TJPB - 0807318-75.2024.8.15.2003
2ª instância - Câmara / Desembargador(a) Joao Batista Barbosa
Processos Relacionados - Outras Instâncias
Polo Ativo
Polo Passivo
Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
-
30/08/2025 01:38
Decorrido prazo de MARIA JOZILDA LOPES DOS SANTOS em 27/08/2025 23:59.
-
30/08/2025 01:38
Decorrido prazo de BANCO BMG S.A em 27/08/2025 23:59.
-
01/08/2025 00:12
Publicado Expediente em 01/08/2025.
-
01/08/2025 00:12
Disponibilizado no DJ Eletrônico em 31/07/2025
-
31/07/2025 00:00
Intimação
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA PARAÍBA TERCEIRA CÂMARA ESPECIALIZADA CÍVEL GABINETE 18 – DES.
JOÃO BATISTA BARBOSA DECISÃO APELAÇÃO CÍVEL Nº 0807318-75.2024.8.15.2003 RELATOR: Inácio Jário Queiroz de Albuquerque - Juiz de Direito Substituto em Segundo Grau APELANTE: Maria Jozilda Lopes dos Santos ADVOGADO: Nicolas Santos Carvalho Gomes - OAB/AM 8.926 APELADO: Banco BMG S.A.
ADVOGADO: Fabio Frasato Caires - OAB/PB 20.461-A Ementa: DIREITO DO CONSUMIDOR E CIVIL.
APELAÇÃO CÍVEL.
CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO.
TRANSMUTAÇÃO CONTRATUAL SEM CONSENTIMENTO.
AUSÊNCIA DE INFORMAÇÃO CLARA.
PRÁTICA ABUSIVA.
NULIDADE CONTRATUAL.
RESTITUIÇÃO EM DOBRO.
DANO MORAL.
PROVIMENTO DO RECURSO.
I.
CASO EM EXAME 1.
Apelação cível interposta por consumidora contra sentença de improcedência em ação ordinária ajuizada contra instituição financeira, objetivando a declaração de nulidade de contrato de cartão de crédito consignado, a repetição de indébito e indenização por danos morais.
A autora alegou ter contratado empréstimo consignado com parcelas fixas, mas foi surpreendida com descontos mensais vinculados à modalidade de cartão de crédito com reserva de margem consignável (RMC), sem ciência ou anuência quanto aos encargos e condições contratuais.
II.
QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2.
Há quatro questões em discussão: (i) verificar se houve contratação válida de cartão de crédito consignado com reserva de margem; (ii) definir se a ausência de informação adequada sobre a natureza do contrato autoriza sua nulidade; (iii) estabelecer o direito à restituição em dobro dos valores descontados indevidamente; e (iv) reconhecer se houve dano moral indenizável.
III.
RAZÕES DE DECIDIR 3.
A ausência de contrato assinado ou de documentos que comprovem o consentimento da autora à contratação da modalidade cartão de crédito consignado configura falha na prestação de informações claras e adequadas, nos termos dos arts. 6º, III, e 31 do CDC. 4.
A transmutação unilateral de empréstimo consignado para cartão de crédito rotativo, com cobrança contínua e indefinida, compromete a previsibilidade da dívida e configura prática abusiva vedada pelo art. 39, V, do CDC. 5.
A instituição financeira responde objetivamente pelos danos causados ao consumidor em razão de defeitos na prestação de serviços e pela ausência de informações adequadas, conforme art. 14 do CDC. 6.
A cobrança sem contrato válido não é justificável e autoriza a repetição em dobro dos valores descontados, nos termos do art. 42, parágrafo único, do CDC e da jurisprudência do STJ. 7.
A imposição de dívida não contratada, com descontos em benefício previdenciário da autora, viola a boa-fé objetiva e a dignidade do consumidor, caracterizando dano moral indenizável. 8.
A indenização por dano moral deve observar critérios de proporcionalidade e razoabilidade, considerando a gravidade da ofensa, a posição das partes e os efeitos do ato ilícito. 9. É legítima, na fase de liquidação, a compensação de eventuais valores efetivamente repassados à autora, desde que comprovados e sem prejuízo à restituição em dobro dos valores indevidamente descontados.
IV.
DISPOSITIVO E TESE 10.
Recurso provido.
Tese de julgamento: 1.
A ausência de consentimento expresso e de informações claras sobre a contratação de cartão de crédito consignado com reserva de margem consignável impõe a nulidade do contrato. 2.
A cobrança de valores com base em contrato nulo autoriza a restituição em dobro dos montantes indevidamente descontados, nos termos do art. 42, parágrafo único, do CDC. 3.
A prática de descontos indevidos em benefício previdenciário, decorrente de contratação não autorizada, configura violação à boa-fé objetiva e enseja indenização por dano moral. ___________ Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, X; CDC, arts. 6º, III, 14, 31, 39, V, 42, parágrafo único; CC, arts. 884 e 944.
Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt no REsp 1.988.191/TO, Rel.
Min.
Marco Buzzi, j. 03.10.2022; STJ, EREsp 1.413.542/RS, Rel.
Min.
Herman Benjamin, j. 21.10.2020; TJ/PB, ApCív 0817153-64.2022.8.15.2001, Rel.
Des.
Oswaldo Trigueiro do Valle Filho, j. 28.08.2024; TJ/PB, ApCív 0804577-93.2020.8.15.0001, Rel.
Desa.
Maria das Graças Morais Guedes, j. 28.11.2024.
RELATÓRIO Trata-se de apelação cível (ID 36296522) interposta por Maria Jozilda Lopes dos Santos, opondo-se à sentença proferida pelo Juízo de Direito da 4ª Vara Cível da Capital, que nos autos da Ação Ordinária, proposta em face do Banco BMG S.A., julgou improcedentes os pedidos preambulares e condenou-lhe ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, estes arbitrados em 10% sobre o valor da condenação, com exigibilidade suspensa, em razão da gratuidade judiciária concedida (ID 36296515).
Para fundamentar sua pretensão, após discorrer sobre o cabimento, a tempestividade recursal e sintetizar a lide, alega que celebrou operação típica de empréstimo consignado, com parcelas fixas, mas a ré promoveu a “transmutação” do negócio jurídico para a modalidade de cartão de crédito com reserva de margem consignável (RMC) - prática que implica a incidência de juros rotativos superiores e prazos indeterminados, comprometendo a previsibilidade do contrato e o equilíbrio financeiro da relação.
Sustenta não ter sido informada sobre o regime rotativo aplicado, apontando ausência de contrato válido e de transparência nas condições pactuadas.
Requer o provimento do recurso, com reforma da sentença, de modo a se julgar totalmente procedentes os pedidos formulados na peça de ingresso (ID 36296522).
Preparo ausente em razão da gratuidade de justiça deferida na origem (ID 36296494).
Contrarrazões em óbvia contrariedade à pretensão recursal (ID 36296525).
Desnecessidade de remessa dos autos à Procuradoria-Geral de Justiça, porquanto ausente interesse público primário a recomendar a intervenção obrigatória do Ministério Público, nos termos dos arts. 178 e 179 do CPC, ficando assegurada sustentação oral, caso seja de seu interesse. É o relatório.
DECISÃO Presentes os pressupostos extrínsecos e intrínsecos de admissibilidade, conheço da apelação interposta.
Mantenho a gratuidade judiciária deferida em primeiro grau de jurisdição (ID 36296494).
Adianto que dou provimento ao recurso.
Da incidência do Código de Defesa do Consumidor Fixa-se, inicialmente, nos termos do artigo 2º, caput, 3º, caput, e § 2º do Código de Defesa do Consumidor (CDC), ser a relação existente entre as partes inquestionavelmente uma relação de consumo, na medida em que ambas se subsumem perfeitamente aos conceitos jurídicos de consumidor e fornecedor.
Confira: CDC - Art. 2º Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final.
Art. 3º Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços. […]; § 2º Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista.
Pertinente a transcrição do verbete da súmula 297 do STJ, in verbis: STJ - Súmula 297 - O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras.
Síntese da lide Pois bem.
A parte autora alegou que: (i) celebrou operação típica de empréstimo consignado, com parcelas fixas, mas a ré promoveu a “transmutação” do negócio jurídico para a modalidade de cartão de crédito com reserva de margem consignável (RMC); (ii) tal prática que implica a incidência de juros rotativos superiores e prazos indeterminados, comprometendo a previsibilidade do contrato e o equilíbrio financeiro da relação; e (iii) não ter sido informada sobre o regime rotativo aplicado.
A sentença de primeiro grau, como relatado, julgou improcedentes os pedidos, entendendo pela existência de contrato e ausência de ilicitude nos descontos.
Irresignado, a autora interpôs apelação, reiterando todos os fundamentos da inicial, com robusta argumentação quanto à nulidade da contratação simulada e aos prejuízos de ordem econômica e moral.
Eis os contornos da actio.
Da nulidade do contrato O contrato impugnado refere-se à modalidade de “cartão de crédito consignado com reserva de margem” (RMC).
Entretanto, a autora afirma categoricamente que contratou empréstimo consignado tradicional.
Não há nos autos documento firmado pelo autor que comprove a ciência ou anuência à cobrança rotativa.
O desconto persistente na folha de pagamento sem prestação de contas, faturas ou planilhas claras demonstra ausência de prestação adequada de informações, ofendendo os arts. 6º, III, e 31 do Código de Defesa do Consumidor (CDC), ipsis litteris: CDC - Art. 6º São direitos básicos do consumidor: [...]; III - a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade, tributos incidentes e preço, bem como sobre os riscos que apresentem; (Redação dada pela Lei nº 12.741, de 2012) [...].
CDC - Art.
Art. 31.
A oferta e apresentação de produtos ou serviços devem assegurar informações corretas, claras, precisas, ostensivas e em língua portuguesa sobre suas características, qualidades, quantidade, composição, preço, garantia, prazos de validade e origem, entre outros dados, bem como sobre os riscos que apresentam à saúde e segurança dos consumidores.
Outrossim, importante destacar que na hipótese se aplica a teoria da responsabilidade objetiva.
A propósito, no tocante à teoria da responsabilidade objetiva do fornecedor/prestador de serviços, precisa é a lição de Carlos Roberto Gonçalves: “O Código de Defesa do Consumidor, atento a esses novos rumos da responsabilidade civil, também consagrou a responsabilidade objetiva do fornecedor, tendo em vista especialmente o fato de vivermos, hoje, em uma sociedade de produção e de consumo em massa, responsável pela despersonalização ou desindividualização das relações entre produtores, comerciantes e prestadores de serviços, em um polo, e compradores e usuários do serviço, no outro.
Em face dos grandes centros produtores, o comerciante perdeu a preeminência de sua função intermediadora.
No sistema codificado, tanto a responsabilidade pelo fato do produto ou serviço como a oriunda do vício do produto ou serviço são de natureza objetiva, prescindindo do elemento culpa a obrigação de indenizar atribuída ao fornecedor.” (GONÇALVES, Carlos Roberto.
Responsabilidade Civil. 8ª ed.
São Paulo: Saraiva, 2003, p. 389).
Assim sendo, em se tratando de alegação de dano decorrente da prestação defeituosa do serviço, a lide deve ser dirimida com aplicação do disposto no artigo 14 do CDC, in verbis: CDC - Art. 14.
O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos. [...]. § 3º O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar: I - que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste; II - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.
Destarte, o fornecedor responde pelos danos causados ao consumidor independentemente de sua culpa, somente se eximindo de indenizá-lo se comprovar não ter sido o serviço defeituoso ou ser a culpa exclusivamente da vítima ou de terceiro.
Nos termos do artigo 6º, inciso III, do Código de Defesa do Consumidor, o fornecedor tem o dever de fornecer informações claras e precisas sobre os serviços prestados.
O artigo 39, inciso V, da mesma norma, veda a imposição de encargos manifestamente excessivos ao consumidor.
Eis os citados dispositivos: CDC - Art. 6º São direitos básicos do consumidor: [...]; III - a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade, tributos incidentes e preço, bem como sobre os riscos que apresentem; (Redação dada pela Lei nº 12.741, de 2012) CDC - Art. 39. É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas: (Redação dada pela Lei nº 8.884, de 11.6.1994) [...]; V - exigir do consumidor vantagem manifestamente excessiva; A ausência de informações sobre a dívida e a cobrança contínua configura prática abusiva, autorizando a revisão dos valores cobrados.
Ademais, a ausência de dados claros sobre a evolução do débito e a impossibilidade de quitação da dívida evidencia abusividade nos encargos financeiros, tornando necessária a revisão do contrato.
Diante da inexistência de provas documentais que demonstrem a legalidade da cobrança, a declaração de ilegalidade dos descontos, cessação das cobranças e cancelamento do contrato, são medidas que se impõem.
Da devolução Quanto à repetição do indébito, assim é o disposto no art. 42 do Código de Defesa do Consumidor: CDC - Art. 42.
Na cobrança de débitos, o consumidor inadimplente não será exposto a ridículo, nem será submetido a qualquer tipo de constrangimento ou ameaça.
Parágrafo único.
O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável.
No caso em comento, a conduta da instituição financeira ao proceder cobranças, sem que o consumidor tenha contratado o respectivo serviço, objeto de cobrança, revela-se totalmente contrária à boa-fé objetiva.
Neste contexto, sabe-se que o postulado da boa-fé objetiva obriga os contratantes a agirem, seja na fase de negociação ou de execução do contrato, segundo padrões éticos de confiança, lealdade e probidade.
A respeito do tema, a doutrina traz importantes lições: “a boa-fé objetiva consiste em um dever de conduta.
Obriga as partes a terem comportamento compatível com os fins econômicos e sociais pretendidos objetivamente pela operação negocial.
No âmbito contratual, portanto, o princípio da boa-fé impõe um padrão de conduta a ambos os contratantes no sentido da recíproca cooperação, com consideração aos interesses comuns, em vista de se alcançar o efeito prático que justifica a própria existência do contrato.
A boa-fé contratual traduz-se, pois, na imposição aos contratantes de um agir pautado pela ética da igualdade e da solidariedade.
Ao perseguir seus interesses particulares, devem as partes de um contrato conferir primazia aos objetivos comuns e, se for o caso, às relações existenciais sobre as patrimoniais, e à preservação da atividade econômica em detrimento da vantagem individual.
Em vez de um indivíduo tomado em si e por si, cuja liberdade se considerava bem supremo e intocável, a tutela da pessoa, instituída pelo sistema constitucional, atribui ao direito contratual novos deveres, qualificando-se o contrato com um instrumento de realização de objetivos que só merecem proteção se e enquanto estiverem de acordo com os valores da sociedade.
Na base do projeto constitucional está a construção de uma sociedade mais justa e solidária (CF, art. 3º, I), atribuindo-se ao direito contratual, por meio de princípios como a boa-fé, papel fundamental nesta direção.” (TEPEDINO, Gustavo; BARBOZA, Heloisa Helena; MORAES, Maria Celina Bodin de.
Código Civil interpretado conforme a Constituição da República.
Vol.
II.
Rio de Janeiro: Editora Renovar, 2006. p. 16/17).
Esta é a jurisprudência: AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL - AÇÃO DECLARATÓRIA C/C PEDIDO CONDENATÓRIO - DECISÃO MONOCRÁTICA QUE DEU PARCIAL PROVIMENTO AO RECLAMO.
INSURGÊNCIA RECURSAL DA PARTE DEMANDADA. 1.
A alegação de afronta ao art. 1.022 do CPC/15 de forma genérica, sem a efetiva demonstração de omissão do Tribunal a quo no exame de teses imprescindíveis para o julgamento da lide, impede o conhecimento do recurso especial ante a deficiência na fundamentação.
Incidência da Súmula 284/STF. 2.
Segundo a orientação firmada pela Corte Especial deste Superior Tribunal de Justiça, “a repetição em dobro, prevista no parágrafo único do art. 42 do CDC, é cabível quando a cobrança indevida consubstanciar conduta contrária à boa-fé objetiva, ou seja, deve ocorrer independentemente da natureza do elemento volitivo” (EREsp n. 1.413.542/RS, relatora Ministra Maria Thereza de Assis Moura, relator para acórdão Ministro Herman Benjamin, Corte Especial, julgado em 21/10/2020, DJe de 30/3/2021).
Incidência da Súmula 83/STJ. 3.
Agravo interno desprovido. (AgInt no REsp n. 1.988.191/TO, relator Ministro Marco Buzzi, Quarta Turma, julgado em 3/10/2022, DJe de 6/10/2022). (grifamos).
Endossam essa convicção, precedentes deste Tribunal de Justiça.
A colaborar: APELAÇÃO CÍVEL.
AÇÃO POR DANOS MORAIS E REPETIÇÃO DE INDÉBITO.
DESCONTO INDEVIDO EM CONTA SALÁRIO DA PARTE AUTORA.
SERVIÇO NÃO CONTRATADO PELA CLIENTE.
RISCO CRIADO E ASSUMIDO PELO BANCO QUE SE BENEFICIA DA FACILITAÇÃO DE CELEBRAÇÃO DE CONTRATOS.
INOBSERVÂNCIA DO DEVER DE PRUDÊNCIA.
ABUSIVIDADE NA CONDUTA.
REPETIÇÃO DE INDÉBITO.
CABIMENTO.
INTELIGÊNCIA DO ART. 42, PARÁGRAFO ÚNICO DO CDC.
ABALO DE ORDEM MORAL CARACTERIZADO.
QUANTUM FIXADO PELA SENTENÇA.
VALOR QUE REFLETE A RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE DA REPARAÇÃO.
MINORAÇÃO INDEVIDA.
DESPROVIMENTO. - A falha na prestação do serviço bancário pela instituição financeira demandada consubstanciada na incidência de descontos indevidos em conta salário da autora, proveniente de contrato de Previdência e Seguro não requerido pela mesma, configura o dever de indenizar pelos danos morais ocasionados à parte. - Não agindo o recorrente com a cautela necessária, perpetrando cobrança indevida em virtude de serviço não requerido pela autora, sua conduta não pode ser enquadrada como erro justificável, o que enseja a devolução em dobro dos valores indevidamente descontados. - Quando se trata do estabelecimento de indenização por abalo psíquico, sabe-se que o valor estipulado não pode ser ínfimo nem abusivo, devendo ser proporcional à dupla função do instituto do dano moral, quais sejam: a reparação do dano, buscando minimizar a dor da vítima; e a punição do ofensor, para que não volte a reincidir. (0802431-55.2015.8.15.0001, Rel.
Des.
Oswaldo Trigueiro do Valle Filho, APELAÇÃO CÍVEL, 4ª Câmara Cível, juntado em 28/03/2019). (grifamos).
No caso concreto, não se trata de engano justificável, mas de modelo de negócio estruturado com opacidade, que impõe ao consumidor dívida rotativa, sem seu consentimento.
A repetição em dobro dos valores descontados é, pois, medida imperativa.
Da compensação do valor eventualmente depositado Embora o contrato tenha sido anulado, é legítimo que, na fase de liquidação, a apelada pleiteie a compensação do valor que efetivamente transferiu ao autor, desde que: (i) seja comprovadamente vinculado ao contrato anulado; (ii) não comprometa a repetição em dobro dos descontos indevidos; e (iii) haja prova idônea (ex: TED, extrato bancário).
Isso evita enriquecimento sem causa (art. 884 do CC) e não altera o reconhecimento da nulidade contratual, nem o direito à reparação.
A questão deverá ser apurada e controvertida na fase de cumprimento de sentença.
Do abalo anímico A conduta da ré extrapola o mero descumprimento contratual.
Trata-se de: (i) imposição de modalidade contratual não informada; (ii) cobrança de dívida infindável com juros escorchantes; e (iii) comprometimento da subsistência do consumidor aposentado.
A conduta da instituição financeira afronta os princípios da boa-fé objetiva e da transparência, previstos no artigo 4º do Código de Defesa do Consumidor.
Como se sabe, o dano moral tem origem na violação de direito de personalidade do ofendido.
Nesse sentido é o magistério de Sérgio Cavalieri, porquanto o renomado autor define o dano moral como: “A lesão a bem integrante da personalidade, tal como a honra, a liberdade, a saúde, a integridade psicológica, causando dor, sofrimento, tristeza, vexame e humilhação à vítima.” (Sérgio Cavalieri.
Programa de Responsabilidade Civil. 2ª edição.
Editora Malheiros. página 74).
Exemplificativamente: APELAÇÃO CÍVEL.
AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE CONTRATO C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO C/C INDENIZAÇÃO.
SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA.
CONTRATO DE CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO.
DESCONTOS REFERENTES AO VALOR MÍNIMO DA FATURA.
FORMALIZAÇÃO DE CONTRATO EM MODALIDADE DIVERSA DA PRETENDIDA PELA CONSUMIDORA.
PEDIDO JULGADO IMPROCEDENTE.
DEVER DE INFORMAÇÃO.
MALFERIMENTO.
VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA BOA-FÉ OBJETIVA.
DEVOLUÇÃO EM DOBRO DOS VALORES PAGOS.
CABIMENTO.
VERBA DE NATUREZA ALIMENTAR.
DANO MORAL CARACTERIZADO.
REFORMA DA SENTENÇA.
PROVIMENTO. - Nos termos do art. 6º do CDC, tratando-se de contrato de adesão, cabe à parte que redige as suas cláusulas, consignar, com clareza, todas as obrigações assumidas pelos contratantes, sob pena de violação dos princípios contratuais da transparência e da informação. - Comprovado nos autos que o autor não tinha pleno conhecimento sobre a natureza da avença firmada – cartão de crédito consignado – bem como que não utilizou o cartão para qualquer outro fim, senão o saque do valor inicial a título de empréstimo, é imperioso reconhecer a ausência de informação prestada pelo banco. - O desconto indevido nos rendimentos do autor decorrente de parcela mínima de cartão de crédito não contratado, configura dano moral indenizável, mormente por se tratar de verba de natureza alimentar. - Quando se trata do estabelecimento de indenização por abalo psíquico, sabe-se que o valor estipulado não pode ser ínfimo nem abusivo, devendo ser proporcional à dupla função do instituto do dano moral, quais sejam: a reparação do dano, buscando minimizar a dor da vítima; e a punição do ofensor, para que não volte a reincidir. (0817153-64.2022.8.15.2001, Rel.
Gabinete 15 - Des.
Oswaldo Trigueiro do Valle Filho, APELAÇÃO CÍVEL, 4ª Câmara Cível, juntado em 28/08/2024). (grifamos).
Esta Terceira Câmara Cível não diverge: EMENTA: DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL.
APELAÇÃO CÍVEL.
EMPRÉSTIMO CONSIGNADO.
FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO.
DESCONTO INDEVIDO.
RESTITUIÇÃO EM DOBRO.
DANO MORAL.
DESPROVIMENTO.
I.
Caso em exame: 1.
Apelação cível interposta pelo Banco Bradesco S.A. contra sentença que julgou procedente ação de obrigação de fazer c/c repetição de indébito e indenização por danos morais movida por Teresinha Silva, em razão de descontos indevidos em sua conta bancária decorrentes de empréstimo consignado não contratado.
II.
Questão em discussão: 2.
A questão em discussão consiste em saber (i) se houve a contratação válida de empréstimo consignado entre as partes, (ii) se há direito à repetição de indébito em dobro, e (iii) se os descontos indevidos geraram danos morais indenizáveis.
III.
Razões de decidir: 3.
Não houve comprovação da validade do contrato de empréstimo consignado, conforme perícia grafotécnica que atestou a divergência nas assinaturas. 4.
O desconto indevido justifica a restituição em dobro dos valores, conforme o art. 42, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor, uma vez que não se comprovou que o desconto foi realizado por engano justificável. 5.
Os descontos indevidos em benefício previdenciário geraram abalo moral passível de reparação, conforme jurisprudência pacificada sobre dano moral puro em situações de falha na prestação de serviço.
IV.
Dispositivo e tese: Recurso desprovido.
Tese de julgamento: 1.
A ausência de comprovação da contratação válida de empréstimo consignado impõe a devolução em dobro dos valores descontados indevidamente, conforme o Código de Defesa do Consumidor. 2.
O desconto indevido, sem autorização, em benefício previdenciário, configura dano moral indenizável.
Dispositivos relevantes citados: Código de Defesa do Consumidor, art. 42, parágrafo único; Código Civil, art. 944.
Jurisprudência relevante citada: STJ, AgInt no AREsp 1.889.901/PB, Rel.
Min.
Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, j. 29/11/2021; STJ, REsp 1.063.343, Rel.
Min.
Nancy Andrighi, Terceira Turma, j. 24/11/2010. (0804577-93.2020.8.15.0001, Rel.
Gabinete 13 - Desa.
Maria das Graças Morais Guedes, APELAÇÃO CÍVEL, 3ª Câmara Cível, juntado em 28/11/2024). (destaques de agora).
Do quantum indenizatório Fixada a premissa de que a indenização é devida, cumpre ao julgador arbitrar o quantum com moderação, norteando-se pelos critérios da gravidade e repercussão da ofensa, da posição social do ofendido e da situação econômica do ofensor.
O montante da condenação deve ser aferido observando-se as circunstâncias que regem o caso concreto, bem como aos princípios da razoabilidade, da proporcionalidade e das diretrizes do art. 944 do Código Civil, in verbis: CC - Art. 944.
A indenização mede-se pela extensão do dano.
E, não havendo critério objetivo para o arbitramento, o julgador deve valer-se de moderação, levando em conta o grau de culpa e a extensão do dano causado, bem como a situação econômica das partes.
Nessa linha de raciocínio, é a lição de Maria Helena Diniz: “Na reparação do dano moral, o juiz determina, por equidade, levando em conta as circunstâncias de cada caso, o quantum da indenização devida, que deverá corresponder à lesão e não ser equivalente, por ser impossível, tal equivalência.
A reparação pecuniária do dano moral é um misto de pena e satisfação compensatória.
Não se pode negar sua função: penal, constituindo uma sanção imposta ao ofensor; e compensatória, sendo uma satisfação que atenue a ofensa causada, proporcionando uma vantagem ao ofendido, que poderá, com a soma de dinheiro recebida, procurar atender a necessidades materiais ou ideais que repute convenientes, diminuindo, assim, seu sofrimento.” (Maria Helena Diniz, in A Responsabilidade Civil por Dano Moral, in Revista Literária de Direito, ano II, nº 9, jan/fev de 1996, p. 9).
Sem destoar, eis o entendimento de Humberto Theodoro Júnior: “Impõe-se rigorosa observância dos padrões adotados pela doutrina e jurisprudência, inclusive dentro da experiência registrada no direito comparado para evitar-se que as ações de reparação de dano moral se transformem em expedientes de extorsão ou de espertezas maliciosas e injustificáveis.
As duas posições sociais e econômicas, da vítima e do ofensor, obrigatoriamente, estarão sob análise, de maneira que o juiz não se limitará a fundar a condenação isoladamente na fortuna eventual de um ou na possível pobreza do outro.” (THEODORO JÚNIOR, Humberto.
Dano Moral. 5ª ed.
São Paulo: Editora Juarez de Oliveira, 2007).
No mesmo sentido, pontifica Yussef Said Cahali: “tem-se que, também aqui, prevalecem os princípios gerais concernentes à reparabilidade do dano moral, resolvendo-se o seu arbitramento no prudente e criterioso arbítrio do magistrado, em que levará em consideração: as circunstâncias do caso concreto; o valor do título protestado e as suas repercussões pessoais e sociais; a malícia, o dolo ou grau de culpa do apresentante do título; a concorrência do devedor para que o protesto se verificasse; as condições pessoais e econômicas das partes, levando-se em conta, não para excluir a responsabilidade, os antecedentes pessoais e honorabilidade e confiabilidade do ofendido; a finalidade da sanção reparatória, em seu caráter admonitório, para que a prática do ato abusivo não se repita; as providencias adotadas posteriormente pelo ofensor, visando atenuar as repercussões negativas do protesto realizado, ainda que estas não se mostrem capazes de fazer desaparecer a ofensa; e finalidade própria da reparação do dano moral, que não visa a restauração do patrimônio, mas apenas proporcionar-lhe uma indenização compensatória da lesão sofrida; as agruras sofridas pelo autor ao longo do penoso processo (cancelamento do protesto) de limpar dos registros públicos e privados a pecha de 'mau pagador', o bom senso, para que a indenização não seja extremamente irrisória ou meramente simbólica, mas que também não seja extremamente gravosa, de modo a inviabilizar sua execução ou representar, a um tempo, verdadeiro enriquecimento sem causa.” (Yussef Said Cahali, in Dano Moral, 4ª edição - São Paulo; Editora RT, 2011; pág. 363 e 364).
Como a legislação não estabeleceu um valor e nem parâmetros para a fixação do dano moral, posto não ser tarifário, foi suplementada pela doutrina e jurisprudência que têm se posicionado no estabelecer valores que não sejam irrisórios para o ofensor, mas que também não se traduzam em enriquecimento ilícito para o ofendido, observando-se com cuidado as circunstâncias e as consequências de cada caso concreto, no fixar o valor da indenização.
Na fixação da indenização por danos morais, deve-se levar em consideração a gravidade objetiva da lesão, a personalidade da vítima, considerando-se sua situação social e sua reputação, a gravidade da falta e as condições do autor do ilícito, não se olvidando do caráter reparador e o pedagógico.
Ponderando, pois, o transtorno suportado pela parte autora e considerando a capacidade econômico-financeira do demandado, bem como o fato de que a indenização por dano moral deve se revestir de caráter compensatório, punitivo e preventivo, temos que o valor de R$ 7.000,00 (sete mil reais), é condizente com as circunstâncias fáticas, a gravidade objetiva do dano e seu efeito lesivo, bem como observa os critérios de proporcionalidade e razoabilidade.
DISPOSITIVO Isso posto, dou provimento ao recurso, para: 1.
Declarar a nulidade integral do contrato de cartão de crédito consignado firmado entre as partes. 2.
Determinar que a instituição ré se abstenha de realizar novos descontos ou cobranças relacionados ao referido contrato, sob qualquer forma. 3.
Condenar a ré à repetição do indébito, em dobro, de todos os valores descontados indevidamente, com correção monetária e juros legais (art. 42, § único, CDC). 4.
Condenar a demandada a pagar ao autor a importância de R$ 7.000,00 (sete mil reais), a título de indenização pelo abalo anímico, corrigida a partir desta data (STJ, Súmula 362), e acrescida de juros de mora de 1% ao mês, incidentes desde a data do evento danoso (STJ, Súmula 54). 5.
Consignar a ressalva de que, na fase de liquidação, poderá ser analisada a compensação dos valores efetivamente repassados a autora, mediante comprovação adequada e respeito ao contraditório. 6.
Inverter o ônus da sucumbência e condenar a apelada ao pagamento integral das custas e dos honorários advocatícios de sucumbência. 7.
Advertir que eventual interposição de agravo interno manifestamente inadmissível ou unanimemente improcedente e, de embargos de declaração manifestamente protelatórios, poderá dar ensejo à aplicação das multas previstas no § 4º, do art. 1.021 e §§ 2º e 3º do art. 1.026 do Código de Processo Civil.
Intimações necessárias.
João Pessoa, data do registro eletrônico.
Inácio Jário Queiroz de Albuquerque RELATOR -
30/07/2025 12:34
Expedição de Outros documentos.
-
30/07/2025 09:48
Concedida a Assistência Judiciária Gratuita a MARIA JOZILDA LOPES DOS SANTOS - CPF: *25.***.*89-68 (APELANTE).
-
30/07/2025 09:48
Conhecido o recurso de MARIA JOZILDA LOPES DOS SANTOS - CPF: *25.***.*89-68 (APELANTE) e provido
-
29/07/2025 11:50
Conclusos para despacho
-
29/07/2025 11:50
Juntada de Certidão
-
29/07/2025 11:38
Recebidos os autos
-
29/07/2025 11:38
Autos incluídos no Juízo 100% Digital
-
29/07/2025 11:37
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
29/07/2025
Ultima Atualização
30/07/2025
Valor da Causa
R$ 0,00
Documentos
DECISÃO MONOCRÁTICA TERMINATIVA COM RESOLUÇÃO DE MÉRITO • Arquivo
DECISÃO MONOCRÁTICA TERMINATIVA COM RESOLUÇÃO DE MÉRITO • Arquivo
ATO ORDINATÓRIO • Arquivo
ATO ORDINATÓRIO • Arquivo
SENTENÇA • Arquivo
SENTENÇA • Arquivo
DECISÃO • Arquivo
DECISÃO • Arquivo
SENTENÇA • Arquivo
SENTENÇA • Arquivo
DECISÃO • Arquivo
DECISÃO • Arquivo
ATO ORDINATÓRIO • Arquivo
ATO ORDINATÓRIO • Arquivo
DECISÃO • Arquivo
DECISÃO • Arquivo
DECISÃO • Arquivo
DECISÃO • Arquivo
Informações relacionadas
Processo nº 0856803-50.2024.8.15.2001
Maria Salete Rodrigues Campos
Osbaildo de Campos
Advogado: Raquel Ferreira da Silva
1ª instância - TJPB
Ajuizamento: 30/08/2024 10:25
Processo nº 0801943-39.2024.8.15.0081
Roberio Santos Arnaud
Carlos Antonio Cirni Ramalho
Advogado: Luiz Filipe Fernandes Carneiro da Cunha
1ª instância - TJPB
Ajuizamento: 07/11/2024 09:08
Processo nº 0818622-53.2019.8.15.2001
Josenildo Carlos Leite
Banco do Brasil SA
Advogado: Jose Arnaldo Janssen Nogueira
1ª instância - TJPB
Ajuizamento: 02/05/2019 09:58
Processo nº 0818622-53.2019.8.15.2001
Josenildo Carlos Leite
Banco do Brasil SA
Advogado: Gabriel Costa Fragoso de Albuquerque
2ª instância - TJPB
Ajuizamento: 03/02/2025 12:29
Processo nº 0807318-75.2024.8.15.2003
Maria Jozilda Lopes dos Santos
Banco Bmg SA
Advogado: Fabio Frasato Caires
1ª instância - TJPB
Ajuizamento: 05/11/2024 11:07