e o prestador de serviços.
Confira-se a ementa do julgado: RECURSO ESPECIAL.
AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO C/C NULIDADE DE CLÁUSULA CONTRATUAL E COMPENSAÇÃO POR DANO MORAL.
PROTOCOLO PEDIASUIT.
PROCEDIMENTO NÃO LISTADO NO ROL DA ANS.
COBERTURA PELA OPERADORA.
INCIDÊNCIA DA CLÁUSULA DE COPARTICIPAÇÃO PARA ATENDIMENTO AMBULATORIAL.
ANÁLISE DA ABUSIVIDADE DO VALOR COBRADO PELA OPERADORA. 1.
Ação revisional de contrato c/c nulidade de cláusula contratual e compensação por dano moral ajuizada em 03/11/2017, da qual foi extraído o presente recurso especial, interposto em 22/02/2022 e concluso ao gabinete em 16/05/2022. 2.
O propósito recursal é dizer sobre a abusividade da cobrança de coparticipação pelo tratamento com o protocolo Pediasuit. 3.
O protocolo Pediasuit, é, em geral, aplicado em sessões conduzidas por fisioterapeutas, terapeutas ocupacionais e/ou fonoaudiólogos, dentro das respectivas áreas de atuação, sem a necessidade de internação ou mesmo da utilização de estrutura hospitalar, enquadrando-se, a despeito de sua complexidade, no conceito de atendimento ambulatorial estabelecido pela ANS. 4.
Se a operadora atende à necessidade do beneficiário ao custear o procedimento ou evento, ainda que não listado no rol da ANS, operase o fato gerador da obrigação de pagar a coparticipação, desde que, evidentemente, haja clara previsão contratual sobre a existência do fator moderador e sobre as condições para sua utilização, e que, concretamente, sua incidência não revele uma prática abusiva. 5.
Como não há norma detalhando as condições para a utilização do fator moderador, a serem informadas ao usuário, deve ser considerada suficiente a discriminação prévia do percentual ou do valor devido para cada procedimento ou grupo de procedimentos e eventos em saúde sobre os quais incidirá a coparticipação - consultas, exames, atendimento ambulatorial, internação, etc. - tendo em conta o efetivamente pago pela operadora ao prestador do serviço. 6.
Para que a coparticipação não caracterize o financiamento integral do procedimento por parte do usuário ou se torne fator restritor severo de acesso aos serviços, é possível aplicar, por analogia, o disposto no art. 19, II, "b", da RN-ANS 465/2022, para limitar a cobrança "ao máximo de cinquenta por cento do valor contratado entre a operadora de planos privados de assistência à saúde e o respectivo prestador de serviços de saúde". 7.
Com o fim de proteger a dignidade do usuário frente à incidência dos mecanismos financeiros de regulação, no que tange à exposição financeira do titular, mês a mês, é razoável fixar como parâmetro, para a cobrança da coparticipação, o valor equivalente à mensalidade paga, de modo que o desembolso mensal realizado por força do mecanismo financeiro de regulação não seja maior que o da contraprestação paga pelo beneficiário. 8.
Hipótese em que deve ser reformado o acórdão recorrido para manter a coparticipação, limitando o valor pago a cada mês pelo beneficiário ao valor da mensalidade, até a completa quitação, respeitado, quanto ao percentual cobrado por procedimento, o limite máximo de 50% do valor contratado entre a operadora de plano de saúde e o respectivo prestador de serviço. 9.
Recurso especial conhecido e provido em parte. (REsp n. 2.001.108/MT, relatora Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 3/10/2023, DJe de 9/10/2023.) Conforme bem pontuado pelo Ministério Público em seu parecer, a cláusula de coparticipação não pode se transformar em financiamento integral do tratamento pelo usuário, nem em fator restritivo severo ao acesso à saúde.
Quando a cobrança mensal de coparticipação se torna tão elevada a ponto de comprometer a capacidade financeira do beneficiário de manter o tratamento, a cláusula se revela abusiva, nos termos do art. 51, IV e § 1º, II, do Código de Defesa do Consumidor.
A decisão liminar proferida neste juízo (ID 8002434) já havia reconhecido a plausibilidade do direito, limitando a coparticipação a 50% do valor da mensalidade, em consonância com o referido precedente do STJ.
Tal medida se mostra razoável e proporcional, pois, ao mesmo tempo que mantém o fator moderador, garante a continuidade do tratamento essencial ao autor, protegendo seu direito fundamental à saúde e ao desenvolvimento pleno.
No que tange ao pedido de indenização por danos morais, contudo, a improcedência é medida que se impõe.
Embora a cobrança nos moldes realizados pela ré tenha sido considerada abusiva, a controvérsia instaurada se circunscreve à interpretação de cláusula contratual.
A ré não negou o tratamento ao autor, mas defendeu a legalidade da cobrança da coparticipação com base no contrato firmado entre as partes.
A divergência sobre a aplicação e os limites de um encargo contratual, sem a demonstração de outras consequências que atinjam de forma grave os direitos da personalidade, configura, em regra, mero aborrecimento, insuficiente para caracterizar o dano moral indenizável.
A situação, portanto, resolve-se no campo obrigacional, com a revisão da cláusula e a adequação dos valores, não havendo ofensa moral a ser compensada.
III.
DISPOSITIVO Ante o exposto, e por tudo mais que dos autos consta, JULGO PROCEDENTES EM PARTE os pedidos formulados na inicial, com resolução de mérito, nos termos do art. 487, I, do CPC, para, confirmando a tutela de urgência deferida, DECLARAR a abusividade da cláusula contratual de coparticipação na parte que permite a cobrança de valores mensais de coparticipação superiores a 50% da mensalidade do plano, e, por conseguinte, DETERMINAR a sua revisão para que a ré, BENEFICÊNCIA CAMILIANA DO SUL, custeie o tratamento multidisciplinar prescrito ao autor, limitando-se a cobrança de coparticipação mensal ao valor equivalente a 50% (cinquenta por cento) da mensalidade regular do plano de saúde, podendo eventuais valores excedentes serem diluídos nas faturas subsequentes, sem que o total mensal (mensalidade + parcela da coparticipação) ultrapasse o teto aqui estabelecido.
Havendo sucumbência recíproca, condeno a ré ao pagamento de 70% das custas processuais e de honorários advocatícios ao patrono do autor, que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, decotado o montante atribuído ao pedido de danos morais.
Condeno o autor ao pagamento dos 30% restantes das custas processuais e de honorários advocatícios ao patrono da ré, que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor do pedido de danos morais julgado improcedente, devidamente atualizado.
Fica, contudo, suspensa a exigibilidade de tais verbas em relação ao autor, por ser beneficiário da justiça gratuita, nos termos do art. 98, § 3º, do CPC.
Publique-se.
Intimem-se.
Ciência ao Ministério Público.
Após o trânsito em julgado, arquivem-se os autos com as cautelas de praxe.
Macapá/AP, 18 de julho de 2025.
PAULO CESAR DO VALE MADEIRA Juiz Titular do 6ª Vara Cível e de Fazenda Pública de Macapá -
20/07/2025 16:24
Expedida/certificada a comunicação eletrôinica
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18/07/2025 20:54
Julgado procedente em parte o pedido
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09/06/2025 12:27
Conclusos para julgamento
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09/06/2025 09:40
Proferidas outras decisões não especificadas
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08/05/2025 16:19
Juntada de Petição de petição
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29/04/2025 16:19
Conclusos para decisão
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27/04/2025 00:32
Decorrido prazo de MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO AMAPÁ em 25/04/2025 23:59.
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05/03/2025 14:03
Confirmada a comunicação eletrônica
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21/02/2025 12:29
Expedida/certificada a comunicação eletrôinica
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21/02/2025 12:21
Proferidas outras decisões não especificadas
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14/02/2025 11:42
Juntada de Petição de petição
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27/12/2024 19:41
Juntada de Petição de petição
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28/11/2024 18:52
Conclusos para decisão
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27/11/2024 00:57
Decorrido prazo de LORENZO RODRIGUES PASTANA em 26/11/2024 23:59.
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26/11/2024 23:29
Juntada de Petição de petição
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19/11/2024 00:14
Confirmada a comunicação eletrônica
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19/11/2024 00:14
Confirmada a comunicação eletrônica
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08/11/2024 19:41
Expedida/certificada a comunicação eletrôinica
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08/11/2024 19:41
Expedida/certificada a comunicação eletrôinica
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07/11/2024 17:14
Proferidas outras decisões não especificadas
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18/09/2024 14:23
Conclusos para decisão
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12/09/2024 21:11
Juntada de Petição de manifestação do ministério público
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26/08/2024 10:46
Confirmada a comunicação eletrônica
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14/08/2024 13:18
Expedida/certificada a comunicação eletrôinica
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23/07/2024 21:18
Juntada de Petição de petição
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11/07/2024 16:32
Expedida/certificada a comunicação eletrôinica
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11/07/2024 16:31
Ato ordinatório praticado
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09/07/2024 10:34
Juntada de Certidão
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28/06/2024 18:47
Juntada de Petição de contestação
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26/06/2024 00:04
Decorrido prazo de LORENZO RODRIGUES PASTANA em 25/06/2024 23:59.
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21/06/2024 13:37
Juntada de Petição de Petição (outras)
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19/06/2024 12:55
Juntada de Petição de Petição (outras)
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18/06/2024 10:54
Confirmada a comunicação eletrônica
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10/06/2024 18:32
Confirmada a comunicação eletrônica
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10/06/2024 18:32
Mandado devolvido entregue ao destinatário
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10/06/2024 18:32
Juntada de Petição de certidão
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06/06/2024 15:16
Expedição de Mandado.
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06/06/2024 15:16
Expedida/certificada a comunicação eletrôinica
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05/06/2024 22:15
Concedida a Medida Liminar
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29/05/2024 14:27
Conclusos para decisão
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28/05/2024 23:32
Autos incluídos no Juízo 100% Digital
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28/05/2024 23:32
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
28/05/2024
Ultima Atualização
21/07/2025
Valor da Causa
R$ 0,00
Documentos
Sentença • Arquivo
Decisão • Arquivo
Decisão • Arquivo
Decisão • Arquivo
Ato ordinatório • Arquivo
Decisão • Arquivo
Outros Documentos • Arquivo
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