TJPB - 0800435-26.2022.8.15.0761
2ª instância - Câmara / Desembargador(a) Agamenilde Dias Arruda Vieira Dantas
Processos Relacionados - Outras Instâncias
Polo Ativo
Advogados
Nenhum advogado registrado.
Polo Passivo
Advogados
Nenhum advogado registrado.
Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
-
25/10/2024 09:59
Baixa Definitiva
-
25/10/2024 09:59
Remetidos os Autos (por julgamento definitivo do recurso) para o Juízo de Origem
-
25/10/2024 09:42
Transitado em Julgado em 24/10/2024
-
24/10/2024 00:11
Decorrido prazo de MARIA ROSA DE SOUZA BARBOSA em 23/10/2024 23:59.
-
24/10/2024 00:11
Decorrido prazo de BP PROMOTORA DE VENDAS LTDA. em 23/10/2024 23:59.
-
24/10/2024 00:06
Decorrido prazo de MARIA ROSA DE SOUZA BARBOSA em 23/10/2024 23:59.
-
24/10/2024 00:06
Decorrido prazo de BP PROMOTORA DE VENDAS LTDA. em 23/10/2024 23:59.
-
08/10/2024 00:11
Decorrido prazo de Intimação de pauta - 2ª Câmara Civel - MPPB em 07/10/2024 23:59.
-
02/10/2024 00:03
Publicado Acórdão em 02/10/2024.
-
02/10/2024 00:03
Disponibilizado no DJ Eletrônico em 01/10/2024
-
01/10/2024 00:00
Intimação
ACÓRDÃO APELAÇÃO CÍVEL Nº 0800435-26.2022.8.15.0761 RELATOR: DESª.
AGAMENILDE DIAS ARRUDA VIEIRA DANTAS APELANTE: BP PROMOTORA DE VENDAS LTDA ADVOGADO(A): KARINA DE ALMEIDA BATISTUCI - OAB/PB 178.033-A APELADO: MARIA ROSA DE SOUZA BARBOSA ADVOGADO(A): EDMILSON ALVES DE AGUIAR JUNIOR - OAB/PB 17.058 Ementa: Direito Civil E Processual Civil.
Apelação Cível.
Ação De Repetição De Indébito C/C Indenização Por Danos Materiais E Morais.
Empréstimo Consignado Não Contratado.
Inexistência De Relação Jurídica.
Juntada De Documento Na Fase Recursal.
Impossibilidade.
Dano Moral Não Configurado.
Compensação De Valores.
Provimento Parcial Do Recurso.
I.
Caso Em Exame 1.
Apelação cível interposta pela instituição financeira contra sentença proferida pelo Juízo da Vara Única de Gurinhem, que julgou procedentes os pedidos em ação de repetição de indébito c/c indenização por danos materiais e morais, ajuizada pela promovente, para declarar inexistente a relação jurídica referente a contrato de empréstimo consignado e condenar o banco réu à restituição em dobro dos valores descontados e ao pagamento de indenização por dano moral.
II.
Questão Em Discussão 2.
Há três questões em discussão: (i) verificar se é admissível a juntada de documento na fase recursal; (ii) determinar a configuração de dano moral indenizável; e (iii) analisar a possibilidade de compensação de valores creditados na conta da autora.
III.
Razões De Decidir: 3.
O banco apelante apresenta o contrato objeto da lide apenas na fase recursal, o que configura supressão de instância, sendo vedada a juntada tardia de documentos que não se enquadram nas hipóteses do art. 435 do CPC, por já existentes antes do ajuizamento da ação. 4.
A condição de analfabeta da autora interfere na validade do negócio jurídico, pois o contrato de prestação de serviço deve ser assinado a rogo e subscrito por duas testemunhas, conforme art. 595 do Código Civil.
A não apresentação de contrato válido configura falha na prestação do serviço e ausência de prova da regularidade da contratação do empréstimo consignado. 5.
O dano moral não é configurado in re ipsa e requer a demonstração de constrangimento excepcional, o que não ficou evidenciado no caso concreto.
O mero desconto indevido, por si só, não é apto a gerar indenização por dano moral. 6.
Quanto à repetição de indébito, a devolução em dobro é aplicável por não haver engano justificável nas cobranças indevidas, demonstrando a má-fé do fornecedor, nos termos do art. 42, parágrafo único, do CDC. 7.
A compensação de valores recebidos na conta da autora referente ao empréstimo consignado não contratado é cabível, pois decorre da ausência de convalidação do negócio jurídico e da necessidade de equilibrar as obrigações financeiras entre as partes.
IV.
Dispositivo E Tese. 4.
Apelação parcialmente provida.
Tese de julgamento: “1.
Documentos apresentados somente na fase recursal, que já existiam ao tempo da contestação, não são admitidos, salvo hipóteses excepcionais previstas no art. 435 do CPC.” “2.
A condição de analfabeto exige que o contrato seja assinado a rogo e subscrito por duas testemunhas para ser válido.” “3.
A compensação de valores recebidos na conta bancária da parte autora é permitida quando evidenciado proveito econômico decorrente de contratos declarados inexistentes.” “4.
O dano moral decorrente de descontos indevidos não é configurado in re ipsa e exige a demonstração de ofensa à dignidade da pessoa humana.” “5.
A devolução em dobro do indébito é devida na ausência de engano justificável, caracterizando a má-fé do fornecedor.” ________ Dispositivos relevantes citados: CPC, arts. 373, II, 434 e 435; CC, art. 595; CDC, art. 42, parágrafo único.
Jurisprudência relevante citada: TJPB, AC nº 0803826-17.2021.8.15.0181, Rel.
Des.
João Alves da Silva, 4ª Câmara Cível, j. 26/10/2021; TJPB, AC nº 0802670-56.2021.8.15.0031, Rel.
Des.
Luiz Sílvio Ramalho Júnior, 2ª Câmara Cível, j. 31/01/2023; TJPB, AC nº 0800627-57.2022.8.15.0211, Rel.
Des.
Leandro dos Santos, 1ª Câmara Cível, j. 12/05/2023; STJ, REsp 1.907.394/MT, Rel.
Min.
Nancy Andrighi, 3ª Turma, j. 04/05/2021 (Tema 1116); TJPB, AC nº 0800602-21.2021.8.15.0521, Rel.
Des.
Márcio Murilo da Cunha Ramos, 3ª Câmara Cível, j. 20/09/2021; STJ, AgInt no REsp 1655212/SP, Rel.
Min.
Raul Araújo, 4ª Turma, j. 19/02/2019; TJPB, AC nº 0800269-31.2017.8.15.1161, Rel.
Desa.
Maria das Graças Morais Guedes, 3ª Câmara Cível, j. 17/08/2020.
RELATÓRIO BP PROMOTORA DE VENDAS LTDA., interpôs apelação cível contra sentença proferida pelo Juízo de Direito da Vara Unica de Gurinhem, nos autos da ação de repetição de indébito c/c indenização por danos materiais e morais c/c pedido liminar de suspensão de empréstimo consignado ilícito, ajuizada pelo apelante em face de MARIA ROSA DE SOUZA BARBOSA, que assim consignou na sentença: “
Ante ao exposto, e com fulcro no art. 487, I do NCPC, JULGO PROCEDENTE os pedidos formulados na inicial, pelo que: 1.
DECLARO INEXISTENTE AS RELAÇÕES JURÍDICAS discutidas nestes autos, devendo os contratos serem excluídos do benefício previdenciário do autor (contrato de nº 816629068 com BANCO BRADESCO FINANCIAMENTOS S/A, inscrita no CNPJ/MF 07.***.***/0001-50).
Como consequência, o réu deve se abster de cobrar qualquer valor a eles referentes, sob pena de devolução em dobro da quantia descontada; 2.
CONDENO a empresas ré a restituírem, em dobro, os valores descontados do benefício da parte autora, com correção monetária incidente desde o pagamento de cada uma e juros de mora de 1% ao mês, incidente desde o efetivo prejuízo, qual seja, a data de cada desconto; 3.
CONDENO as empresas ré a pagar ao autor, a título de indenização por dano moral, o valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) CADA, com correção monetária pelo INPC, contado a partir da data desta decisão e juros de mora de 1% ao mês a contar do evento danoso.” (ID 30090202) Nas suas razões recursais (ID 30090206), o banco apelante defende a regularidade da contratação do empréstimo trazendo no corpo de seu apelo e em anexo o contrato objeto da lide, assim, entende pela inexistência de defeito na prestação do serviço, pugnando pelo afastamento da repetição do indébito e da indenização em dano moral ante a ausência de situação ensejadora de tal indenização.
Por fim, caso mantidas as condenações, pugna pela redução da indenização em dano moral arbitrada, que a incidência dos juros sobre o dano moral seja a partir da sentença, bem como a devolução dos valores depositados na conta da promovente sob pena de enriquecimentos ilícitos.
Sem contrarrazões.
Autos não remetidos ao Parquet. É o relatório.
VOTO Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço parcialmente do recurso.
Registre-se, inicialmente, que o banco recorrente apenas em sede recursal apresentou cópia do suposto contrato (ID 30090208), o que implica supressão de instância, pois a matéria não foi arguida perante o Juízo a quo.
Pois bem.
Constitui obrigação da parte instruir os autos com as provas que corroborem suas alegações (art. 434 do CPC), podendo juntar documentos, a qualquer tempo, desde que com o escopo de provar fatos ocorridos após os articulados e para contrapor os documentos juntados pela parte contrária (art. 435 do CPC).
Segundo o parágrafo único deste último dispositivo, “admite-se também a juntada posterior de documentos formados após a petição inicial ou a contestação, bem como dos que se tornaram conhecidos, acessíveis ou disponíveis após esses atos, cabendo à parte que os produzir comprovar o motivo que a impediu de juntá-los anteriormente e incumbindo ao juiz, em qualquer caso, avaliar a conduta da parte de acordo com o art. 5º”.
In casu, o banco/promovido colacionou, nesta seara recursal, documento que – caso tido como verdadeiro - já preexistia ao próprio ajuizamento da ação, sem sequer ventilar justificativa plausível para a apresentação tardia, muito menos comprovar eventual óbice que teria impedido a exibição anterior, simplesmente fazendo a juntada, como se a estivesse realizando em sede de contestação, peça na qual não ofertou qualquer documento comprobatório da suposta avença. É importante ressaltar que, no caso destes autos, em razão da matéria nele tratada, a juntada tardia dos documentos, acarretaria claro prejuízo à defesa da parte autora, pois, caso os instrumentos houvessem sido apresentados no tempo correto, antes da prolação da sentença, a parte poderia se valer dos mecanismos processuais propícios à impugnação da autenticidade da assinatura e/ou dos próprios instrumentos, ensejando, inclusive, a possibilidade de realização de perícia, o que não é viável nesta fase em que se encontra o feito.
Portanto, a desconsideração do documento apresentado com a apelação é imperativa no presente caso, não se tratando de mero rigor formal, mas de medida necessária à preservação dos ditames do supracitado art. 435 do CPC e do próprio direito de defesa da parte autora.
Nesse sentido, precedente desta Egrégia Corte: APELAÇÃO.
AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO COM PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA E DANOS MORAIS.
PROCEDÊNCIA PARCIAL.
INSURGÊNCIA DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA.
JUNTADA DE DOCUMENTAÇÃO SOMENTE NA FASE RECURSAL.
IMPOSSIBILIDADE.
DOCUMENTOS QUE JÁ ESTAVAM EM POSSE DO BANCO APELANTE.
FALTA DE JUSTIFICATIVA PARA APRESENTAÇÃO TARDIA (ART. 435, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CPC). (…) “A juntada de documentos após a prolação de sentença é admitida somente em casos excepcionais, quando se tratar de documento novo ou quando a parte provar que deixou de proceder a juntada por motivo de força maior.
Documentos acostados depois de prolatada a sentença, não merecem ser conhecidos, por antigos” - Não há que se falar em cerceamento de defesa quando não houve solicitação e/ou indeferimento de perícia grafotécnica na origem, sobretudo quando o banco demandando, a quem competia juntar o contrato firmado com parte adversa, deixa de fazê-lo no momento oportuno. - Cumpria ao banco, no momento oportuno, a prova da regularidade do empréstimo consignado impugnado pela parte adversa.
Sem essa prova, é de rigor o decreto de inexigibilidade do débito, a determinação de devolução de valores e a configuração de danos morais (…). (TJPB 0803826-17.2021.8.15.0181, Rel.
Des.
João Alves da Silva, APELAÇÃO CÍVEL, 4ª Câmara Cível, juntado em 26/10/2021).
O referido documento, portanto, não se enquadra no conceito de novo, estabelecido pela exegese do art. 435, do Código de Processo Civil, porquanto já existente por ocasião da apresentação da peça de defesa, de modo que não se destina a fazer prova dos fatos ocorridos depois dos articulados, tampouco para contrapô-los aos que foram produzidos nos autos.
Assim, entendo que não é passível de análise o documento apresentado na fase recursal, e que não se enquadre em nenhuma das hipóteses dos art. 435, do Código de Processo Civil.
Dessa forma, o que ficou evidenciado é que não restou comprovada a realização do contrato de empréstimo, o que demonstra a falha na prestação do serviço por parte do recorrente.
Feitas tais considerações.
A apelação devolve a este grau de jurisdição a regularidade da contratação do empréstimo consignado de nº 816629068 entre as partes e caso negativo o cabimento de restituição dos valores descontados a título de dano material e o cabimento de indenização de cunho moral.
O apelo merece ser parcialmente provido.
Explico.
De início, verifica-se que a autora aduz não ter celebrado qualquer contrato com o banco réu.
Todavia, por ocasião da contestação, a instituição promovida não apresentou nenhum contrato ou termo que comprovasse a contratação dos mesmos.
Analisando o RG do autor (ID 30090172), resta claro que a autora é analfabeta, onde tal condição interfere diretamente na análise da validade do negócio jurídico, pois, para que o mesmo seja considerado válido é necessário agente capaz, objeto lícito, possível, determinado ou determinável e forma prescrita ou não defesa em lei nos termos do artigo 104 do Código Civil.
Nesse cenário, o Código Civil, no seu art. 595 prevê que no contrato de prestação de serviço, quando qualquer das partes não souber ler, nem escrever, o instrumento poderá ser assinado a rogo e subscrito por duas testemunhas, ou seja, tais condições devem ser observadas no presente caso.
Quanto à validade do contrato, do ponto de vista de haver sido firmado por pessoa analfabeta, tem-se que tal condição, por si só, não configura vício de consentimento, nem impede a livre manifestação de sua vontade.
O analfabeto, pois, não é pessoa civilmente incapaz, e a lei civil não exige escritura pública como condição de validade dos atos de vontade por ele firmados, bastando, para tanto, que os instrumentos contratuais preencham os requisitos do art. 595 do Código Civil, in verbis: “Art. 595.
No contrato de prestação de serviço, quando qualquer das partes não souber ler, nem escrever, o instrumento poderá ser assinado a rogo e subscrito por duas testemunhas.” A esse respeito, confira a jurisprudência: APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO ANULATÓRIA– CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO - LEGALIDADE DA CONTRATAÇÃO – DÍVIDA CONTRAÍDA - CONTRATO ASSINADO (IMPRESSÃO DIGITAL) - COM ASSINATURA A ROGO DE DUAS TESTEMUNHAS - VALOR DEPOSITADO NA CONTA DO PROMOVENTE/APELADO - AUSÊNCIA DE DESCONHECIMENTO DO AVENÇADO - DANO MORAL NÃO CONFIGURADO – REFORMA DA SENTENÇA - PROVIMENTO DO APELO. - A condição de analfabeto não configura dificuldade ou empecilho à livre manifestação de sua vontade, uma vez que o contrato acusa sua assinatura (impressão digital) e, ainda que analfabeto, não há nenhuma restrição para contrair empréstimo, até porque o contrato foi assinado a rogo por duas testemunhas. - Provimento do recurso.
VISTOS, RELATADOS E DISCUTIDOS os presentes autos acima identificados.
ACORDA a Segunda Câmara Especializada Cível, à unanimidade, em dar provimento ao apelo, nos termos do voto do Relator. (0802670-56.2021.8.15.0031, Rel.
Des.
Luiz Sílvio Ramalho Júnior (aposentado), APELAÇÃO CÍVEL, 2ª Câmara Cível, juntado em 31/01/2023) APELAÇÃO.
AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE NEGÓCIO JURÍDICO C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS.
EMPRÉSTIMO CONSIGNADO.
CONTRATO EFETIVAMENTE FIRMADO E ASSINADO PELA PROMOVENTE.
ALEGAÇÃO DE ANALFABETISMO.
FALTA DE COMPROVAÇÃO DE VÍCIO DE CONSENTIMENTO OU NULIDADE DO NEGÓCIO JURÍDICO.
RESPONSABILIDADE EM CUMPRIR COM AS OBRIGAÇÕES ASSUMIDAS.
MANUTENÇÃO DA SENTENÇA.
DESPROVIMENTO DO APELO. - Tendo o Autor firmado contrato de empréstimo e se beneficiado do mesmo, e, não tendo se desincumbido do ônus de provar supostas irregularidades ou vício na manifestação de sua vontade que, em tese, maculariam a obrigação, não há que se falar em repetição do indébito ou danos morais, na medida em que não foram constatadas quaisquer ilicitudes na formalização da avença. - "Demonstrada nos autos a existência de contrato, bem como que os valores do empréstimo que se imputa fraudulento foram transferidos para a conta bancária do autor, de se presumir a existência de negócio jurídico firmado segundo o princípio da boa-fé, mormente porque se a vontade da parte não era a de contratar o aludido empréstimo, a ela caberia tomar as providências no sentido da imediata restituição do valor depositado na sua conta." (TJPB – ACÓRDÃO/DECISÃO do Processo Nº 00009943520148151201, 4ª Câmara Especializada Cível, Relator DES.
JOÃO ALVES DA SILVA , j. em 27-02-2018) APELAÇÃO CÍVEL.
AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE CONTRATUAL C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS.
EMPRÉSTIMO CONSIGNADO.
ALEGAÇÃO DE CONTRATAÇÃO FRAUDULENTA.
ANALFABETO.
DESCONTO DEVIDO.
PACTUAÇÃO COMPROVADA.
CONTRATO ASSINADO POR A ROGO E DUAS TESTEMUNHAS.
INTELIGÊNCIA DO ART. 595 DO CC.
IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO.
IRRESIGNAÇÃO.
MANUTENÇÃO DO DECISUM.
DESPROVIMENTO DO RECURSO.
No caso concreto, as provas colacionadas aos autos revelaram a origem do débito, razão pela qual a alegação de que é pessoa analfabeta e de que não tem condições de ter conhecimento dos termos da contratação, não merece prosperar, porquanto restou comprovada a assinatura a rogo e das testemunhas, inclusive com a documentação respectiva. (0800627-57.2022.8.15.0211, Rel.
Des.
Leandro dos Santos, APELAÇÃO CÍVEL, 1ª Câmara Cível, juntado em 12/05/2023) Salutar trazer o voto da Ministra NANCY ANDRIGHI do STJ que inclusive ensejou o Tema Repetitivo 1116 que julga a validade (ou não) da contratação de empréstimo consignado por pessoa analfabeta, mediante instrumento particular assinado a rogo e subscrito por duas testemunhas, vejamos: DIREITO CIVIL.
RECURSO ESPECIAL.
AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE NEGÓCIO JURÍDICO C/C PEDIDOS DE RESTITUIÇÃO DE VALORES E COMPENSAÇÃO POR DANOS MORAIS.
CONTRATO DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO FIRMADO POR IDOSO INDÍGENA ANALFABETO.
VALIDADE.
REQUISITO DE FORMA.
ASSINATURA DO INSTRUMENTO CONTRATUAL A ROGO POR TERCEIRO, NA PRESENÇA DE DUAS TESTEMUNHAS.
ART. 595 DO CC/02.
PROCURADOR PÚBLICO.
DESNECESSIDADE.1.
Ação ajuizada em 20/07/2018.
Recurso especial interposto em 22/05/2020 e concluso ao gabinete em 12/11/2020. 2.
O propósito recursal consiste em dizer acerca da forma a ser observada na contratação de empréstimo consignado por idoso indígena que não sabe ler e escrever (analfabeto). 3.
Os analfabetos, assim como os índios, detêm plena capacidade civil, podendo, por sua própria manifestação de vontade, contrair direitos e obrigações, independentemente da interveniência de terceiro. 4.
Como regra, à luz dos princípios da liberdade das formas e do consensualismo, a exteriorização da vontade dos contratantes pode ocorrer sem forma especial ou solene, salvo quando exigido por lei, consoante o disposto no art. 107 do CC/02.5.
Por essa razão, em um primeiro aspecto, à míngua de previsão legal expressa, a validade do contrato firmado por pessoa que não saiba ler ou escrever não depende de instrumento público. 6.
Noutra toada, na hipótese de se tratar de contrato escrito firmado pela pessoa analfabeta, é imperiosa a observância da formalidade prevista no art. 595 do CC/02, que prevê a assinatura do instrumento contratual a rogo por terceiro, com a subscrição de duas testemunhas. 7.
Embora o referido dispositivo legal se refira ao contrato de prestação de serviços, deve ser dada à norma nele contida o máximo alcance e amplitude, de modo a abranger todos os contratos escritos firmados com quem não saiba ler ou escrever, a fim de compensar, em algum grau, a hipervulnerabilidade desse grupo social. 8.
Com efeito, a formalização de negócios jurídicos em contratos escritos – em especial, os contratos de consumo – põe as pessoas analfabetas em evidente desequilíbrio, haja vista sua dificuldade de compreender as disposições contratuais expostas em vernáculo.
Daí porque, intervindo no negócio jurídico terceiro de confiança do analfabeto, capaz de lhe certificar acerca do conteúdo do contrato escrito e de assinar em seu nome, tudo isso testificado por duas testemunhas, equaciona-se, ao menos em parte, a sua vulnerabilidade informacional. 9.
O art. 595 do CC/02 se refere a uma formalidade a ser acrescida à celebração de negócio jurídico por escrito por pessoa analfabeta, que não se confunde com o exercício de mandato.
O contratante que não sabe ler ou escrever declara, por si próprio, sua vontade, celebrando assim o negócio, recorrendo ao terceiro apenas para um auxílio pontual quanto aos termos do instrumento escrito. 10.
O terceiro, destarte, não celebra o negócio em representação dos interesses da pessoa analfabeta, como se mandatário fosse.
Por isso, não é necessário que tenha sido anteriormente constituído como procurador. 11.
Se assim o quiser, o analfabeto pode se fazer representar por procurador, necessariamente constituído mediante instrumento público, à luz do disposto no art. 654, caput, do CC/02.
Nessa hipótese, típica do exercício de mandato, não incide o disposto no art. 595 do Código e, portanto, dispensa-se a participação das duas testemunhas. 12.
Recurso especial conhecido e provido. (REsp 1.907.394/MT, Rel.
Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 04/05/2021, DJe 10/05/2021 Portanto, resta inconteste que o banco promovido não se desincumbiu do ônus que possui de provar a existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor.
Por tal razão, o banco não comprovou a regularidade da contratação do serviço em debate.
Vejamos: Art. 373.
O ônus da prova incumbe: (…) II - ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor.
Desta feita, ocorrendo contratação com falha ou mediante fraude, em virtude da falta de diligência no momento da suposta negociação, mostram-se inexistente o serviço discriminado na inicial, caracterizando, assim, a responsabilidade civil do promovido, em razão de falha na prestação do serviço, conforme prevê o art. 14 do CDC. É importante destacar que a relação de consumo, na qual opera a inversão do ônus da prova, não desonera a parte autora da comprovação mínima dos fatos constitutivos de seu direito com relação à indenização imaterial reivindicada.
Ademais, a cobrança indevida de valores, por si só, não implica ocorrência de dano moral indenizável.
Isso porque, o dano moral, no caso em tela, não é in re ipsa, carecendo de demonstração nos autos do efetivo constrangimento pelo qual foi submetida a parte autora, ora apelante, porque tem como requisito, além da cobrança indevida, a demonstração de que a parte experimentou sofrimento excepcional, ônus probatório que competia à parte autora, nos termos do art. 373, I, do CPC.
No art. 1º, III, da CF, a dignidade da pessoa humana foi consagrada como fundamento do Estado Democrático de Direito, verbis: Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: I - a soberania; II - a cidadania; III - a dignidade da pessoa humana; IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; V - o pluralismo político.
Como consequência, tal dispositivo conferiu ao dano moral uma nova feição e maior dimensão, haja vista que os direitos à honra, ao nome, à intimidade, à privacidade e à liberdade são abrangidos pelo direito à dignidade.
Assim, à luz da Constituição vigente, pode-se entender o dano moral como a violação do direito à dignidade.
Nessa perspectiva, o dano moral não está necessariamente vinculado a alguma reação psíquica da vítima, consoante leciona Cavalieri Filho: “Pode haver ofensa à dignidade da pessoa humana sem dor, vexame, sofrimento, assim como pode haver dor, vexame e sofrimento sem violação da dignidade.
Dor vexame e humilhação podem ser consequências e não causas.
Assim como a febre é o efeito de uma agressão orgânica, a reação psíquica da vítima só pode ser considerada dano moral quando tiver por causa uma agressão à sua dignidade”. (Sérgio Cavalieri Filho, Programa de Responsabilidade Civil, 8ª Edição, Revista e ampliada, Editora Atlas, p. 80).
O dano moral não mais se restringe à dor, à tristeza e ao sofrimento.
Entretanto, deve existir alguma ofensa à dignidade da pessoa humana.
Assim, a despeito da situação vivenciada pela parte promovente, conquanto, tenha ocorrido, de fato, uma falha na prestação do serviço, tendo em vista que o banco demandado efetuou cobranças indevidas a título de empréstimo consignado mensalmente, mas, não restou evidenciada, no caso concreto, a alegada ofensa à honra, eis que as circunstâncias desta demanda não demonstram a ocorrência de qualquer abalo moral, passível de ensejar indenização, vez que não transcendem mero dissabor.
O mero desconto do valor, na conta bancária da parte autora, por si só, não é apto a gerar dano moral indenizável, em decorrência de tratar-se de valor, que em nenhum momento deixou a parte autora em débito com o banco, ou com saldo negativo, no caso dos autos.
Nesse sentido é o entendimento Jurisprudencial: “AÇÃO ANULATÓRIA DE TARIFAS BANCÁRIAS C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS – ABERTURA DE CONTA PARA RECEBIMENTO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO – COBRANÇA DE TARIFA BANCÁRIA DE SERVIÇO NÃO CONTRATADO – COBRANÇA INDEVIDA – DANO MORAL - NÃO CONFIGURADO – DESCONTO DE VALOR ÍNFIMO – RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.
Quando a instituição financeira efetua descontos de tarifas em conta destinada para recebimento de beneficio previdenciário, sem comprovar contratualmente a anuência da aposentada, impõe-se o reconhecimento de vício na relação de consumo e a transformação do referido registro bancário em conta salário.” (TJ-MS - AC: 8007713620198120044 MS 0800771-36.2019.8.12.0044, Relator: Des.
Júlio Roberto Siqueira Cardoso, Data de Julgamento: 09/09/2020, 4ª Câmara Cível, Data de Publicação: 17/09/2020).
E: “APELAÇÕES CÍVEIS – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS – DESCONTO DE SEGURO DE VIDA EM CONTA CORRENTE – CONTRATAÇÃO NÃO DEMONSTRADA – DEVOLUÇÃO DE VALORES DEVIDA – DANO MORAL – NÃO CONFIGURAÇÃO – AUSÊNCIA DE LESÃO – DEVER REPARATÓRIO AFASTADO – ÔNUS SUCUMBENCIAL – REDISTRIBUIÇÃO – 1º APELO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO – 2º APELO PREJUDICADO.
No caso, não restou comprovada a contratação do seguro de vida por parte do autor/correntista do banco, desse modo, mostra-se devida a devolução dos valores descontados indevidamente.
A cobrança indevida gera o direito à restituição simples do indébito (AgRg no AREsp 357.081/RS), contudo não configura, por si só, o dano moral, que exige a efetiva demonstração de que houve ofensa aos direitos da personalidade.
Com o afastamento da indenização por dano moral resta prejudicada a análise do recurso adesivo por meio do qual o autor pretendia a majoração do quantum fixado.” (TJ-MT 10018914020178110041 MT, Relator: DIRCEU DOS SANTOS, Data de Julgamento: 16/12/2020, Terceira Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 22/01/2021).
No mesmo sentido: “APELAÇÕES CÍVEIS – AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS – DESCONTO DE SEGURO DE VIDA EM CONTA CORRENTE – CONTRATAÇÃO NÃO DEMONSTRADA – DEVOLUÇÃO DE VALORES DEVIDA – DANO MORAL – NÃO CONFIGURAÇÃO – AUSÊNCIA DE LESÃO – DEVER REPARATÓRIO AFASTADO – ÔNUS SUCUMBENCIAL – REDISTRIBUIÇÃO – 1º APELO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO – 2º APELO PREJUDICADO.
No caso, não restou comprovada a contratação do seguro de vida por parte do autor/correntista do banco, desse modo, mostra-se devida a devolução dos valores descontados indevidamente.
A cobrança indevida gera o direito à restituição simples do indébito (AgRg no AREsp 357.081/RS), contudo não configura, por si só, o dano moral, que exige a efetiva demonstração de que houve ofensa aos direitos da personalidade.
Com o afastamento da indenização por dano moral resta prejudicada a análise do recurso adesivo por meio do qual o autor pretendia a majoração do quantum fixado. (TJ-MT 10018914020178110041 MT, Relator: DIRCEU DOS SANTOS, Data de Julgamento: 16/12/2020, Terceira Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 22/01/2021).
E também: APELAÇÃO CÍVEL.
DIREITO DO CONSUMIDOR.
COBRANÇA INDEVIDA DE SEGURO.
DANOS MORAIS.
INEXISTÊNCIA DE LESÃO A DIREITO DA PERSONALIDADE.
MEROS ABORRECIMENTOS.
DESPROVIMENTO DO APELO. – Tratando-se de descontos não autorizados pelo consumidor, em conta corrente, configura-se o mero aborrecimento incapaz de fundamentar um decreto por danos morais. (0804654-42.2023.8.15.0181, Rel.
Des.
Gabinete (vago), APELAÇÃO CÍVEL, 2ª Câmara Cível, juntado em 19/12/2023) PROCESSUAL CIVIL – Agravo interno – Insurgência contra decisão que negou provimento ao recurso de apelação do autor – Ação de indenização por danos materiais e morais – Alegação autoral de cobrança indevida denominada “TITULO DE CAPITALIZAÇÃO” – Danos morais inocorrentes – Caso concreto que não calha a modalidade in re ipsa – A parte autora não fez prova mínima dos fatos alegados e constitutivos do seu direito, a teor do art. 373, I, do CPC – Ausência de comprovação de abalo a algum atributo da personalidade da parte demandante – Manutenção da decisão monocrática – Desprovimento. - A inversão de do ônus de prova, não recai sobre o pedido de dano moral, que no caso em tela, não é in re ipsa, carecendo de demonstração nos autos do efetivo constrangimento pelo qual foi submetida a parte autora, porque tem como requisito, além da cobrança indevida, a demonstração de que a parte experimentou sofrimento excepcional, ônus probatório que competia à parte autora, nos termos do art. 373, I, do CPC. - Assim, cabia à parte autora comprovar situação excepcional de ofensa a direito da sua personalidade para ter direito à indenização, o que não fez. - O caso em apreço trata-se de um ilícito sem potencialidade de ofender a dignidade da consumidora.
Por óbvio que não se está afastando os incômodos sofridos pela recorrente, porém não são suficientes para atribuir responsabilização civil, sob pena de banalização do instituto. - O descumprimento contratual, por si só, é incapaz de afetar os direitos da personalidade da parte autora, configurando mero dissabor do cotidiano, sob pena de colocar em descrédito a própria concepção da responsabilidade civil e do dano moral. (0803103-15.2022.8.15.0261, Rel.
Des.
Abraham Lincoln da Cunha Ramos, APELAÇÃO CÍVEL, 2ª Câmara Cível, juntado em 13/11/2023) A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça tem ressaltado, inclusive, que o ordenamento jurídico brasileiro apenas garante a compensação do verdadeiro dano moral, não havendo proteção jurídica para o simples dissabor ou decepção.
Veja-se: “AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL.
AÇÃO DE INDENIZAÇÃO.
ENVIO DE CARTÃO DE CRÉDITO SEM SOLICITAÇÃO DO CONSUMIDOR.
AUSÊNCIA DE NEGATIVAÇÃO OU COBRANÇA INDEVIDA.
DANOS MORAIS NÃO CONFIGURADOS.
MERO ABORRECIMENTO.
AGRAVO DESPROVIDO. 1. É pacífica a jurisprudência desta Corte no sentido de que os aborrecimentos comuns do dia a dia, os meros dissabores normais e próprios do convívio social não são suficientes para originar danos morais indenizáveis.
Incidência da Súmula 83/STJ. 2.
No caso, a revisão do concluído pelo Tribunal a quo, no sentido de que não houve ofensa à honra, em decorrência do envio, não solicitado, de cartão de crédito, demandaria o revolvimento do acervo fático-probatório dos autos, situação que encontra óbice na Súmula 7/STJ. 3.
Agravo interno não provido.” (STJ - AgInt no REsp: 1655212 SP 2017/0035891-1, Relator: Ministro RAUL ARAÚJO, Data de Julgamento: 19/02/2019, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 01/03/2019).
Como visto, à luz das exposições, e da evolução de entendimento desta 2ª Câmara Cível, não deve prosperar o pedido inicial da parte autora, concernente a condenação em danos morais, pois os problemas enfrentados com a cobrança indevida não ultrapassaram a esfera do mero dissabor cotidiano, no caso concreto.
No que se refere à repetição do indébito em valor dobrado, tem-se como patente a ilegalidade dos descontos realizados na conta bancária da parte consumidora.
Dito isso, resta definir como se dará a devolução dos valores cobrados indevidamente pelo banco apelado, isto é, se o ressarcimento ocorrerá na forma simples ou dobrada.
Como os fatos ensejadores da pretensão de ressarcimento, ora analisada, ocorreram antes de 30 de março de 2021, deve ser aplicada a modulação prevista no EAREsp 676.608/RS, ou seja, de que a devolução em dobro exige a comprovação da má-fé por parte do prestador do serviço na cobrança indevida.
Pois bem, é sabido que é sabido que o instituto da repetição de indébito está inserido no art. 42, parágrafo único, do CDC, e prevê que o consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável.
Confira-se: “Art. 42. […] Parágrafo único.
O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável.” (sem grifo no original) Então, além da cobrança e pagamento indevidos, há uma exigência excepcional, que a lei consumerista chamou de “engano justificável”.
O engano justificável é o fato ou ato de terceiro que leva o fornecedor a um erro sobre o qual não tem controle. É o que acontece, por exemplo, nos casos de fraude praticados por terceiros contra a instituição financeira, como na hipótese de cartão clonado.
O fornecedor não tem, muitas vezes, como saber que o responsável pelo contrato não é aquele que deveria.
Logo, o erro da cobrança indevida encontra uma escusa, uma justificativa.
Afinal, são-lhe apresentados documentos, assinatura, entre todos os dados e documentos possíveis.
E tudo o leva a crer que o consumidor de quem cobra é realmente quem contratou o produto ou serviço.
Assim, sobre as hipóteses de a cobrança indevida decorrer de “engano justificável”, ensina ANTONIO HERMANN V.
BENJAMIN: “O engano é justificável exatamente quando não decore de dolo ou culpa. É aquele que, não obstante todas as cautelas razoáveis exercidas pelo fornecedor-credor, manifesta-se.” (grifei) É bem verdade que o princípio da boa-fé objetiva está presente em todas as relações jurídicas como regra de comportamento de fundo ético.
Assim, nos contratos de consumo, haverá quebra da boa-fé objetiva sempre que o fornecedor deixar de observar os deveres de lealdade, transparência, informação correta, clara e adequada, preço justo, colaboração, cooperação, etc.
Para concluir essa noção de boa-fé objetiva, veja-se o escólio do Professor FLÁVIO TARTUCE: “Da atuação concreta das partes na relação contratual é que surge o conceito de boa-fé objetiva, que, nas palavras de Cláudia Lima Marques, Herman Benjamin e Bruno Miragem, constitui regra de conduta.
Na mesma linha, conforme reconhece o Enunciado n. 26 do Conselho da Justiça Federal, aprovado na I Jornada de Direito Civil, a boa-fé objetiva vem a ser a exigência de um comportamento de lealdade dos participantes negociais, em todas as fases do negócio.
A boa-fé objetiva tem relação direta com os deveres anexos ou laterais de conduta, que são deveres inerentes a qualquer negócio, sem a necessidade de previsão no instrumento.
Entre eles merecem destaque o dever de cuidado, o dever de respeito, o dever de lealdade, o dever de probidade, o dever de informar, o dever de transparência, o dever de agir honestamente e com razoabilidade.” É cediço que o CDC determina a aplicação automática da inversão automática do ônus da prova (ope legis) quando o processo tratar de relação de consumo que verse sobre responsabilidade por fato do produto ou por responsabilidade por fato do serviço (CDC, arts. 12 e 14).
Não obstante, essa inversão automática não se aplica à pretensão da devolução em dobro do indébito, prevista no art. 42, § único, do CDC.
Assim, há de se ficar demonstrado, nos autos, que a cobrança indevida foi produto de má-fé do fornecedor de serviços, ou fruto de uma das modalidades da culpa (negligência, imperícia ou imprudência), para fazer jus ao duplo ressarcimento.
Para o Direito Civil, o dolo consiste na intenção de causar prejuízo ou fraudar outrem. É o erro induzido, ou proposital.
Diferencia-se da culpa, porque, no dolo, o agente tem a intenção de praticar o fato e produzir determinado resultado: existe a má-fé.
No caso em apreço, entretanto, não há falar em engano justificável, muito menos em culpa.
Deve-se, pois, levar em consideração que a conta bancária é um típico contrato de depósito, de modo que a relação entre o consumidor e o banco é de verdadeira fidúcia, pois o depositário detém o dever de guarda dos recursos monetários do cliente.
Logo, é fato que os descontos realizados pelo banco, não constituem erro justificável.
Trata-se, em verdade, de ato eivado por má-fé, na medida em que é praticado mediante abuso da relação de confiança.
Pois quem guarda tem o dever de zelo, e a subtração indevida não é o que se espera dentro dessa relação contratual.
E mais, no caso dos autos, para que ocorresse a conduta lesiva do banco réu, não houve atuação de terceiros, a exemplo de um falsário, de sorte que o banco prestador tinha total controle sobre as informações da autora e sobre a modalidade de sua conta.
Portanto, como os descontos, além de indevidos, não decorreram de erro justificável, posto que pautados em má-fé por parte do fornecedor de serviços, cabível o duplo ressarcimento.
Neste sentido, colham-se os precedentes desta câmara e dos demais órgãos fracionários do TJPB: APELAÇÃO.
AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS.
PROCEDÊNCIA.
IRRESIGNAÇÃO DO BANCO.
TARIFA DE MANUTENÇÃO DE CONTA “CESTA DE SERVIÇOS”.
CONTRATAÇÃO NÃO COMPROVADA.
COBRANÇA INDEVIDA.
DEVOLUÇÃO EM DOBRO.
DANO MORAL IN RE IPSA.
QUANTUM INDENIZATÓRIO.
FIXAÇÃO RAZOÁVEL E PROPORCIONAL.
JUROS DE MORA.
NECESSIDADE DE CORREÇÃO.
INCIDÊNCIA A PARTIR DA CITAÇÃO.
PROVIMENTO PARCIAL. - Tratando-se de conta salário, com destinação exclusiva para o recebimento de proventos, configura-se indevida a cobrança de tarifa de manutenção de conta “cesta de serviços”. - A incidência sobre a conta salário de encargos não contratados constitui engano injustificável, sendo cabível a devolução em dobro, na forma do art. 42, parágrafo único, do CDC. - A condenação por danos morais era mesmo medida que se impunha, em face da falha na prestação do serviço e ilicitude da conduta do recorrente, sendo de rigor a manutenção do quantum indenizatório, quando fixado de forma razoável e proporcional. - Na hipótese de responsabilidade contratual, os juros de mora são devidos desde a data da citação. (TJPB – Apelação Cível n. 0800602-21.2021.8.15.0521; relator: Des.
Márcio Murilo da Cunha Ramos; 3.ª Câmara Cível; data: 20/09/2021) APELAÇÃO CÍVEL.
AÇÃO INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS.
PRELIMINAR.
NÃO CONHECIMENTO DE DOCUMENTOS JUNTADOS POR OCASIÃO DO APELO.
IRRELEVÂNCIA.
CONTRATO ACOSTADO NO DECORRER DA INSTRUÇÃO PROBATÓRIA.
REJEIÇÃO.
MÉRITO.
RELAÇÃO DE CONSUMO.
COBRANÇA INDEVIDA DE TARIFAS.
SERVIÇOS BANCÁRIOS NÃO CONTRATADOS.
AUSÊNCIA DE PROVA EM CONTRÁRIO. ÔNUS DO BANCO.
INCISO VII DO ART. 6º DO CDC.
CONDUTA ABUSIVA DEMONSTRADA.
RESTITUIÇÃO EM DOBRO.
MANUTENÇÃO DA SENTENÇA.
DESPROVIMENTO. - Considerando que o suposto contrato firmado entre as partes foi acostado aos autos pelo banco no decorrer da instrução processual, impõe-se a rejeição da preliminar de não conhecimento dos referidos “documentos novos”. - Correta a condenação do Juízo a quo à devolução dos valores indevidamente descontados, pois a responsabilidade das instituições financeiras, em caso de cobrança indevida por serviços não solicitados, é objetiva, nos termos do art. 14 do CDC, devendo à restituição ser feita em dobro, conforme art. 42, parágrafo único do CDC. (0800269-31.2017.8.15.1161, Rel.
Desa.
Maria das Graças Morais Guedes, APELAÇÃO CÍVEL, 3.ª Câmara Cível, juntado em 17/08/2020) APELAÇÃO CÍVEL.
AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER CUMULADA COM INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E RESTITUIÇÃO DE VALORES.
RELAÇÃO CONSUMERISTA.
ABERTURA DE CONTA PARA PERCEPÇÃO DE SALÁRIO.
COBRANÇA DE TARIFAS RELATIVAS A SERVIÇOS NÃO CONTRATADOS.
CONDUTA ILEGAL.
DEVOLUÇÃO DOS VALORES INDEVIDAMENTE PAGOS.
REPETIÇÃO EM DOBRO.
INTELIGÊNCIA DO ART. 42, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CDC.
ABALO DE ORDEM MORAL CONFIGURADO.
DEVER DE INDENIZAR.
QUANTUM INDENIZATÓRIO.
OBSERVÂNCIA AOS CRITÉRIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE.
VALOR DE R$ 3.000,00 QUE ATENDE AOS PARÂMETROS LEGAIS.
APELO PROVIDO. – Consoante o artigo 2º, I, da Resolução nº. 3.402/2006, do Banco Central do Brasil, é vedado às instituições financeiras cobrar tarifas a qualquer título no caso de conta salário. – Não agindo a empresa com a cautela necessária, no momento da abertura da conta bancária, que não admitia a cobrança de serviços não solicitados pelo consumidor, sua conduta não pode ser enquadrada como erro justificável, o que enseja a devolução em dobro dos valores indevidamente descontados. (...). (0802033-76.2019.8.15.0031, Rel.
Des.
Oswaldo Trigueiro do Valle Filho, APELAÇÃO CÍVEL, 4ª Câmara Cível, juntado em 05/06/2020)
Por outro lado, em que pese a ausência de contratação válida do empréstimo consignado, analisando o extrato bancário juntado pela parte autora (ID 30090173) demonstra que vários valores de créditos oriundos de empréstimos foram transferidos à conta bancária de sua titularidade.
Nesse contexto, apesar da impossibilidade da convalidação do negócio, na medida em que não restou comprovada a anuência do beneficiário, devida se mostra a compensação dos valores efetivamente creditados em favor da parte promovente.
Destaco, por oportuno, que a compensação de crédito no caso em análise não consiste em decisão extra petita, porquanto tratar-se de consequência lógica do pedido inicial, considerando que foi requerida a nulidade/declaração de inexistência dos contratos após a disponibilização do respectivo crédito, sendo evidente o proveito econômico obtido pelo demandante.
Assim, caberá ao juízo a quo, em sede de liquidação de sentença, apurar os valores cabíveis a cada uma das partes, decorrente dos descontos ilegais perpetrados pelo banco demandado.
Ante o exposto, CONHEÇO PARCIALMENTE e DOU PROVIMENTO EM PARTE à apelação, reformando a sentença parcialmente, para afastar a condenação em dano moral e permitir a compensação entre os valores da condenação e os recebidos pela apelada referentes ao contrato objeto da presente - 816629068 - , mantendo a sentença nos seus demais termos.
Majoro os honorários sucumbenciais, nos termos do art. 85, § 11º, do CPC, para 15% (quinze por cento), sobre o valor da condenação. É o voto.
João Pessoa, datado e assinado eletronicamente.
Desª.
Agamenilde Dias Arruda Vieira Dantas Relatora -
30/09/2024 23:04
Expedição de Outros documentos.
-
30/09/2024 23:04
Conhecido em parte o recurso de BP PROMOTORA DE VENDAS LTDA. - CNPJ: 07.***.***/0001-87 (APELANTE) e provido em parte
-
30/09/2024 21:06
Deliberado em Sessão - Julgado - Mérito
-
30/09/2024 11:23
Juntada de Petição de petição
-
19/09/2024 12:30
Expedição de Outros documentos.
-
19/09/2024 12:11
Expedição de Outros documentos.
-
19/09/2024 12:04
Inclusão do processo para julgamento eletrônico de mérito
-
19/09/2024 11:59
Expedição de Outros documentos.
-
19/09/2024 11:52
Inclusão do processo para julgamento eletrônico de mérito
-
18/09/2024 11:15
Proferido despacho de mero expediente
-
17/09/2024 08:29
Conclusos para despacho
-
16/09/2024 20:50
Pedido de inclusão em pauta virtual
-
06/09/2024 13:36
Conclusos para despacho
-
06/09/2024 13:36
Juntada de Certidão
-
06/09/2024 12:56
Recebidos os autos
-
06/09/2024 12:56
Autos incluídos no Juízo 100% Digital
-
06/09/2024 12:56
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
06/09/2024
Ultima Atualização
30/09/2024
Valor da Causa
R$ 0,00
Documentos
ACÓRDÃO • Arquivo
DESPACHO • Arquivo
DESPACHO • Arquivo
DESPACHO • Arquivo
SENTENÇA • Arquivo
DESPACHO • Arquivo
DESPACHO • Arquivo
DESPACHO • Arquivo
DESPACHO • Arquivo
DESPACHO • Arquivo
Informações relacionadas
Processo nº 0864083-72.2024.8.15.2001
Icaro Matheus Nobrega Santiago
Tam Linhas Aereas S/A
Advogado: Fabio Rivelli
1ª instância - TJPB
Ajuizamento: 04/10/2024 08:15
Processo nº 0800175-76.2024.8.15.0211
Maria Concebida da Costa
Banco Bradesco
Advogado: Wilson Sales Belchior
1ª instância - TJPB
Ajuizamento: 15/01/2024 11:43
Processo nº 0801433-82.2024.8.15.0321
Jose Elias do Nascimento
Mapfre Seguros Gerais S.A.
Advogado: David Sombra
1ª instância - TJPB
Ajuizamento: 22/07/2024 18:30
Processo nº 0825332-84.2022.8.15.2001
Luis Carlos Gomes
Antonio Braz &Amp; Vanya Maia Advogados Asso...
Advogado: Antonio Braz da Silva
1ª instância - TJPB
Ajuizamento: 03/05/2022 15:40
Processo nº 0825332-84.2022.8.15.2001
Luis Carlos Gomes
Banco Bradesco
Advogado: Waldir Henrique Silva Batista
2ª instância - TJPB
Ajuizamento: 08/07/2025 19:19