TJRN - 0004482-98.2010.8.20.0101
2ª instância - Câmara / Desembargador(a) Vice-Presidencia
Processos Relacionados - Outras Instâncias
Polo Ativo
Polo Passivo
Partes
Advogados
Nenhum advogado registrado.
Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
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19/06/2023 00:00
Intimação
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE TRIBUNAL PLENO Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0004482-98.2010.8.20.0101 Polo ativo VALDENIR BATISTA DE ARAUJO Advogado(s): SILDILON MAIA THOMAZ DO NASCIMENTO Polo passivo MPRN - 03ª Promotoria Caicó e outros Advogado(s): AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL EM APELAÇÃO CÍVEL N.º 0004482-98.2010.8.20.0101 AGRAVANTE: VALDENIR BATISTA DE ARAÚJO ADVOGADO: SILDILON MAIA THOMAZ DO NASCIMENTO RECORRIDO: MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL EMENTA: AGRAVO INTERNO CONTRA DECISÃO QUE NEGOU SEGUIMENTO AO RECURSO ESPECIAL.
TEMA 1.199 DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL.
REPERCUSSÃO GERAL.
SERVIDOR PÚBLICO DO PODER JUDICIÁRIO DO RN.
ACÓRDÃO DO COLEGIADO FRACIONÁRIO QUE RECONHECEU A EXISTÊNCIA DE DESVIO E APROPRIAÇÃO INDEVIDA DE VALORES DEPOSITADOS QUE DEVERIAM ESTA SOB A GUARDA DO PODER PÚBLICO.
JULGADO FUNDAMENTO NA EXISTÊNCIA DO ELEMENTO VOLITIVO DO DOLO, CONSUBSTANCIADA NA MÁ-FE, COM AUFERIMENTO DE VANTAGEM PATRIMONIAL E LOUCUPLETAMENTO ILÍCITO POR VASTO PERÍODO DE TEMPO.
CONFLUÊNCIA COM O PARADIGMA FIRMADO PELO STF.
MANUTENÇÃO DA DECISÃO VERGASTADA.
AGRAVO INTERNO CONHECIDO E DESPROVIDO. 1.
O acórdão que julgou a apelação cível se encontra alinhado com o decidido pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no julgamento dos Tema 1.199, razão pela qual deve ser mantida a decisão que, em juízo de admissibilidade do recurso especial, negou seguimento ao apelo, com fundamento na técnica de vinculação decisória prevista no art. 1.030, I, “b”, do CPC. 2.
Inexistência de argumentos suficientes apresentados no recurso de agravo para infirmar a decisão anterior. 3.
Conhecimento e desprovimento do agravo interno.
ACÓRDÃO ACORDAM os Desembargadores do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Norte, em sessão plenária, à unanimidade de votos, conhecer e negar provimento ao agravo interno, nos termos do voto do Relator, parte integrante deste.
RELATÓRIO Cuida-se de agravo interno (Id. 18236083) interposto por VALDENIR BATISTA DE ARAÚJO em face da decisão (Id. 17634760) que negou seguimento ao recurso especial (Id. 9019487, fls. 451/465) interposto pela ora agravante, por aplicação do entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no julgamento do Tema 1199 (ARE 843989) sob à sistemática da repercussão geral.
Argumenta a inaplicabilidade do Tema 1199 (ARE 843989), bem como a comunicabilidade da instância penal com a instância da improbidade administrativa, nos termos do art. 21, § 4º, da Lei 8.429/1992, com a redação dada pela Lei n.º 14.230/2021.
Contrarrazões apresentadas (Id. 18587069). É o relatório.
VOTO Sem maiores transpirações argumentativas, realço que o agravo interno manejado preenche os requisitos de admissibilidade, devendo, portanto, ser conhecido.
No entanto, embora admitida a via recursal pretendida, verifico, desde já, que os fundamentos lançados não se revelam hábeis a autorizar a modificação da decisão agravada.
E digo isso por não constatar qualquer equívoco que venha a acometer a decisão agravada, tendo em vista que se encontra em sintonia com o entendimento firmado em Precedente Qualificado pelo Supremo Tribunal Federal (STF), a saber, Tema 1199 (ARE 843989).
A propósito, colaciono a ementa do aresto paradigmático e a tese fixada, respectivamente: CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO.
IRRETROATIVIDADE DA LEI MAIS BENÉFICA (LEI 14.230/2021) PARA A RESPONSABILIDADE POR ATOS ILÍCITOS CIVIS DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA (LEI 8.429/92).
NECESSIDADE DE OBSERVÂNCIA DA CONSTITUCIONALIZAÇÃO DE REGRAS RÍGIDAS DE REGÊNCIA DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E RESPONSABILIZAÇÃO DOS AGENTES PÚBLICOS CORRUPTOS PREVISTAS NO ARTIGO 37 DA CF.
INAPLICABILIDADE DO ARTIGO 5º, XL DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL AO DIREITO ADMINISTRATIVO SANCIONADOR POR AUSÊNCIA DE EXPRESSA PREVISÃO NORMATIVA.
APLICAÇÃO DOS NOVOS DISPOSITIVOS LEGAIS SOMENTE A PARTIR DA ENTRADA EM VIGOR DA NOVA LEI, OBSERVADO O RESPEITO AO ATO JURÍDICO PERFEITO E A COISA JULGADA (CF, ART. 5º, XXXVI).
RECURSO EXTRAORDINÁRIO PROVIDO COM A FIXAÇÃO DE TESE DE REPERCUSSÃO GERAL PARA O TEMA 1199. 1.
A Lei de Improbidade Administrativa, de 2 de junho de 1992, representou uma das maiores conquistas do povo brasileiro no combate à corrupção e à má gestão dos recursos públicos. 2.
O aperfeiçoamento do combate à corrupção no serviço público foi uma grande preocupação do legislador constituinte, ao estabelecer, no art. 37 da Constituição Federal, verdadeiros códigos de conduta à Administração Pública e aos seus agentes, prevendo, inclusive, pela primeira vez no texto constitucional, a possibilidade de responsabilização e aplicação de graves sanções pela prática de atos de improbidade administrativa (art. 37, § 4º, da CF). 3.
A Constituição de 1988 privilegiou o combate à improbidade administrativa, para evitar que os agentes públicos atuem em detrimento do Estado, pois, como já salientava Platão, na clássica obra REPÚBLICA, a punição e o afastamento da vida pública dos agentes corruptos pretendem fixar uma regra proibitiva para que os servidores públicos não se deixem "induzir por preço nenhum a agir em detrimento dos interesses do Estado”. 4.
O combate à corrupção, à ilegalidade e à imoralidade no seio do Poder Público, com graves reflexos na carência de recursos para implementação de políticas públicas de qualidade, deve ser prioridade absoluta no âmbito de todos os órgãos constitucionalmente institucionalizados. 5.
A corrupção é a negativa do Estado Constitucional, que tem por missão a manutenção da retidão e da honestidade na conduta dos negócios públicos, pois não só desvia os recursos necessários para a efetiva e eficiente prestação dos serviços públicos, mas também corrói os pilares do Estado de Direito e contamina a necessária legitimidade dos detentores de cargos públicos, vital para a preservação da Democracia representativa. 6.
A Lei 14.230/2021 não excluiu a natureza civil dos atos de improbidade administrativa e suas sanções, pois essa “natureza civil” retira seu substrato normativo diretamente do texto constitucional, conforme reconhecido pacificamente por essa SUPREMA CORTE (TEMA 576 de Repercussão Geral, de minha relatoria, RE n° 976.566/PA). 7.
O ato de improbidade administrativa é um ato ilícito civil qualificado – “ilegalidade qualificada pela prática de corrupção” – e exige, para a sua consumação, um desvio de conduta do agente público, devidamente tipificado em lei, e que, no exercício indevido de suas funções, afaste-se dos padrões éticos e morais da sociedade, pretendendo obter vantagens materiais indevidas (artigo 9º da LIA) ou gerar prejuízos ao patrimônio público (artigo 10 da LIA), mesmo que não obtenha sucesso em suas intenções, apesar de ferir os princípios e preceitos básicos da administração pública (artigo 11 da LIA). 8.
A Lei 14.230/2021 reiterou, expressamente, a regra geral de necessidade de comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação do ato de improbidade administrativa, exigindo – em todas as hipóteses – a presença do elemento subjetivo do tipo – DOLO, conforme se verifica nas novas redações dos artigos 1º, §§ 1º e 2º; 9º, 10, 11; bem como na revogação do artigo 5º. 9.
Não se admite responsabilidade objetiva no âmbito de aplicação da lei de improbidade administrativa desde a edição da Lei 8.429/92 e, a partir da Lei 14.230/2021, foi revogada a modalidade culposa prevista no artigo 10 da LIA. 10.
A opção do legislador em alterar a lei de improbidade administrativa com a supressão da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa foi clara e plenamente válida, uma vez que é a própria Constituição Federal que delega à legislação ordinária a forma e tipificação dos atos de improbidade administrativa e a gradação das sanções constitucionalmente estabelecidas (CF, art. 37, §4º). 11.
O princípio da retroatividade da lei penal, consagrado no inciso XL do artigo 5º da Constituição Federal (“a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu”) não tem aplicação automática para a responsabilidade por atos ilícitos civis de improbidade administrativa, por ausência de expressa previsão legal e sob pena de desrespeito à constitucionalização das regras rígidas de regência da Administração Pública e responsabilização dos agentes públicos corruptos com flagrante desrespeito e enfraquecimento do Direito Administrativo Sancionador. 12.
Ao revogar a modalidade culposa do ato de improbidade administrativa, entretanto, a Lei 14.230/2021, não trouxe qualquer previsão de “anistia” geral para todos aqueles que, nesses mais de 30 anos de aplicação da LIA, foram condenados pela forma culposa de artigo 10; nem tampouco determinou, expressamente, sua retroatividade ou mesmo estabeleceu uma regra de transição que pudesse auxiliar o intérprete na aplicação dessa norma – revogação do ato de improbidade administrativa culposo – em situações diversas como ações em andamento, condenações não transitadas em julgado e condenações transitadas em julgado. 13.
A norma mais benéfica prevista pela Lei 14.230/2021 – revogação da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa –, portanto, não é retroativa e, consequentemente, não tem incidência em relação à eficácia da coisa julgada; nem tampouco durante o processo de execução das penas e seus incidentes.
Observância do artigo 5º, inciso XXXVI da Constituição Federal. 14.
Os prazos prescricionais previstos em lei garantem a segurança jurídica, a estabilidade e a previsibilidade do ordenamento jurídico; fixando termos exatos para que o Poder Público possa aplicar as sanções derivadas de condenação por ato de improbidade administrativa. 15.
A prescrição é o perecimento da pretensão punitiva ou da pretensão executória pela INÉRCIA do próprio Estado.
A prescrição prende-se à noção de perda do direito de punir do Estado por sua negligência, ineficiência ou incompetência em determinado lapso de tempo. 16.
Sem INÉRCIA não há PRESCRIÇÃO.
Sem INÉRCIA não há sancionamento ao titular da pretensão.
Sem INÉRCIA não há possibilidade de se afastar a proteção à probidade e ao patrimônio público. 17.
Na aplicação do novo regime prescricional – novos prazos e prescrição intercorrente – , há necessidade de observância dos princípios da segurança jurídica, do acesso à Justiça e da proteção da confiança, com a IRRETROATIVIDADE da Lei 14.230/2021, garantindo-se a plena eficácia dos atos praticados validamente antes da alteração legislativa. 18.
Inaplicabilidade dos prazos prescricionais da nova lei às ações de ressarcimento ao erário fundadas na prática de ato doloso tipificado na Lei de Improbidade Administrativa, que permanecem imprescritíveis, conforme decidido pelo Plenário da CORTE, no TEMA 897, Repercussão Geral no RE 852.475, Red. p/Acórdão: Min.
EDSON FACHIN. 19.
Recurso Extraordinário PROVIDO.
Fixação de tese de repercussão geral para o Tema 1199: "1) É necessária a comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos de improbidade administrativa, exigindo-se - nos artigos 9º, 10 e 11 da LIA - a presença do elemento subjetivo - DOLO; 2) A norma benéfica da Lei 14.230/2021 - revogação da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa -, é IRRETROATIVA, em virtude do artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal, não tendo incidência em relação à eficácia da coisa julgada; nem tampouco durante o processo de execução das penas e seus incidentes; 3) A nova Lei 14.230/2021 aplica-se aos atos de improbidade administrativa culposos praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado, em virtude da revogação expressa do texto anterior; devendo o juízo competente analisar eventual dolo por parte do agente; 4) O novo regime prescricional previsto na Lei 14.230/2021 é IRRETROATIVO, aplicando-se os novos marcos temporais a partir da publicação da lei". (ARE 843989, Relator(a): ALEXANDRE DE MORAES, Tribunal Pleno, julgado em 18/08/2022, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-251 DIVULG 09-12-2022 PUBLIC 12-12-2022) 1) É necessária a comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos de improbidade administrativa, exigindo-se - nos artigos 9º, 10 e 11 da LIA - a presença do elemento subjetivo - DOLO; 2) A norma benéfica da Lei 14.230/2021 - revogação da modalidade culposa do ato de improbidade administrativa -, é IRRETROATIVA, em virtude do artigo 5º, inciso XXXVI, da Constituição Federal, não tendo incidência em relação à eficácia da coisa julgada; nem tampouco durante o processo de execução das penas e seus incidentes; 3) A nova Lei 14.230/2021 aplica-se aos atos de improbidade administrativa culposos praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado, em virtude da revogação expressa do texto anterior; devendo o juízo competente analisar eventual dolo por parte do agente; 4) O novo regime prescricional previsto na Lei 14.230/2021 é IRRETROATIVO, aplicando-se os novos marcos temporais a partir da publicação da lei.
No caso dos autos, o julgado do colegiado fracionário entendeu, à luz dos elementos probatórios acostados aos autos, pela configuração do elemento volitivo do dolo, consubstanciada na má-fe, reconhecendo que o ora recorrente, enquanto servidor público do Poder Judiciário do RN perpetrou desvio e apropriação indevida de valores depositados que deveriam esta sob a guarda do poder público, com auferimento de vantagem patrimonial e locupletamento ilícito por vasto período de tempo, razão pela qual o condenou pela prática do ato de improbidade, consoante se vê dos excertos do voto do Redator para o acórdão (Id. 9019487 – págs. 357/380): “(...) As argumentações centrais do Apelante são as seguintes: a) que não pode ser responsabilizado pelo desvio de recursos, pois entre as funções a serem exercidas no cargo que ocupava, de Diretor de Secretaria, não estava a de recolher dinheiro das partes; b) que por ter sido aplicada, no âmbito administrativo, a penalidade de demissão ao servidor, parte do objeto da presente demanda perdeu sua objetividade; c) que a aplicação da perda do cargo no âmbito cível implicaria num "triplo título condenatório", já que ocorrera a aplicação dessa sanção nas esferas administrativa e penal; d) que por ter confessado espontaneamente a conduta praticada e por ter ressarcido o dano integralmente, as sanções aplicadas na sentença de Primeiro Grau foram desproporcionais.
Consigno inicialmente que de acordo com posição consagrada na doutrina e na jurisprudência, as esferas civil, administrativa e penal são, em regra, independentes.
Desse modo, sanções aplicadas num desses ramos não traz repercussão nos demais (...) A doutrina e a jurisprudência, porém, trazem duas exceções, hipóteses nas quais a decisão na esfera penal implica em repercussão na esfera cível e administrativa.
Trata-se dos casos em que no âmbito penal existe sentença transitada em julgado que reconheça a negativa de autoria ou do próprio fato delituoso (inexistência material do fato).
No caso dos autos, o recorrente, então servidor do Poder Judiciário do Estado do Rio Grande do Norte, fora acusado de desviar dinheiro relativo a custas e depósitos judiciais realizados pelas partes em processos judiciais que tramitavam perante o Juizado Especial da Comarca de Caicó/RN.
No âmbito administrativo, como assinalado acima, por decisão do Plenário do Tribunal de Justiça em 10 de fevereiro de 2010 (fl. 303), foi aplicada ao recorrente a penalidade de demissão prevista no art. 143, I e IX da Lei Complementar n. 122/1994, "pela prática de crime contra a Administração Pública, previsto no artigo 312 do Código Penal, e em razão da prática de atos de improbidade administrativa, na forma prevista nos artigos 9º e 11, da Lei n. 8.429/92." (Fl. 301).
Na seara criminal, processo n. 000030-11.2011.8.20.0101, o ora recorrente fora condenando pelo Juízo de Direito da Vara Criminal de Caicó a 6 (seis) anos e 8 (oito) meses de reclusão e 148 dias-multa, a ser cumprido em regime semiaberto, sentença esta reformada em grau de recurso pela Egrégia Câmara Criminal deste Tribunal nos autos do processo 2012.005367-5, Relatado pelo Excelentíssimo Desembargador Virgílio Macêdo Jr, julgado em 19 de março de 2013 e submetida à análise do STJ no REsp 1.387.180/RN, cuja relatoria caberá à Ministra Alderita Ramos de Oliveira (Desembargadora Convocada do TJPE) da Sexta Turma do STJ, ainda pendente de decisão.
A absolvição realizada pela Câmara Criminal do Tribunal lastreou-se no art. 386, III, do Código de Processo Penal.
Na ocasião, a Câmara reconheceu que a conduta não constituiria infração penal.
Contra este acórdão foi interposto Recurso Especial que, como dito, ainda aguarda julgamento.
Como ressaltado, em razão do fundamento utilizado pela Colenda Câmara Criminal deste Tribunal e tendo em conta ainda que o acórdão prolatado na esfera penal ainda não transitou em julgado, referida decisão não repercute na esfera cível e administrativa, pois, como dito, apenas decisões penais absolutórias nas quais se reconheça a ausência do fato ou ausência de autoria é que trazem repercussão nas searas cíveis e criminais, não sendo este o caso dos autos.
A decisão tomada no âmbito penal só repercute nas demais esferas, considerado-se a independência entre as instâncias, se a absolvição criminal negar a existência do fato ou da autoria, como destacado nos seguintes precedentes do STJ (...) Feito esse registro inicial, destacamos que a Lei n. 8.429, de 2 de junho de 1992, Lei de Improbidade Administrativa (LIA), apresenta um feixe de condutas que configuram atos de improbidade por representarem i) enriquecimento ilícito (art. 9º); ii) lesão ao erário (art. 10) ou iii) por terem atentado contra os princípios da Administração Pública (art. 11). (...) Nos presentes autos, o Ministério Público do Estado do Rio Grande do Norte imputou ao agente público, então servidor do Poder Judiciário Estadual da Comarca de Caicó/RN, a prática de desviar recursos destinados ao pagamento de custas, perícias e quitações judiciais, havendo, segundo o Parquet, violação aos arts. 9º (enriquecimento ilícito) e 11 (atentado aos Princípios da Administração Pública) da Lei de Improbidade Administrativa.
A petição inicial imputa ao réu, ora recorrente, violações aos arts. 9º e 11 da Lei de Improbidade Administrativa, por ter, na visão do Ministério Público, ocorrido acréscimo patrimonial ilícito em razão do exercício de função pública e recebimento de vantagem patrimonial indevida (art. 9º) e por ter ocorrido violação ao dever de honestidade (art. 11).
A sentença de Primeira Instância acolheu em parte a pretensão ministerial, considerando que o réu, ora recorrente, violou os arts. 9º e 11, da Lei de Improbidade.
Como destacado pela doutrina e pelo STJ, a improbidade não pode ser confundida com a mera ilegalidade.
A improbidade é ilegalidade tipificada e qualificada pelo elemento subjetivo da conduta do agente.
Por isso mesmo, a jurisprudência do STJ considera indispensável, para a caracterização de improbidade, que a conduta do agente seja dolosa, para a tipificação das condutas descritas nos artigos 9º e 11 da Lei 8.429/92, ou pelo menos eivada de culpa grave, nas do artigo 10 (AgRg no REsp 1352541/MG, Relator Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, j. em 05.02.2013; AgRg no AREsp 73.968/SP, Relator Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, j. em 02.10.2012).
No caso, penso que as condutas praticadas pelo recorrente ultrapassam a mera ilegalidade, visto que houve – de maneira confessada pelo recorrente – apropriação de recursos que deveriam ficar sob a guarda do Poder Público, representado pelo servidor, conduta que se amolda aos arts. 9º e 11 da Lei de Improbidade Administrativa.
Por cerca de 2 (dois) anos e por 393 (trezentas e noventa e três) vezes, o servidor se apropriou e utilizou de recursos que deveriam ser destinados ao pagamento de custas judiciais, perícias e quitações de processos que tramitavam perante o Juizado Especial da Comarca de Caicó/RN.
Ao contrário do que alega em seu recurso, o simples fato de não exisitir a função de "tesoureiro judicial" não elimina as tipificações das práticas desenvolvidas pelo recorrente.
Do mesmo modo, o fato de não ter havido a designação do servidor para exercer a função de Diretor de Secretaria por ato formal do Presidente do Tribunal não elimina a responsabilidade do servidor.
Também não elimina a responsabilidade do servidor o fato de não estar entre as funções do Diretor de Secretaria, receber e guardar numerário de processos judiciais (custas, pagamentos por perícias, preparo etc).
O que, de fato, deve ser analisado é a conduta praticada pelo servidor e não se os atos por ele praticados estavam na esfera de atribuições do cargo que exercia.
Ademais, das provas anexadas aos autos e da confissão do recorrente (fl. 202/203) destacamos as seguintes passagens que corroboram os fatos narrados pelo Ministério Público em sua petição inicial: (...) Em seu recurso de apelação, fl. 449, admite que "o apelante confessou a conduta espontaneamente e realizou sua autodenúncia antes mesmo da instauração da sindicância que apurou os fatos." (Grifamos). (...) Constata-se, pois, que diante do amplo acervo probatório produzido no processo administrativo e da confissão do recorrente, restam configurados atos de improbidade administrativa praticados pelo servidor, seja por enriquecimento ilícito (art. 9º, da Lei de Improbidade Administrastiva), seja por transgressão aos princípios da Administração Pública (art. 11). (...) O recorrente, por ter desviado e se apropriado de numerários que deveriam estar sob a guarda do Poder Público, auferiu vantagem patrimonial indevida em razão da função ou das atividades que exercia incidindo nas cominações do art. 9º, XI e XII da Lei de Improbidade (...) Nos presentes autos, o recorrente incorporou valores que deveriam se destinar ao pagamento de demandas decorrentes de processos judiciais (quitações, parcelamentos, por exemplo); quantias essas que estavam sob a tutela da Administração Pública.
Além de incorporar, fez uso em benefício próprio desse patrimônio, incidindo, pois, nas tipificações descritas nos incisos XI e XII do art. 9º da Lei de Improbidade Administrativa. (...) Nos autos, das provas coletadas e da confissão do recorrente no âmbito do processo administrativo, se evidencia que por longo período de tempo o recorrente usou, obteve, utilizou e se apropriou de valores que deveriam ser destinados ao pagamento de custas processuais, periciais e pagamentos efetuados pelas partes em processos judiciais.
Houve, pois, enriquecimento ilícito decorrente do recebimento de vantagem patrimonial indevida, conduta dolosa por parte do Apelante e nexo causal entre a conduta e vantagem patrimonial recebida.
Recursos que tinham como destino os processos judiciais foram utilizados – indevidamente – pelo recorrente em benefício próprio.
Apoderou-se o recorrente, em conduta nitidamente dolosa, de recursos que não eram seus; eram das partes ou do Poder Público.
Recursos que deveriam estar sob a guarda, tutela e proteção do agente público foram desviados em benefício do agente em nítido comportamento doloso Além do enriquecimento ilícito, pelo recebimento de vantagem patrimonial indevida, da conduta dolosa por parte do agente, restaram demonstrados o liame entre o recebimento e o cargo exercido pelo recorrente e o nexo causal entre o comportamento do agente e a vantagem patrimonial recebida.
Acrescente-se, ademais, que a conduta perpetrada, além de ter ensejado enriquecimento ilícito, resultou em lesão aos princípios da Administração Pública.
De fato, conforme disposição contida no art. 37, caput, da Constituição da República, o Poder Público é regido pelos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência.
A Lei n. 8.429/1992 (Lei de Improbidade Administrativa) tem como fundamento basilar a proteção ao princípio da moralidade.
Com esse pensamento, a LIA confere proteção aos princípios regentes da Administração Pública, ao dispor em seu art. 11 que ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições configura improbidade administrativa.
Quanto ao art. 11 da Lei de Improbidade, as condutas do recorrente incidem em violação aos deveres de honestidade, legalidade, lealdade previstas no caput e por ter praticado ato visando fim proibido em lei ou regulamento ou diverso daquele previsto, na regra de competência (inciso I) e, por ter retardado ou dificultado pagamentos a que faziam jus as partes do processo, o recorrente retardou ou deixou de praticar, indevidamente, ato de ofício (inciso II).
Os atos praticados pelo recorrente, como dito, transgridem os princípios da legalidade, pois desrespeitaram a lei ao desviar recursos que tinham destino previsto na legislação processual; da moralidade, pois se apoderou de recursos públicos, prática que fere basilares preceitos éticos e feriu o dever de lealdade à instituição ao qual trabalhava.
As práticas desenvolvidas pelo recorrente – materializadas em desvio de recursos que deveriam ter sido utilizados para pagar custas, perícias e pagamentos/quitações de acordos – ultrapassam a mera ilegalidade, fazendo exsurgir também as sanções decorrentes do art. 11 da LIA. (...) Em razão de tudo que foi dito acima, penso, pois, que se amolda às condutas censuradas pelos arts. 9º e 11, da Lei n. 8.429/1992, a prática por parte de servidor público, de se apropriar e usar recursos que deveriam se destinar ao pagamento de custas, emolumentos e quitações de processos judiciais.
O desvio de finalidade do dinheiro, o favorecimento próprio desses recursos, além do uso irregular de recursos públicos com prejuízo ao Erário e às partes configura improbidade administrativa, pois ultrapassa a mera ilegalidade (...)”.
Assim, incide no caso em concreto o item 1 da tese fixada no Tema 1199 (ARE 843989).
Por outro turno, quanto à pretensa aplicação do § 4º, do art. 21 da nova LIA, não se trata, em absoluto, de matéria abrangida pelo tema, sendo tal dispositivo, inclusive, objeto da ADI 7236 no STF (com sua eficácia, atualmente suspensa, por medida liminar do Min.
Alexandre de Moraes), ressaltando-se que o juízo originário, inobstante haja tratado da independência das esferas quando não negada a existência do fato, inocorreu, nesse ponto específico, impugnação no Recurso Especial de Id 9019487 (pág. 465).
Repise-se, que o referido dispositivo teve sua eficácia suspensa, em razão do deferimento parcial de medida cautelar concedida no bojo da ADI 7236 razão pela qual é impossível a aplicabilidade do dispositivo invocado pelo ora agravante.
Vejamos trechos da decisão: (VI) Artigo 21, § 4º, da Lei 8.429/1992, incluído pela Lei 14.230/2021– LIMINAR CONCEDIDA.
No ponto, a Requerente afirma que, ao criar uma “irrestrita incidência dos casos de absolvição na seara criminal a ensejara extinção da ação de improbidade”, a norma questionada afrontaria cabalmente os princípios da independência das instâncias, do juiz natural, do livre convencimento motivado e da inafastabilidade da jurisdição.
Em análise sumária para concessão da medida liminar, plausível a alegação da requerente.
Consagrada no § 4º do art. 37 da Constituição Federal, segundo o qual “os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível”, a independência de instâncias exige tratamentos sancionatórios diferenciados entre os atos ilícitos em geral (civis, penais e político-administrativos) e os atos de improbidade administrativa. (...) a comunicabilidade ampla pretendida pela norma questionada acaba por corroer a própria lógica constitucional da autonomia das instâncias, o que indica, ao menos em sede de cognição sumária, a necessidade do provimento cautelar.
Diante de todo o exposto, presentes os requisitos para concessão de medida, suspendo a eficácia do artigo 21, §4º da Lei 8.429/1992, incluído pela Lei 14.230/2021. (grifo do Relator).
Restou estabelecido, portanto, pela eminente Relator Min.
ALEXANDRE DE MORAES, que não é possível à comunicabilidade ampla das instâncias como pretende o art. 21, §4º da Lei n.º 8.429/1992, incluído pela Lei n.º 14.230/2021.
Portanto, não se verifica, ainda, nas razões do agravante, quaisquer argumentos bastantes a infirmar a decisão que aplicou o previsto no art. 1030, I, “b”, do Código de Processo Civil (CPC) para negar seguimento ao recurso especial.
Diante do exposto, voto pelo conhecimento e desprovimento do agravo interno, para manter a decisão agravada em todos os seus termos. É como voto.
Natal/RN, data da assinatura.
Desembargador GLAUBER RÊGO Vice-Presidente/Relator Natal/RN, 5 de Junho de 2023. - 
                                            
15/03/2023 13:53
Conclusos para decisão
 - 
                                            
10/03/2023 09:25
Juntada de Petição de contrarrazões
 - 
                                            
24/02/2023 13:06
Publicado Intimação em 23/02/2023.
 - 
                                            
24/02/2023 13:06
Disponibilizado no DJ Eletrônico em 17/02/2023
 - 
                                            
16/02/2023 06:39
Expedição de Outros documentos.
 - 
                                            
16/02/2023 06:37
Juntada de intimação
 - 
                                            
13/02/2023 23:38
Juntada de Petição de agravo interno
 - 
                                            
12/01/2023 18:43
Juntada de Petição de outros documentos
 - 
                                            
11/01/2023 13:37
Expedição de Outros documentos.
 - 
                                            
19/12/2022 11:07
Recurso Especial não admitido
 - 
                                            
12/12/2022 16:06
Conclusos para decisão
 - 
                                            
12/12/2022 16:05
Recebidos os autos
 - 
                                            
12/12/2022 16:02
Juntada de termo
 - 
                                            
30/11/2022 21:35
Juntada de Petição de petição
 - 
                                            
11/05/2021 10:47
Remetidos os Autos (em grau de recurso) para o STJ
 - 
                                            
15/04/2021 15:38
Remetidos os Autos (em grau de admissibilidade) para Vice-Presidência
 - 
                                            
08/04/2021 08:46
Proferido despacho de mero expediente
 - 
                                            
07/04/2021 13:50
Conclusos para decisão
 - 
                                            
07/04/2021 13:50
Redistribuído por encaminhamento em razão de Determinação judicial
 - 
                                            
18/03/2021 18:11
Proferido despacho de mero expediente
 - 
                                            
18/03/2021 09:46
Recebidos os autos
 - 
                                            
18/03/2021 09:46
Conclusos para despacho
 - 
                                            
18/03/2021 09:46
Distribuído por sorteio
 
Detalhes
                                            Situação
                                            Ativo                                        
                                            Ajuizamento
                                            07/04/2021                                        
                                            Ultima Atualização
                                            13/06/2023                                        
                                            Valor da Causa
                                            R$ 0,00                                        
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