TJSP - 1009901-84.2024.8.26.0114
1ª instância - 06 Civel de Campinas
Polo Ativo
Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
-
25/04/2025 00:00
Intimação
ADV: Lays Fernanda Ansanelli da Silva (OAB 337292/SP), Marcelo Miranda (OAB 53282/SC) Processo 1009901-84.2024.8.26.0114 - Procedimento Comum Cível - Reqte: Benedito Donizeti Alves - Reqdo: Ambec-associação dos Aposentados Mutualistas -
Vistos.
Trata-se de ação declaratória de inexistência de relação jurídica com pedido de indenização por danos materiais e morais e tutela antecipada ajuizada por BENEDITO DONIZETI ALVES em face de ASSOCIAÇÃO DE APOSENTADOS MUTUALISTAS PARA BENEFICIOS COLETIVOS (AMBEC).
Em síntese, o autor alega que é aposentado e recebe o benefício previdenciário mensal do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS.
Sustenta que notou descontos de seu benefício sob o título CONTRIBUIÇÃO AMBEC, no valor mensal de R$ 45,00 por mês, que começaram a partir de setembro de 2023.
Afirma que não assinou nenhum contrato com o réu, tampouco afiliou-se à instituição.
Requereu a concessão de justiça gratuita e tutela antecipada de urgência a fim de interromper os descontos realizados em seu benefício.
Pleiteou a aplicação do Código de Defesa do Consumidor (CDC) e a inversão do ônus da prova.
Defendeu a indenização por dano moral no valor de R$ 20.000,00 e o dever de indenizar pelos danos materiais consistentes nos descontos indevidos na forma dobrada no valor de R$ 450,00 (até a data da propositura da ação).
O despacho inicial concedeu os benefícios da gratuidade processual à autora, bem como indeferiu a tutela de urgência para suspender os descontos (fls. 25/26).
A ré AMBEC contestou a ação, preliminarmente alegou a indevida concessão de gratuidade de justiça (fls. 53).
Pleiteou o benefício da justiça gratuita.
No mérito, alegou que houve filiação voluntária da autora por meio de gravação telefônica.
Afirmou que os descontos foram insignificantes para configurar dano moral.
Ademais, descreveu os benefícios a que a parte autora faz jus por ser associado.
Alegou ausência de ato ilícito.
Ao final, requereu a total improcedência da ação.
Em réplica, a autora, em resumo, defendeu a invalidade da contratação via ligação telefônica e ratificou os pleitos iniciais. É O RELATÓRIO.
FUNDAMENTO E DECIDO.
O processo permite julgamento no estado em que se encontra, porquanto inobstante tratar-se de matéria de fato e de direito, não reclama produção de prova em audiência, conforme autoriza o artigo 355, inciso I, do Código de Processo Civil.
Observo, ainda, que as partes tiveram oportunidade de se manifestar amplamente sobre as provas documentais produzidas nos autos.
Em relação a preliminar de indevida concessão do benefício de gratuidade de justiça, os documentos de fls. 20/23 comprovam que o autor é aposentado da previdência social e recebe rendimento inferior a três salários-mínimos.
Além disso, a associação ré não demonstrou alteração na situação financeira do autor.
Por isso, rejeito a preliminar alegada.
Ademais, a ré busca a concessão da justiça gratuita.
Entretanto, embora seu estatuto social revele que sua atuação é voltada para aposentados de forma geral, verifica-se que, na prática, sua atuação não é exclusivamente na proteção de direitos de pessoas idosas (fls. 55/91).
Além disso, não há nos autos qualquer prova da incapacidade financeira da associação ré a comprovar a impossibilidade de arcar com as despesas e custas processuais.
Assim, com fulcro na Súmula 481 do STJ, indefiro a gratuidade de justiça requerida pela ré.
No mérito, a ação é parcialmente procedente.
A discussão restringe-se em apurar se é válida a relação jurídica que ensejou descontos na aposentadoria da autora, sob o título "CONTRIBUIÇÃO AMBEC.
A relação jurídica estabelecida entre as partes é típica relação de consumo, regida pelo Código de Defesa do Consumidor, uma vez que a ré se enquadra no conceito de prestador de serviço, nos termos do artigo 3º de referido diploma legal.
De acordo com os documentos apresentados na inicial, nota-se que, em setembro de 2023, iniciou-se o desconto da contribuição direto do benefício previdenciário do autor, no valor de R$ 45,00 (fls. 20/23), que o autor nega ter autorizado.
No entanto, a ré apresentou link da gravação de ligação telefônica (fls. 42), na qual é possível ouvir claramente o diálogo entre a representante da associação ré e o autor.
Da análise das provas apresentadas, constata-se que a associação fundamenta a regularidade da adesão discutida na demanda na gravação telefônica que, supostamente, evidenciaria a anuência da autora com os descontos e sua filiação à associação.
A despeito das alegações da ré, as provas apresentadas de fato são insuficientes para comprovar a filiação voluntária da autora à associação, o que torna indevidos os descontos em seu benefício previdenciário.
A Lei nº 8.213/1991 estabelece as normas para os benefícios da Previdência Social, incluindo as regras para descontos diretamente dos benefícios previdenciários.
O artigo 115, inciso V, permite descontar mensalidades de associações de aposentados legalmente reconhecidas, mas somente com a autorização prévia e expressa do beneficiário, protegendo a escolha dos segurados.
Nesse contexto, há regulamentação específica para descontos referentes ao pagamento de mensalidades associativas incidentes sobre benefício previdenciário, conforme previsto no artigo 655 da Instrução Normativa do INSS nº 128/2022, cujos requisitos devem ser observados para validade da autorização: Art. 655.
Os descontos dos valores referentes ao pagamento de mensalidades associativas nos benefícios de aposentadoria e pensão por morte previdenciários serão autorizados, desde que: I - sejam realizados com associações, confederações ou entidades de aposentados e/ou pensionistas que tenham celebrado Acordo de Cooperação Técnica com o INSS para esse fim; II - o benefício previdenciário esteja desbloqueado para inclusão do desconto de mensalidade associativa; e III - seja apresentada, pelas associações, confederações e entidades de aposentados e/ou pensionistas acordantes, a seguinte documentação: a) termo de filiação à associação ou entidade de aposentado e/ou pensionista devidamente assinado pelo beneficiário; b) termo de autorização de desconto de mensalidade associativa em benefício previdenciário devidamente assinado pelo beneficiário, constando o número do CPF; e c) documento de identificação civil oficial e válido com foto. § 1º Os documentos de que tratam as alíneas: I - "a" e "b" do inciso III do caput poderão ser formalizados em meio eletrônico, desde que contemplem requisitos de segurança que permitam garantir sua integridade e não repúdio, podendo ser auditado pelo INSS, a qualquer tempo; e II - "a" a "c" do inciso III do caput, quando formalizados em meio físico, devem ser digitalizados e disponibilizados ao INSS. § 2º O desconto de mensalidade associativa em benefício previdenciário constitui uma faculdade do beneficiário, não eximindo a associação, confederação ou entidade de aposentados e/ou pensionistas de disponibilizar outros meios para o pagamento da mensalidade associativa. § 3º Somente mediante decisão judicial será permitida autorização de desconto firmada por representante legal do beneficiário (procurador, tutor ou curador).
No caso em análise, a associação ré não atendeu aos requisitos formais previstos na regulamentação vigente, ao deixar de apresentar termo de filiação devidamente assinado, bem como autorização expressa para descontos no benefício previdenciário.
A simples gravação telefônica, sem respaldo documental, não se revela instrumento idôneo para comprovar a existência de vínculo jurídico válido ou consentimento informado por parte do autor.
No mais, é dever da prestadora de serviços garantir a demonstração de informações claras, corretas e precisas ao consumidor, conforme determina o artigo 31 do Código de Defesa do Consumidor: A oferta e apresentação de produtos ou serviços devem assegurar informações corretas, claras, precisas, ostensivas e em língua portuguesa sobre suas características, qualidades, quantidade, composição, preço, garantia, prazos de validade e origem, entre outros dados, bem como sobre os riscos que apresentam à saúde e segurança dos consumidores.
No áudio da ligação telefônica (fls. 42), com duração de 1 minuto e 44 segundos, ouve-se que a funcionária interlocutora da área de qualidade limitou-se a induzir a autora à mera confirmação de dados pessoais.
Em seguida, a representante da associação pergunta se o autor autorizava o uso dessas informações para cadastro no clube de benefícios e compartilhamento com empresas parceiras da AMBEC, remetendo à política de dados no site.
Houve a leitura breve de suposto termo de consentimento e a autorização de desconto de R$ 45,00 diretamente do benefício previdenciário.
Desse modo, nota-se que a associação não forneceu explicações detalhadas acerca dos termos contratuais ou esclareceu, de forma transparente e compreensível, a que exatamente se destinaria a filiação ofertada.
Não há explicação sobre as vantagens, serviços ou benefícios decorrentes da adesão, restringindo-se a colher o consentimento do consumidor de forma rápida e superficial.
A conduta da associação ré não atendeu aos deveres de transparência e clareza impostos por força do artigo 31 do Código de Defesa do Consumidor.
A liberdade associativa é um direito fundamental garantido pela Constituição Federal do Brasil, especificamente no artigo 5º, inciso XX, segundo o qual: ninguém poderá ser compelido a associar-se ou a permanecer associado.
Em outras palavras, a adesão e a permanência em qualquer tipo de associação são opcionais e dependem da livre decisão de cada indivíduo.
Por isso, é de rigor o reconhecimento da invalidade da adesão defendida pela associação.
Dessa forma, a ré não se desincumbiu do seu ônus probatório, previsto no artigo 373, inciso II, do Código de Processo Civil, por não comprovar a existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do demandante.
Em relação ao pedido de devolução em dobro de valores descontados desde setembro de 2023, reputo não ser devida, haja vista que, ainda que de forma maculada, a parte autora autorizou os descontos em questão.
Todavia, os danos morais não restaram configurados.
Para a caracterização do dano moral indenizável, é necessário demonstrar ofensa significativa à esfera íntima do indivíduo, com repercussão concreta em seu estado psicológico ou emocional, não se confundindo com meros aborrecimentos cotidianos.
No caso em apreço, ainda que a prestação do serviço tenha sido falha, os descontos mensais de R$ 45,00, iniciados em setembro de 2023 e mantidos sem reclamação formal da autora na via administrativa até o ajuizamento da presente ação em março de 2024, demonstram situações corriqueiras, que não extrapolam o mero dissabor ou aborrecimento ordinário.
Em detida análise dos autos, não há elementos que comprovem tentativa de solução extrajudicial ou o efetivo abalo psíquico da autora, tampouco houve qualquer evidência de danos concretos, como a inscrição indevida em cadastros de inadimplentes ou cobrança vexatória, circunstâncias que poderiam indicar a violação efetiva à dignidade do demandante.
Diante desse conjunto probatório e considerando que o fato superveniente não resultou em ofensa grave à esfera íntima da requerente, não subsiste o dever de indenizar pelos danos morais pleiteados.
Diante do exposto, extingo o processo, com resolução de mérito, nos termos do artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil e julgo parcialmente procedentes os pedidos da petição inicial para: I) DECLARAR a inexistência de relação jurídica entre as partes e, em consequência, a inexigibilidade dos débitos descontados, cessando definitivamente os descontos do benefício previdenciário do autor; II) CONDENAR a ré ao pagamento simples dos valores descontados mensalmente, desde setembro de 2023 até a efetiva comprovação da interrupção, com correção monetária desde o efetivo prejuízo/desembolso de cada parcela (Súmula 43 do STJ) e incidência de juros de mora de 1% ao mês desde a citação em 19/03/2024 (fls. 31) até 28/08/2024.
A correção monetária será realizada pela Tabela Prática do TJSP desde cada desembolso até 28/08/2024, aplicando-se, posteriormente, o IPCA-E (art. 389, § único, do Código Civil).
Os juros de mora, por sua vez, serão calculados, a partir de 28/08/2024, de acordo com a Taxa Selic, deduzido o índice de correção monetária (§ 1º,do art. 406, do Código Civil), sendo certo que, se a referida taxa apresentar resultado negativo, este será considerado igual a zero para efeito de cálculo dos juros de referência (§ 3º, do art. 406,do Código Civil).
Em razão da sucumbência recíproca, condeno a requerida no pagamento de 50% das custas e despesas processuais, bem como de honorários advocatícios, ora fixados em 10% sobre o valor da condenação.
Em consequência, condeno a autora ao pagamento de 50% das custas e despesas processuais e de honorários advocatícios ao patrono da ré, ora fixados em 10% sobre o proveito econômico relativo aos pedidos não acolhidos (diferença entre o valor pretendido e o valor da condenação), observada a gratuidade.
Advirto as partes, desde logo, que a oposição de embargos de declaração fora das hipóteses legais e/ou com postulação meramente infringente lhes sujeitará a imposição da multa prevista pelo artigo 1.026, §2º, do Código de Processo Civil.
Após o trânsito em julgado, arquivem-se os autos.
P.I.C. -
24/04/2025 23:59
Certidão de Publicação Expedida
-
24/04/2025 00:31
Remetido ao DJE
-
23/04/2025 15:54
Julgada Procedente em Parte a Ação
-
31/03/2025 05:29
Pedido de Habilitação Juntado
-
26/09/2024 17:55
Conclusos para decisão
-
26/09/2024 17:53
Certidão de Cartório Expedida
-
09/08/2024 18:58
Especificação de Provas Juntada
-
25/07/2024 23:37
Certidão de Publicação Expedida
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25/07/2024 12:06
Remetido ao DJE
-
25/07/2024 11:14
Ato ordinatório - Intimação - DJE
-
16/05/2024 18:16
Réplica Juntada
-
22/04/2024 23:09
Certidão de Publicação Expedida
-
22/04/2024 12:04
Remetido ao DJE
-
22/04/2024 11:47
Ato ordinatório - Intimação - DJE
-
19/04/2024 10:05
Contestação Juntada
-
13/04/2024 01:17
Suspensão do Prazo
-
26/03/2024 09:03
AR Positivo Juntado
-
14/03/2024 01:27
Certidão de Publicação Expedida
-
13/03/2024 05:13
Certidão Juntada
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13/03/2024 00:27
Remetido ao DJE
-
12/03/2024 13:38
Carta Expedida
-
12/03/2024 13:38
Não Concedida a Antecipação de tutela
-
07/03/2024 10:41
Conclusos para decisão
-
06/03/2024 16:42
Distribuído Livremente (por Sorteio) (movimentação exclusiva do distribuidor)
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
06/03/2024
Ultima Atualização
25/04/2025
Valor da Causa
R$ 0,00
Documentos
Ato Ordinatório • Arquivo
Sentença • Arquivo
Ato Ordinatório • Arquivo
Ato Ordinatório • Arquivo
Decisão • Arquivo
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