TJCE - 3001864-27.2024.8.06.0167
1ª instância - 2ª Vara Civel da Comarca de Sobral
Processos Relacionados - Outras Instâncias
Polo Ativo
Polo Passivo
Assistente Desinteressado Amicus Curiae
Partes
Advogados
Nenhum advogado registrado.
Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
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29/01/2025 16:14
Remetidos os Autos (em grau de recurso) para Instância Superior
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29/01/2025 16:13
Alterado o assunto processual
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19/12/2024 20:10
Decorrido prazo de JOSE OSVALDO SOARES BALREIRA JUNIOR em 16/12/2024 23:59.
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25/11/2024 00:00
Publicado Ato Ordinatório em 25/11/2024. Documento: 126172390
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22/11/2024 00:00
Disponibilizado no DJ Eletrônico em 22/11/2024 Documento: 126172390
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21/11/2024 13:26
Ato ordinatório praticado
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21/11/2024 12:30
Expedida/certificada a comunicação eletrônica Documento: 126172390
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21/11/2024 11:32
Juntada de Petição de apelação
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15/10/2024 00:41
Decorrido prazo de JOSE OSVALDO SOARES BALREIRA JUNIOR em 14/10/2024 23:59.
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23/09/2024 00:00
Publicado Sentença em 23/09/2024. Documento: 105202648
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20/09/2024 00:00
Disponibilizado no DJ Eletrônico em 20/09/2024 Documento: 105202648
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20/09/2024 00:00
Intimação
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO CEARÁ Comarca de Sobral 2ª Vara Cível da Comarca de Sobral Av.
Monsenhor Aloisio Pinto, 1300, Dom Expedito - CEP 62050-255, Fone: (88) 3614-4354, Sobral-CE - E-mail: [email protected] SENTENÇA Processo nº: 3001864-27.2024.8.06.0167 Classe: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) Assunto: [Abuso de Poder] Requerente: JOSE OSVALDO SOARES BALREIRA JUNIOR Requerido:
I - RELATÓRIO. Trata-se de Ação Ordinária, com pedido de tutela provisória, proposta por JOSE OSVALDO SOARES BALREIRA JUNIOR em face do MUNICÍPIO DE SOBRAL, por intermédio da qual busca provimento judicial para determinar que o Município de Sobral se abstenha de proceder à cobrança da Tarifa de Manejo de Resíduos Sólidos Urbanos (TRSU) em desfavor do autor, instituído pela Lei Complementar Municipal nº 89, de 17 de novembro de 2023. Narra a ocorrência de inconstitucionalidade formal, em razão da exigência de lei específica quanto à matéria, conforme art. 150, § 6º, CRFB. Argumenta que a cobrança de taxa como forma de remunerar a prestação de serviços públicos deve ser utilizada apenas com relação às atividades que sejam dotadas dos critérios da divisibilidade e da especificidade. Aduz, assim, que se aplicaria ao caso o Tema Repetitivo n.º 146 do Supremo Tribunal Federal (STF), o qual preconiza que a taxa pode ser cobrada exclusivamente em razão dos serviços públicos de coleta, remoção e tratamento ou destinação de lixo ou resíduos provenientes de imóveis e que tal providência não viola o artigo 145, II, da Constituição Federal. Pondera, entretanto, que não restou evidenciada a referibilidade entre o critério adotado para o seu cálculo e o serviço público a ser remunerado, tanto que foi adotado como critério o consumo d'água, o qual não guardaria relação com o serviço público objeto da cobrança, violando, portanto, o que disciplina a Constituição Federal quanto a tal espécie tributária. Pugnou, em sede de tutela provisória, a determinação para que o Município de Sobral imediatamente se abstenha de proceder à cobrança da Tarifa de Manejo de Resíduos Sólidos Urbanos (TRSU) em desfavor do autor, oficiando-se o Serviço Autônomo de Água e Esgoto (SAAE) para que retire a cobrança da fatura de consumo do peticionante, sob pena de incidência de multa diária no valor de R$ 500,00 (quinhentos) reais. Deferido o pedido de tutela provisória de urgência para suspender a exigibilidade do crédito tributário referente à tarifa para o custeio do Serviço Público de Manejo de Resíduos Sólidos Urbanos (SMRSU), determinado que o requerido se abstenha de cobrar a SMRSU do requerente (id. 85111392). O município requerido apresentou Embargos de Declaração em face de Decisão de id. 85111392, alegando a existência de fato superveniente, qual seja, a publicação da Resolução ARIS CE nº 38/2024, a qual modificou a Resolução ARIS CE nº 37/2024, tornando a cobrança pela prestação dos serviços de manejo de resíduos sólidos legal. Despacho de id. 88098515 determinando a intimação do embargado para que apresentasse contrarrazões. Contrarrazões (id. 88489271), aduzindo que mesmo após a Resolução ARIS nº 38/2024, a cobrança da tarifa continua sendo compulsória e ausência de licitação para delegar a prestação do serviço em questão. Contestação apresentada no id. 88678985, afirma a obediência à legislação federal e as determinações da agência reguladora de âmbito federal, além de que, após a publicação da Resolução ARIS nº 38/2024, não há que se falar em qualquer ilegalidade da tarifa.
Requer a revogação da tutela concedida e a improcedência total da ação. Decisão (id. 104797353) rejeitando os embargos de declaração. Vieram-me os autos conclusos. É o sucinto relatório.
Passo a analisar e a decidir. II - FUNDAMENTAÇÃO. O julgamento conforme o estado do processo é aplicável quando não há necessidade de produção de prova testemunhal em audiência, conforme estabelecido no art. 355, I, do CPC. No caso em testilha, a matéria dos autos é nitidamente de direito, de modo que descabe qualquer produção probatória, razão pela qual é possível decidir antecipadamente a causa, em respeito à razoável duração do processo. Ademais, é desnecessário haver prévio anúncio às partes a respeito, podendo ser feito em sentença, não havendo falar em cerceamento de defesa, conforme o STJ: PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO.
DIREITO À SAÚDE.
FORNECIMENTO DE FÁRMACO.
PEDIDO DE PRODUÇÃO DE PROVA.
INDEFERIMENTO.
CERCEAMENTO DE DEFESA.
INOCORRÊNCIA.
LIVRE CONVENCIMENTO MOTIVADO.
SÚMULA 7 DO STJ.
APLICAÇÃO. […] 2. Compete ao magistrado, como destinatário final da prova, avaliar a pertinência das diligências que as partes pretendem realizar, segundo o disposto nos arts. 130 e 420, II, do Código de Processo Civil/1973, podendo afastar o pedido de produção de provas inúteis ou meramente protelatórias, a teor do princípio do livre convencimento motivado. 3. Havendo elementos de prova suficientes nos autos, mostra-se possível o julgamento antecipado da lide, sem que isso implique cerceamento de defesa, consoante reiterada jurisprudência desta Corte de Justiça. 4.
Hipótese em que o Tribunal de origem, à luz do suporte fático-probatório constante nos autos (laudo médico), evidenciou a necessidade da medicação prescrita ao ora agravado, decidindo pela desnecessidade da produção da prova requerida pelo ente público, cujas premissas são insuscetíveis de revisão no âmbito do recurso especial, em face do óbice contido na Súmula 7 do STJ. 5.
Agravo interno desprovido. (AgInt no AREsp 337.735/RS, Rel.
Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA TURMA, DJe 3/2/2017) - grifado. Dessa forma, tendo este juízo já firmado suas convicções com a prova anexada aos autos, é legítima a medida.
Nessa esteira, também é a sinalização do Supremo Tribunal Federal: "A antecipação é legítima se os aspectos decisivos da causa estão suficientemente líquidos para embasar o convencimento do magistrado" (RE 101171/SP). Presentes os pressupostos processuais de constituição válida e regular do processo, passo o exame de mérito da demanda. Adoto, contudo, a informação trazida de alteração normativa (Resolução ARIS CE n.º 38/2024) para subsidiar a análise da sentença a ser proferida.
II.I - PRELIMINAR. II.I.I - TUTELA SATISFATIVA.
Como preliminar, a parte requerida sustenta a ilegalidade da decisão que deferiu a concessão de tutela de urgência contra a Fazenda Pública, por entender ter sido uma tutela satisfativa, contrariando o preceito legal insculpido no art. 1º, § 3º, da Lei nº 8.437/1992. Sobre o assunto, conquanto compreenda as ponderações apresentadas pela Prefeitura Municipal de Sobral, entendo que não se respaldam diante do ordenamento jurídico pátrio e dos pronunciamentos feitos pelo Supremo Tribunal Federal (STF), notadamente quando analisado sob a ótica da ADI 4.296. Nesse julgamento, a Corte Suprema entendeu que obstáculos que se coloquem à concessão da medida liminar em mandado de segurança serão sempre inconstitucionais por restringirem uma ação constitucional de natureza civil estampada no art. 5º da Constituição, na previsão dos direitos e garantias fundamentais. Portanto, entendeu-se que "as cláusulas restritivas à possibilidade de o juiz conceder medidas liminares no âmbito do mandado de segurança comprometem o poder geral de cautela do magistrado, a garantia de pleno acesso à jurisdição e a própria defesa do direito líquido e certo protegida pela Constituição Federal". Segue a ementa do referido julgamento: EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE.
ARTS. 1º, §2º, 7º, III E §2º, 22, §2º, 23 E 25, DA LEI DO MANDADO DE SEGURANÇA (LEI 12.016/2009).
ALEGADAS LIMITAÇÕES À UTILIZAÇÃO DESSA AÇÃO CONSTITUCIONAL COMO INSTRUMENTO DE PROTEÇÃO DE DIREITOS INDIVIDUAIS E COLETIVOS.
SUPOSTA OFENSA AOS ARTS. 2º E 5º, XXXV E LXIX, DA CONSTITUIÇÃO.
NÃO CABIMENTO DO "WRIT" CONTRA ATOS DE GESTÃO COMERCIAL DE ENTES PÚBLICOS, PRATICADOS NA EXPLORAÇÃO DE ATIVIDADE ECONÔMICA, ANTE A SUA NATUREZA ESSENCIALMENTE PRIVADA.
EXCEPCIONALIDADE QUE DECORRE DO PRÓPRIO TEXTO CONSTITUCIONAL.
POSSIBILIDADE DE O JUIZ EXIGIR CONTRACAUTELA PARA A CONCESSÃO DE MEDIDA LIMINAR.
MERA FACULDADE INERENTE AO PODER GERAL DE CAUTELA DO MAGISTRADO.
INOCORRÊNCIA, QUANTO A ESSE ASPECTO, DE LIMITAÇÃO AO JUÍZO DE COGNIÇÃO SUMÁRIA.
CONSTITUCIONALIDADE DO PRAZO DECADENCIAL DO DIREITO DE IMPETRAÇÃO E DA PREVISÃO DE INVIABILIDADE DE CONDENAÇÃO AO PAGAMENTO DE HONORÁRIOS SUCUMBENCIAIS.
JURISPRUDÊNCIA CONSOLIDADA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL.
PROIBIÇÃO DE CONCESSÃO DE LIMINAR EM RELAÇÃO A DETERMINADOS OBJETOS.
CONDICIONAMENTO DO PROVIMENTO CAUTELAR, NO ÂMBITO DO MANDADO DE SEGURANÇA COLETIVO, À PRÉVIA OITIVA DA PARTE CONTRÁRIA.
IMPOSSIBILIDADE DE A LEI CRIAR ÓBICES OU VEDAÇÕES ABSOLUTAS AO EXERCÍCIO DO PODER GERAL DE CAUTELA.
EVOLUÇÃO DO ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL.
CAUTELARIDADE ÍNSITA À PROTEÇÃO CONSTITUCIONAL AO DIREITO LÍQUIDO E CERTO.
RESTRIÇÃO À PRÓPRIA EFICÁCIA DO REMÉDIO CONSTITUCIONAL.
PREVISÕES LEGAIS EIVADAS DE INCONSTITUCIONALIDADE.
PARCIAL PROCEDÊNCIA DA AÇÃO. 1.
O mandado de segurança é cabível apenas contra atos praticados no desempenho de atribuições do Poder Público, consoante expressamente estabelece o art. 5º, inciso LXIX, da Constituição Federal.
Atos de gestão puramente comercial desempenhados por entes públicos na exploração de atividade econômica se destinam à satisfação de seus interesses privados, submetendo-os a regime jurídico próprio das empresas privadas. 2.
No exercício do poder geral de cautela, tem o juiz a faculdade de exigir contracautela para o deferimento de medida liminar, quando verificada a real necessidade da garantia em juízo, de acordo com as circunstâncias do caso concreto.
Razoabilidade da medida que não obsta o juízo de cognição sumária do magistrado. 3.
Jurisprudência pacífica da CORTE no sentido da constitucionalidade de lei que fixa prazo decadencial para a impetração de mandado de segurança (Súmula 632/STF) e que estabelece o não cabimento de condenação em honorários de sucumbência (Súmula 512/STF). 4.
A cautelaridade do mandado de segurança é ínsita à proteção constitucional ao direito líquido e certo e encontra assento na própria Constituição Federal.
Em vista disso, não será possível a edição de lei ou ato normativo que vede a concessão de medida liminar na via mandamental, sob pena de violação à garantia de pleno acesso à jurisdição e à própria defesa do direito líquido e certo protegida pela Constituição.
Proibições legais que representam óbices absolutos ao poder geral de cautela. 5.
Ação julgada parcialmente procedente, apenas para declarar a inconstitucionalidade dos arts. 7º, §2º, e 22º, §2º, da Lei 12.016/2009, reconhecendo-se a constitucionalidade dos arts. 1º, § 2º; 7º, III; 23 e 25 dessa mesma lei. (ADI 4296, Relator(a): MARCO AURÉLIO, Relator(a) p/ Acórdão: ALEXANDRE DE MORAES, Tribunal Pleno, julgado em 09-06-2021, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-202 DIVULG 08-10-2021 PUBLIC 11-10-2021) Como se pode perceber, a ADI 4.296 dirigia-se aos preceitos legais da Lei n.º 12.016/2009 (Lei do Mandado de Segurança). Ocorre que a decisão proferida tem diretos reflexos não apenas no Código de Processo Civil (art. 1.059), como também na Lei n.º 8.437/1992.
Explico. Ao mencionar o artigo 1º da Lei n.º 8.437/1992 a inviabilidade de concessão de liminar contra a Fazenda Pública, tal previsão ficou atrelada às vedações legais previstas para os casos relacionados na Lei do Mandado de Segurança, conforme transcrição abaixo: Art. 1° Não será cabível medida liminar contra atos do Poder Público, no procedimento cautelar ou em quaisquer outras ações de natureza cautelar ou preventiva, toda vez que providência semelhante não puder ser concedida em ações de mandado de segurança, em virtude de vedação legal. É dizer, somente não serão cabíveis quando não o forem, também, pela previsão legal relacionada às ações mandamentais. Ora, por um silogismo jurídico, se inexiste mais óbice legal para que sejam concedidas medidas liminares em ações mandamentais (mandado de segurança), conforme a ADI 4.296, igualmente não haverá impedimento para que magistradas e magistrados possam conceder tutela provisória contra a Fazenda Pública, não mais subsistindo a ratio do art. 1º da Lei n.º 8.437/1992, motivo pelo qual não reconheço qualquer ilegalidade e rejeito a preliminar invocada. II.I.II - PREVENÇÃO DA 3ª VARA CÍVEL.
Por outro lado, quanto ao argumento de prevenção da 3ª Vara Cível da Comarca de Sobral pelo fato de ter sido ajuizada a Ação Popular nº 3001260-66.2024.8.06.0167, bem como a necessidade de harmonia entre a decisão proferida naqueles autos e a destes, cabe salientar que inexiste qualquer argumento hábil a ensejar a reunião dos processos nem tampouco a manutenção de decisão idênticas. Inclusive, sobre o assunto, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) - CC 47.731/DF - já teve a oportunidade de se manifestar, cuja transcrição de excerto da ementa utilizo como fundamento para rechaçar a tese levantada pela municipalidade: [...] 4.
A simples possibilidade de sentenças divergentes sobre a mesma questão jurídica não configura, por si só, conflito de competência.
Não existe, em nosso sistema, um instrumento de controle, com eficácia erga omnes, da legitimidade (ou da interpretação), em face da lei, de atos normativos secundários (v.g., resoluções) ou de cláusulas padronizadas de contratos de adesão.
Também não existe, nem mesmo em matéria constitucional, o instrumento da avocação, que permita concentrar o julgamento de múltiplos processos a respeito da mesma questão jurídica perante um mesmo tribunal e, muito menos, perante juiz de primeiro grau.
Assim, a possibilidade de decisões divergentes a respeito da interpretação de atos normativos, primários ou secundários, ou a respeito de cláusulas de contrato de adesão, embora indesejável, é evento previsível, cujos efeitos o sistema busca minimizar com os instrumentos da uniformização de jurisprudência (CPC, art. 476), dos embargos de divergência (CPC, art. 546) e da afetação do julgamento a órgão colegiado uniformizador (CPC, art. 555, § 1º), dando ensejo, inclusive, à edição de súmulas (CPC, art. 479) e à fixação de precedente destinado a dar tratamento jurídico uniforme aos casos semelhantes.
Mas a possibilidade de sentenças com diferente compreensão sobre a mesma tese jurídica não configura, por si só, um conflito de competência. [...]" Portanto, não há motivos mínimos para se reconhecer a competência, por qualquer prisma que seja, da 3ª Vara Cível da Comarca de Sobral para processar e julgar o presente feito. Caso se entendesse como alegado pela municipalidade, haveria clara afronta às regras de competência (e de modificação de competência) do Código de Processo Civil e à regra constitucional de independência funcional, ao se pretender (ou querer pretender) que a decisão tivesse que ser igual à proferida pela mencionada unidade judiciária. Portanto, rejeito as preliminares aventadas. Ausentes outras preliminares ou questões processuais e presentes as condições da ação, passo ao julgamento do mérito. II.
II - MÉRITO. II.II.I - Inconstitucionalidade Formal. A parte autora pondera a existência de inconstitucionalidade formal em razão da previsão contida no art. 150, § 6º, da Constituição Federal que estabelece que "qualquer subsídio ou isenção, redução de base de cálculo, concessão de crédito presumido, anistia ou remissão, relativos a impostos, taxas ou contribuições, só poderá ser concedido mediante lei específica, federal, estadual ou municipal, que regule exclusivamente as matérias acima enumeradas ou o correspondente tributo ou contribuição, sem prejuízo do disposto no art. 155, § 2.º, XII, g". Segundo argumenta a parte autora, a Lei Complementar n.º 89, de 17 de novembro de 2023, foi editada para dispor sobre o Programa de Recuperação Fiscal de Sobral (RECUPERASOL), no qual se estabeleceu (art. 3º) "dispensa do pagamento total ou parcial da correção monetária, multa moratória e juros, relativos aos créditos tributários e não tributários, inscritos ou não na Dívida Ativa da Administração Pública Direta e Indireta do Município de Sobral, ajuizados ou não, decorrentes de fatos geradores até 31 de dezembro de 2022". Salienta, então, que, apesar de a referida legislação versar sobre tal temática, foi inclusa a previsão, no artigo 19, totalmente alheia e estranha à questão relacionada ao programa de recuperação fiscal, a fim de acrescentar o art. 112-A à Lei Complementar n° 39, de 23 de dezembro de 2013, com o seguinte teor: Art. 112-A.
O Poder Executivo Municipal fica autorizado a instituir e regulamentar a tarifa para o custeio do Serviço Público de Manejo de Resíduos Sólidos Urbanos (SMRSU), destinada a prestação do serviço de limpeza urbana e de manejo de resíduos sólidos, em conformidade com a Lei Federal n° 11.445/2007 e suas alterações, em conjunto com as Resoluções da Agência Nacional de Água e Saneamento Básico". A Prefeitura Municipal de Sobral, conquanto tenha apresentado contestação, nada mencionou a respeito, ao passo que a outra requerida, mesmo citada, não se manifestou nos presentes autos. Esses são, portanto, os pontos trazidos em relação à possível ocorrência de inconstitucionalidade formal. Passo a analisar. Como é cediço, o sistema jurídico brasileiro autoriza que o Poder Judiciário possa, incidentalmente, reconhecer possível inconstitucionalidade de norma legal existente como questão prejudicial e, em razão desse reconhecimento, conceder a pretensão deduzida na inicial ajuizada. É dizer, nessas hipóteses, não se irá simplesmente declarar ou não a (in)constitucionalidade de determinada norma, como ocorre nos controles abstratos de constitucionalidade, mas, em razão dessa análise e da existência dessa inconstitucionalidade, será definida a ausência de obrigatoriedade do cumprimento daquela exigência legal eivada de inconstitucionalidade. É sempre elucidativo o escólio do eminente Ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Ferreira Mendes, em sua obra Curso de Direito Constitucional, em coautoria com o atual Procurador-Geral da República, Paulo Gustavo Gonet Branco, in verbis: [...] No controle incidental a inconstitucionalidade é arguida no contexto de um processo ou ação judicial, em que a questão da inconstitucionalidade configura um incidente, uma questão prejudicial que deve ser decidida pelo Judiciário.
Cogita-se também de inconstitucionalidade pela via da exceção, uma vez que o objeto da ação não é o exame de constitucionalidade da lei.
Em geral, associa-se o controle incidental ao modelo difuso, tendo em vista a forma processual própria desse modelo derivado do sistema americano.
Canotilho anota, porém, que o modelo português de controle de constitucionalidade admite o controle incidental exercido pela Corte Constitucional3565.
No Brasil, essa possibilidade também se verifica nos julgamentos de processos subjetivos de competência originária do STF.
O controle principal permite que a questão constitucional seja suscitada autonomamente em um processo ou ação principal, cujo objeto é a própria inconstitucionalidade da lei.
Em geral, admite-se a utilização de ações diretas de inconstitucionalidade ou mecanismos de impugnação in abstracto da lei ou ato normativo. [...] No mesmo rumo, vale trazer a lição de Ingo Wolfgang Sarlet, para quem: [...] O autor, ao apresentar a demanda, e o réu, ao contestar, invocam leis ou atos normativos para sustentar suas posições, cuja validade depende de estarem em conformidade com a Constituição.
A norma que viola a Constituição é nula e, assim, não pode ser aplicada pelo juiz.
Portanto, a solução de todo e qualquer litígio pode exigir do juiz o reconhecimento da inconstitucionalidade de lei.
Qualquer caso judicial pode obrigar o juiz de primeiro grau de jurisdição ou o tribunal, a partir de decisão da maioria absoluta dos membros do seu Plenário ou Órgão Especial, a deixar de aplicar determinada norma por considerá-la inconstitucional.
Deixar de aplicar lei inconstitucional é inerente ao poder de decidir, ou seja, ao poder jurisdicional.
Vale dizer que o controle incidental de constitucionalidade faz parte da tarefa cotidiana e rotineira dos juízes e tribunais.
Trata-se, exatamente, da doutrina Marshall, que inspirou o judicial review estadunidense.
Em 1803, a Suprema Corte dos Estados Unidos, então presidida pelo Juiz John Marshall, enfrentou o célebre caso Marbury v.
Madison,251 em que determinada lei foi contraposta à Constituição.
Desenvolveu-se, aí, o raciocínio que deu origem à tese de que todo juiz tem poder e dever de negar validade à lei que, indispensável para a solução do litígio, não for compatível com a Constituição.252 Surge, com a aceitação deste raciocínio, o controle incidental de constitucionalidade, que, originariamente, também foi corretamente visto como controle difuso, uma vez que o poder de realizar o controle de constitucionalidade de forma incidental, isto é, no curso de processo destinado a resolver um litígio, conferiu este poder a todos os juízes e tribunais. [...] No processo que é instaurado para permitir a solução de conflito de interesses, a questão de constitucionalidade - seja arguida pela parte, terceiro, Ministério Público ou ainda aferida de ofício pelo juiz - é apreciada de forma incidental, como prejudicial à solução do litígio entre as partes.
A decisão da questão de constitucionalidade, assim, não é a decisão da questão principal ou, mais exatamente, do objeto litigioso do processo, mas a decisão da questão cujo exame constitui premissa indispensável para a análise da questão principal ou do mérito, sobre o qual litigam as partes do processo. [...] Portanto, estabelecidas essas premissas, não há qualquer vedação para este Juízo analisar as inconstitucionalidades, formal e material, trazidas pela parte autora. Em relação à inconstitucionalidade formal, entendo restar presente a sua ocorrência.
Explico. Como se extrai do texto constitucional constante do art. 150, § 6º, da CRFB/1988, qualquer subsídio ou isenção, redução de base de cálculo, concessão de crédito presumido, anistia ou remissão, relativos a impostos, taxas ou contribuições, só poderá ser concedido mediante lei específica, federal, estadual ou municipal, que regule exclusivamente as matérias acima enumeradas ou o correspondente tributo ou contribuição. Logo, o legislador, ao tratar dos referidos assuntos, deveria editar uma lei específica sobre o tema e regular exclusivamente sobre, não podendo se utilizar da referida legislação para tratar sobre assuntos estranhos e totalmente alheios à temática originária, tendo sido justamente o que ocorreu com a edição e sanção da Lei Complementar n.º 89, de 17 de novembro de 2023, a qual, a pretexto de instituir o Programa de Recuperação Fiscal de Sobral, acabou se valendo para, no final do teor legislativo, sem qualquer relação ou conexão com o programa de recuperação fiscal, instituir e regulamentar a tarifa para o custeio do Serviço Público de Manejo de Resíduos Sólidos Urbanos (SMRSU), destinada a prestação do serviço de limpeza urbana e de manejo de resíduos sólidos, em conformidade com a Lei Federal n° 11.445/2007. Essa prática de inclusão no final do texto legal ("caudas legislativas") de temas totalmente alheios ao objeto central da norma é costumeira nas diversas esferas do Poder Legislativo.
Nesse sentido, vale transcrever a manifestação da Ministra Carmen Lúcia e do Ministro Luiz Fux quando do julgamento da ADI 5154/PA, in verbis: [...] Ministra Carmen Lúcia: [...] E me lembro até, Ministro Teori, que foi lembrado na constituinte, nos debates, algo que era muito próprio em matéria tributária, e que o Estado de Minas Gerais teve desde o início, e Rui Barbosa era contra, que eram as chamadas "caudas orçamentárias".
Tratava-se de uma lei sobre a matéria, e, lá no final, criava-se um tributo, e se dizia: "mas foi por lei".
O Supremo, desde o início da República, vinha e dizia que não podia fazer isso, que teria que ter essa especificação.
E o Estado de Minas Gerais, por exemplo, era um dos que eram useiros e vezeiros nessas práticas.
Isso, eu me lembro muito, porque, no debate da constituinte, foi lembrado, e o professor Celso Antônio Bandeira, ao defender, por exemplo, a lei específica para criar empresa estatal, dizia: "não, por lei, ela tem que, pelo menos, ter autorizada sua criação, quando não criada; mas isso não basta para nós, é preciso que seja lei específica", ou seja: só se pode criar essa entidade. [...]" Ministro Luiz Fux "[...] A terceira razão é um imperativo de racionalidade legislativa e de controle social.
A exigência de "lei específica" como "diploma monotemático" tem sólidos fundamentos materiais ao impedir deliberações legislativas açodadas e não direcionadas especificamente ao tema para o qual a Constituição exigiu atenção especial.
Não é incomum ouvirem-se na prática legislativa referências às "caudas legislativas", que nada mais são do que dispositivos com conteúdo estranho ao objeto do projeto de lei original, nele inseridos estrategicamente para deliberação conjunta.
Essa manobra dificulta a racionalização do debate parlamentar e permite que sejam aprovadas normas sobre assuntos de importância relativa mais baixa que, não fosse o artifício, encontrariam dificuldades adicionais para serem chanceladas pelo órgão legislativo como um todo. Ademais, leis monotemáticas facilitam o controle social na medida em que conferem maior destaque e visibilidade ao conteúdo dos atos aprovados pelas casas legislativas.
Isso porque leis que veiculam diversas matérias e tratam de diferentes assuntos impõem à sociedade um elevado custo no processamento de toda informação que carregam.
Essa circunstância tem impactos diretos e imediatos na responsividade dos agentes eleitos às demandas e pressões sociais. [...]" Na análise da ADI n.º 5154/PA, a questão divisada era justamente saber se a lei estadual do Estado do Pará teria afrontado a Constituição Federal ao prever, em uma única lei, o regime de previdência estadual para os servidores públicos civis e militares, em razão da previsão contida no art. 142, § 3º, X, da CF/1988, haja vista que há previsão expressa no sentido de se exigir lei específica. Apesar de a discussão ter circundado a situação de exigência de lei específica, o Redator para o Acórdão, Ministro Gilmar Mendes, estabeleceu a perfeita distinção entre lei específica de lei com conteúdo exclusivo.
Transcrevo excerto do voto do Ministro Gilmar Mendes, haja vista que se aplica ao caso em testilha: [...] Consoante verifica-se do debate, cuida-se de saber se a Lei Complementar 39, de 2002, do Estado do Pará, que instituiu o regime de previdência Estadual para os servidores públicos civis e militares violou o art. 42, § 1º da Constituição Federal, quanto à exigência de Lei específica para cuidar do regime de previdência do servidor militar (art. 142, § 3º, X, da CF/88). A Constituição Federal, no art. 42, § 1º, ao requerer lei estadual específica para dispor sobre as matérias do art. 142, § 3º, X, não proibiu que uma única lei pudesse tratar dessa e outras matérias de forma separada, autônoma, tal como ocorreu com a Lei Complementar 39, do Estado do Pará, que dispôs sobre regras previdenciárias próprias aos militares, ainda que também tenha cuidado de servidores públicos em geral. Nesse sentido, não se deve confundir lei específica com lei de conteúdo exclusivo.
A Constituição, quando exige que uma lei regule exclusivamente determinada matéria, o faz expressamente, tal como fez no art. 150, § 6º, que tem a seguinte redação: § 6.º Qualquer subsídio ou isenção, redução de base de cálculo, concessão de crédito presumido, anistia ou remissão, relativos a impostos, taxas ou contribuições, só poderá ser concedido mediante lei específica, federal, estadual ou municipal, que regule exclusivamente as matérias acima enumeradas ou o correspondente tributo ou contribuição, sem prejuízo do disposto no art. 155, § 2.º, XII, g. [...]" Veja, portanto, que o exemplo dado no julgado acima acerca da necessidade de lei com conteúdo exclusivo foi justamente a previsão constante do art. 150, § 6º, da CF/1988, de modo que, no caso dos presentes autos, em relação à Lei Complementar n.º 89, de 17 de novembro de 2023, não houve, nitidamente, o respeito ao conteúdo exclusivo da proposta original de recuperação fiscal, em razão de ter feito incluir matérias totalmente alheias como no caso a instituição e regulamentação da tarifa para o custeio do Serviço Público de Manejo de Resíduos Sólidos Urbanos (SMRSU). Desta feita, com esteio nesses argumentos, reconheço a inconstitucionalidade formal do artigo 19 da Lei Complementar n.º 89, de 17 de novembro de 2023, em razão de afronta ao conteúdo exclusivo que deveria haver a legislação relacionada à recuperação fiscal, conforme preconizado pelo art. 150, § 6º, da CF/1988. II.II.II - Inconstitucionalidade Material. Em se tratando de inconstitucionalidade material, a parte autora sustentou a sua ocorrência em relação à Resolução ARIS CE n.º 037/2024, uma vez que o "Município de Sobral optou por remunerar o serviço de coleta de resíduos sólidos pelo instituto do preço público, na modalidade de tarifa, ao invés de instituir a espécie tributária da taxa". Argumentou que a cobrança de taxa como forma de remunerar a prestação de serviços públicos deve ser utilizada apenas com relação às atividades que sejam dotadas dos critérios da divisibilidade e da especificidade. Aduziu, assim, que se aplicaria ao caso o Tema Repetitivo n.º 146 do Supremo Tribunal Federal (STF), o qual preconiza que a taxa pode ser cobrada exclusivamente em razão dos serviços públicos de coleta, remoção e tratamento ou destinação de lixo ou resíduos provenientes de imóveis e que tal providência não viola o artigo 145, II, da Constituição Federal. Ponderou, entretanto, que não restou evidenciada a referibilidade entre o critério adotado para o seu cálculo e o serviço público a ser remunerado, tanto que foi adotado como critério o consumo d'água, o qual não guardaria relação com o serviço público objeto da cobrança, violando, portanto, o que disciplina a Constituição Federal quanto a tal espécie tributária. No decorrer do feito, a Prefeitura Municipal de Sobral informou a ocorrência de alteração normativa da Resolução ARIS CE n.º 037/2024 pela Resolução ARIS CE n.º 038/2024, resultando na existência de fato superveniente apto a alterar significativamente o resultado desta contenda, notadamente: a) a exclusão do §2º do art. 1º da Res.
ARIS CE nº 37/2024; b) a possibilidade de o Município de Sobral, de ofício, incluir usuários a ter acesso à tarifa social a partir do cruzamento de dados existentes na base do município; c) os usuários que não possuem ligação de água ou que esteja com o serviço cortado/suspenso, não haverá a cobrança; e, d) a possibilidade de exclusão do pagamento da tarifa dos grandes geradores, inclusive com a normatização do Município de Sobral por meio da Instrução Normativa nº 03, de 13 de maio de 2024, expedida pela Secretaria Municipal das Finanças - SEFIN. Por sua vez, a parte autora, ao ser intimada para se manifestar sobre os fundamentos trazidos pela requerida, aduziu não haver qualquer fato superveniente que modificasse significativamente o resultado desta demanda, haja vista que "o serviço de coleta de resíduos sólidos, mesmo após a Resolução ARIS nº 38/2024, continua sendo compulsório, posto que não há espontaneidade na sua contratação, configurando, na espécie, o que a doutrina chama de "compulsoriedade indireta". Ponderou, outrossim, que, "da forma como regulado o serviço tanto pelo Marco Legal do Saneamento Básico quanto pela legislação do Município de Sobral e das Resoluções da ARIS, há manifesto dever legal de submissão do munícipe ao serviço de coleta de resíduos sólidos, circunstância que afasta completamente a possibilidade de remuneração do serviço por tarifa". Pois bem. Em que pesem os relevantes fundamentos trazidos pela municipalidade quanto à inovação normativa em razão da expedição da Resolução ARIS CE n.º 38/2024, vale mencionar que o objeto da lide continua plenamente válido, de modo que não percebo qualquer alteração na causa de pedir ou mesmo do pedido, haja vista que o cerne da controvérsia ainda reside, qual seja: o modo de cobrança realizado em relação ao serviço de coleta de resíduos sólidos. Portanto, apesar de ter havido a alteração das Resoluções, permanece a necessidade de pronunciamento judicial para saber se houve, na edição de ambas, o respeito ao texto constitucional. Antes de partir para análise propriamente das resoluções, há de se estabelecer premissas necessárias para o enfrentamento da matéria. O questionamento se dá em razão da forma de cobrança (taxa ou tarifa) levada a efeito para a prestação de serviços públicos de coleta de resíduos sólidos. Como já adiantei por ocasião da decisão liminar, pouco importa o nomen iuris que tenha sido dado a cobrança, haja vista que nem sempre o legislador nomeia os tributos que institui de acordo com as características essenciais de que se revestem, sendo tal análise feita a partir dos elementos constituintes de sua cobrança e do preenchimento dos requisitos estabelecidos pela norma constitucional. Nesse sentido, vale transcrever excerto do ensinamento do eminente doutrinador e Desembargador Federal do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, Leandro Paulsen (Curso de Direito Tributário Completo, 2020): [...] Ao outorgar competência para a instituição das diversas espécies tributárias, a Constituição revela suas características intrínsecas e aponta o regime jurídico específico que lhes é aplicável. Embora todos os tributos se submetam a regras gerais comuns, há normas específicas para as taxas, para os impostos, para as contribuições de melhoria, para os empréstimos compulsórios e para as contribuições. A importância de distinguir as diversas espécies tributárias e de conseguir identificar, num caso concreto, de que espécie se cuida, está justamente no fato de que a cada uma corresponde um regime jurídico próprio. Nem sempre o legislador nomeia os tributos que institui de acordo com as características essenciais de que se revestem.
Por vezes, chama de taxa o tributo que constitui verdadeira contribuição, ou de contribuição o que configura imposto. Equívocos de denominação podem decorrer da errônea compreensão das diversas espécies tributárias ou mesmo do intuito de burlar exigências formais (lei complementar) e materiais (vinculação a determinadas bases econômicas), estabelecidas pelo texto constitucional.
Por exemplo: a União não pode criar dois impostos com mesmo fato gerador e base de cálculo, nem duas contribuições de seguridade social com o mesmo fato gerador e base de cálculo; mas não há óbice constitucional a que seja criada contribuição com fato gerador idêntico ao de imposto já existente. É indispensável saber com segurança, portanto, se uma nova exação surgida é um imposto ou uma contribuição". [...] É justamente esse o espírito legislativo etiquetado no art. 4º do Código Tributário Nacional (CTN), in verbis: Art. 4º A natureza jurídica específica do tributo é determinada pelo fato gerador da respectiva obrigação, sendo irrelevantes para qualificá-la: I - a denominação e demais características formais adotadas pela lei; II - a destinação legal do produto da sua arrecadação. Portanto, sobreleva a importância da natureza jurídica do tributo, o qual é determinado, única e exclusivamente, pelo fato gerador da respectiva obrigação tributária, não tendo relevância as questões acerca da denominação e demais características, bem como a destinação legal do produto arrecadado.
Por outro lado, há de ressaltar a impossibilidade ou incompatibilidade jurídica da delegação de serviços públicos compulsórios. Como se sabe, a única forma de retribuição de serviços públicos compulsórios é a taxa, cuja atribuição somente é do Estado, e como os agentes delegatários de serviços públicos são remunerados via tarifa, pode-se deduzir que onde há serviço compulsório é vedado delegar. Tal fato se dá porque os serviços públicos têm sua prestação direta ou sob regime de concessão ou permissão autorizada pelo art. 175 da Constituição da República Federativa do Brasil/1988, sendo que o serviço público prestado por delegação se rege contratualmente e submete-se à política tarifária, assegurando-se aos usuários o direito ao serviço adequado, além da proteção objetiva contra danos eventualmente experimentados. Já a questão da compulsoriedade demonstra a força do poder estatal sobre os administrados, sendo fixado o regime remuneratório dos serviços com esteio no primado da legalidade, cuja adesão se faz obrigatória a um serviço emanado exclusivamente da lei, nos termos do art. 5º, II, da CRFB/1988. Então, somente pelo regime jurídico-tributário pode-se compelir o usuário ao pagamento de qualquer serviço público. O regime jurídico tarifário tem sua cobrança atrelada ao serviço contratual prestado ao consumidor e depende da identificação deste.
Afasta-se do tributário - e consequentemente das taxas -, contudo, pela exigência da manifestação de vontade do particular na adesão ao vínculo obrigacional. Questiona-se, então, quais serviços públicos podem ser ou são obrigatórios e quais são aqueles que, desprovidos do caráter da compulsoriedade, podem ser sujeitos de delegação e, portanto, de remuneração via espécie tarifária. Para tanto, mister se faz transcrever a clássica distinção entre serviços propriamente estatais, essenciais ao interesse público e não essenciais, idealizada pelo Ministro Moreira Alves: [...] 1) Serviços públicos propriamente estatais, em cuja prestação o Estado atue no exercício de sua soberania, visualizada esta sob o ponto de vista interno e externo: esses serviços são indelegáveis, porque somente o Estado pode prestá-los.
São remunerados, por isso mesmo, mediante taxa, mas o particular pode, de regra, optar por sua utilização ou não.
Exemplo: o serviço judiciário, o de emissão de passaportes.
Esses serviços, não custa repetir, por sua natureza, são remunerados mediante taxa e a sua cobrança somente ocorrerá em razão da cobrança pela mera potencialidade de sua utilização.
Vale, no ponto, a lição de Geraldo Ataliba, no sentido de que não é possível instituir taxas por serviços não efetivamente prestados.
O que acontece é que certos serviços podem ser tornados obrigatórios pela lei e é isto o que significa a locução "posto à disposição" do contribuinte.
E isto, aliás, o que resulta do disposto no art. 79, I, b, CTN. 2) Serviços públicos essenciais ao interesse público: são serviços prestados no interesse da comunidade.
São remunerados mediante taxa.
E porque são essenciais ao interesse público, porque essenciais à comunidade ou à coletividade, a taxa incidirá sobre a utilização efetiva ou potencial do serviço. É necessário que a lei - para cuja edição será observado o princípio da razoabilidade, mesmo porque, como bem lembrou o Ministro Moreira Alves, citando Jéze, a noção de serviços essenciais é de certo modo relativa, porque varia de Estado para Estado e de época (RTJ 98/238) - estabeleça a cobrança sobre a prestação potencial, ou admita essa cobrança por razão de interesse público.
Como exemplo, podemos mencionar o serviço de distribuição de água, de coleta de lixo, de esgoto, de sepultamento.
No mencionado RE n.º 89.876-RJ, o Supremo Tribunal decidiu que, "sendo compulsória a utilização do serviço público de remoção de lixo - o que resulta, inclusive, de sua disciplina como serviço essencial à saúde pública - a tarifa de lixo instituída pelo Decreto n.º 196, de 12 de novembro de 1975, do poder Executivo do Município do Rio de Janeiro, é, em verdade, taxa" (RTJ 98/230). 3) Serviços públicos não essenciais e que, não utilizados, disso não resulta dano ou prejuízo para a comunidade ou para o interesse público.
Esses serviços são, de regra, delegáveis, vale dizer, podem ser concedidos e podem ser remunerados mediante preço público.
Exemplo: o serviço postal, os serviços telefônicos, telegráficos, de distribuição de energia elétrica, de gás, etc. (RE 209.365, Relator: Ministro Carlos Velloso, Tribunal Pleno, DJ 7 dez. 2000, fls. 886-887) Vê-se, assim, que, pela referida divisão, os serviços públicos de coleta de lixo são classificados como essenciais ao interesse público e, portanto, prestados diretamente pelo Estado, de modo que sua compulsoriedade é notória, não podendo ser delegado a particulares. Ora, não podendo ser delegado a particulares, impede-se a remuneração via modelo de tarifa, sendo cogente a incidência do regime jurídico-tributário de taxa. Nesse sentido, vale mencionar excerto do voto do Relator Presidente, Joaquim Barbosa, na STA 710/MC, julgada em 2013: [...] A facultatividade caracterizadora de tarifas ou de preços públicos é o regime jurídico à qual a exação está sujeita, isto é, se se trata de serviço público primário e de prestação obrigatória pelo Estado (ou exercício de poder de polícia, e.g., na forma de fiscalização), trata-se de tributo (cf., e.g., o AI 531.529-AgR, rel. min.
Joaquim Barbosa, Segunda Turma, DJe de 07.10.2010 e o RE 181.475, rel. min.
Carlos Velloso, Segunda Turma, DJ de 25.06.1999). [...] De igual modo, tem-se o entendimento proferido pelo STF, no âmbito da ADI 800, da ADI 447 e do RE 209.365, em que restou assentado que apenas os serviços públicos não obrigatórios podem ser delegados e, via de consequência, ser remunerados por tarifa. Nada obstante, vale mencionar que o Supremo Tribunal Federal (STF) afetou para o regime de Repercussão Geral o RE n.º 847.429/SC, Tema n.º 903, em que se discute, à luz dos arts. 1º, III; 5º, XXII; 97; 145, II; 150, I; 170, V; e 175, parágrafo único, II, da Constituição Federal, a possibilidade de delegação, mediante contrato de concessão, do serviço de coleta e remoção de lixo domiciliar, bem como a forma de remuneração de tais serviços, no que diz respeito à essencialidade e à compulsoriedade. E, nesses autos, já há manifestação da Procuradoria-Geral da República, cujo excerto se faz necessário transcrever haja vista que se amolda perfeitamente ao delineado até o presente momento, ipsis litteris: [...] Assim, na linha da jurisprudência e da doutrina tributarista majoritária, é impensável a delegação dos serviços de coleta e remoção de lixo residencial e a sua consequente remuneração por tarifa.
Ao determinar o texto constitucional que "ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei" (art. 5.º-II da Constituição), veda-se, salvo melhor entendimento, qualquer possibilidade de que o Estado interfira na órbita do cidadão para impor-lhe obrigações que não tenham amparo em lei.
Essa diretriz não se circunscreve ao campo tributário, impondo-se igualmente às obrigações de fazer - a exemplo da obrigação de tratar poluentes e lixo industrial, sob pena de aplicação de sanções administrativas ou penais.
Portanto, antes de se relacionar com a noção de taxa, o tema ora examinado conecta-se profundamente com o princípio da legalidade, impedindo que serviços obrigatórios de coleta e remoção de lixo domiciliar possam ser delegados, por concessão ou permissão.
A descentralização de serviços públicos por delegação tem como desdobramento necessário a incidência do regime tarifário, essencial à manutenção do equilíbrio econômico-financeiro das concessões.
Além disso, por definição, taxas são cobradas exclusivamente em razão da prestação de serviços diretamente pelo Poder Público.
Também seria absolutamente heterodoxo permitir que, fixada a taxa de limpeza por lei, na forma exigida pela Constituição, transferisse-se sua cobrança ao concessionário, mediante delegação da capacidade tributária ativa, uma vez que, como regra, apenas entes públicos podem ser dotados dessa capacidade.
Recorde-se que, não apenas no pagamento, mas também na gestão, os ativos tributários têm regramento próprio e requerem controles específicos.
Essas conclusões tornam inviável a delegação do serviço obrigatório, na forma do art. 175-caput e parágrafo único-III da Constituição, que pressupõe tanto a descentralização da responsabilidade - transferida ao particular mediante concessão ou permissão do serviço público - quanto a remuneração direta deste, por tarifa.
A perspectiva não impede, sem embargo, que o serviço obrigatório de coleta e remoção de lixo domiciliar possa ser remunerado pelo usuário mediante taxa paga ao ente tributário competente, que contrata, em seu nome, o prestador de serviços e o remunera diretamente.
Nesse caso, o usuário do serviço essencial terá suas garantias constitucionais preservadas, ao mesmo tempo em que surgem potenciais ganhos de eficiência na prestação.
Em suma: a Constituição não autoriza o Estado a financiar serviços públicos de adesão obrigatória senão pela via tributária.
As conclusões aqui tecidas obedecem, em primeiro plano, ao princípio da legalidade, cuja incidência no direito administrativo vem expressa no caput do art. 37 da Constituição.
Reforça-se, ainda, no campo tributário, sob a regência dos arts. 145-II e 150-I do texto constitucional.
Não há óbice, contudo, à contratação, pela própria administração, de empresas prestadoras de serviços, para a realização de tarefas como a coleta e remoção de resíduos domiciliares, desde que o custeio fique sob responsabilidade do Poder Público, que poderá exclusivamente na forma da lei taxar os respectivos usuários.
Fiel a essa compreensão, cumpre dar parcial provimento ao recurso extraordinário, com fixação da seguinte tese de repercussão geral: É inconstitucional, à luz do conceito de taxa e do princípio da legalidade tributária, a delegação do serviço de coleta e remoção de resíduos domiciliares mediante concessão, que pressupõe a remuneração do concessionário por tarifa. [...] Vê-se, assim, que o entendimento da Procuradoria-Geral da República no Tema 903 que se aplica em perfeita sintonia ao caso em voga é justamente pela inconstitucionalidade de delegação do serviço de coleta e de remoção de resíduos sólidos mediante remuneração tarifária. Estabelecidas essas premissas basilares, passa-se à análise propriamente das Resoluções que são objetos destes autos. Resolução ARIS CE n.º 037/2024. Em relação à Resolução ARIS CE n.º 037/2024, este Juízo já teve a oportunidade de se manifestar, em decisão liminar, expondo os fundamentos que, àquela altura, já se entendia pela afronta ao texto constitucional. E, mesmo após o devido contraditório e ampla defesa, as partes requeridas nada se manifestaram sobre a Resolução ARIS CE n.º 037/2024, tendo apenas informado a sua revogação pela Resolução ARIS CE n.º 038/2024 e a alegada mudança significativa introduzida com o novo regramento, o que leva a deduzir o reconhecimento pela contrariedade ao ordenamento jurídico no que atine à Resolução ARIS CE n.º 037/2024. Desta feita, transcrevo excerto do fundamento adotado e utilizo também, nesta sentença, para reconhecer a inconstitucionalidade material em relação à Resolução ARIS CE n.º 037/2024: "[...] Inicialmente, insta evidenciar que o Novo Marco Legal do Saneamento Básico (Lei nº 14.026/2020, que alterou a Lei nº 11.445/2007) definiu novas regras para a universalização dos serviços de água, esgotamento sanitário, drenagem urbana e manejo de resíduos sólidos urbanos. Dentre as novas previsões, está a de cobrança de serviço de manejo de resíduos sólidos urbanos (RSU).
O serviço público de manejo de resíduos sólidos compreende as atividades de coleta, transbordo, transporte, triagem para fins de reutilização ou reciclagem, tratamento e destinação final dos resíduos sólidos urbanos, abrangendo os domésticos, comerciais e industriais, nos termos dos arts. 3º-C, I e II, e 7º, I e II, da Lei nº 11.445/2007, in verbis: "Art. 3º-C Consideram-se serviços públicos especializados de limpeza urbana e de manejo de resíduos sólidos as atividades operacionais de coleta, transbordo, transporte, triagem para fins de reutilização ou reciclagem, tratamento, inclusive por compostagem, e destinação final dos: (Incluído pela Lei nº 14.026, de 2020) I - resíduos domésticos; (Incluído pela Lei nº 14.026, de 2020) II - resíduos originários de atividades comerciais, industriais e de serviços, em quantidade e qualidade similares às dos resíduos domésticos, que, por decisão do titular, sejam considerados resíduos sólidos urbanos, desde que tais resíduos não sejam de responsabilidade de seu gerador nos termos da norma legal ou administrativa, de decisão judicial ou de termo de ajustamento de conduta; e (Incluído pela Lei nº 14.026, de 2020) III - resíduos originários dos serviços públicos de limpeza urbana, tais como: (Incluído pela Lei nº 14.026, de 2020) (...) Art. 7º - Para os efeitos desta Lei, o serviço público de limpeza urbana e de manejo de resíduos sólidos urbanos é composto pelas seguintes atividades: I - de coleta, de transbordo e de transporte dos resíduos relacionados na alínea "c" do inciso I do caput do art. 3º desta Lei; (Redação pela Lei nº 14.026, de 2020) II - de triagem, para fins de reutilização ou reciclagem, de tratamento, inclusive por compostagem, e de destinação final dos resíduos relacionados na alínea "c" do inciso I do caput do art. 3º desta Lei; e (Redação pela Lei nº 14.026, de 2020) III - de varrição de logradouros públicos, de limpeza de dispositivos de drenagem de águas pluviais, de limpeza de córregos e outros serviços, tais como poda, capina, raspagem e roçada, e de outros eventuais serviços de limpeza urbana, bem como de coleta, de acondicionamento e de destinação final ambientalmente adequada dos resíduos sólidos provenientes dessas atividades. (Redação pela Lei nº 14.026, de 2020" Da análise de tais dispositivos, encontra-se a definição legal dos serviços de manejo de resíduos sólidos conferida pelo novo marco do saneamento.
Por sua vez, o art.
Art. 112-A da Lei Complementar n° 39, de 23 de dezembro de 2013 - CTM, com redação dada pela Lei Complementar n° 89, de 17 de novembro de 2023, versou quanto à seguinte cobrança, in litteris: Art. 112-A.
O Poder Executivo Municipal fica autorizado a instituir e regulamentar a tarifa para o custeio do Serviço Público de Manejo de Resíduos Sólidos Urbanos (SMRSU), destinada a prestação do serviço de limpeza urbana e de manejo de resíduos sólidos, em conformidade com a Lei Federal nº 11.445/2007 e suas alterações, em conjunto com as Resoluções da Agência Nacional de Água e Saneamento Básico." Estabelecidas as definições e limites da prestação da atividade estatal que se pretende coibir, cabe agora a análise constitucional da matéria relacionada à forma de remuneração da prestação desse serviço.
A Constituição Federal, em seu art. 145, II, atribui a competência aos Municípios para instituírem a espécie tributária Taxas: " A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir os seguintes tributos: I - impostos; II - taxas, em razão do exercício do poder de polícia ou pela utilização, efetiva ou potencial, de serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos a sua disposição; III - contribuição de melhoria, decorrente de obras públicas. (...)" A norma constitucional delimita a hipótese de incidência das taxas nos mesmos termos em que já era estabelecido pelo Código Tributário Nacional (CTN), conforme se depreende de seus arts. 77 e 79: Art. 77. as taxas cobradas pela União, pelos Estados, pelo Distrito Federal ou pelos Municípios, no âmbito de suas respectivas atribuições, têm como fato gerador o exercício regular do poder de polícia, ou a utilização, efetiva ou potencial, de serviço público específico e divisível, prestado ao contribuinte ou posto à sua disposição. Art. 79.
Os serviços públicos a que se refere o artigo 77 consideram-se: I - utilizados pelo contribuinte: a) efetivamente, quando por ele usufruídos a qualquer título; b) potencialmente, quando, sendo de utilização compulsória, sejam postos à sua disposição mediante atividade administrativa em efetivo funcionamento; II - específicos, quando possam ser destacados em unidades autônomas de intervenção, de utilidade, ou de necessidades públicas; III - divisíveis, quando suscetíveis de utilização, separadamente, por parte de cada um dos seus usuários. Pode-se concluir, portanto, que a taxa é a contraprestação de serviço público, ou de benefício posto à disposição, ou custeado pelo Estado em favor de quem a paga ou por este provocado.
Assim, tem-se que produto da taxa visa a custear a atividade estatal, não podendo ter destinação desvinculada de tal atividade.
Como é cediço, é pacífico na doutrina tributária que o que distingue taxa das demais espécies tributárias é a sua referibilidade, de modo que, conforme já esclarecido acima, é essencial que a taxa instituída esteja vinculada ao serviço público prestado e que este seja mensurável em relação ao contribuinte, não devendo compor sua base de cálculo fatos que não indiquem razoável proporcionalidade e referência entre a atividade estatal e o contribuinte.
Em outros termos, é a base de cálculo prevista na norma que deve confirmar a referibilidade exigida das taxas, não sendo isto o que se verifica na cobrança realizada pelo Município demandado.
Nesse sentido são as lições do professor Hugo de Brito Machado, ipsis litteris: [...] O essencial na taxa é a referibilidade da atividade estatal ao obrigado.
A atuação estatal que constitui fato gerador da taxa há de ser relativa ao sujeito passivo desta, e não à coletividade em geral.
Por isto mesmo, o serviço público cuja prestação enseja a cobrança da taxa há de ser específico e divisível, posto que somente assim será possível verificar uma relação entre esses serviços e o obrigado ao pagamento da taxa. [...] Entende-se específico quando o ente federativo tem condições de identificar o contribuinte que se vale do serviço ou para os quais o serviço está posto à disposição; ou quando o contribuinte sabe por qual serviço está pagando.
Enquanto a divisibilidade é quando o ente federativo tem condições de mensurar a quantidade de serviço oferecido ou efetivamente prestado ao contribuinte.
Ocorre que, em análise da Resolução ARIS/CE n° 37 (id 84865743), pode-se perceber que a base de cálculo - a qual será utilizada para aferição do custo do serviço de coleta de resíduos sólidos - levou em consideração, exclusivamente, a categoria do imóvel e o volume cúbico de água consumida (art. 2° e 3° da Resolução).
Ou seja, não se percebe na legislação atacada nenhum parâmetro relevante que reflita no cálculo do custo do serviço público prestado ao contribuinte da taxa, não trazendo qualquer elemento que indique efetivamente, por exemplo, qual seria a periodicidade dessa coleta, a distância do imóvel, ou mesmo a utilização do imóvel, critérios esses que, se estivessem presentes na norma, seriam fatores determinantes para a definição dos parâmetros de cobrança da taxa, cumprindo a necessária observância da referibilidade ínsita a este tributo [...] É bem verdade que, a respeito da taxa de coleta de lixo domiciliar, especificamente, o C.
Supremo Tribunal Federal, no Recurso Extraordinário nº 576.321/SP RG-QO (Tribunal Pleno, Relator Ministro RICARDO LEWANDOWSKI, j. 04.12.2008, DJe 12.02.2009), em sede de Repercussão Geral (tema 146), firmou orientação no sentido de que "a taxa cobrada exclusivamente em razão dos serviços provenientes de imóveis, não viola o artigo 145, II, da Constituição Federal" e que "é constitucional a adoção, no cálculo do valor de taxa, de um ou mais elementos da base de cálculo própria de determinado imposto, desde que não haja integral identidade entre uma base e outra".
A questão foi objeto das Súmulas Vinculantes nºs 19 e 29 do C.
Supremo Tribunal Federal: Súmula Vinculante 19: A taxa cobrada exclusivamente em razão dos serviços públicos de coleta, remoção e tratamento ou destinação de lixo ou resíduos provenientes de imóveis não viola o artigo 145, II, da Constituição Federal.
Súmula Vinculante 29: É constitucional a adoção, no cálculo do valor de taxa, de um ou mais elementos da base de cálculo própria de determinado imposto, desde que não haja integral identidade entre uma base e outra Portanto, não há inconstitucionalidade na cobrança de taxa de coleta de lixo domiciliar, desde que nos moldes do estabelecido pelas Súmulas Vinculantes 19 e 20.
Assim, embora constitucional a taxa em razão dos serviços públicos de coleta, remoção e tratamento ou destinação de lixo ou resíduos provenientes de imóveis, bem como a possibilidade de adoção de um ou mais elementos na composição da sua base de cálculo, o certo é que esta deve estar relacionada com o custo da atividade estatal e não pode ter elemento estranho ao custo dos serviços relacionados.
No caso em testilha, consoante acima evidenciado, a taxa questionada está atrelada ao volume cúbico de água consumida, elemento totalmente estranho ao custo dos serviços relacionados à coleta, remoção, transporte e destinação final dos resíduos sólidos, afrontando diretamente os termos previstos na constituição.
De mais a mais, no que tange aos precedentes do Pretório acerca possibilidade de custeio de coleta e tratamento de resíduos por meio de taxa, tais custeios devem ser completamente dissociados dos serviços de limpeza da polução, bem como, plenamente específicos e divisíveis, o que não se coaduna ao caso dos autos, exempli gratia: ( ...) é constitucional a taxa de coleta, remoção e tratamento ou destinação de lixo ou resíduos provenientes de imóveis, desde que essas atividades sejam completamente dissociadas de outros serviços públicos de limpeza realizados em benefício da população em geral, como ocorre no caso dos autos.
Resta controvertida (...) a demanda precisamente no ponto de fixação da taxa em valor fixo e diferenciado para imóveis residenciais e não residenciais. (...) o princípio da isonomia tributária se perfaz na devida repartição dos custos dos serviços entre os usuários. Isto é, traduz-se o princípio da isonomia, bem como a capacidade contributiva, ao promover a especificidade e a divisibilidade na razoável presunção de que imóveis residenciais e não residenciais produzem quantidades e variantes diferentes de resíduos, desfrutando dos serviços de coleta em medidas diversas. (RE 1.291.252, rel. min.
Dias Toffoli, dec. monocrática, j. 11-11-2020, DJE 274 de 18-11-2020.) Na realidade, evidencia-se que a "Tarifa de SMRSU" prevista na norma municipal nada mais é do que um tributo cobrado pela prestação de um serviço indivisível e geral, indevidamente denominado de tarifa.
Destarte, em análise prefacial, conclui-se que a tarifa de SMRSU é indevida, já que não possui esse caráter de especificidade e de divisibilidade e adota como base de cálculo o volume cúbico de água consumido, o qual é totalmente estranho ao âmbito da prestação do serviço. [...]" Portanto, como se pode deduzir, na decisão que concedeu a liminar já houve o reconhecimento da inconstitucionalidade material (e mantenho o entendimento nesta sentença), quer seja pela forma de instituição de tarifa quando deveria tê-lo sido por taxa - em razão da compulsoriedade determinada a cada cidadão, sendo que a cobrança de tarifa (preço público) se dá apenas em caráter contratual e, portanto, opcional - quer seja por ausência de referibilidade, de especificidade e de divisibilidade, além do que não devem compor a base de cálculo fatos que não indiquem razoável proporcionalidade e referência entre a atividade estatal e o contribuinte, o que ocorreu com a cobrança por metro cúbico de água. Assim sendo, reconheço, de forma incidental, a inconstitucionalidade material da Resolução ARIS CE n.º 037/2024 e, portanto, por consequência, determino que as partes requeridas se abstenham de proceder à cobrança da Tarifa de Manejo de Resíduos Sólidos Urbanos (TRSU) em desfavor do autor, oficiando-se o Serviço Autônomo de Água e Esgoto (SAAE) para que retire a cobrança da fatura de consumo do peticionante. Resolução ARIS CE n.º 038/2024. Quanto à Resolução ARIS CE n.º 038/2024, a Prefeitura Municipal de Sobral abordou alguns aspectos que merecem a devida análise por este Juízo. Argumentou que, com o advento da nova normatização, houve (1) a exclusão do §2º do art. 1º da Res.
ARIS CE nº 37/2024; (2) a possibilidade de o Município de Sobral, de ofício, incluir usuários a ter acesso à tarifa social a partir do cruzamento de dados existentes na base do município; (3) a ausência de cobrança para os usuários que não possuem ligação de água ou que esta esteja cortada/suspensa; e (4) a possibilidade de exclusão do pagamento da tarifa dos grandes geradores, inclusive com a normatização do Município de Sobral por meio da Instrução Normativa nº 03, de 13 de maio de 2024, expedida pela Secretaria Municipal das Finanças - SEFIN. Além disso, pontuou que houve o rigoroso cumprimento da legislação federal a respeito, notadamente a Lei n.º 11.445/2007, que dispõe sobre diretrizes nacionais para o saneamento básico, bem como a Lei n.º 14.026/2020, que atualiza o marco legal do saneamento básico e altera a Lei n.º 9.984/2000. Pondera, também, que a Resolução ANA n.º 79/2021, que aprova as normas de referência para regulação dos serviços públicos de saneamento básico, estabeleceu a possibilidade de cobrança via tarifa.
Defende, então, a constitucionalidade da medida normativa adotada. Pois bem. Em síntese, tem-se que a municipalidade defende a constitucionalidade por, em razão da alteração normativa com o advento da Resolução ARIS CE n.º 038/2024, inexistir qualquer compulsoriedade ao usuário, haja vista que se não quiser utilizar o serviço da Agência Reguladora deverá adotar outro meio para a coleta de seus resíduos sólidos, bem como que o histórico legislativo federal autorizaria a forma de instituição da cobrança por tarifa para a coleta dos resíduos sólidos. Novamente, conquanto entenda os argumentos da Prefeitura Municipal de Sobral, não merecem prosperar. Em relação à questão do histórico legislativo federal, vale mencionar como já o fiz por ocasião da decisão que rejeitou os embargos de declaração, a análise do texto normativo está sendo feito à luz da Constituição, de modo que descabe falar ou analisar a respeito da evolução normativa federal, eis que não se está fazendo um controle de legalidade, mas de constitucionalidade. Nada obstante, percebe-se que, em nenhum momento, a legislação federal mencionada pela municipalidade obriga que a coleta de resíduos sólidos seja cobrada mediante tarifa, mas faculta essa possibilidade assim como também o faz para a taxa. Isso fica evidente quando se faz a leitura a -
19/09/2024 13:17
Expedida/certificada a comunicação eletrônica Documento: 105202648
-
19/09/2024 13:17
Expedida/certificada a intimação eletrônica
-
19/09/2024 13:17
Julgado procedente o pedido
-
17/09/2024 17:24
Conclusos para julgamento
-
13/09/2024 17:51
Embargos de declaração não acolhidos
-
13/09/2024 13:40
Conclusos para decisão
-
13/09/2024 09:09
Cancelada a movimentação processual Conclusos para decisão
-
29/06/2024 01:24
Decorrido prazo de PROCURADORIA GERAL DO ESTADO em 28/06/2024 23:59.
-
26/06/2024 15:10
Juntada de Petição de contestação
-
21/06/2024 15:16
Juntada de Petição de pedido (outros)
-
14/06/2024 00:00
Intimação
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO CEARÁ Comarca de Sobral 2ª Vara Cível da Comarca de Sobral Av.
Monsenhor Aloisio Pinto, 1300, Dom Expedito - CEP 62050-255, Fone: (88) 3614-4354, Sobral-CE - E-mail: [email protected] DESPACHO Processo nº: 3001864-27.2024.8.06.0167 Classe: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) Assunto: [Abuso de Poder] Requerente: JOSE OSVALDO SOARES BALREIRA JUNIOR Requerido: Trata-se de embargos de declaração (id. nº 87503329) opostos pelo Município requerido. Intimem-se os embargados para apresentarem suas contrarrazões no prazo de 05 (cinco) dias.
Expedientes necessários.
Sobral/CE, data da assinatura eletrônica.
Erick José Pinheiro Pimenta Juiz de Direito -
14/06/2024 00:00
Disponibilizado no DJ Eletrônico em 14/06/2024 Documento: 88098515
-
13/06/2024 12:50
Expedida/certificada a comunicação eletrônica Documento: 88098515
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13/06/2024 12:50
Proferido despacho de mero expediente
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06/06/2024 09:39
Juntada de Petição de pedido (outros)
-
31/05/2024 16:17
Conclusos para decisão
-
31/05/2024 10:34
Juntada de Petição de petição
-
31/05/2024 10:25
Juntada de Petição de embargos de declaração
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24/05/2024 01:22
Decorrido prazo de MUNICIPIO DE SOBRAL em 23/05/2024 23:59.
-
10/05/2024 12:08
Juntada de Petição de ciência
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06/05/2024 16:09
Expedição de Outros documentos.
-
06/05/2024 15:57
Expedição de Outros documentos.
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06/05/2024 15:54
Expedição de Outros documentos.
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06/05/2024 15:54
Expedição de Outros documentos.
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30/04/2024 13:53
Concedida a Medida Liminar
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30/04/2024 09:40
Juntada de Petição de petição
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29/04/2024 13:40
Conclusos para decisão
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29/04/2024 11:52
Juntada de Petição de pedido (outros)
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29/04/2024 11:09
Proferido despacho de mero expediente
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25/04/2024 10:05
Juntada de Petição de documento de comprovação
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25/04/2024 10:02
Juntada de Petição de guias de recolhimento/ deposito/ custas
-
24/04/2024 19:16
Conclusos para decisão
-
24/04/2024 19:16
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
24/04/2024
Ultima Atualização
21/05/2025
Valor da Causa
R$ 0,00
Documentos
ACÓRDÃO SEGUNDO GRAU • Arquivo
Despacho • Arquivo
Despacho • Arquivo
Ato Ordinatório • Arquivo
Ato Ordinatório • Arquivo
Sentença • Arquivo
Decisão • Arquivo
Documento de Comprovação • Arquivo
Despacho • Arquivo
Decisão • Arquivo
Petição • Arquivo
Despacho • Arquivo
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