TJSP - 2115241-17.2025.8.26.0000
2ª instância - Câmara / Desembargador(a) Renato Rangel Desinano
Polo Passivo
Advogados
Nenhum advogado registrado.
Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
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08/07/2025 20:11
Juntada de Petição de Petição (outras)
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08/07/2025 20:10
Subprocesso Cadastrado
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12/06/2025 12:44
Prazo
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12/06/2025 00:00
Publicado em
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11/06/2025 15:04
Expedição de Certidão.
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11/06/2025 00:00
Intimação
DESPACHO Nº 2115241-17.2025.8.26.0000 - Processo Digital.
Petições para juntada devem ser apresentadas exclusivamente por meio eletrônico, nos termos do artigo 7º da Res. 551/2011 - Ação Rescisória - Santos - Autor: Transbrasa Transitária Brasileira Ltda - Réu: Megara Empreendimentos e Participações Ltda - Registro: Número de registro do acórdão digital Não informado VOTO Nº 40.185 Trata-se de ação rescisória objetivando desconstituir sentença proferida pelo Juízo da 7ª Vara Cível da Comarca de Santos que julgou, conjuntamente, improcedentes a ação declaratória (autos nº 0033423-31.2011.8.26.0562) e a ação cautelar (autos nº 0027687-32.2011.8.26.0562), ajuizadas pela TRANSBRASA TRANSITÁRIA BRASILEIRA LTDA contra LIBRA TERMINAIS S/A e LIBRA TERMINAL 35 S/A; e procedente a ação de cobrança (autos nº 0018336- 98.2012.8.26.0562), ajuizada por LIBRA TERMINAIS S/A e LIBRA TERMINAL 35 S/A contra TRANSBRASA TRANSITÁRIA BRASILEIRA LTDA; demandas conexas em que se discutiu a legalidade da cobrança da tarifa denominada THC2 (Terminal Handling Charge 2) ou SSE (Serviço de Segregação e Entrega de Contêineres) (fls. 614/624 dos autos nº 0033423-31.2011.8.26.0562).
A autora ampara a sua pretensão nos incisos V e VII, do art. 966 do Código de Processo Civil.
Discorre sobre o funcionamento das operações portuárias e sustenta que não existe relação jurídica entre os recintos alfandegários e os operadores portuários a justificar a cobrança da tarifa THC2/SSE.
Alega que a cobrança representa manifesta violação aos artigos 26 e 40, §1º, I, da Lei no 12.815/13 e aos artigos 629, 750 e 754 do Código Civil.
Aduz que os serviços de capatazia já são remunerados pela tarifa THC original.
Assevera que A separação do SSE das demais movimentações englobadas pela Capatazia significaria uma distorção das responsabilidades no contrato de transporte (fl. 12).
Afirma que a cobrança da THC2/SSE também distorce a responsabilidade da ré como depositária da carga.
Expõe que o C.
STJ reconheceu que a cobrança dessa tarifa pelos operadores portuários constitui conduta abusiva e anticompetitiva.
Pontua que a 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região declarou, em maio/2024, a ilegalidade da cobrança da tarifa.
Afirma que o CADE há muito entende pela abusividade da tarifa e que, não obstante alguns operadores portuários tenham conseguido afastar judicialmente a proibição da cobrança determinada pela autarquia, a decisão mais recente do Poder Judiciário sobre essa questão tema, exarada pelo TRF da 1ª Região, é no sentido de manter a vedação imposta pelo CADE.
Sustenta que a decisão rescidenda não poderia ter fundamentado a validade da cobrança sobre a mera regulamentação da tarifa pela ANTAQ, uma vez que tal fato não obsta a análise de sua validade sob o prisma concorrencial.
Defende que não há hierarquia entre a autarquia de defesa da concorrência e a agência reguladora.
Expõe, ainda, que o Tribunal de Contas da União, em 2024, manteve decisão exarada pelo próprio órgão de controle que, em 2022, anulou dispositivos da resolução da ANTAQ que permitiam a cobrança da tarifa (fls. 1/41). É o relatório.
Depreende-se dos autos que a autora busca desconstituir sentença que julgou conjuntamente 3 (três) ações conexas, a saber: i) a ação declaratória de autos nº 0033423-31.2011.8.26.0562), na qual a autora pleiteou a declaração de inexistência de relação jurídica a justificar a cobrança da tarifa THC2/SSE pelos operadores portuários requeridos; ii) a ação cautelar de autos nº 0027687-32.2011.8.26.0562, na qual a autora visou impedir que os operadores portuários requeridos retivessem ou dificultassem a entrega de contêineres sobre o pretexto do não pagamento da tarifa; iii) a ação de cobrança de autos nº 0018336- 98.2012.8.26.0562, ajuizada pelos operadores portuários, ora requeridos, para a cobrança da TCH2/SSE da autora, pelos serviços prestados no porto de Santo/SP.
A questão de fundo foi a legalidade da cobrança da tarifa denominada THC2 (Terminal Handling Charge 2) ou SSE (Serviço de Segregação e Entrega de Contêineres), devida, em tese, pelos serviços de segregação, separação e entrega de contêineres prestados pelos operadores portuários (parte requerida) ao recinto alfandegário (parte autora).
O D.
Juízo de primeiro grau considerou legítima a cobrança, nos seguintes termos (fls. 614/624 dos autos nº 0033423-31.2011.8.26.0562): "Trata-se de ação ordinária na qual a autora Transbrasa visa obter a declaração de inexigibilidade da cobrança denominada "THC2" ou qualquer outra denominação que venha se utilizar para a adequação de carga dentro do terminal ante a ausência de relação jurídica entre as partes, com condenação da ré em obrigação de não fazer consistente na abstenção de condutas tendentes a constranger a tal pagamento, com confirmação da liminar concedida na cautelar.
Em apenso, há ação de cobrança proposta pela Libra Terminais S/A e Libra Terminal 35 S/A contra Transbrasa visando a condenação da ré ao pagamento pelos serviços de segregação e entrega prestados, consubstanciados nas faturas apresentadas, com juros e correção a partir da data dos vencimentos dos títulos, bem como condenação da ré no pagamento pelos serviços de segregação e entrega que vierem a ser prestados e não pagos, em valor a ser apurados em liquidação por artigos, com juros e correção.
Deve-se ressaltar que atividade de capatazia era regida pela Lei Federal 8.630/93, que está disciplinada pela Lei Federal 12.815/2013, a qual, em seu art. 40, § 1°, inc.
I, define: "atividade de movimentação de mercadorias nas instalações dentro do porto, compreendendo o recebimento, conferência, transporte interno, abertura de volumes para a conferência aduaneira, manipulação, arrumação e entrega, bem como o carregamento e descarga de embarcações, quando efetuados por aparelhamento portuário".
Com a privatização do Porto de Santos, essa prestação de serviços, realizada na zona primária ("porto molhado"), passou a ser executada pelos operadores portuários.
E sobre ela incide a denominada THC (Terminal Handling Charge), tarifa que substituiu a antiga taxa de capatazia - outrora cobrada pela CODESP e que é cobrada do armador, ou seja, o dono do navio ou aquele que compra espaços no navio.
Além da operação de "porto molhado", os operadores portuários passaram a atuar, também, nos serviços de segregação e entrega de contêineres aos chamados Recintos Alfandegadários, também, chamados de "portos secos.
O questionamento da presente ação versa sobre a cobrança do THC2 efetuada pelas rés - Operadores Portuários ("porto molhado") à autora - Terminal Retroportuário Alfandegado (TRA - "Porto Seco").
Tal cobrança, conforme justificada das rés, é efetuada pela separação e entrega das mercadorias provenientes dos Armadores que atracam no Porto de Santos/SP.
Assim, em tendo o importador escolhido contratar o serviço de armazenagem com algum Terminal Retroportuário Alfandegado TRA, cabe ao Operador Portuário enviar a mercadoria mediante o pagamento de uma nova tarifa, a THC2.
Há muita discussão sobre a legalidade de tal cobrança, tanto é, que já houve reconhecimento, pelo CADE, de ofensa à legislação antitruste.
Concluiu o órgão de defesa econômica que o serviço de segregação, separação ou entrega de cargas está abarcado por aquela outra tarifa (THC), não havendo justificativa para cobrança da nova tarifa.
Tal decisão constou do Parecer n°326/2004 dado no Processo Administrativo n° 08012.007443/99-17 .
Porém, tal decisão foi questionado pelas rés perante à 3' Vara Federal do Distrito Federal que teve o julgamento de procedência, em ambas as Instâncias, para determinar a anulação da decisão do CADE, nos autos do processo administrativo acima citado e, em consequência, declarar o direito da Libra de de cobrar pelo serviço de segregação e entrega de contêineres aos Trás - Terminais Retroalfandegados do Porto de Santos, na forma regulada pelas autoridades administrativas (ANTAQ/CODESP).
Os autos ficaram no aguardo de tal decisão da Justiça Federal e ante ao julgamento de tal questão perante o E.
TRF viável o prosseguimento do feito ante a manifestação das partes em tal sentido.
A propósito, o referido julgamento teve a seguinte Ementa: (...) Sobre o serviço de segregação e entrega de contêineres, deve-se ressaltar que na fundamentação do voto o I.
Desembargador afirmou o seguinte: "Em primeiro lugar, verifico que apenas os operadores portuários podem realizar tal serviço: após a retirada dos contêineres do navio mercante (o que só pode ser feito por quem detém píer de atracação) eles só põem ser colocados na pilha comum no terminal necessitando haver uma futura segregação para entrega aos importadores ou aos seus prepostos ( Trás Terminais Retroportuários Alfandegados ou EADIs Estações Aduaneiras do interior).
No que diz respeito ao serviço de segregação e entrega de contêineres, portanto, não existe concorrência entre operadores portuárias e terminais alfandegados." A autora sustenta que não há relação jurídica entre as partes e nem prestação de serviço para justificar a cobrança do serviço de segregação e entrega de contéineres.
Porém, tal alegação não pode ser aceita pois tal serviço é realizado conforme acima indicado e pode ser cobrado tanto dos recintos alfandegados quanto do próprio importador, ficando na dependência de quem o importador irá contratar para a prestação do serviço já que a ré também presta serviço de armazenagem e desembaraço e cobra pelo mesmo.
E, o fato de não haver contrato escrito entre as partes não impede a cobrança pelas rés vez que a prestação desse serviço dispensa tal forma de contratação.
Além do que, tal cobrança não pode ser considerada como ilegal pois a ANTAQ (Agência Nacional de Transportes Aquaviários), autarquia especial responsável por regular, supervisionar e fiscalizar as atividades de prestação de serviços de transporte aquaviário e de exploração da infraestrutura portuária e aquaviária, proferiu decisão, Resolução ANTAQ 2.389/2012, considerando lícita a tarifa THC2, estabelecendo limites à sua cobrança.
O artigo 90 da citada Resolução dispõe o seguinte:" Os serviços de recebimento ou de entrega de cargas para qualquer outro modal de transporte, tanto dentro quanto fora dos limites do terminal portuário, não pode fazer parte dos serviços remunerados pela BOX RATE, nem daquelas cujas despesas são ressarcidas por meio do THC, salvo previsão contratual em sentido diverso. § único Autoridade Portuária, quando for o caso, estabelecerá o preço máximo a ser cobrado por esses serviços".
Assim, pode-ser concluir que cabe à Codesp regulamentar e arbitrar os preços dos serviços portuários, além de coibir práticas lesivas, ficando totalmente afastada a tese de concorrência desleal levantada pela autora, conforme julgado acima citado vez que se tal fato efetivamente existisse a Codesp já teria adotado medidas visando coibir tais abusos.
Não se desconhece que o tema objeto das ações é controvertido e que há julgamentos dando respaldo tanto à tese da autora como das rés.
Porém, considerando o julgamento da ação que tramitava perante à 3a Vara da Justiça Federal do Distrito Federal que reconheceu o direito das rés na cobrança pelo serviço de segregação e entrega de contêineres aos Trás na forma regulada pelas autoridades administrativas (ANTAQ/CODESP), bem como recentes julgados do E.
Tribunal sobre o tema, não há mais justificativa para a manutenção da liminar concedida vez que a cobrança do TCH2 não pode ser considerada como abusiva.
Deve-se ressaltar, ainda, que tal cobrança já existia antes da privatização do porto Organizado de Santos, quando a CODESP atuava diretamente na movimentação e entrega de contêineres aos recintos alfandegados.
Assim, tal prática não pode ser considerada como criação das rés, tanto é, que existe regulamentação dos órgãos competentes para a cobrança dos valores referentes a tal prestação de serviço.
Em suma, a cobrança efetuada pelas rés é legítima porque tem base em serviço efetivamente prestado que por tal motivo deve ser remunerado e não há ilegalidade em tal cobrança vez que baseada no ordenamento jurídico em vigor.
Deste modo, é de rigor a improcedência da ação proposta por Transbrasa contra as rés, ficando revogada a liminar concedida.
Em face da improcedência da ação, é de rigor a procedência da ação de cobrança interposta pelas rés LiBra contra a autora com declaração de existência de prestação de serviço de segregação e entrega (SEE -THC2) e condenação da ré - Transbrasa ao pagamento pelos serviços de segregação e .entrega prestados nas faturas apresentadas com a iniciais.
Ressalto que as faturas acostados a ação de cobrança não sofreram impugnação pela ré e, por tal motivo, ficam aceitas, bem como a incidência da correção monetária e dos juros desde os respectivos vencimentos.
E, também, é viável a condenação nos demais serviços que vierem a ser prestados e não pagos, no curso da demanda, em valor a ser apurado em liquidação de sentença por artigos.
No curso do processo foi determinada a prestação de caução e os valores depositados deverão ser utilizados para abatimento do valor devido a partir da data dos depósitos realizados e por tal motivo não poderão ser levados pelas partes até o trânsito em julgado desta sentença." (grifo nosso) Em face dessa r. sentença, a autora interpôs recurso de apelação, ao qual a 11ª Câmara de Direito Privado deu provimento (fls. 66/74).
Ocorre que os operadores portuários interpuseram Recurso Especial, que não foi admitido por este E.
TJSP, razão pela qual foi interposto o Agravo em Recurso Especial nº 1.777.034/SP, provido pelo C.
STJ para julgar deserto o recurso de apelação interposto pela autora (fls. 74/76).
Dessa forma, uma vez que o acórdão que julgou a apelação da autora, proferido por esta 11ª Câmara de Direito Privado, deixou de surtir efeitos, ante a deserção reconhecida pelo C.
STJ, tem-se que a decisão de mérito definitiva dos autos é a sentença prolatada pelo N.
Magistrado de primeiro grau, sendo esta decisão que a autora busca rescindir.
Pois bem.
Traçado o histórico processual, contata-se que, não obstante o esforço argumentativo da autora, a hipótese é de indeferimento da petição inicial.
Inicialmente, é importante ressaltar o caráter excepcionalismo da ação rescisória, justificado pela necessidade de se conferir estabilidade às relações jurídicas, garantia de natureza fundamental e assegurada pelo art. 5º, inciso XXXVI, da CF/1988.
No caso, observa-se que a autora fundamenta sua pretensão no art. 966, caput e inciso V, do Código de Processo Civil, segundo os quais A decisão de mérito, transitada em julgado, pode ser rescindida quando violar manifestamente norma jurídica.
Contudo, segundo consagrado entendimento doutrinário e jurisprudencial, para fins de cabimento de ação rescisória pelo dispositivo citado, a decisão rescidenda deve violar frontal e diretamente a norma apontada, não se admitindo a desconstituição de decisão de mérito transitada em julgado se a interpretação jurídica adotada, conquanto não seja a melhor, for razoável.
Deveras, ao lecionar sobre o dispositivo em comento, a mais abalizada doutrina atesta o caráter excepcional até aqui sustentado ao afirmar que: "De um lado, a nova qualificação que a Lei fez da violação à lei não mais literal, mas 'manifesta' não se afigurou feliz, respeitadas opiniões em contrário.
Se o que pretendeu foi restringir o cabimento da rescisória nessa hipótese, a mudança era desnecessária: o texto em vigor já é suficiente para manter o caráter excepcional da medida, que sabidamente não se presta a apenas corrigir injustiças, menos ainda à reavaliação do quadro probatório (...).
Maior ampliação seria um equívoco: o emprego da rescisória não pode e não deve ser banalizado e, tanto mais na hipótese aqui examinada, não convém alargar a medida excepcional, de sorte a colocá-la como uma espécie de novo recurso." (YARSHELL, Flávio Luiz.
Breves Notas sobre a Disciplina da Ação Rescisória no CPC 2015.
In: O Novo Código de Processo Civil: questões controvertidas (vários autores).
São Paulo: Atlas, 2015, p. 164/165, grifo nosso) No mesmo sentido, em nota 20 ao artigo 966 do Código de Processo Civil, Theotônio Negrão cita julgados segundo os quais: "A afronta deve ser direta contra a literalidade da norma jurídica e não deduzível a partir de interpretações possíveis, restritivas ou extensivas, ou mesmo integração analógica" (STJ-2ª Seção, AR 720-EI, Min.
Nancy Andrighi, j. 9.10.02, DJU 17.2.03).
No mesmo sentido: RJTJERGS 286/211 (AR *00.***.*10-77). "Para que a ação rescisória fundada no art. 485, V, do CPC prospere, é necessário que a interpretação dada pelo 'decisum' rescindendo seja de tal modo aberrante que viole o dispositivo legal em sua literalidade.
Se, ao contrário, o acórdão rescindendo elege uma dentre as interpretações cabíveis, ainda que não seja a melhor, a ação rescisória não merecer vingar, sob pena de tornar-se recurso ordinário com prazo de interposição de dois anos. (RSTJ 93/416).
No mesmo sentido: RSTJ 40/17, STJ-RT 733/154, RT 634/93" (Theotonio Negrão, Código de Processo Civil e legislação processual em vigor, 47ª ed., Saraiva, p. 864, grifo nosso).
Ainda sobre a via estreita da ação rescisória, confira-se o seguinte julgado do C.
Superior Tribunal de Justiça: "AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL.
ADMISSIBILIDADE.
RECONSIDERAÇÃO.
AÇÃO RESCISÓRIA.
VIOLAÇÃO MANIFESTA DE NORMA JURÍDICA.
ART. 966, V, DO CPC.
REEXAME DA JUSTIÇA DE DECISÃO.
NÃO CABIMENTO.
SÚMULA N. 83 DO STJ.
DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL NÃO CONHECIDO.
AGRAVO INTERNO DESPROVIDO. 1.
A violação de literal disposição da lei que autoriza o manejo de ação rescisória, a teor do disposto no art. 966, V, do CPC, deve ser manifestamente teratológica, aberrante, detectável primo icto oculi, ou seja, pressupõe a demonstração clara e inequívoca de que a decisão rescindenda conferiu interpretação flagrantemente contrária ao conteúdo da norma jurídica impugnada. 2.
A ação rescisória não é meio adequado para se rediscutir suposta justiça ou injustiça da decisão, má interpretação de fatos ou reexame de provas produzidas, ou mesmo para complementá-la. 3.
A admissibilidade do recurso especial fundado na alínea c do permissivo constitucional depende do preenchimento dos requisitos essenciais para comprovação do dissídio pretoriano, conforme prescrições dos arts. 1.029, § 1º, do CPC e 255, § 1º, do RISTJ. 4.
A transcrição de trechos do acórdão paradigma para fins de cotejo analítico não supre a ausência de juntada do inteiro teor do julgado. 5.
Os acórdãos confrontados não são aptos para demonstrar o dissídio jurisprudencial quando não há semelhança entre suas bases fáticas. 6.
Agravo interno desprovido." (AgInt no AREsp n. 2.615.451/SP, relator Ministro João Otávio de Noronha, Quarta Turma, julgado em 11/11/2024, DJe de 13/11/2024, grifo nosso) Na hipótese, não há como se constatar, sob qualquer ângulo de análise, que a decisão rescidenda conferiu interpretação manifestamente teratológica às normas jurídicas supostamente violadas.
Ao revés, percebe-se que a sentença abordou minuciosamente a questão, explicitando de forma didática o contexto das operações portuárias, no qual se insere a cobrança impugnada, e respaldando suas conclusões na regulamentação então vigente das autoridades reguladoras competentes e em decisão da Justiça Federal que anulou decisão do CADE e permitiu que as rés continuassem cobrando a tarifa TCH2/SSE.
A propósito, esse último ponto citado merece destaque, pois constitui o mais relevante fundamento a justificar o não cabimento de ação rescisória pelo art. 966, inciso V do CPC. É manifesta a controvérsia jurisprudencial a respeito da legalidade da tarifa TCH2/SSE, como a própria sentença reconhece ao consignar que o tema objeto das ações é controvertido e que há julgamentos dando respaldo tanto à tese da autora como das rés (fl. 63). É o que também pode se extrair do próprio teor da petição inicial desta ação rescisória.
Não bastassem as decisões da Justiça Federal em ambos os sentidos, ora mantendo as restrições impostas pelo CADE, ora anulando-as, verifica-se que a questão foi controversa no âmbito deste próprio Tribunal de Justiça.
Confira-se os seguintes julgados, que militam contra a pretensão da autora: "AÇAO CIVIL PUBLICA - TARIFA DE SEGREGAÇÃO E ENTREGA DE CONTEINERES - THC2 - NÃO CONFIGURAÇÃO DE OFENSA À LIVRE CONCORRÊNCIA, À ORDEM ECONÓMICA E AOS CONSUMIDORES - R.
SENTENÇA MANTIDA - Adstrito exclusivamente aos elementos constantes dos autos, infere-se que a cobrança da tarifa de segregação e entrega de contêineres, conhecida como THC2, não configura ofensa à livre concorrência, à ordem económica e aos consumidores - Cobrança que remete a período anterior à privatização do Porto Organizado de Santos, em que a CODESP atuava diretamente na movimentação e entrega de contêineres aos recintos alfandegados, não se tratando, assim, de criação dos Operadores Portuários privados - Autoridade Portuária incumbida de coibir práticas lesivas à livre concorrência concebe a cobrança da THC2 como legítima, inclusive regulando e fiscalizando os preços cobrados dos recintos alfandegados - Não configuração de ofensa aos preceitos dispostos na Lei 8.884/94, nem lesão a interesses difusos - R. sentença mantida - Recurso não provido." (TJSP; Apelação Cível 9139157-20.2009.8.26.0000; Relator (a):Roberto Mac Cracken; Órgão Julgador: 37ª Câmara de Direito Privado; Foro de Santos -4ª.
Vara Cível; Data do Julgamento: 09/02/2012; Data de Registro: 28/02/2012) "TRANSPORTE MARÍTIMO.
SERVIÇOS DE SEGREGAÇÃO E ENTREGA DE CONTÊINERES.
TARIFA THC2.
Ação declaratória de inexistência de relação jurídica cumulada com a de inexigibilidade de dívida.
Reconvenção.
Procedência da ação principal e improcedência do pedido reconvencional.
Apelação de parte a parte.
Pretensão da ré reportada à legitimidade da tarifa cobrada.
Pretensão da autora voltada à majoração da verba honorária.
Serviços de segregação e entrega de contêineres.
Cobrança de tarifa denominada THC2.
Tarifa que não se confunde com aquela denominada THC.
Legitimidade reconhecida pelas autoridades regulatória e administrativa (ANTAQ/CODESP).
Decisão do Conselho Administrativo de Defesa Econômica CADE, que determinou a cessão da cobrança, declarada nula pela Justiça Federal.
Legalidade da tarifa reconhecida pela Justiça Federal e por esta Egrégia Corte.
Precedentes.
Sentença reformada.
Ação principal improcedente e procedente o pedido reconvencional.
Recurso da ré provido e não provido o adesivo da autora." (TJSP; Apelação Cível 1001108-25.2014.8.26.0562; Relator (a):Sebastião Flávio; Órgão Julgador: 23ª Câmara de Direito Privado; Foro de Santos -7ª Vara Cível; Data do Julgamento: 05/10/2016; Data de Registro: 11/10/2016) "AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXIGIBILIDADE DE DÉBITO Cobrança de THC2; tarifa de serviços de segregação, empilhamento e entrega de contêineres no porto seco Inocorrência de cobrança em duplicidade, abusiva ou violadora do direito da concorrência Tarifa gerada em razão de serviço adicional visando à celeridade no desembaraço aduaneiro Precedentes Recurso improvido." (TJSP; Apelação Cível 1011405-91.2014.8.26.0562; Relator (a):J.
B.
Franco de Godoi; Órgão Julgador: 23ª Câmara de Direito Privado; Foro de Santos -5ª Vara Cível; Data do Julgamento: 26/04/2017; Data de Registro: 03/05/2017) "Apelação.
Transporte Marítimo.
Sentença de improcedência.
Autora que alega cobrança abusiva de taxas de armazenagem e serviços.
Ré que comprova os serviços prestados e preço compatível com os valores praticados pelas empresas concorrentes.
Cobrança de THC2.
Valor que é exigido não apenas em razão da liberação de mercadorias do costado do navio à pilha comum do terminal portuário, mas também pela contrapartida de uma efetiva movimentação e transporte de contêineres a partir do ponto onde são armazenados.
Inocorrência de cobrança em duplicidade, abusiva ou violadora do direito da concorrência.
Retenção das mercadorias, Legalidade (artigo 644, do CC).
Sentença mantida.
Recurso desprovido." (TJSP; Apelação Cível 1016680-16.2017.8.26.0562; Relator (a):Elói Estevão Troly; Órgão Julgador: 15ª Câmara de Direito Privado; Foro de Santos -6ª Vara Cível; Data do Julgamento: 18/03/2019; Data de Registro: 18/03/2019) "AÇÃO DECLARATÓRIA TRANSPORTE MARÍTIMO DE CARGA SERVIÇO DE SEGREGAÇÃO E ENTREGA DE CONTAINERS COBRANÇA DE THC2 Cobrança da tarifa THC2 que não se confunde com aquela denominada THC Tarifa THC2 que tem fundamento em serviço existente, que implica custo não remunerado pela THC Tarifa gerada em razão de serviço adicional, visando a celeridade no desembaraço aduaneiro Inexistência de cobrança em duplicidade Cobrança legítima Ação improcedente Sentença mantida pelos próprios fundamentos Art. 252 do Regimento Interno do TJSP Sentença proferida e publicada quando já em vigor o NCPC Honorários advocatícios majorados, com base no art. 85, §11, do NCPC, para R$10.500,00 Apelo improvido." (TJSP; Apelação Cível 1006641-57.2017.8.26.0562; Relator (a):Salles Vieira; Órgão Julgador: 24ª Câmara de Direito Privado; Foro de Santos -5ª Vara Cível; Data do Julgamento: 08/08/2019; Data de Registro: 16/08/2019) Ora, não se pode considerar como violação manifesta à norma jurídica interpretação a respeito da qual haja real e fundada divergência nos tribunais.
Realmente, conforme já decidiu esta 11ª Câmara de Direito Privado, deve-se nortear o exame das ações rescisórias, à luz de uma interpretação restritiva, sob pena de banalização de um instrumento cuja utilização deve ser excepcional.
Quanto ao inciso V em particular, que prevê a possibilidade de rescisão de decisão que 'violar manifestamente norma jurídica', um dos critérios de análise de enquadramento dos casos concretos é a existência de posicionamento jurisprudencial pacífico acerca das alegações do autor da ação rescisória. (TJSP; Ação Rescisória 2182067-98.2020.8.26.0000; Relator (a):Marco Fábio Morsello; Órgão Julgador: 11ª Câmara de Direito Privado; Foro Central Cível -41ª Vara Cível; Data do Julgamento: 02/09/2020; Data de Registro: 02/09/2020, grifo nosso) Conforme exposto, a questão não estava minimamente pacificada nos tribunais quando a sentença foi proferida.
E, não obstante os julgados citados pela autora em sua inicial pareçam demonstrar uma recente convergência jurisprudencial pela ilegalidade da cobrança, é evidente que esse não era o cenário quando foi prolatada a decisão rescidenda.
Repise-se que não é qualquer violação da lei que admite o ingresso da ação rescisória, entendendo a melhor doutrina e a jurisprudência que a literal violação exige que no momento de aplicação da norma por meio da decisão judicial não exista interpretação controvertida nos tribunais. (NEVES, Daniel Amorim Assumpção.
Manual de Direito Processual Civil, 15 ed, 2023, p. 1033, grifo nosso) Nesse sentido é a Súmula 343 do C.
STF: Não cabe ação rescisória por ofensa a literal disposição de lei, quando a decisão rescindenda se tiver baseado em texto legal de interpretação controvertida nos tribunais.
Em suma, pelo quanto exposto até aqui, não há violação manifesta a norma jurídica nos termos do art. 966, inciso V, do CPC, a justificar o cabimento de ação rescisória, respeitado o esforço argumentativo da autora.
Por fim, percebe-se que a autora também suscita o art. 966, inciso VII, do CPC, que prevê o cabimento de ação rescisória quando obtiver o autor, posteriormente ao trânsito em julgado, prova nova cuja existência ignorava ou de que não pôde fazer uso, capaz, por si só, de lhe assegurar pronunciamento favorável.
No caso, a autora ampara a sua pretensão em acórdão do Tribunal de Contas da União (Acórdão nº 1448/2022) que anulou disposições da resolução da ANTAQ que permitiam a cobrança da tarifa THC2/SSE.
Registre-se que o Poder Judiciário não está vinculado à coisa julgada administrativa firmada no âmbito dos órgãos de controle externo, razão pela qual não há como se constatar que o aludido acórdão, por si só, seria capaz de alterar o resultado do julgado.
Contudo, ainda que a decisão do TCU tivesse esse condão, observa-se que ela foi proferida cerca de 8 anos após a publicação da decisão rescidenda.
E, da leitura do dispositivo do Codex processual citado, extrai-se que, para se admitir a rescisória com base no inciso VII, é preciso que a prova já existisse ao tempo em que foi proferida a decisão de mérito que se busca rescindir.
Esse entendimento é assente na jurisprudência do C.
STJ, segundo a qual "o documento novo que propicia o manejo da açãorescisória,fundada no art. 485,VII,do CPC/73 [art. 966,VII,do CPC/2015], é aquele que, já existente à época da decisão rescindenda, era ignorado pelo autor ou do qual não pôde fazer uso, capaz de assegurar, por si só, a procedência do pronunciamento jurisdicional" (AgRg no REsp 1.407.540/SE, Rel.
Min.
Mauro Campbell Marques, DJe de 19/12/2014, grifo nosso).
Em suma, sob qualquer ângulo de análise, reputo que não está configurada qualquer hipótese de cabimento da ação rescisória, mais uma vez respeitada a argumentação da parte autora.
Tem-se que a requerente, na verdade, usa a presente ação como sucedâneo de recurso, buscando nova apreciação da matéria, o que não pode configurar causa de rescindibilidade do pronunciamento jurisdicional, restando evidente a falta de interesse processual da autora.
Ante o exposto, indefiro a petição inicial e julgo extinto o processo, nos termos do art. 968, § 3º c/c arts. 330, III e 485, I e VI, do Código de Processo Civil.
São Paulo, 6 de junho de 2025.
RENATO RANGEL DESINANO Relator - Magistrado(a) Renato Rangel Desinano - Advs: Bruno Corrêa Burini (OAB: 183644/SP) - Maria Silvia Resende Barroso (OAB: 128896/RJ) - Carolina Moreira Miranda (OAB: 199673/RJ) - 3º andar -
06/06/2025 21:35
Decisão Monocrática registrada
-
06/06/2025 18:44
Remetidos os Autos (;7:Processamento de Grupos e Câmaras) para destino
-
06/06/2025 18:40
Decisão Monocrática - Extinção - Indeferimento da Petição Inicial
-
06/06/2025 14:45
Conclusos para decisão
-
21/05/2025 00:00
Publicado em
-
20/05/2025 17:44
Prazo
-
20/05/2025 17:37
Expedição de Certidão.
-
19/05/2025 11:27
Juntada de Petição de Petição (outras)
-
19/05/2025 11:27
Expedição de Outros documentos.
-
16/05/2025 17:27
Remetidos os Autos (;7:Processamento de Grupos e Câmaras) para destino
-
16/05/2025 17:26
Despacho
-
25/04/2025 00:00
Publicado em
-
24/04/2025 18:51
Juntada de Petição de Petição (outras)
-
24/04/2025 18:50
Expedição de Outros documentos.
-
24/04/2025 00:00
Publicado em
-
23/04/2025 00:00
Conclusos para decisão
-
22/04/2025 16:49
Conclusos para decisão
-
22/04/2025 16:38
Distribuído por competência exclusiva
-
22/04/2025 15:51
Documento Finalizado
-
16/04/2025 17:47
Remetidos os Autos (;7:Distribuição de Originários) para destino
-
16/04/2025 15:38
Processo Cadastrado
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
22/04/2025
Ultima Atualização
08/07/2025
Valor da Causa
R$ 0,00
Documentos
Decisão Monocrática Terminativa • Arquivo
Despacho • Arquivo
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