TJSC - 5078093-66.2023.8.24.0930
2ª instância - Câmara / Desembargador(a) Terceira C Mara de Direito Civil - Gabinetes
Processos Relacionados - Outras Instâncias
Polo Passivo
Partes
Advogados
Nenhum advogado registrado.
Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
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17/09/2025 00:00
Intimação
Apelação Nº 5078093-66.2023.8.24.0930/SC APELANTE: MARLI RISTOW (AUTOR)ADVOGADO(A): DIEGO SCHMITZ (OAB SC047266)APELANTE: BANCO C6 S.A. (RÉU)ADVOGADO(A): JULIANO RICARDO SCHMITT (OAB SC020875) DESPACHO/DECISÃO I - Relatório Forte no Princípio da Celeridade, e utilizando racionalmente as ferramentas informatizadas, adota-se, in totum, o relatório da Sentença (evento 61, SENT1), in verbis: Trata-se de ação em que a parte requerente pretende a tutela jurisdicional para declarar a inexistência de débito, bem como para condenar a requerida ao pagamento de repetição de indébito em dobro, e compensação por danos morais, no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais). Narrou, para tanto, que constatou descontos mensais de R$115,00 (cento e quinze reais) em seu benefício, referentes ao contrato nº 010015996360, que alega jamais ter celebrado. Aduziu que o empréstimo consignado no valor de R$4.763,88 (quatro mil, setecentos e sessenta e três reais e oitenta e oito centavos), teria sido liberado em 21/01/2021, para quitação em 84 parcelas mensais. Sustentou a ocorrência de contratação fraudulenta, caracterizando falha na prestação de serviço pela instituição financeira requerida.
Invoca a aplicação do CDC, a responsabilidade objetiva do fornecedor (art. 14), a inversão do ônus da prova (art. 6º, VIII) e a repetição em dobro do indébito (art. 42, parágrafo único), no montante de R$4.474,58 (quatro mil, quatrocentos e setenta e quatro reais e cinquenta e oito centavos). Pleiteou ainda, indenização por danos morais no valor de R$10.000,00 (dez mil reais), com correção monetária pelo INPC e juros de 1% ao mês desde o evento danoso. Em sede de tutela de urgência, requereu a suspensão dos descontos, a não inclusão em cadastros de inadimplentes e a abstenção de novos descontos. Ao final, pugnou pelo benefício da justiça gratuita em razão de sua hipossuficiência econômica. Citada, a parte requerida apresentou defesa em forma de contestação, ocasião em que arguiu, no mérito, a respeito da regularidade da contratação do empréstimo consignado, formalizado pela Cédula de Crédito Bancário nº *00.***.*96-60, emitida em 25/01/2021, no valor de R$4.763,88 (quatro mil, setecentos e sessenta e três reais e oitenta e oito centavos). Alegou que a requerente assinou o contrato, sendo a assinatura compatível com aquela constante em seus documentos pessoais e na petição inicial. Aduziu que o valor foi efetivamente creditado na conta da requerente e que a contratação ocorreu via correspondente bancário autorizado, com utilização de tecnologia OCR para validação documental. Sustentou a inexistência de falha na prestação do serviço e argumenta que a requerente não buscou solução administrativa antes da judicialização. Apontou que o lapso de mais de dois anos entre a contratação e o ajuizamento da ação configura comportamento contraditório e violação à boa-fé objetiva. Quanto à repetição de indébito, refuta a devolução em dobro por ausência de má-fé e defende eventual restituição simples com compensação do montante creditado. No tocante aos danos morais, sustenta sua inexistência, invocando o IRDR nº 5011469-46.2022.8.24.0000 do TJSC, segundo o qual o mero desconto indevido não caracteriza dano moral presumido. Ao final, pugnou pela improcedência dos pedidos e, subsidiariamente, requer a produção de prova testemunhal e o depoimento pessoal da requerente. Houve réplica. As partes foram instadas a especificar provas, ocasião em que a requerente pugnou pela realização de perícia judicial grafotécnica, e o requerido pugnou pelo julgamento antecipado dos pedidos. Após regular trâmite, os autos vieram conclusos. Ato contínuo, sobreveio Sentença (evento 61, SENT1), da lavra do Magistrado Gilberto Gomes de Oliveira Junior, julgando a lide nos seguintes termos: Ante o exposto, resolvendo o mérito, nos termos do art. 487, I do Código de Processo Civil, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos iniciais, para: a) DECLARAR a inexistência de relação jurídica havida entre as partes, objeto da presente demanda; b) CONDENAR a parte requerida, BANCO C6 S.A., ao pagamento da repetição de indébito em dobro, dos valores que foram indevidamente descontados do benefício da parte requerente, valor que deverá ser corrigido pelos índices divulgados pela CGJ/SC (Provimento n. 24/2024), desde a data de cada desconto, nos termos da Súmula 43 do STJ, e acrescida de juros de mora à razão de 1% (um por cento) ao mês, desde a citação, nos termos do art. 405, do CC, e as demais prestações que tiverem sido descontadas no curso do presente feito, nos termos do art. 323 do CPC, até 30/08/2024, data a partir da qual os juros de mora deverão ser calculados pela Taxa SELIC.
Em razão do princípio da sucumbência, condeno o requerido ao pagamento proporcional de 70% (setenta por cento) e a requerente em 30% (trinta por cento) das despesas processuais pendentes, conforme arts. 86 e 87 do CPC.
Estão as partes, igualmente, obrigadas a indenizar as despesas adiantadas no curso do processo pela parte adversa, de forma proporcional à respectiva sucumbência, conforme art. 82, § 2º, do CPC.
Condeno o requerido ao pagamento de honorários sucumbenciais em favor do advogado da requerente, no percentual de 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, devidamente corrigido, nos termos do art. 85, § 2.º do CPC.
Em razão da sucumbência recíproca, condeno a requerente ao pagamento de honorários sucumbenciais em favor do advogado do requerido, no percentual de 10% (dez por cento) sobre o valor de que sucumbiu de seu pedido condenatório, devidamente corrigido, nos termos do art. 85, § 2.º do CPC.
Havendo custas processuais quitadas e não utilizadas, autorizo, desde já, sua restituição à parte que efetuou o seu pagamento.
Publique-se.
Registre-se.
Intimem-se.
Após o trânsito em julgado, nada mais havendo, arquivem-se. Irresignada, a autora interpôs recurso de apelação (evento 69, APELAÇÃO1), pugnando, em síntese, o reconhecimento do seu direito ao recebimento de indenização por danos morais e a fixação de honorários recursais em favor do seu procurador. O demandado, por sua vez, interpôs recurso de apelação (evento 75, APELAÇÃO1), aventando a prefacial de cerceamento de defesa, ante o indeferimento do pedido de oitiva da parte autora.
Rechaça, outrossim, a imprescindibilidade da perícia grafotécnica, defendendo a suficiência da prova por si apresentada.
Assevera ter logrado êxito na comprovação da contratação e na consequente disponibilização do valor contratado, pugnando a reforma da Sentença, para julgar improcedente o pleito exordial.
Refuta a condenação ao pagamento de repetição de indébito em dobro, postulando, em caso de eventual manutenção da condenação, a determinação de compensação. Apresentada contrarrazões por ambas as partes (evento 77, CONTRAZ1 e evento 82, CONTRAZ1), ascenderam os autos a este Tribunal. Este é o relatório. II - Decisão 1.
Da possibilidade de decisão unipessoal Inicialmente, impõe-se destacar caber ao Relator, nos termos do artigo 932 do Códigode Processo Civil, em atenção ao direito das partes de receber da forma mais célere possível a prestação jurisdicional (artigo 5º, LXXVIII, da Constituição Federal), procedera julgamento monocrático de questão jurídica com entendimento pacificado no âmbito do Supremo Tribunal Federal ou Superior Tribunal de Justiça. Extrai-se da Lei Processual Civil: "Art. 932.
Incumbe ao relator: I - dirigir e ordenar o processo no tribunal, inclusive em relação à produção de prova,bem como, quando for o caso, homologar autocomposição das partes; II - apreciar o pedido de tutela provisória nos recursos e nos processos de competência originária do tribunal; III - não conhecer de recurso inadmissível, prejudicado ou que não tenha impugnado especificamente os fundamentos da decisão recorrida; IV - negar provimento a recurso que for contrário a: a) súmula do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça ou do próprio tribunal; b) acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos; c) entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência; V - depois de facultada a apresentação de contrarrazões, dar provimento ao recurso sea decisão recorrida for contrária a: a) súmula do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça ou do própriotribunal; b) acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos; c) entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência; VI - decidir o incidente de desconsideração da personalidade jurídica, quando este for instaurado originariamente perante o tribunal; VII - determinar a intimação do Ministério Público, quando for o caso; VIII - exercer outras atribuições estabelecidas no regimento interno do tribunal. Parágrafo único.
Antes de considerar inadmissível o recurso, o relator concederá o prazode 5 (cinco) dias ao recorrente para que seja sanado vício ou complementada a documentação exigível." Ainda, atentando ao permissivo legal constante no artigo 932, VIII, o Regimento Interno deste Tribunal de Justiça confere ao Relator a faculdade de proferir decisão monocrática na hipótese sub examine.
Extrai-se: "Art. 132 - São atribuições do relator, além de outras previstas na legislação processual: [...] XIII - negar seguimento a recurso nos casos previstos em lei; XIV - não conhecer de recurso inadmissível, prejudicado ou que não tenha impugnado especificamente os fundamentos da decisão recorrida; XV - negar provimento a recurso nos casos previstos no inciso IV do art. 932 do Códigode Processo Civil ou quando esteja em confronto com enunciado ou jurisprudência dominante do Tribunal de Justiça; XVI - depois de facultada a apresentação de contrarrazões, dar provimento a recurso nos casos previstos no inciso V do art. 932 do Código Processo Civil ou quando a decisão recorrida for contrária a enunciado ou jurisprudência dominante do Tribunal de Justiça;" In casu, havendo remansosa jurisprudência sobre o tema, passível de análise monocrática o presente feito. 2.
Admissibilidade É consabido que o procedimento recursal exige o preenchimento de pressupostos específicos, necessários para que se possa examinar o mérito do recurso interposto. Portanto, torna-se imperiosa, num primeiro momento, a análise dos pressupostos recursais, em razão de constituírem a matéria preliminar do procedimento recursal, ficando vedado ao Tribunal o conhecimento do mérito no caso de não preenchimento de quaisquer destes pressupostos. Tais pressupostos são classificados como intrínsecos (cabimento, interesse recursal, legitimidade recursal, inexistência de fato extintivo do direito de recorrer) e extrínsecos (regularidade formal, tempestividade e preparo).
Os pressupostos intrínsecos estão atrelados ao direito de recorrer, ao passo que os extrínsecos se referem ao exercício desse direito. Assim, recolhido o preparo recursal pelo demandado (evento 68, CUSTAS1), dispensada a autora do referido encargo, porquanto beneficiária da justiça gratuita, e preenchidos os demais pressupostos de admissibilidade, passa-se à análise dos recursos. Trata-se de recursos interpostos por ambas as partes contra Sentença de parcial procedência proferida nos autos da ação declaratória/indenizatória movida por Marli Ristow em desfavor de Banco C6 Consignado S/A. Em suas razões recursais, pretende o demandado a anulação da Sentença, com o retorno dos autos à origem para oitiva da autora.
No mérito, defende a regularidade da contratação e dos consequentes descontos operados, sublinhando a suficiência da documentação apresentada.
Sucessivamente, requer o afastamento da determinação de repetição de indébito e a determinação de compensação. A autora, por sua vez, requer a condenação do requerido ao pagamento de indenização por danos morais e a fixação de honorários recursais. Delimitado o âmbito recursal, passa-se à análise das insurgências aventadas. 3.
Do recurso do requerido 3.1.
Preliminar de cerceamento de defesa Sustenta o requerido, em prefacial, o cerceamento de seu direito de defesa em razão do julgamento antecipado da lide, arguindo ser necessária oitiva da requerente. Pois bem. Não se olvide que, como regra, em respeito ao princípio da efetividade e da instrumentalidade do processo, a parte que pretende a declaração de nulidade deve demonstrar nos autos em que medida a produção das provas que lhe foram supostamente cerceadas poderia modificar os rumos do silogismo meritório da lide. Com efeito, a produção de provas que detenham efetiva pertinência com o caso sub examine é direito fundamental positivado na Constituição Federal, e concretiza o princípio do amplo acesso à justiça (art. 5º, XXXV, da CF) transformando em ação a garantia da ampla defesa (art. 5º, LV, da CF). Nesta esteira, a ponderação constitucional exige que os operadores do direito compreendam o processo como um meio de resolução de conflitos e, como tal, aleguem tão somente fatos e fundamentos que tenham a efetiva correlação com o caso em análise, e que, precipuamente, tenham relevância suficiente com o pronunciamento final. Assim, não há como considerar apto a provocar a nulidade do julgado e, consequentemente, a nova análise dos fatos na Primeira Instância, o argumento genérico de necessidade de dilação probatória, quando dissociado de demonstração da exata maneira pela qual os fatos seriam efetivamente demonstrados por meio da prova não realizada. Nesse sentido, destaca-se julgado proferido por este Órgão Fracionário que corrobora a necessidade de requerimento de prova devidamente fundamentado: "APELAÇÃO CÍVEL.
AÇÃO DE COBRANÇA DE MULTA CONTRATUAL.
SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA.
APELO DOS RÉUS.CONTRARRAZÕES. ALEGADA OFENSA AO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE. TESE AFASTADA.
RAZÕES RECURSAIS QUE ATACAM OS FUNDAMENTOS DA DECISÃO VERGASTADA.PROEMIAL DE CERCEAMENTO DE DEFESA DIANTE DO JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE.
INSUBSISTÊNCIA.
PEDIDO GENÉRICO.
AUSÊNCIA DE REQUERIMENTO ESPECÍFICO NO CURSO DO FEITO.
PROVA DEMANDADA, ADEMAIS, DE CARÁTER DOCUMENTAL.
NULIDADE NÃO EVIDENCIADA [...]" (TJSC, Apelação n. 5002552-19.2023.8.24.0189, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel.
André Carvalho, Terceira Câmara de Direito Civil, j. 17-12-2024). De mais a mais, embora não seja conferida ao Magistrado liberdade absoluta na apreciação e valoração da prova, por ser norteado pelo princípio do livre convencimento motivado (art. 371, CPC), cabe a ele o indeferimento das consideradas dispensáveis - a dilação probatória despicienda importa, inclusive, em violação do direito fundamental à duração razoável do processo (arts. 5º, LXXVIII, CF, e 4º CPC), porque implica demora indevida para resolução da causa. Nesse contexto, uma vez apresentadas as provas documentais existentes, a realização de audiência para oitiva da parte requerente não teria qualquer serventia, notadamente por se tratar, in casu, de matéria de fato cuja prova documental se mostrava suficiente ao deslinde do feito. Dessarte, convencido o Magistrado de que a oitiva da requerente não teria capacidade de influenciar no julgamento da demanda, agiu corretamente ao julgar antecipadamente o mérito. Portanto, houve o implemento dos requisitos autorizadores do julgamento antecipado da lide, nos termos do artigo 355, I, do Código de Processo Civil. Sobre o tema, Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero lecionam: O art. 355, CPC, arrola as duas hipóteses em que tem cabimento resolver de maneira imediata o mérito, julgando o juiz procedente ou improcedente o pedido formulado pelo demandante (art. 487, I, CPC).
O critério que legitima o julgamento imediato do pedido e que está presente nos dois incisos do artigo em comento é a desnecessidade de produção de provas em audiência.
Tem o juiz de estar convencido a respeito das alegações de fato da causa para que possa julgar imediatamente o pedido.
Não sendo cabível a colheita de prova oral (depoimentos pessoais e oitiva de testemunhas, art. 361, II e III, CPC) nem a obtenção de esclarecimentos do perito a respeito do laudo pericial (art. 361, I, CPC), cabe o julgamento imediato do mérito (Novo Código de Processo Civil comentado. 2ª ed.
Rev., atual. e ampl.
São Paulo: RT, 2016, p. 452). Desse modo, inocorrente o alegado cerceamento do direito de defesa, a Sentença deve ser mantida neste tocante. 3.2.
Da nulidade da contratação No mérito, pleiteia o banco demandado o reconhecimento da regularidade da contratação, com a consequente reforma da Sentença, para julgar improcedentes os pedidos iniciais. Fundamenta sua pretensão, afirmando ter colacionado aos autos cópia do contrato firmado pela autora e sua respectiva documentação.
Destaca, outrossim, o fato de a requerente ter recebido o valor emprestado e permanecido inerte. A celeuma recursal reside, portanto, em torno da autenticidade da firma aposta no documento ensejador dos descontos operados nos proventos da autora. Pois bem. Ab initio, imprescindível ressaltar ter sido a aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor devidamente fundamentada pelo Juízo de Primeiro Grau, inexistindo qualquer insurgência recursal neste tocante, razão pela qual a análise do presente recurso será realizada sob o manto da legislação consumerista. Dito isso, é cediço que, à configuração da responsabilidade civil objetiva prevista no artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor, exige-se a comprovação da prática de conduta comissiva ou omissiva, causadora de prejuízo à esfera patrimonial de outrem, independentemente de culpa, decorrendo dessas situações, os pressupostos: ato ilícito, dano e nexo de causalidade. Nesse sentido, incumbe a autora, independentemente da inversão do ônus probatório, demonstrar a ocorrência de evento causador de dano e o nexo causal com a atividade exercida pelo fornecedor no mercado consumidor, que, por sua vez, desincumbir-se-á do dever ressarcitório tão somente se comprovar a inexistência de dano, ou ainda, de liame causal entre o dano e exercício de sua atividade. É o que determina o § 3º do artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor, in verbis: "§ 3° O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar: I - que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste; II - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro." Esclarecido isso, extrai-se incontroverso dos autos o fato de o requerido ter promovido descontos mensais nos proventos da autora, no valor de R$ 115,00 (cento e quinze reais – evento 1, DOC7, fl. 02). A autora, no entanto, impugnou a regularidade dos referidos descontos, asseverando jamais ter celebrado a respectiva contratação. O requerido, por sua vez, defendeu a regularidade dos descontos operados, alegando terem as partes firmado contrato de empréstimo, através do qual foi liberado em favor da autora a quantia de R$ 4.763,88 (quatro mil setecentos e sessenta e três reais e oitenta e oito centavos), cujo pagamento seria realizado mediante desconto no benefício previdenciário da autora de oitenta e quatro parcelas mensais, no valor de R$ 115,00 (cento e quinze reais), cada.
Acrescentou, ainda, ter liberado o valor contratado na conta corrente da autora. Fundamentou suas assertivas acostando aos autos cópias do contrato supostamente firmado pela autora, e dos seus documentos de identificação (evento 19, DOC6), além do comprovante de depósito da quantia emprestada na conta bancária da requerente (evento 19, DOC8). A requerente, no entanto, impugnou expressamente a autenticidade da assinatura aposta no contrato de empréstimo apresentado pelo demandado (evento 56, PET1). Dessarte, considerando ter sido a autenticidade da assinatura consignada no documento referido expressamente impugnada pela parte autora - fazendo cessar, portanto, a fé dos escritos particulares - competia ao demandado (responsável pela produção da prova cuja autenticidade está sendo impugnada), o ônus de comprovar a veracidade do referido documento, à luz da regra estampada nos artigos 428, inciso I, e 429, inciso II, ambos do Código de Processo Civil, in verbis: Art. 428.
Cessa a fé do documento particular quando: I - for impugnada sua autenticidade e enquanto não se comprovar sua veracidade;(...) Art. 429.
Incumbe o ônus da prova quando:(...) II - se tratar de impugnação da autenticidade, à parte que produziu o documento. Nesse sentido, inclusive, a Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), sob o rito dos recursos especiais repetitivos (Tema 1.061), definiu que, nas hipóteses em que o consumidor/autor impugnar a autenticidade da assinatura constante em contrato bancário juntado ao processo pela instituição financeira, caberá a ela o ônus de provar a veracidade do registro. Logo, tratando-se de contestação à assinatura aposta em contrato bancário apresentado pelo banco, incumbe à parte que produziu o documento - no presente caso, o demandado - o ônus de provar sua autenticidade. A respeito do tema, leciona Nelson Nery Junior: "Contestação de assinatura.
A parte que produz o documento é aquela por conta de quem ele se fez (...) Logo, é a responsável por irregularidades dele constantes.
Note-se que aqui não se contesta o documento como um todo, como na hipótese do CPC 429 I, mas apenas parte dele, qual seja a aposição a assinatura.
Sendo assim, o responsável pela confecção do documento, aquele por conta de que ele se fez, é quem deve contrapor as alegações de falsidade, até porque pode justificar ou comprovar a presença da pessoa que assinou." (Código de Processo Civil comentado. 16. ed.
São Paulo: revista dos Tribunais, 2016. p. 1140-1141) In casu, no entanto, o requerido se manifestou, tão somente, pela produção de prova oral, deixando de postular a realização de perícia grafotécnica (evento 58, PET1), gerando, por conseguinte, a presunção - favorável à autora - de que os escritos, realmente, não gozam de autenticidade. Neste tocante, ressalte-se que, ao contrário do defendido pelo demandado, seria imprescindível a produção de perícia grafotécnica, haja vista não ser possível aferir sem o auxílio de profissional da área a autenticidade das assinaturas apostas no documento comprobatório do empréstimo consignado. Com efeito, a impossibilidade técnica de aferição da autenticidade da assinatura em razão da não produção da prova técnica pericial, como ocorrido, tem como consequência jurídica a ineficácia instrutória do documento, justamente por incumbir à parte que produziu o documento (demandado) a obrigação de provar a veracidade da assinatura (inversão ope legis). Em situação semelhante, inclusive, destaca-se da jurisprudência deste Sodalício: APELAÇÃO CÍVEL.
AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO COM PEDIDO DE INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL.
SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA.
RECURSO DA COOPERATIVA DE CRÉDITO REQUERIDA.TESE DE QUE O AUTOR NÃO COMPROVOU A IRREGULARIDADE DA DÍVIDA.
INSUBSISTÊNCIA.
IMPUGNAÇÃO À ASSINATURA APOSTA EM CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO.
REQUERIDA QUE NÃO SE DESINCUMBIU DO ÔNUS PROBATÓRIO DE DEMONSTRAR SUA AUTENTICIDADE.
INTELIGÊNCIA DO ART. 429, II, DO CPC E DO TEMA 1061 DO STJ.
PEDIDO DE PERÍCIA GRAFOTÉCNICA PELO AUTOR, COM DETERMINAÇÃO DE PAGAMENTO DOS HONORÁRIOS PERICIAIS POR ELE, NOS TERMOS DO ART. 95 DO CPC.
SITUAÇÃO, TODAVIA, QUE NÃO IMPLICA EM DESLOCAMENTO DO ÔNUS DA PROVA.
PAGAMENTO DOS HONORÁRIOS QUE É DEVIDO POR QUEM PEDE A PERÍCIA. ESTUDO, NA HIPÓTESE, NEM AO MENOS PLEITEADO POR QUEM O INTERESSAVA (A RÉ). DESISTÊNCIA DA PROVA PELO DEMANDANTE, PORTANTO, QUE NÃO O PREJUDICA.
ACIONADA QUE NÃO TEM O DEVER DE CUSTEAR OS HONORÁRIOS, PORQUE NÃO REQUEREU A PERÍCIA. TODAVIA, FACULDADE DE NÃO DESINCUMBÊNCIA DO ÔNUS DA PROVA QUE LHE ATRAI AS CONSEQUÊNCIAS PROCESSUAIS DAÍ ADVINDAS.
VERACIDADE DA ASSINATURA NÃO COMPROVADA. (...) (TJSC, Apelação n. 5009112-74.2019.8.24.0008, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel.
André Carvalho, Terceira Câmara de Direito Civil, j. 09-07-2024). Registre-se, outrossim, que, o fato de o requerido ter depositado o numerário da conta bancária da autora (evento 19, DOC8), não implica no reconhecimento da autenticidade da negociação. Isso porque, além de a pretensão autoral estar dentro do prazo previsto em lei (art. 27, do CDC), não há possibilidade de formação de contrato sem que as partes mútua e reciprocamente estabeleçam de forma livre o seu consentimento. A respeito do tema, disserta Arnaldo Rizzardo: "Embora não capitulado explicitamente nos arts. 104 e 166, mas está inerente nestes e em outros dispositivos, acrescenta-se mais um requisito primordial para a validade dos contratos, que é o consentimento.
Define-se como a integração de vontades distintas, ou a conjugação das vontades convergindo ao fim desejado. [...]Para criar um laço obrigacional é necessário, mister que haja um perfeito acordo, isto é, mútuo consenso sobre o mesmo objeto - dourum vel plurium in idem placitum consensus. [...] Importa que a vontade dos declarantes vise como escopo imediato um resultado jurídico de natureza obrigacional, além do que ela se deve traduzir por uma manifestação exterior suficiente e inequívoca, que por si só basta para evidenciar o consentimento.
O contrato não se forma sem o acordo das vontades sobre todos os pontos que as partes julgam indispensáveis na convenção." (Contratos. 13ª ed.
Rio de Janeiro: Forense, 2013. p. 16/17) Na hipótese não se pode reconhecer como válido um contrato cuja autenticidade não restou comprovada pelo demandado, tão somente porque a autora fez uso do numerário depositado em sua conta bancária. Nesse sentido, inclusive, mutatis mutandis, extrai-se da jurisprudência da Corte Superior: 10.
A aparente resignação do correntista com o investimento financeiro realizado a sua revelia não pode, assim, ser interpretada como ciência em relação aos riscos da operação.
Tal informação ostenta relevância fundamental, cuja incumbência cabia ao banco, que, no caso concreto, não demonstrou ter agido com a devida diligência.11.
Consequentemente, sobressai a ilicitude da conduta da casa bancária, que, aproveitando-se de sua posição fática privilegiada, transferiu, sem autorização expressa, recursos do correntista para modalidade de investimento incompatível com o perfil do investidor, motivo pelo qual deve ser condenada a indenizar os danos materiais e morais porventura causados com a operação.12.
Recurso especial dos correntistas provido.
Recurso especial da casa bancária prejudicado.(REsp n. 1.326.592/GO, relator Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 7/5/2019) No mesmo norte, já se manifestou este órgão Fracionário: APELAÇÃO CÍVEL.
DESCONTOS ALEGADAMENTE INDEVIDOS EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO.
SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA.
RECURSO AUTORAL.
ALEGADA INAPLICABILIDADE DO INSTITUTO DA SUPRESSIO.
ACOLHIMENTO.
ACEITAÇÃO TÁCITA PELO CONSUMIDOR INVIÁVEL.
DISPONIBILIZAÇÃO DOS VALORES ALEGADAMENTE MUTUADOS, ADEMAIS, QUE NÃO TEM O CONDÃO DE CONVALIDAR O AJUSTE. (...). (TJSC, Apelação n. 5025210-16.2024.8.24.0023, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel.
André Carvalho, Terceira Câmara de Direito Civil, j. 04-02-2025). Necessário frisar que a requerente não consentiu com os termos da avença, com as taxas e juros impostos ou com as condições de pagamento.
Logo não há como obrigá-la a cumprir o pacto contra o qual não expressou qualquer voluntariedade de contratação. Assim, por não respeitar a vontade na assunção da obrigação o pacto não supera o plano de existência (e, por conseguinte, de validade), sendo de todo ineficaz, afigurando-se inviável a aplicabilidade do instituto da supressio no caso em questão. Nesse sentido, diante da ausência de elementos essenciais ao reconhecimento da própria existência e também da validade do negócio, impossível dar juridicidade a efeito que tão somente dele poderia decorrer. Sendo assim, é de ser mantida a nulidade da contratação e a consequente desconstituição do débito, com a determinação de suspensão dos descontos nos proventos da autora. Assim sendo, nega-se provimento ao recurso interposto pelo demandado neste tocante. 3.3.
Da repetição de indébito Tocante a repetição de indébito, a Corte Especial do Superior Tribunal de justiça, ao julgar o EAREsp n. 676.608/RS, adotou o entendimento de que a devolução em dobro do valor indevidamente cobrado do consumidor não depende da comprovação de que o fornecedor agiu com má-fé. Ou seja, para fazer jus ao ressarcimento em dobro, basta o consumidor produzir prova da ocorrência da cobrança indevida, e de seu respectivo pagamento. No mesmo julgado, contudo, a Corte Superior fixou a modulação dos efeitos da referida decisão, no sentido de ser aplicável o novo entendimento apenas as situações ocorridas após a data da publicação do acórdão, em 30/03/2021. Com efeito, colaciona-se a referida decisão: 13.
Fixação das seguintes teses.
Primeira tese: A restituição em dobro do indébito (parágrafo único do artigo 42 do CDC) independe da natureza do elemento volitivo do fornecedor que realizou a cobrança indevida, revelando-se cabível quando a referida cobrança consubstanciar conduta contrária à boa-fé objetiva. (...) Modulação dos efeitos: Modulam-se os efeitos da presente decisão - somente com relação à primeira tese - para que o entendimento aqui fixado quanto à restituição em dobro do indébito seja aplicado apenas a partir da publicação do presente acórdão.
A modulação incide unicamente em relação às cobranças indevidas em contratos de consumo que não envolvam prestação de serviços públicos pelo Estado ou por concessionárias, as quais apenas serão atingidas pelo novo entendimento quando pagas após a data da publicação do acórdão." (STJ.
EAREsp 676608 / RS.
Rel.
Min.
OG Fernandes, julgado em 21/10/2020 e DJE 30/03/2021). Ressalte-se que, apesar de o Superior Tribunal de Justiça não ter encerrado a "discussão quanto às hipóteses de aplicação da repetição em dobro prevista no art. 42, parágrafo único, do CDC" (Tema 929 - STJ), este Tribunal têm-se filiado ao posicionamento exarado pela Corte Especial, senão vejamos: APELAÇÕES CÍVEIS.
AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA C/C REPETIÇÃO DO INDÉBITO E COMPENSATÓRIA DE DANOS MORAIS.
CONTRATO DE CARTÃO DE CRÉDITO CONSIGNADO.
DESCONTOS OPERADOS NO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO DA AUTORA.
SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA.
INSURGÊNCIAS RECÍPROCAS. (...) REPETIÇÃO DO INDÉBITO.
RESTITUIÇÃO QUE DEVERÁ SE DAR NA FORMA SIMPLES E DOBRADA, A DEPENDER DA DATA EM QUE FORAM PERPETRADOS OS DESCONTOS (EARESP 600.663/STJ).
ADEQUAÇÃO DA SENTENÇA NO PONTO. (...). (TJSC, Apelação n. 5000688-19.2024.8.24.0024, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel.
Saul Steil, Terceira Câmara de Direito Civil, j. 26-11-2024). Seguindo referido posicionamento, in casu, restou devidamente comprovado que os descontos operados pelo demandado nos proventos da autora, decorreram de relação contratual declarada inexistente. Observou-se, ainda, que parte dos descontos indevidos foram realizados antes de 30/03/2021, enquanto outra parte ocorreu após (evento 1, DOC7 - fl. 02). Afigura-se cabível, portanto, a determinação de repetição de indébito em dobro dos valores desembolsados pela requerente após 30/03/2021.
Tocante as parcelas deduzidas antes do dia 30/03/2021, o reembolso deverá ocorrer de forma simples, adequando-se a Sentença no ponto.
Mantidos os consectários legais fixados em Sentença. 3.4.
Da compensação Quanto a pretensão de determinação de devolução dos valores creditados em favor da autora, razão assiste ao demandado. Isso porque, reconhecida a nulidade da contratação, bem como restando comprovada a disponibilização do numerário à autora (evento 19, DOC8), as partes devem retornar ao status quo ante, devendo a requerente proceder a devolução da referida quantia, admitida a compensação. Nesse sentido, inclusive, é uníssona a jurisprudência deste Sodalício: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL.
SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA.
INSURGÊNCIA DA PARTE AUTORA.
DEFENDIDA A IRREGULARIDADE DA CONTRATAÇÃO.
SUBSISTÊNCIA.
EMPRÉSTIMO FIRMADO EM MEIO ELETRÔNICO. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DA AUTENTICIDADE DA ASSINATURA DIGITAL APOSTA NO PACTO.
CASA BANCÁRIA QUE SE ABSTEVE DE REQUERER A PERÍCIA TÉCNICA.
INTELIGÊNCIA DO TEMA 1.061 DO STJ.
ADEMAIS, DADOS PESSOAIS INSERIDOS NA AVENÇA QUE NÃO TRADUZEM REALIDADE.
ENDEREÇO DE IP QUE REMETE AO MUNICÍPIO DE CURITIBA/PR, EMBORA A AUTORA RESIDA EM CONCÓRDIA/SC.
GEOLOCALIZAÇÃO, DE IGUAL MODO, QUE APONTA ENDEREÇO DIVERGENTE.
CASA BANCÁRIA QUE NÃO SE DESINCUMBIU DO SEU ÔNUS PROBATÓRIO (ART. 373, II, CPC).
ATO ILÍCITO VERIFICADO.
REPETIÇÃO DO INDÉBITO. TESE FIXADA PELO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA NO JULGAMENTO DO EARESP N. 676.608/RS DISPENSANDO A EXISTÊNCIA DA MÁ-FÉ.
PRETENSÃO ACOLHIDA.
DEVOLUÇÃO DE VALORES QUE DEVE OCORRER NA FORMA DOBRADA, TENDO EM VISTA A DATA EM QUE OS DESCONTOS FORAM INICIADOS.
COMPENSAÇÃO DE VALORES DEVIDA.
CONSEQUÊNCIA LÓGICA DO RETORNO DAS PARTES AO STATUS QUO ANTE.
EXEGESE DOS ARTS. 182 E 368, AMBOS DO CC (...). (TJSC, Apelação n. 5109556-26.2023.8.24.0930, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel.
Sérgio Izidoro Heil, Terceira Câmara de Direito Civil, j. 03-09-2024). Registra-se, ademais, que se admite a compensação (art. 368, do Código Civil), especialmente porque a requerente deve restituir ao demandado os valores que foram comprovadamente creditados indevidamente em sua conta bancária, sob pena de enriquecimento sem justa causa (art. 884 do CC). Os referidos valores também deverão ser acrescidos de correção monetária pelo iCGJ (índice da Corregedoria-Geral da Justiça desta Corte cf.
Circular CGJ/PJSC n. 231/2023) e juros de mora de 1% ao mês, a contar da data do depósito do valor. Nessa senda, dá-se provimento ao apelo do requerido, no ponto, para determinar a devolução pela autora do valor depositado em seu favor à título do contrato anulado em questão, admitindo-se a compensação. 4.
Do recurso da autora 4.1.
Do dano moral Tocante ao dano moral, imprescindível registrar que, ao longo dos anos sempre me filiei ao entendimento de que os descontos indevidos em benefício previdenciário dispensava a produção de outras provas.
Sobretudo porque não se pode banalizar a privação indevida e injustificada de bens de quem quer que seja, mas especialmente por considerar a particularidade da função social atrelada ao benefício previdenciário. A diversidade de posicionamentos abrigadas por esta Corte de Justiça, assim como a existência de reiteradas decisões em sentido oposto, contudo, resultaram na instauração de Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (n. 5011469-46.2022.8.24.0000) junto ao Grupo de Câmaras de Direito Civil, em que se fixou a seguinte tese jurídica: "Tema 25 Não é presumido o dano moral quando o desconto indevido em benefício previdenciário decorrer de contrato de empréstimo consignado declarado inexistente pelo Poder Judiciário." Nessa senda, a fim de garantir a isonomia e segurança jurídica, passo a adotar, por dever funcional, o entendimento do Grupo de Câmaras de Direito Civil deste Sodalício, no sentido de ser necessária a comprovação do abalo anímico no caso concreto. Dito isso, imperioso reconhecer tratar-se a autora de pessoa idosa, hipossuficiente, que aufere mensalmente aposentadoria pelo INSS, da qual foi extraído de forma irregular a quantia de R$ 115,00 (cento e quinze reais) mensais (evento 1, DOC7). Consigne-se, ainda, que os descontos indevidos perduraram por tempo suficiente a causar grandes transtornos a parte autora. Além da evidente ilicitude da conduta da demandada, observa-se que os valores descontados indevidamente causaram demasiada privação à autora da demanda, especialmente por se tratar de desconto indevido de verba de caráter alimentar, o que se afigura capaz de afetar o seu sustento próprio ou familiar. Como se não bastasse, além de todos os percalços enfrentados na esfera extrajudicial, o requerente precisou disponibilizar tempo e dinheiro com a contratação de advogado, busca de documentos, e demais providências que envolvem um litígio judicial. Sendo assim, não há como dizer que os descontos indevidos em verba alimentar mensal da parte hipossuficiente tenham lhe gerado mero aborrecimento ou dissabor, já que inegável o abalo psíquico suportado pelo requerente ao ver-se parcialmente privada de seu benefício previdenciário em decorrência de contratação com a qual não concordou. Dessarte, extrai-se julgados deste Órgão fracionário nos quais a questão tratada no presente voto é bem dirimida: APELAÇÃO CÍVEL.
AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZATÓRIA POR DANOS MORAIS E MATERIAIS.
DESCONTOS INDEVIDOS EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO EM RAZÃO DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO ALEGADAMENTE NÃO CONTRATADO, SUCEDIDO DE TRANSFERÊNCIA DE PARTE DO VALOR MUTUADO PARA TERCEIROS SEM CONHECIMENTO NEM ANUÊNCIA DO AUTOR.
SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA.
APELOS POR AMBAS AS REQUERIDAS E TAMBÉM PELO AUTOR. [...].
EXAME DE MÉRITO.
ALEGADA A REGULARIDADE DA CONTRATAÇÃO.
IMPROCEDÊNCIA. ÔNUS DE COMPROVAR A HIGIDEZ DO CONTRATO QUE INCUMBE À CASA BANCÁRIA REQUERIDA.
PROVA NÃO SATISFEITA.
AUSÊNCIA DE PRODUÇÃO DE PROVA PERICIAL.
NECESSIDADE, AINDA QUE SE TRATE DE CONTRATO DIGITAL.
TEMA 1.061 DO STJ. [...].
POSTULADA A CONDENAÇÃO DAS REQUERIDAS AO PAGAMENTO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS.
PROCEDÊNCIA.
PECULIARIDADES DO CASO EM COMENTO QUE PERMITEM INFERIR EXISTÊNCIA DE DANO MORAL INDENIZÁVEL.
ARBITRAMENTO DO QUANTUM EM OBSERVÂNCIA ÀS PARTICULARIDADES DA CAUSA E AOS PRECEDENTES DESTA CÂMARA.REDISTRIBUIÇÃO DA SUCUMBÊNCIA E ARBITRAMENTO DE HONORÁRIOS.
RECURSO DA PRIMEIRA REQUERIDA CONHECIDO E DESPROVIDO.
RECURSO DA SEGUNDA REQUERIDA PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESSA EXTENSÃO, DESPROVIDO.
RECURSO DO AUTOR CONHECIDO E PROVIDO. (TJSC, Apelação n. 5011900-55.2024.8.24.0018, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel.
André Carvalho, Terceira Câmara de Direito Civil, j. 15-07-2025). No mesmo rumo: APELAÇÃO CÍVEL.
AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS.
RECURSO DA AUTORA. 1) EMPRÉSTIMO CONSIGNADO EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. AUSÊNCIA DE CONTRATAÇÃO.
DANOS MORAIS.
ILICITUDE DA CONDUTA CARACTERIZADA.
ABALO ANÍMICO NÃO PRESUMIDO.
OBSERVÂNCIA À TESE FIXADA NO IRDR N. 25, DESTA CORTE.
CONSEQUÊNCIAS MAIORES PARA ALÉM DO PRÓPRIO PREJUÍZO MATERIAL. DESCONTO EQUIVALENTE A 8 % (OITO POR CENTO) DOS RENDIMENTOS DA AUTORA.
CONSUMIDORA IDOSA E COM HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA.
IMPUTAÇÃO DA RESPONSABILIDADE SOB A ÓPTICA DA HIPERVULNERABILIDADE.
PREJUÍZO À SUBSISTÊNCIA. DANO MORAL CARACTERIZADO.
SENTENÇA REFORMADA. [...].
RECURSO CONHECIDO EM PARTE E, NESTA EXTENSÃO, PARCIALMENTE PROVIDO. (TJSC, Apelação n. 5009223-82.2024.8.24.0008, do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, rel.
Gerson Cherem II, Terceira Câmara de Direito Civil, j. 01-07-2025). Assim, devidamente comprovada a ocorrência do abalo anímico extraordinário, inquestionável o dever da parte demandada de indenizar o prejuízo de ordem moral causado à requerente, razão porque a Sentença deve ser reformada no ponto para condenar a requerida ao pagamento de indenização por danos morais. Tocante ao valor da indenização por danos morais é preciso salientar que, em virtude da inexistência de parâmetros legais para fixação da verba indenizatória, prepondera na doutrina e jurisprudência o entendimento de que o arbitramento da indenização pelo Magistrado levará em consideração os critérios de razoabilidade e proporcionalidade, além de analisar as peculiaridades do caso concreto. Estabeleceu-se, ainda, a necessidade de analisar-se não só as possibilidades financeiras da parte ofensora - pois a reprimenda deve ser proporcional ao patrimônio material, para que surta efeito inibitório concreto -, mas igualmente da parte ofendida, pois o Direito não tolera o enriquecimento sem causa. Outrossim, importante salientar que, em casos tais, a indenização arbitrada guarda, além do caráter compensatório, também o caráter pedagógico e inibitório, vez que visa precipuamente coibir a continuidade ou repetição de práticas como a que se observou no presente processo judicial. Assim sendo, o montante indenizatório a ser fixado deve respeitar as peculiaridade do caso, levando-se em consideração a extensão do dano impingido ao autor (artigo 944 do Código Civil), mas igualmente o grau de aviltamento dos valores social e constitucionalmente defendidos (artigo 1º, incisos II e III, da Constituição Federal; artigo 5º da Lei de Introdução às Normas de Direito Brasileiro) da dignidade humana e cidadania, tudo conforme a gravidade da ofensa. Dito isso, vê-se, de um lado, uma instituição financeira com expressiva participação no mercado consumidor, valendo-se de elevada capacidade organizacional e grande poderio econômico, que não agiu com diligência ao promover indevidamente o desconto mensal no valor de R$ 115,00 (cento e quinze reais) sobre o benefício previdenciário auferido pela parte requerente, que, por sua vez, corresponde a pouco mais de 1 (um) salário mínimo mensal. De outro, tem-se a demandante, consumidora idosa, inegavelmente vulnerável, em situação de hipossuficiência fática e técnica, que suportou descontos em seus proventos, de forma ilícita, em razão de contrato não formalizado com o demandado. Nesse viés, curial observar a proporcionalidade entre o ato ilícito praticado e os danos morais suportados pelo autor, de modo a compensá-lo de forma razoável e proporcional à extensão do dano e à sua dignidade, sem, contudo, provocar a ruína financeira do ofensor, bem como, imprimir o necessário caráter inibitório e pedagógico visando evitar conduta reincidente por parte da demandada. Assim, ponderadas as particularidades do caso concreto, sopesando-se os critérios da razoabilidade e da proporcionalidade, entende-se que o quantum indenizatório de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), representa valor que está em consonância com a extensão do dano causado, além de guardar o caráter pedagógico e inibidor necessário a reprimenda. Assim, pelas razões expostas, o reclamo deve ser provido no presente particular, para condenar o requerido ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), corrigidos monetariamente pelo IPCA/IBGE (CC, art. 389, parágrafo único) a partir do arbitramento e com incidência de juros de mora pela Taxa Selic (deduzido dos juros o índice de atualização monetária, conforme art. 406, §1º, CC), a partir do evento danoso (Súmula 54, do STJ). Prejudicado o pedido de fixação de honorários recursais, diante do parcial provimento do apelo do demandado. 5.
Da adequação dos ônus sucumbenciais Provido o recurso de apelação da autora para acolher, in totum, os pedidos inaugurais, faz-se necessária a adequação do ônus sucumbencial, condenando o demandado ao pagamento integral das custas processuais e honorários advocatícios de sucumbência (art. 85, do CPC). No caso em tela, houve condenação da parte requerida ao pagamento de indenização por dano moral e material (repetição de indébito), o que deflui no arbitramento dos honorários sucumbenciais com base nos critérios impressos no artigo 85, § 2º, do Código de Processo Civil, verbis: "Art. 85.
A sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor.[...]§ 2º Os honorários serão fixados entre o mínimo de dez e o máximo de vinte por cento sobre o valor da condenação, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da causa, atendidos:I - o grau de zelo do profissional;II - o lugar de prestação do serviço;III - a natureza e a importância da causa;IV - o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço." Desse modo, atentando-se ao tempo despendido na demanda, ao local de prestação do serviço, à qualidade e ao zelo do trabalho efetuado pelos procuradores da parte autora, atendidos os critérios do artigo 85, § 2º, do Código de Processo Civil, arbitram-se os honorários sucumbenciais em 20% (vinte por cento) sobre o valor atualizado da condenação. Ante o exposto, com fulcro nas normas constantes do art. 932 do Código de Processo Civil e do art. 132 do Regimento Interno do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina, conheço do recurso do requerido e dou-lhe parcial provimento, tão somente, para: a) determinar a repetição de indébito de forma simples dos valores descontados anteriormente à data de 30/03/2021, mantida a devolução em dobro para os descontos efetuados após essa data, como também os consectários legais nos termos fixado na sentença de primeiro grau; b) determinar a compensação entre a repetição de indébito e os valores efetivamente creditados em favor da parte autora, acrescidos de correção monetária pelo iCGJ (índice da Corregedoria-Geral da Justiça desta Corte cf.
Circular CGJ/PJSC n. 231/2023) e juros de mora de 1% ao mês, a contar da data do depósito do valor.
Outrossim, conheço do recurso da parte autora e dou-lhe provimento, para condenar o demandado ao pagamento de indenização por danos morais, no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), corrigidos monetariamente pelo IPCA/IBGE (CC, art. 389, parágrafo único) a partir do arbitramento e com incidência de juros de mora pela Taxa Selic (deduzido dos juros o índice de atualização monetária, conforme art. 406, §1º, CC), a partir do evento danoso (Súmula 54, do STJ).
Readequados os ônus sucumbências, condena-se a parte demandada ao pagamento da integralidade das custas processuais e dos honorários advocatícios fixados em 20% (vinte por cento) sobre o valor atualizado da condenação. -
10/09/2025 00:00
Lista de distribuição
Processo 5078093-66.2023.8.24.0930 distribuido para Gab. 03 - 3ª Câmara de Direito Civil - 3ª Câmara de Direito Civil na data de 08/09/2025. -
08/09/2025 19:08
Distribuído por sorteio - Autos com o Relator
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
08/09/2025
Ultima Atualização
17/09/2025
Valor da Causa
R$ 0,00
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