TJRN - 0800682-31.2024.8.20.5600
2ª instância - Câmara / Desembargador(a) Glauber Rego
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Assistente Desinteressado Amicus Curiae
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                                            23/09/2024 00:00 Intimação PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE CÂMARA CRIMINAL Processo: APELAÇÃO CRIMINAL - 0800682-31.2024.8.20.5600 Polo ativo TONY EDUARDO DA SILVA FIGUEIREDO Advogado(s): ALCILEIDE MARQUES DOS SANTOS, PATRICIA PAULA BARROS MOREIRA Polo passivo MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE Advogado(s): Apelação Criminal nº 0800682-31.2024.8.20.5600 Origem: Juízo de Direito da 12ª Vara Criminal da Comarca de Natal/RN Apelante: Tony Eduardo da Silva Figueiredo Advogadas: Alcileide Marques dos Santos - OAB RN 19517 e Patrícia Paula Barros Moreira - OAB/RN nº 4896-E Apelado: Ministério Público Relator: Desembargador Glauber Rêgo EMENTA: PENAL.
 
 PROCESSO PENAL.
 
 ART. 33, CAPUT, DA LEI 11.343/06.
 
 CONDENAÇÃO.
 
 APELAÇÃO CRIMINAL DA DEFESA.
 
 NULIDADE DAS PROVAS ADVINDAS DE INVASÃO DE DOMICÍLIO.
 
 ACOLHIMENTO.
 
 INGRESSO NÃO AUTORIZADO DOS POLICIAIS EM RESIDÊNCIA.
 
 DENÚNCIA ANÔNIMA ISOLADA E DESACOMPANHADA DE OUTRAS DILIGÊNCIAS.
 
 NÃO OCORRÊNCIA DE PRÉVIO E CERTO CENÁRIO DE FLAGRANTE DELITO.
 
 AUSÊNCIA DE FUNDADAS RAZÕES (JUSTA CAUSA) PARA A MEDIDA DE EXCEÇÃO.
 
 TEMA REPETITIVO Nº 1163 DO TRIBUNAL DA CIDADANIA AINDA NÃO JULGADO.
 
 APLICAÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA DA 5ª E 6ª TURMAS DO STJ, BEM COMO, DO STF (TEMA 280 DA REPERCUSSÃO GERAL).
 
 AUSÊNCIA DE MATERIALIDADE DELITIVA.
 
 ABSOLVIÇÃO IMPOSITIVA.
 
 RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.
 
 ACÓRDÃO A Câmara Criminal do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Norte, à UNANIMIDADE de votos, em dissonância com o parecer da 5.ª Procuradoria de Justiça, conheceu e deu provimento ao recurso defensivo para declarar a nulidade da apreensão das drogas mediante invasão de domicílio e, por via de consequência, absolver o réu à luz do art. 386, II, do CPP, vez que inexistente a prova da materialidade do crime, tudo nos termos do voto do Relator, Desembargador GLAUBER RÊGO, sendo acompanhado pelos Desembargadores DR.
 
 ROBERTO GUEDES (JUIZ CONVOCADO - Revisor) e SARAIVA SOBRINHO(Vogal).
 
 RELATÓRIO Trata-se de recurso de Apelação Criminal interposto por Tony Eduardo da Silva Figueiredo em face da sentença prolatada pelo Juízo de Direito da 12ª Vara Criminal da Comarca de Natal/RN que o condenou pela prática do crime previsto no art. 33, caput, da Lei nº 11.343/06, a uma pena privativa de liberdade de 5 anos e 10 meses de reclusão, em regime fechado, e 520 dias-multa.
 
 Nas razões recursais (ID 25929016 - págs. 1 e ss), o apelante postulou: a) o reconhecimento de nulidade do processo em razão das provas obtidas mediante violação de domicílio; b) a desclassificação da conduta para o tipo do art. 28 da Lei de Drogas; c) a redução da pena ao mínimo legal.
 
 Em sede de contrarrazões (ID 26035705 - Págs. 1 e ss), o Ministério Público de primeiro grau requereu o conhecimento e desprovimento do apelo, no que foi seguido pelo parecer da 5ª Procuradoria de Justiça (ID 26096708 - Págs. 1 e ss). É o relatório.
 
 Ao Eminente Revisor.
 
 VOTO Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço do recurso.
 
 Nada obstante esteja pendente de julgamento o Tema Repetitivo 1163 pelo Tribunal da Cidadania[1] (consulta realizada em 06/08/2024), o entendimento que prevalece na jurisprudência acerca da matéria é no sentido de que “1.
 
 O Supremo Tribunal Federal, apreciando o Tema n. 280 da sistemática da repercussão geral, à oportunidade do julgamento do RE n. 603.616/RO, decidiu que, para a adoção da medida de busca e apreensão sem mandado judicial, faz-se necessária a caracterização de justa causa, consubstanciada em fundadas razões que indiquem que, no interior do imóvel, ocorre situação de flagrante delito. 2.
 
 O ingresso regular em domicílio alheio depende, para sua validade e regularidade, da existência de fundadas razões (justa causa) que sinalizem para a possibilidade de mitigação do direito fundamental em questão. É dizer, somente quando o contexto fático anterior à invasão permitir a conclusão acerca da ocorrência de crime no interior da residência, é que se mostra possível sacrificar o direito à inviolabilidade do domicílio.” (AgRg no HC n. 903.235/ES, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 17/6/2024, DJe de 19/6/2024.).
 
 No caso dos autos, o recorrente deve ser absolvido em razão da ausência de materialidade delitiva decorrente da nulidade da apreensão de droga mediante violação de domicílio. É o que se conclui após a detida análise do arcabouço probatório amealhado durante a instrução criminal.
 
 A testemunha Heráclison Lima de Amorim (policial) afirmou que recebeu denúncia de um popular de ocorrência de tráfico de drogas na residência do réu e, ao chegar no local, quando o réu viu a polícia tentou fugir mas conseguiram alcançá-lo fora de casa.
 
 Recordou que a abordagem foi feita fora da residência e “tudo o que foi encontrado estava no bolso dele” (2’40”).
 
 Aduziu que, diante do flagrante, entendeu ser desnecessária a autorização dos moradores e adentraram na residência do réu, mas nada de ilícito foi encontrado.
 
 Assinalou que não tinha conhecimento sobre a vida pregressa do réu antes da abordagem e que não tinha informações de que o réu trabalhava para outros traficantes.
 
 A testemunha Marcelo de Lima (policial) asseverou que recebeu denúncia de um transeunte acerca de tráfico de drogas na casa do réu e foi averiguar.
 
 Quando chegou na casa do réu, ele tentou entrar, mas conseguiram fazer a abordagem fora de casa.
 
 Asseverou que o réu “estava com um pé fora e como se fosse com um pé dentro.
 
 E quando ele viu a gente ele já tentou entrar, né, rapidamente.
 
 Aí foi quando a gente o chamou para que saísse e foi feita a abordagem ao mesmo” (7’10”).
 
 Informou que, como foi encontrada droga com ele, adentraram na residência com o fim de verificar se o acusado havia jogado alguma coisa para dentro da casa, mas não foi achado nada de ilegal.
 
 Nesse ponto, é de se destacar a inconsistência dos depoimentos dos policiais quando afirmam num momento que conseguiram alcançar o réu fora de casa (policial Heráclison Lima de Amorim) e, em outro, que o réu foi chamado para fora de casa (policial Marcelo de Lima) ou seja, o réu efetivamente estava dentro de casa no momento dos fatos.
 
 Ao seu turno, a declarante Sayonara Silva de Barros (companheira do acusado) disse que, no momento dos fatos, estava na cozinha e o réu no sofá carregando a tornozeleira e quando viu já foi os policiais dentro de casa.
 
 Afirmou que a câmera de sua casa (na qual funciona um pequeno comércio) foi desligada.
 
 Detalhou que a sua casa fica com a porta aberta, porque ela tem uma pequena mercearia e o sofá fica logo em frente a porta de entrada.
 
 Asseverou que ninguém autorizou a entrada dos policiais e o réu foi preso porque foi encontrada a droga no bolso dele, destacando que ele é viciado em cocaína.
 
 Já a testemunha Hildernaly da Silva Ribeiro (vizinha do acusado) afirmou que estava na calçada de casa e no momento dos fatos e já viu os policiais dentro da casa do réu.
 
 Noticiou que o réu estava no sofá dentro de casa e que perguntou para a filha do réu o que havia acontecido, tendo a adolescente respondido que tinha sido a polícia.
 
 Ressaltou que depois “os dois [policiais] já estavam lá dentro e o outro [policial] fora com ele [réu]” porque tinham mandado o réu sair (4’30”).
 
 Por fim, o acusado, em seu interrogatório judicial, asseverou que estava em casa carregando a tornozeleira eletrônica quando chegaram os policiais e abordaram um rapaz que estava comprovando alguma coisa na loja de sua esposa (que fica na sala da casa do réu).
 
 Disse que, quando os policiais viram o réu carregando a tornozeleira no sofá, invadiram a casa, puxaram o réu pela camisa e fizeram a revista pessoal, oportunidade em que acharam cocaína em seu bolso.
 
 A análise verticalizada dos depoimentos acima demonstra que os policiais foram averiguar possível ocorrência de tráfico de drogas na residência do acusado e lá chegando, sem qualquer indício aparente de prática delitiva, tão somente pela “atitude suspeita” do acusado em entrar em sua casa quando visualizou os policiais, estes interpretaram haver situação justificadora do ingresso na residência do réu, independentemente de mandado judicial ou de consentimento do morador.
 
 A escorar a conclusão acima, deve ser ressaltado que, no momento da abordagem policial, não foi encontrada droga com a pessoa que estava no comércio que fica na casa do réu (vide fotos de págs 49 e ss), o que poderia até servir de forte indício da prática da mercancia ilícita de entorpecente e, em tese, justificar o ingresso no imóvel.
 
 Destaque-se também que não há notícias de prévia investigação (campanas, fotos, vídeos etc) ou medidas cautelares de exceção (quebra de sigilo telemático) que, minimamente, apontassem para a suposta traficância exercida pelo acusado e que servissem de indício para a entrada forçada em domicílio.
 
 Ademais, as imagens da câmera de segurança da residência do acusado (IDs 25476311 e 25476311) mostram a chegada dos 3 policiais em frente a casa do réu, mas não mostram o acusado do lado de fora do portão/porta da residência (o que parece fragilizar a versão de que o acusado estava do lado de fora quando da chegada dos policiais).
 
 Por fim, não se pode olvidar que os policiais não documentaram a diligência através de vídeo (o que não se afigurava difícil já que estavam em número de 3), providência essa que poderia dirimir eventual dúvidas acerca de como se deu a diligência.
 
 O proceder dos agentes de segurança em invadir a residência do acusado com base em meras suspeitas (denúncia anônima e atitude do acusado de, segundo os policiais, entrar em sua casa quando visualizou os agentes de segurança) colide com a jurisprudência da 5ª e da 6ª Turmas do STJ, sentido de que, mutatis mutandis: “PROCESSO PENAL.
 
 AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL.
 
 AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL CONHECIDO PARA DAR PROVIMENTO AO RECURSO ESPECIAL DA DEFESA.
 
 VIOLAÇÃO DE DOMICÍLIO.
 
 INGRESSO PRECEDIDO APENAS DE DENÚNCIA ANÔNIMA.
 
 AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA.
 
 ABSOLVIÇÃO DA AGRAVADA.
 
 INCONFORMISMO DO MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL.
 
 AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1.
 
 O Tribunal a quo reconheceu a validade da busca domiciliar, ao fundamento de que havia fundada razão para o ingresso dos policiais no domicílio da acusada, consubstanciada em denúncia anônima que teria especificado o endereço da ocorrência da prática de tráfico de drogas e ilustrado a prática delitiva por escambo (informação de que uma pessoa não identificada, na mesma data, teria trocado um aparelho televisor por drogas). 2.
 
 Todavia, nos termos da jurisprudência desta Corte, a denúncia anônima, isoladamente, não constitui justa causa para entrada forçada de agentes estatais em domicílio.
 
 Precedentes. 3. À míngua de prévia apuração da procedência da denúncia anônima, com efetiva obtenção de elementos indicativos da ocorrência do tráfico no interior da casa, forçoso reconhecer a ausência de justa causa necessária para a entrada no domicílio dos acusados. 4.
 
 No que se refere à alegação do agravante de que teria havido consentimento dos moradores da casa, não se verifica no acórdão recorrido, tampouco na sentença, a configuração de tal hipótese.
 
 Ao contrário, pelo depoimento extrajudicial do corréu, transcrito na sentença, os policiais teriam invadido a casa. 5.
 
 Reitera-se que, na hipótese dos autos, impõe-se reconhecer a nulidade das provas que ampararam a condenação da agravada e do corréu, pois obtidas mediante invasão do domicílio.
 
 E, nesse passo, inexistindo prova da materialidade do crime, em face da ilicitude da apreensão das drogas, deve ser a agravada absolvida, nos termos do art. 386, II, do Código de Processo Penal - CPP. 6.
 
 Agravo regimental desprovido. (AgRg no AREsp n. 2.356.254/MS, relator Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, julgado em 7/5/2024, DJe de 13/5/2024.)” “AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL.
 
 PROCESSO PENAL.
 
 TRÁFICO DE ENTORPECENTES.
 
 NULIDADE.
 
 INVASÃO DE DOMICÍLIO.
 
 AUSÊNCIA DE FUNDADAS RAZÕES PARA O INGRESSO.
 
 BUSCA PESSOAL OU VEICULAR.
 
 NECESSIDADE DE VISUALIZAÇÃO DE CORPO DE DELITO.
 
 NÃO OCORRÊNCIA.
 
 AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1.
 
 O Supremo Tribunal Federal, por ocasião do julgamento do RE n. 603.616/RO, submetido à sistemática da repercussão geral, firmou o entendimento de que a "entrada forçada em domicílio sem mandado judicial só é lícita, mesmo em período noturno, quando amparada em fundadas razões, devidamente justificadas a posteriori, que indiquem que dentro da casa ocorre situação de flagrante delito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade, e de nulidade dos atos praticados". 2.
 
 O Ministro Rogerio Schietti Cruz, ao discorrer acerca da controvérsia objeto desta irresignação no REsp n. 1.574.681/RS, bem destacou que "a ausência de justificativas e de elementos seguros a legitimar a ação dos agentes públicos, diante da discricionariedade policial na identificação de situações suspeitas relativas à ocorrência de tráfico de drogas, pode fragilizar e tornar írrito o direito à intimidade e à inviolabilidade domiciliar" (Sexta Turma, julgado em 20/4/2017, DJe 30/5/2017). 3.
 
 Ademais, a própria Suprema Corte tem entendido que são necessárias prévias razões para tão grave invasão do domínio da privacidade do agente, exigindo-se que "essas razões sejam fundadas, para além de uma mera e subjetiva suspeita, no que se sabia antes, e não depois, da diligência" (RE n. 1.474.190/RJ, relator Ministro André Mendonça, julgado em 16/4/2024, DJe 16/4/2024, grifei). 4.
 
 No caso, a diligência apoiou-se em meras denúncias anônimas e no comportamento suspeito do acusado, que tentou empreender fuga no momento da abordagem, o que motivou a busca pessoal, em que foram encontrados 19g (dezenove gramas) de maconha em posse do agente, e o posterior ingresso na residência, onde localizados 135g (cento e trinta e cinco gramas) da mesma droga. 5.
 
 Esta Sexta Turma tem diversos julgados no sentido de que a apreensão de drogas em posse de um agente não torna prescindível a necessidade de mandado judicial para a invasão de domicílio, porquanto o fato de o suspeito estar com restrição ambulatorial - ainda que momentaneamente, uma vez que detido em flagrante - afasta qualquer possibilidade de que esteja, naquele momento, causando risco à investigação. 6.
 
 Agravo regimental desprovido. (AgRg no REsp n. 2.132.520/RS, relator Ministro Antonio Saldanha Palheiro, Sexta Turma, julgado em 24/6/2024, DJe de 27/6/2024.)” Em reforço aos argumentos acima, registre-se que, em harmonia com o entendimento firmado no julgamento do RE n. 603.616/RO, submetido à sistemática da repercussão geral (Tema 280), o Ministro Gilmar Mendes, no RE 1.475.414 (decisão publicada em 20/02/2024), negou provimento ao recurso manejado pelo Ministério Público contra decisão da 6ª Turma do STJ que havia negado provimento ao agravo regimental acusatório ao argumento de que: “(...) as razões delineadas na decisão agravada são bastantes a demonstrar a ilegalidade da abordagem realizada na hipótese, por estar motivada na existência de notícias anônimas acerca da prática do crime de tráfico de drogas na localidade, seguida da apreensão de um rádio comunicador e um celular em posse de terceiros (sem a localização de nenhuma porção de drogas com eles), que supostamente confessaram seu envolvimento com o tráfico de drogas, subordinados ao ora agravado, e indicaram o local em que os entorpecentes estariam armazenados e poderiam ser encontrados.
 
 Como já sinalizado, a autoridade policial não realizou nenhuma diligência prévia para corroborar as supostas informações recebidas, tampouco solicitou autorização para ingressar no imóvel – já que adentrou por uma grade aberta. (...) Conforme visto, segundo o Tribunal a quo, as provas obtidas por meio do ingresso dos policiais no domicílio do acusado seriam lícitas essencialmente porque o tráfico de drogas é crime de natureza permanente, cujo flagrante se protrai no tempo.
 
 No entanto, ao contrário do que concluiu o Tribunal de origem, reputo seriam ilícitos os elementos de informação obtidos em desfavor do réu.
 
 Senão vejamos. (...) No caso dos autos, como visto, não há sequer referência a eventual autorização de algum dos moradores da residência para o ingresso dos policiais em seu domicílio.
 
 Ao contrário, a moldura fática extraída dos autos evidencia que os agentes ali ingressaram sem anunciar sua chegada, tampouco pedir que alguma das pessoas que ali estava autorizasse sua entrada.
 
 Portanto, uma vez que, no caso dos autos, não há nem sequer como inferir que o réu estivesse praticando o delito de tráfico de drogas, ou mesmo outro ato de caráter permanente, no interior da residência onde se homiziou, entendo não haver razão séria para a mitigação da inviolabilidade do domicílio, ainda que tenha havido posterior descoberta e apreensão, em sua residência, de substâncias entorpecentes, sob pena de esvaziar-se essa franquia constitucional da mais alta importância.
 
 Diante de tais considerações, tenho que a descoberta a posteriori de uma situação de flagrante decorreu de ingresso ilícito na moradia do acusado, em violação a norma constitucional que consagra direito fundamental à inviolabilidade do domicílio, o que torna imprestável, no caso concreto, a prova ilicitamente obtida e, por conseguinte, todos os atos dela decorrentes e a própria ação penal – relativa ao delito descrito no art. 33 da Lei n. 11.343/2006 –, porque apoiada exclusivamente nessa diligência policial.
 
 A propósito, faço lembrar que a essência da Teoria dos Frutos da Árvore Envenenada (melhor seria dizer venenosa, tradução da fruits of the poisonous tree doctrine, de origem norte-americana), consagrada no art. 5º, LVI, da nossa Constituição da República, repudia as provas supostamente lícitas e admissíveis, obtidas, porém, a partir de outra contaminada por ilicitude original. (...)’ No mesmo sentido: RE 1.429.613/GO, por mim relatado, DJe 5.6.2023; RHC 207.459/SP, por mim relatado, Segunda Turma, DJe 18.5.2023; RE 1.448.918/SC, por mim relatado, DJe 29.9.2023; recentemente: RE 1.447.084 AgR/RS, Rel.
 
 Min.
 
 Dias Toffoli, Segunda Turma, DJe 4.12.2023; RE 1.447.026 AgR/RS, Rel.
 
 Min.
 
 Dias Toffoli, Segunda Turma, DJe 8.1.2024; dentre outros.” Deve ser ressaltado que o julgado do STJ colacionado na sentença de primeiro grau (AgRg no HC n. 841.369/AL, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 30/11/2023, DJe de 5/12/2023) para afastar a ocorrência da invasão de domicílio tinha como premissa a anuência expressa do morador para o ingresso no imóvel.
 
 Cenário completamente diverso do presente, no qual nenhum dos depoentes, nem de longe, afirmou ou deixou nas entrelinhas que houve a concordância para o ingresso dos agentes de segurança na casa do apelante.
 
 Aliás, o próprio policial Heráclison Lima de Amorim quando indagado acerca do ponto afirmou ser desnecessária a autorização dos moradores (porquanto tinha sido encontrada droga com o réu) e entraram no imóvel.
 
 Nessa ordem de considerações, urge o reconhecimento da nulidade arguida pela defesa, trazendo a reboque: a) a declaração da absolvição do acusado por não existir prova da materialidade delitiva, bem como, b) a prejudicialidade da análise dos demais pleitos recursais.
 
 Diante do exposto, em dissonância com o parecer da 5.ª Procuradoria de Justiça, conheço e dou provimento ao recurso defensivo para declarar a nulidade da apreensão das drogas mediante invasão de domicílio e, por via de consequência, absolver o réu à luz do art. 386, II, do CPP, vez que inexistente a prova da materialidade do crime, tudo nos termos da fundamentação acima. É como voto.
 
 Natal/RN, data e hora do sistema.
 
 Desembargador Glauber Rêgo Relator [1] “RECURSO ESPECIAL.
 
 PROPOSTA DE JULGAMENTO SOB O RITO DOS RECURSOS REPETITIVOS.
 
 INVASÃO DE DOMICÍLIO.
 
 FUGA DO RÉU E/OU DENÚNCIA ANÔNIMA.
 
 EXISTÊNCIA OU NÃO DE JUSTA CAUSA.
 
 RELEVÂNCIA DA TESE A SER DEFINIDA. 1.
 
 Tema sob afetação: Analisar se a simples fuga do réu para dentro da residência ao avistar os agentes estatais e/ou a mera existência de denúncia anônima acerca da possível prática de delito no interior do domicílio, desacompanhada de outros elementos preliminares indicativos de crime, constituem ou não, por si sós, fundadas razões (justa causa) a autorizar o ingresso dos policiais em seu domicílio, sem prévia autorização judicial e sem o consentimento válido do morador. 2.
 
 A multiplicidade de hipóteses semelhantes julgadas por ambas as Turmas que compõem a Terceira Seção justifica, de per si, a proposta de afetação (ex vi do art. 1.036 do Código de Processo Civil). 3.
 
 Recurso especial submetido à Terceira Seção, a fim de que o seu julgamento seja submetido ao rito dos recursos repetitivos, de sorte a definir tese sobre a existência ou não de justa causa a autorizar o ingresso dos policiais em domicílio alheio, sem prévia autorização judicial e sem o consentimento válido do morador, nas hipóteses em que o réu empreende fuga para dentro da residência ao avistar os agentes estatais e/ou quando há denúncia anônima acerca da possível prática de delito no interior do domicílio, desacompanhada de outros elementos preliminares indicativos de crime. (ProAfR no REsp n. 1.990.972/MG, relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Terceira Seção, julgado em 30/8/2022, DJe de 1/9/2022.)” Natal/RN, 12 de Setembro de 2024.
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                                            13/09/2024 00:00 Intimação PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE CÂMARA CRIMINAL Processo: APELAÇÃO CRIMINAL - 0800682-31.2024.8.20.5600 Polo ativo TONY EDUARDO DA SILVA FIGUEIREDO Advogado(s): ALCILEIDE MARQUES DOS SANTOS, PATRICIA PAULA BARROS MOREIRA Polo passivo MINISTERIO PUBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE Advogado(s): Apelação Criminal nº 0800682-31.2024.8.20.5600 Origem: Juízo de Direito da 12ª Vara Criminal da Comarca de Natal/RN Apelante: Tony Eduardo da Silva Figueiredo Advogadas: Alcileide Marques dos Santos - OAB RN 19517 e Patrícia Paula Barros Moreira - OAB/RN nº 4896-E Apelado: Ministério Público Relator: Desembargador Glauber Rêgo EMENTA: PENAL.
 
 PROCESSO PENAL.
 
 ART. 33, CAPUT, DA LEI 11.343/06.
 
 CONDENAÇÃO.
 
 APELAÇÃO CRIMINAL DA DEFESA.
 
 NULIDADE DAS PROVAS ADVINDAS DE INVASÃO DE DOMICÍLIO.
 
 ACOLHIMENTO.
 
 INGRESSO NÃO AUTORIZADO DOS POLICIAIS EM RESIDÊNCIA.
 
 DENÚNCIA ANÔNIMA ISOLADA E DESACOMPANHADA DE OUTRAS DILIGÊNCIAS.
 
 NÃO OCORRÊNCIA DE PRÉVIO E CERTO CENÁRIO DE FLAGRANTE DELITO.
 
 AUSÊNCIA DE FUNDADAS RAZÕES (JUSTA CAUSA) PARA A MEDIDA DE EXCEÇÃO.
 
 TEMA REPETITIVO Nº 1163 DO TRIBUNAL DA CIDADANIA AINDA NÃO JULGADO.
 
 APLICAÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA DA 5ª E 6ª TURMAS DO STJ, BEM COMO, DO STF (TEMA 280 DA REPERCUSSÃO GERAL).
 
 AUSÊNCIA DE MATERIALIDADE DELITIVA.
 
 ABSOLVIÇÃO IMPOSITIVA.
 
 RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.
 
 ACÓRDÃO A Câmara Criminal do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Norte, à UNANIMIDADE de votos, em dissonância com o parecer da 5.ª Procuradoria de Justiça, conheceu e deu provimento ao recurso defensivo para declarar a nulidade da apreensão das drogas mediante invasão de domicílio e, por via de consequência, absolver o réu à luz do art. 386, II, do CPP, vez que inexistente a prova da materialidade do crime, tudo nos termos do voto do Relator, Desembargador GLAUBER RÊGO, sendo acompanhado pelos Desembargadores DR.
 
 ROBERTO GUEDES (JUIZ CONVOCADO - Revisor) e SARAIVA SOBRINHO(Vogal).
 
 RELATÓRIO Trata-se de recurso de Apelação Criminal interposto por Tony Eduardo da Silva Figueiredo em face da sentença prolatada pelo Juízo de Direito da 12ª Vara Criminal da Comarca de Natal/RN que o condenou pela prática do crime previsto no art. 33, caput, da Lei nº 11.343/06, a uma pena privativa de liberdade de 5 anos e 10 meses de reclusão, em regime fechado, e 520 dias-multa.
 
 Nas razões recursais (ID 25929016 - págs. 1 e ss), o apelante postulou: a) o reconhecimento de nulidade do processo em razão das provas obtidas mediante violação de domicílio; b) a desclassificação da conduta para o tipo do art. 28 da Lei de Drogas; c) a redução da pena ao mínimo legal.
 
 Em sede de contrarrazões (ID 26035705 - Págs. 1 e ss), o Ministério Público de primeiro grau requereu o conhecimento e desprovimento do apelo, no que foi seguido pelo parecer da 5ª Procuradoria de Justiça (ID 26096708 - Págs. 1 e ss). É o relatório.
 
 Ao Eminente Revisor.
 
 VOTO Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço do recurso.
 
 Nada obstante esteja pendente de julgamento o Tema Repetitivo 1163 pelo Tribunal da Cidadania[1] (consulta realizada em 06/08/2024), o entendimento que prevalece na jurisprudência acerca da matéria é no sentido de que “1.
 
 O Supremo Tribunal Federal, apreciando o Tema n. 280 da sistemática da repercussão geral, à oportunidade do julgamento do RE n. 603.616/RO, decidiu que, para a adoção da medida de busca e apreensão sem mandado judicial, faz-se necessária a caracterização de justa causa, consubstanciada em fundadas razões que indiquem que, no interior do imóvel, ocorre situação de flagrante delito. 2.
 
 O ingresso regular em domicílio alheio depende, para sua validade e regularidade, da existência de fundadas razões (justa causa) que sinalizem para a possibilidade de mitigação do direito fundamental em questão. É dizer, somente quando o contexto fático anterior à invasão permitir a conclusão acerca da ocorrência de crime no interior da residência, é que se mostra possível sacrificar o direito à inviolabilidade do domicílio.” (AgRg no HC n. 903.235/ES, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 17/6/2024, DJe de 19/6/2024.).
 
 No caso dos autos, o recorrente deve ser absolvido em razão da ausência de materialidade delitiva decorrente da nulidade da apreensão de droga mediante violação de domicílio. É o que se conclui após a detida análise do arcabouço probatório amealhado durante a instrução criminal.
 
 A testemunha Heráclison Lima de Amorim (policial) afirmou que recebeu denúncia de um popular de ocorrência de tráfico de drogas na residência do réu e, ao chegar no local, quando o réu viu a polícia tentou fugir mas conseguiram alcançá-lo fora de casa.
 
 Recordou que a abordagem foi feita fora da residência e “tudo o que foi encontrado estava no bolso dele” (2’40”).
 
 Aduziu que, diante do flagrante, entendeu ser desnecessária a autorização dos moradores e adentraram na residência do réu, mas nada de ilícito foi encontrado.
 
 Assinalou que não tinha conhecimento sobre a vida pregressa do réu antes da abordagem e que não tinha informações de que o réu trabalhava para outros traficantes.
 
 A testemunha Marcelo de Lima (policial) asseverou que recebeu denúncia de um transeunte acerca de tráfico de drogas na casa do réu e foi averiguar.
 
 Quando chegou na casa do réu, ele tentou entrar, mas conseguiram fazer a abordagem fora de casa.
 
 Asseverou que o réu “estava com um pé fora e como se fosse com um pé dentro.
 
 E quando ele viu a gente ele já tentou entrar, né, rapidamente.
 
 Aí foi quando a gente o chamou para que saísse e foi feita a abordagem ao mesmo” (7’10”).
 
 Informou que, como foi encontrada droga com ele, adentraram na residência com o fim de verificar se o acusado havia jogado alguma coisa para dentro da casa, mas não foi achado nada de ilegal.
 
 Nesse ponto, é de se destacar a inconsistência dos depoimentos dos policiais quando afirmam num momento que conseguiram alcançar o réu fora de casa (policial Heráclison Lima de Amorim) e, em outro, que o réu foi chamado para fora de casa (policial Marcelo de Lima) ou seja, o réu efetivamente estava dentro de casa no momento dos fatos.
 
 Ao seu turno, a declarante Sayonara Silva de Barros (companheira do acusado) disse que, no momento dos fatos, estava na cozinha e o réu no sofá carregando a tornozeleira e quando viu já foi os policiais dentro de casa.
 
 Afirmou que a câmera de sua casa (na qual funciona um pequeno comércio) foi desligada.
 
 Detalhou que a sua casa fica com a porta aberta, porque ela tem uma pequena mercearia e o sofá fica logo em frente a porta de entrada.
 
 Asseverou que ninguém autorizou a entrada dos policiais e o réu foi preso porque foi encontrada a droga no bolso dele, destacando que ele é viciado em cocaína.
 
 Já a testemunha Hildernaly da Silva Ribeiro (vizinha do acusado) afirmou que estava na calçada de casa e no momento dos fatos e já viu os policiais dentro da casa do réu.
 
 Noticiou que o réu estava no sofá dentro de casa e que perguntou para a filha do réu o que havia acontecido, tendo a adolescente respondido que tinha sido a polícia.
 
 Ressaltou que depois “os dois [policiais] já estavam lá dentro e o outro [policial] fora com ele [réu]” porque tinham mandado o réu sair (4’30”).
 
 Por fim, o acusado, em seu interrogatório judicial, asseverou que estava em casa carregando a tornozeleira eletrônica quando chegaram os policiais e abordaram um rapaz que estava comprovando alguma coisa na loja de sua esposa (que fica na sala da casa do réu).
 
 Disse que, quando os policiais viram o réu carregando a tornozeleira no sofá, invadiram a casa, puxaram o réu pela camisa e fizeram a revista pessoal, oportunidade em que acharam cocaína em seu bolso.
 
 A análise verticalizada dos depoimentos acima demonstra que os policiais foram averiguar possível ocorrência de tráfico de drogas na residência do acusado e lá chegando, sem qualquer indício aparente de prática delitiva, tão somente pela “atitude suspeita” do acusado em entrar em sua casa quando visualizou os policiais, estes interpretaram haver situação justificadora do ingresso na residência do réu, independentemente de mandado judicial ou de consentimento do morador.
 
 A escorar a conclusão acima, deve ser ressaltado que, no momento da abordagem policial, não foi encontrada droga com a pessoa que estava no comércio que fica na casa do réu (vide fotos de págs 49 e ss), o que poderia até servir de forte indício da prática da mercancia ilícita de entorpecente e, em tese, justificar o ingresso no imóvel.
 
 Destaque-se também que não há notícias de prévia investigação (campanas, fotos, vídeos etc) ou medidas cautelares de exceção (quebra de sigilo telemático) que, minimamente, apontassem para a suposta traficância exercida pelo acusado e que servissem de indício para a entrada forçada em domicílio.
 
 Ademais, as imagens da câmera de segurança da residência do acusado (IDs 25476311 e 25476311) mostram a chegada dos 3 policiais em frente a casa do réu, mas não mostram o acusado do lado de fora do portão/porta da residência (o que parece fragilizar a versão de que o acusado estava do lado de fora quando da chegada dos policiais).
 
 Por fim, não se pode olvidar que os policiais não documentaram a diligência através de vídeo (o que não se afigurava difícil já que estavam em número de 3), providência essa que poderia dirimir eventual dúvidas acerca de como se deu a diligência.
 
 O proceder dos agentes de segurança em invadir a residência do acusado com base em meras suspeitas (denúncia anônima e atitude do acusado de, segundo os policiais, entrar em sua casa quando visualizou os agentes de segurança) colide com a jurisprudência da 5ª e da 6ª Turmas do STJ, sentido de que, mutatis mutandis: “PROCESSO PENAL.
 
 AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL.
 
 AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL CONHECIDO PARA DAR PROVIMENTO AO RECURSO ESPECIAL DA DEFESA.
 
 VIOLAÇÃO DE DOMICÍLIO.
 
 INGRESSO PRECEDIDO APENAS DE DENÚNCIA ANÔNIMA.
 
 AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA.
 
 ABSOLVIÇÃO DA AGRAVADA.
 
 INCONFORMISMO DO MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL.
 
 AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1.
 
 O Tribunal a quo reconheceu a validade da busca domiciliar, ao fundamento de que havia fundada razão para o ingresso dos policiais no domicílio da acusada, consubstanciada em denúncia anônima que teria especificado o endereço da ocorrência da prática de tráfico de drogas e ilustrado a prática delitiva por escambo (informação de que uma pessoa não identificada, na mesma data, teria trocado um aparelho televisor por drogas). 2.
 
 Todavia, nos termos da jurisprudência desta Corte, a denúncia anônima, isoladamente, não constitui justa causa para entrada forçada de agentes estatais em domicílio.
 
 Precedentes. 3. À míngua de prévia apuração da procedência da denúncia anônima, com efetiva obtenção de elementos indicativos da ocorrência do tráfico no interior da casa, forçoso reconhecer a ausência de justa causa necessária para a entrada no domicílio dos acusados. 4.
 
 No que se refere à alegação do agravante de que teria havido consentimento dos moradores da casa, não se verifica no acórdão recorrido, tampouco na sentença, a configuração de tal hipótese.
 
 Ao contrário, pelo depoimento extrajudicial do corréu, transcrito na sentença, os policiais teriam invadido a casa. 5.
 
 Reitera-se que, na hipótese dos autos, impõe-se reconhecer a nulidade das provas que ampararam a condenação da agravada e do corréu, pois obtidas mediante invasão do domicílio.
 
 E, nesse passo, inexistindo prova da materialidade do crime, em face da ilicitude da apreensão das drogas, deve ser a agravada absolvida, nos termos do art. 386, II, do Código de Processo Penal - CPP. 6.
 
 Agravo regimental desprovido. (AgRg no AREsp n. 2.356.254/MS, relator Ministro Joel Ilan Paciornik, Quinta Turma, julgado em 7/5/2024, DJe de 13/5/2024.)” “AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL.
 
 PROCESSO PENAL.
 
 TRÁFICO DE ENTORPECENTES.
 
 NULIDADE.
 
 INVASÃO DE DOMICÍLIO.
 
 AUSÊNCIA DE FUNDADAS RAZÕES PARA O INGRESSO.
 
 BUSCA PESSOAL OU VEICULAR.
 
 NECESSIDADE DE VISUALIZAÇÃO DE CORPO DE DELITO.
 
 NÃO OCORRÊNCIA.
 
 AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1.
 
 O Supremo Tribunal Federal, por ocasião do julgamento do RE n. 603.616/RO, submetido à sistemática da repercussão geral, firmou o entendimento de que a "entrada forçada em domicílio sem mandado judicial só é lícita, mesmo em período noturno, quando amparada em fundadas razões, devidamente justificadas a posteriori, que indiquem que dentro da casa ocorre situação de flagrante delito, sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade, e de nulidade dos atos praticados". 2.
 
 O Ministro Rogerio Schietti Cruz, ao discorrer acerca da controvérsia objeto desta irresignação no REsp n. 1.574.681/RS, bem destacou que "a ausência de justificativas e de elementos seguros a legitimar a ação dos agentes públicos, diante da discricionariedade policial na identificação de situações suspeitas relativas à ocorrência de tráfico de drogas, pode fragilizar e tornar írrito o direito à intimidade e à inviolabilidade domiciliar" (Sexta Turma, julgado em 20/4/2017, DJe 30/5/2017). 3.
 
 Ademais, a própria Suprema Corte tem entendido que são necessárias prévias razões para tão grave invasão do domínio da privacidade do agente, exigindo-se que "essas razões sejam fundadas, para além de uma mera e subjetiva suspeita, no que se sabia antes, e não depois, da diligência" (RE n. 1.474.190/RJ, relator Ministro André Mendonça, julgado em 16/4/2024, DJe 16/4/2024, grifei). 4.
 
 No caso, a diligência apoiou-se em meras denúncias anônimas e no comportamento suspeito do acusado, que tentou empreender fuga no momento da abordagem, o que motivou a busca pessoal, em que foram encontrados 19g (dezenove gramas) de maconha em posse do agente, e o posterior ingresso na residência, onde localizados 135g (cento e trinta e cinco gramas) da mesma droga. 5.
 
 Esta Sexta Turma tem diversos julgados no sentido de que a apreensão de drogas em posse de um agente não torna prescindível a necessidade de mandado judicial para a invasão de domicílio, porquanto o fato de o suspeito estar com restrição ambulatorial - ainda que momentaneamente, uma vez que detido em flagrante - afasta qualquer possibilidade de que esteja, naquele momento, causando risco à investigação. 6.
 
 Agravo regimental desprovido. (AgRg no REsp n. 2.132.520/RS, relator Ministro Antonio Saldanha Palheiro, Sexta Turma, julgado em 24/6/2024, DJe de 27/6/2024.)” Em reforço aos argumentos acima, registre-se que, em harmonia com o entendimento firmado no julgamento do RE n. 603.616/RO, submetido à sistemática da repercussão geral (Tema 280), o Ministro Gilmar Mendes, no RE 1.475.414 (decisão publicada em 20/02/2024), negou provimento ao recurso manejado pelo Ministério Público contra decisão da 6ª Turma do STJ que havia negado provimento ao agravo regimental acusatório ao argumento de que: “(...) as razões delineadas na decisão agravada são bastantes a demonstrar a ilegalidade da abordagem realizada na hipótese, por estar motivada na existência de notícias anônimas acerca da prática do crime de tráfico de drogas na localidade, seguida da apreensão de um rádio comunicador e um celular em posse de terceiros (sem a localização de nenhuma porção de drogas com eles), que supostamente confessaram seu envolvimento com o tráfico de drogas, subordinados ao ora agravado, e indicaram o local em que os entorpecentes estariam armazenados e poderiam ser encontrados.
 
 Como já sinalizado, a autoridade policial não realizou nenhuma diligência prévia para corroborar as supostas informações recebidas, tampouco solicitou autorização para ingressar no imóvel – já que adentrou por uma grade aberta. (...) Conforme visto, segundo o Tribunal a quo, as provas obtidas por meio do ingresso dos policiais no domicílio do acusado seriam lícitas essencialmente porque o tráfico de drogas é crime de natureza permanente, cujo flagrante se protrai no tempo.
 
 No entanto, ao contrário do que concluiu o Tribunal de origem, reputo seriam ilícitos os elementos de informação obtidos em desfavor do réu.
 
 Senão vejamos. (...) No caso dos autos, como visto, não há sequer referência a eventual autorização de algum dos moradores da residência para o ingresso dos policiais em seu domicílio.
 
 Ao contrário, a moldura fática extraída dos autos evidencia que os agentes ali ingressaram sem anunciar sua chegada, tampouco pedir que alguma das pessoas que ali estava autorizasse sua entrada.
 
 Portanto, uma vez que, no caso dos autos, não há nem sequer como inferir que o réu estivesse praticando o delito de tráfico de drogas, ou mesmo outro ato de caráter permanente, no interior da residência onde se homiziou, entendo não haver razão séria para a mitigação da inviolabilidade do domicílio, ainda que tenha havido posterior descoberta e apreensão, em sua residência, de substâncias entorpecentes, sob pena de esvaziar-se essa franquia constitucional da mais alta importância.
 
 Diante de tais considerações, tenho que a descoberta a posteriori de uma situação de flagrante decorreu de ingresso ilícito na moradia do acusado, em violação a norma constitucional que consagra direito fundamental à inviolabilidade do domicílio, o que torna imprestável, no caso concreto, a prova ilicitamente obtida e, por conseguinte, todos os atos dela decorrentes e a própria ação penal – relativa ao delito descrito no art. 33 da Lei n. 11.343/2006 –, porque apoiada exclusivamente nessa diligência policial.
 
 A propósito, faço lembrar que a essência da Teoria dos Frutos da Árvore Envenenada (melhor seria dizer venenosa, tradução da fruits of the poisonous tree doctrine, de origem norte-americana), consagrada no art. 5º, LVI, da nossa Constituição da República, repudia as provas supostamente lícitas e admissíveis, obtidas, porém, a partir de outra contaminada por ilicitude original. (...)’ No mesmo sentido: RE 1.429.613/GO, por mim relatado, DJe 5.6.2023; RHC 207.459/SP, por mim relatado, Segunda Turma, DJe 18.5.2023; RE 1.448.918/SC, por mim relatado, DJe 29.9.2023; recentemente: RE 1.447.084 AgR/RS, Rel.
 
 Min.
 
 Dias Toffoli, Segunda Turma, DJe 4.12.2023; RE 1.447.026 AgR/RS, Rel.
 
 Min.
 
 Dias Toffoli, Segunda Turma, DJe 8.1.2024; dentre outros.” Deve ser ressaltado que o julgado do STJ colacionado na sentença de primeiro grau (AgRg no HC n. 841.369/AL, relator Ministro Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, julgado em 30/11/2023, DJe de 5/12/2023) para afastar a ocorrência da invasão de domicílio tinha como premissa a anuência expressa do morador para o ingresso no imóvel.
 
 Cenário completamente diverso do presente, no qual nenhum dos depoentes, nem de longe, afirmou ou deixou nas entrelinhas que houve a concordância para o ingresso dos agentes de segurança na casa do apelante.
 
 Aliás, o próprio policial Heráclison Lima de Amorim quando indagado acerca do ponto afirmou ser desnecessária a autorização dos moradores (porquanto tinha sido encontrada droga com o réu) e entraram no imóvel.
 
 Nessa ordem de considerações, urge o reconhecimento da nulidade arguida pela defesa, trazendo a reboque: a) a declaração da absolvição do acusado por não existir prova da materialidade delitiva, bem como, b) a prejudicialidade da análise dos demais pleitos recursais.
 
 Diante do exposto, em dissonância com o parecer da 5.ª Procuradoria de Justiça, conheço e dou provimento ao recurso defensivo para declarar a nulidade da apreensão das drogas mediante invasão de domicílio e, por via de consequência, absolver o réu à luz do art. 386, II, do CPP, vez que inexistente a prova da materialidade do crime, tudo nos termos da fundamentação acima. É como voto.
 
 Natal/RN, data e hora do sistema.
 
 Desembargador Glauber Rêgo Relator [1] “RECURSO ESPECIAL.
 
 PROPOSTA DE JULGAMENTO SOB O RITO DOS RECURSOS REPETITIVOS.
 
 INVASÃO DE DOMICÍLIO.
 
 FUGA DO RÉU E/OU DENÚNCIA ANÔNIMA.
 
 EXISTÊNCIA OU NÃO DE JUSTA CAUSA.
 
 RELEVÂNCIA DA TESE A SER DEFINIDA. 1.
 
 Tema sob afetação: Analisar se a simples fuga do réu para dentro da residência ao avistar os agentes estatais e/ou a mera existência de denúncia anônima acerca da possível prática de delito no interior do domicílio, desacompanhada de outros elementos preliminares indicativos de crime, constituem ou não, por si sós, fundadas razões (justa causa) a autorizar o ingresso dos policiais em seu domicílio, sem prévia autorização judicial e sem o consentimento válido do morador. 2.
 
 A multiplicidade de hipóteses semelhantes julgadas por ambas as Turmas que compõem a Terceira Seção justifica, de per si, a proposta de afetação (ex vi do art. 1.036 do Código de Processo Civil). 3.
 
 Recurso especial submetido à Terceira Seção, a fim de que o seu julgamento seja submetido ao rito dos recursos repetitivos, de sorte a definir tese sobre a existência ou não de justa causa a autorizar o ingresso dos policiais em domicílio alheio, sem prévia autorização judicial e sem o consentimento válido do morador, nas hipóteses em que o réu empreende fuga para dentro da residência ao avistar os agentes estatais e/ou quando há denúncia anônima acerca da possível prática de delito no interior do domicílio, desacompanhada de outros elementos preliminares indicativos de crime. (ProAfR no REsp n. 1.990.972/MG, relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, Terceira Seção, julgado em 30/8/2022, DJe de 1/9/2022.)” Natal/RN, 12 de Setembro de 2024.
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                                            22/08/2024 00:00 Intimação Poder Judiciário do Rio Grande do Norte Câmara Criminal Por ordem do Relator/Revisor, este processo, de número 0800682-31.2024.8.20.5600, foi pautado para a Sessão VIRTUAL (Votação Exclusivamente PJe) do dia 09-09-2024 às 08:00, a ser realizada no Sala de Sessão da Câmara Criminal.
 
 Caso o processo elencado para a presente pauta não seja julgado na data aprazada acima, fica automaticamente reaprazado para a sessão ulterior.
 
 No caso de se tratar de sessão por videoconferência, verificar o link de ingresso no endereço http://plenariovirtual.tjrn.jus.br/ e consultar o respectivo órgão julgador colegiado.
 
 Natal, 21 de agosto de 2024.
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                                            07/08/2024 15:34 Remetidos os Autos (em revisão) para Gab. Des. Ricardo Procópio na Câmara Criminal 
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                                            30/07/2024 10:07 Conclusos para julgamento 
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                                            29/07/2024 18:45 Juntada de Petição de parecer 
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                                            25/07/2024 12:19 Expedição de Outros documentos. 
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                                            25/07/2024 10:55 Recebidos os autos 
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                                            25/07/2024 10:54 Juntada de intimação 
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                                            19/07/2024 13:50 Remetidos os Autos (em diligência) para Primeiro Grau 
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                                            19/07/2024 13:49 Juntada de termo de remessa 
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                                            19/07/2024 10:19 Juntada de Petição de petição 
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                                            04/07/2024 05:31 Publicado Intimação em 04/07/2024. 
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                                            04/07/2024 05:31 Disponibilizado no DJ Eletrônico em 03/07/2024 
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                                            03/07/2024 00:00 Intimação PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE Gab.
 
 Des.
 
 Glauber Rêgo na Câmara Criminal Apelação Criminal nº 0800682-31.2024.8.20.5600 Origem: Juízo de Direito da 12ª Vara Criminal da Comarca de Natal/RN Apelante: Tony Eduardo da Silva Figueiredo Advogadas: Alcileide Marques dos Santos - OAB RN 19517 e Patrícia Paula Barros Moreira - OAB/RN nº 4896-E Apelado: Ministério Público Relator: Desembargador Glauber Rêgo DESPACHO Intime-se o recorrente, através de sua advogada, para que apresente as razões de apelação, no prazo de 08 (oito) dias, nos termos do que dispõe o art. 600, § 4º, do Código de Processo Penal.
 
 Após, remetam-se os autos ao Juízo de origem para que o Ministério Público de primeira instância possa oferecer as contrarrazões ao recurso defensivo.
 
 Em seguida, já devidamente acostadas as mídias relativas à instrução criminal, vistas dos autos à Procuradoria Geral de Justiça para parecer de estilo, tudo mediante concessão das chaves de acesso do feito eletrônico.
 
 Após, retornem os autos conclusos.
 
 Publique-se.
 
 Intimem-se e Cumpra-se.
 
 Natal/RN, data e hora do sistema.
 
 Desembargador Glauber Rêgo Relator
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                                            02/07/2024 18:10 Expedição de Outros documentos. 
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                                            26/06/2024 09:07 Proferido despacho de mero expediente 
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                                            25/06/2024 07:57 Recebidos os autos 
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                                            25/06/2024 07:57 Conclusos para despacho 
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                                            25/06/2024 07:57 Distribuído por sorteio 
Detalhes
                                            Situação
                                            Ativo                                        
                                            Ajuizamento
                                            25/06/2024                                        
                                            Ultima Atualização
                                            18/09/2024                                        
                                            Valor da Causa
                                            R$ 0,00                                        
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