TJRN - 0808020-75.2024.8.20.0000
2ª instância - Câmara / Desembargador(a) Berenice Capuxu
Polo Passivo
Partes
Assistente Desinteressado Amicus Curiae
Advogados
Nenhum advogado registrado.
Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
-
05/09/2024 00:00
Intimação
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE SEGUNDA CÂMARA CÍVEL Processo: AGRAVO DE INSTRUMENTO - 0808020-75.2024.8.20.0000 Polo ativo A.
C.
D.
C.
S. e outros Advogado(s): ALLAN CASSIO DE OLIVEIRA LIMA, FABIO ALEX DA SILVA SANTOS Polo passivo UNIMED NATAL SOCIEDADE COOPERATIVA DE TRABALHO MEDICO e outros Advogado(s): RODRIGO MENEZES DA COSTA CAMARA, JOSE CARLOS VAN CLEEF DE ALMEIDA SANTOS EMENTA: DIREITO DO CONSUMIDOR E PROCESSO CIVIL.
AGRAVO DE INSTRUMENTO.
PLANO DE SAÚDE.
CANCELAMENTO UNILATERAL DE CONTRATO DE PLANO DE SAÚDE.
PACIENTE COM TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA (TEA).
NECESSÁRIA COBERTURA PELO CONVÊNIO.
ABRANGÊNCIA.
EXISTÊNCIA DE LAUDO EMITIDO POR MÉDICOS QUE ACOMPANHAM A CRIANÇA.
ATESTADA NECESSIDADE NA REALIZAÇÃO DOS TRATAMENTO VINDICADOS.
IMPOSSIBILIDADE DO PRESTADOR DO SERVIÇO INVIABILIZAR A CONTINUIDADE DO TRATAMENTO.
RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.
PREJUDICADO O AGRAVO INTERNO.
ACÓRDÃO Acordam os Desembargadores que integram a 2ª Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, em Turma, por unanimidade, em consonância com o parecer ministerial, em conhecer e prover o recurso, confirmando a tutela outrora deferida para determinar que as agravadas mantenham o contrato de saúde firmado com a parte autora ou lhe possibilite a migração para um plano de saúde individual com as mesmas condições ofertadas no coletivo vigente, inclusive sem novo prazo de carência, bem como a continuidade na realização dos tratamentos em curso, nos termos do voto da Relatora.
RELATÓRIO Agravo de Instrumento (Id. 25437612) interposto por A.
C.
D.
C.
S., representada por sua genitora CRISTIANA CRISTINE DA COSTA MELO, contra decisão (Id. 25437781) proferida pelo Juízo da 1ª Vara Cível da Comarca de Mossoró/RN que, nos autos da Ação nº 0814059-96.2024.8.20.5106, proposta em face da UNIMED NATAL SOCIEDADE COOPERATIVA DE TRABALHO MÉDICO e da QUALICORP ADMINISTRADORA DE BENEFÍCIOS S.A., indeferiu o pleito liminar de urgência formulado pela autora, nos seguintes termos: "A parte autora requereu liminar objetivando: ‘Que seja deferida liminar (Antecipação de Tutela) inaudita altera parte para que as Requeridas se abstenham de procederem com o cancelamento do plano de saúde da autora, mantendo integralmente o contrato e o tratamento da requerente de acordo com a prescrição médica, efetuando a emissão dos boletos para pagamento dos meses subsequentes, ou, caso já tenham efetuado o cancelamento, restabeleçam com urgência o presente contrato, bem como seja aplicada multa diária em valor a ser estipulado por Vossa Excelência para o caso de descumprimento da ordem judicial’ (…) No que tange ao direito à manutenção do plano de saúde em razão de a parte autora estar em tratamento médico atualmente, o laudo médico (ID nº 123888837) demonstra que a autora está em tratamento para Transtorno do Espectro Autista (CID 11 – 6A02).
Nesse sentido, em que pese a sensibilidade desse juízo ao quadro da parte autora, não se trata de doença grave (risco à vida), sendo que a obrigação da operadora quanto à continuidade dos cuidados assistenciais restringe-se à situações nas quais haja risco à sobrevivência ou à incolumidade física do beneficiário, o que não é o caso dos autos. (…) Posto isto, indefiro o pedido de tutela de urgência” Em suas razões, a recorrente alegou a necessidade urgente de manter as obrigações contratuais, determinando que a operadora do plano se abstenha de promover o cancelamento imotivado do contrato de plano de saúde da autora, eis que se encontra em tratamento do Autismo.
Ademais, aduziu que “a Unimed Natal de forma injustificada informou a Autora que seu plano de saúde junto a QUALICORP a partir da data de 23 de junho de 2024, será cancelado, ficando todos os serviços/atendimentos que o menor necessita prejudicado”.
Outrossim, informou que o “Superior Tribunal de Justiça (STJ), sob o rito dos recursos repetitivos (Tema 1.082), estabeleceu a tese de que a operadora, mesmo após rescindir unilateralmente o plano ou o seguro de saúde coletivo, deve garantir a continuidade da assistência a beneficiário internado ou em tratamento de doença grave, até a efetiva alta, desde que ele arque integralmente com o valor das mensalidades”.
Portanto, pugnou liminarmente a concessão da tutela liminar de urgência para que as agravadas se abstenham de proceder com o cancelamento do plano de saúde da autora, aqui agravante, com a posterior confirmação da liminar em decisão colegiada, para reformar a decisão combatida.
Gratuidade deferida na origem.
Decisão determinando a manutenção do contrato de saúde firmado com o autor ou assegurando a possibilidade de migração para um plano de saúde individual nas mesmas condições ofertadas no coletivo vigente, inclusive sem novo prazo de carência (Id. 25481160).
Pedido de reconsideração da decisão movido pela UNIMED (Id. 25717896), sob o argumento de que a relação contratual é da UNIMED com a QUALICORP e que assim a recorrida estaria no seu pleno exercício do direito em promover a rescisão do contrato.
Contrarrazões apresentadas pela QUALICORP (Id. 25799874), rebatendo os argumentos da parte recorrente, pugnando pelo conhecimento e desprovimento do recurso.
O Ministério Público, por meio do seu 9º Procurador de Justiça, em substituição ao 17º Procurador, apresentou parecer pelo conhecimento e provimento do recurso, eis presentes os requisitos de admissibilidade para concessão da medida, tendo em vista que deve-se resguardar a saúde por meio do melhor tratamento da criança. É o que importa relatar.
VOTO Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço do recurso.
Inicialmente, recebo o pedido de reconsideração (Id. 25717896) como se agravo interno fosse.
O cerne da controvérsia se baseia em aferir a possibilidade de manutenção de contrato coletivo de saúde, após a realização de rescisão unilateral pela operadora.
Antes de adentrar no mérito da demanda, compulsando os diversos laudos médicos dispostos nos autos (Id. 25437770), vejo se tratar de criança diagnosticada com autismo CID-10 F84.4 que, conforme pontuado pelo médico que a acompanha (Id. 25437770, pág. 1): “necessita tratamento multiprofissional intensivo semanal sob pena de piora e descompensação do quadro” Além disso, entendo ser pertinente consignar que os contratos de plano de saúde se submetem ao Código de Defesa do Consumidor (art. 3º, § 2º), conforme disposição do Enunciado n° 608 da Súmula do STJ, e, em razão disso, as cláusulas devem respeitar as formas de elaboração e interpretação previstas na lei consumerista, não podendo ameaçar seu objeto ou equilíbrio contratual que, nesse caso específico, corresponde ao dever contratual do convênio em proporcionar os meios necessários ao restabelecimento da saúde do paciente.
A priori, a conduta perpetrada pela operadora de saúde quanto ao cancelamento unilateral do contrato coletivo referido, sem motivação, encontra amparo na Resolução Normativa da ANS nº 557/2022, desde que os respectivos termos estejam previstos expressamente no respectivo instrumento contratual.
Entretanto, o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp 1.846.123/SP, sob a relatoria do Ministro Luis Felipe Salomão, firmou tese vinculante – Tema 1082 – nos seguintes termos: “A operadora, mesmo após o exercício regular do direito à rescisão unilateral de plano coletivo, deverá assegurar a continuidade dos cuidados assistenciais prescritos a usuário internado ou em pleno tratamento médico garantidor de sua sobrevivência ou de sua incolumidade física, até a efetiva alta, desde que o titular arque integralmente com a contraprestação devida.” Eis a ementa do referido acórdão repetitivo: RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA.
PLANO DE SAÚDE COLETIVO.
CANCELAMENTO UNILATERAL.
BENEFICIÁRIO SUBMETIDO A TRATAMENTO MÉDICO DE DOENÇA GRAVE. 1.
Tese jurídica firmada para fins do artigo 1.036 do CPC: "A operadora, mesmo após o exercício regular do direito à rescisão unilateral de plano coletivo, deverá assegurar a continuidade dos cuidados assistenciais prescritos a usuário internado ou em pleno tratamento médico garantidor de sua sobrevivência ou de sua incolumidade física, até a efetiva alta, desde que o titular arque integralmente com a contraprestação (mensalidade) devida." 2.
Conquanto seja incontroverso que a aplicação do parágrafo único do artigo 13 da Lei 9.656/1998 restringe-se aos seguros e planos de saúde individuais ou familiares, sobressai o entendimento de que a impossibilidade de rescisão contratual durante a internação do usuário - ou a sua submissão a tratamento médico garantidor de sua sobrevivência ou da manutenção de sua incolumidade física - também alcança os pactos coletivos. 3.
Isso porque, em havendo usuário internado ou em pleno tratamento de saúde, a operadora, mesmo após exercido o direito à rescisão unilateral do plano coletivo, deverá assegurar a continuidade dos cuidados assistenciais até a efetiva alta médica, por força da interpretação sistemática e teleológica dos artigos 8º, § 3º, alínea "b", e 35-C, incisos I e II, da Lei n. 9.656/1998, bem como do artigo 16 da Resolução Normativa DC/ANS n. 465/2021, que reproduz, com pequenas alterações, o teor do artigo 18 contido nas Resoluções Normativas DC/ANS n. 428/2017, 387/2015 e 338/2013. 4.
A aludida exegese também encontra amparo na boa-fé objetiva, na segurança jurídica, na função social do contrato e no princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, o que permite concluir que, ainda quando haja motivação idônea, a suspensão da cobertura ou a rescisão unilateral do plano de saúde não pode resultar em risco à preservação da saúde e da vida do usuário que se encontre em situação de extrema vulnerabilidade. 5.
Caso concreto: (i) a autora aderiu, em 1º.12.2012, ao seguro-saúde coletivo empresarial oferecido pela ré, do qual o seu empregador era estipulante; (ii) no aludido pacto, havia cláusula expressa prevendo que, após o período de 12 meses de vigência, a avença poderia ser rescindida imotivadamente por qualquer uma das partes, mediante notificação por escrito com no mínimo 60 dias de antecedência; (iii) diante da aludida disposição contratual, a operadora enviou carta de rescisão ao estipulante em 14.12.2016, indicando o cancelamento da apólice em 28.2.2017; (iv) desde 2016, a usuária encontrava-se afastada do trabalho para tratamento médico de câncer de mama, o que ensejou notificação extrajudicial - encaminhada pelo estipulante à operadora em 11.1.2017 - pleiteando a manutenção do seguro-saúde até a alta médica; (v) tendo em vista a recusa da ré, a autora ajuizou a presente ação postulando a sua migração para plano de saúde individual; (vi) desde a contestação, a ré aponta que não comercializa tal modalidade contratual; e (vii) em 4.4.2017, foi deferida antecipação da tutela jurisdicional pelo magistrado de piso - confirmada na sentença e pelo Tribunal de origem - determinando que "a ré mantenha em vigor o contrato com a autora, nas mesmas condições contratadas pelo estipulante, ou restabeleça o contrato, se já rescindido, por prazo indeterminado ou até decisão em contrário deste juízo, garantindo integral cobertura de tratamento à moléstia que acomete a autora" (fls. 29-33). 6.
Diante desse quadro, merece parcial reforma o acórdão estadual a fim de se afastar a obrigatoriedade de oferecimento do plano de saúde individual substitutivo do coletivo extinto, mantendo-se, contudo, a determinação de continuidade de cobertura financeira do tratamento médico do câncer de mama - porventura em andamento -, ressalvada a ocorrência de efetiva portabilidade de carências ou a contratação de novo plano coletivo pelo atual empregador. 7.
Recurso especial parcialmente provido. (REsp n. 1.846.123/SP, relator Ministro Luis Felipe Salomão, Segunda Seção, julgado em 22/6/2022, DJe de 1/8/2022.) Assim, estando a usuária do plano coletivo internada ou em pleno tratamento de saúde, a operadora, mesmo após exercer o direito à rescisão unilateral, deverá assegurar a continuidade dos cuidados assistenciais até a efetiva alta médica, por força da interpretação sistemática e teleológica do art. 8º, § 3º, alínea “b”, e art. 35-C, incisos I e II, da Lei nº 9.656/98, bem como do art. 16 da Resolução Normativa DC/ANS n. 465/2021.
No mesmo sentido, colaciono precedentes desta Corte Estadual sobre o tema: CONSUMIDOR.
PLANO DE SAÚDE.
CANCELAMENTO UNILATERAL.
BENEFICIÁRIO SUBMETIDO A TRATAMENTO MÉDICO DE DOENÇA GRAVE (CÂNCER).
MANUTENÇÃO DO CONTRATO DE PLANO DE SAÚDE.
PLANO EMPRESARIAL.
MANUTENÇÃO DO PLANO PELO PRAZO DE UM ANO.
AVISO PRÉVIO DE CANCELAMENTO DE 60 DIAS.
CANCELAMENTO ANTES DO PREVISTO.
SUPOSTA MIGRAÇÃO PARA PLANO SUPERIOR.
PACIENTE FICOU SEM ASSISTÊNCIA DURANTE A MIGRAÇÃO DO PLANO.
DESPESAS DECORRENTES DA DOENÇA CUSTEADAS PELA AUTORA.
NECESSIDADE DE RESSARCIMENTO.
POSIÇÃO DO STJ ACERCA DA MATÉRIA.
INCIDÊNCIA DA TESE FIXADA NO TEMA 1082 (RESP 1.846.123/SP).
CONHECIMENTO E DESPROVIMENTO DO RECURSO.
PRECEDENTES. - Ao julgar o REsp 1.846.123/SP - Relator Ministro Luis Felipe Salomão - Segunda Seção - j. em 22/06/2022 – Tema 1082, o Superior Tribunal de Justiça fixou-se tese segundo a qual, “a operadora, mesmo após o exercício regular do direito à rescisão unilateral de plano coletivo, deverá assegurar a continuidade dos cuidados assistenciais prescritos a usuário internado ou em pleno tratamento médico garantidor de sua sobrevivência ou de sua incolumidade física, até a efetiva alta, desde que o titular arque integralmente com a contraprestação devida.” - No caso, o plano do agravado foi assinado em 24 de setembro de 2020, conforme documento na fl. 39 – ID 89545318 do Primeiro Grau.
Garantiu-se a notificação com antecedência mínima de 60 (sessenta) dias.
Todavia, a rescisão do caso é obstada pelo fato do contratante ser portador de doença grave (câncer) e estar submetido a tratamento médico.
Portanto, eventual rescisão deve aguardar a conclusão do tratamento do consumidor, com sua alta definitiva.” (TJRN - AC nº 0863025-85.2022.8.20.5001 – Relator Desembargador João Rebouças - 3ª Câmara Cível - j. em 28/06/2023).
CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL.
AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER.
TUTELA DE URGÊNCIA.
DEFERIMENTO NA ORIGEM.
AGRAVO DE INSTRUMENTO.
CONTRATO DE PLANO DE SAÚDE COLETIVO.
RESCISÃO UNILATERAL.
NÃO COMPROVAÇÃO DA ALEGADA INADIMPLÊNCIA.
AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE NOTIFICAÇÃO PRÉVIA E PESSOAL NO PRAZO LEGAL.
NECESSIDADE (ART. 13, INCISO II, DA LEI 9.656/98).
BENEFICIÁRIO SUBMETIDO A TRATAMENTO MÉDICO DE DOENÇA GRAVE.
IMPOSSIBILIDADE DE RESCISÃO UNILATERAL.
TEMA 1.082 DO STJ.
RECURSO DESPROVIDO.” (TJRN – AI nº 0806020-39.2023.8.20.0000 – Relator Desembargador Ibanez Monteiro - 2ª Câmara Cível – j. em 04/08/2023).
PROCESSUAL CIVIL E CONSUMIDOR.
AGRAVO DE INSTRUMENTO.
AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS.
PLANO DE SAÚDE.
CANCELAMENTO UNILATERAL POR INADIMPLÊNCIA.
TUTELA DE URGÊNCIA CONCEDIDA NA ORIGEM.
AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE NOTIFICAÇÃO PRÉVIA E PESSOAL NO PRAZO LEGAL.
NECESSIDADE.
DEVER DE OBSERVÂNCIA ART. 13, INCISO II, DA LEI 9.656/98.
CRIANÇA EM TRATAMENTO MULTIDICIPLINAR.
CONTINUIDADE.
TEMA 1.082 DO STJ.
MANUTENÇÃO DA DECISÃO ATACADA QUE SE IMPÕE.
CONHECIMENTO E DESPROVIMENTO DO INSTRUMENTAL.
AGRAVO INTERNO PREJUDICADO.” (TJRN – AI nº 0811632-89.2022.8.20.0000 – Relator Desembargador Cornélio Alves - 1ª Câmara Cível – j. em 31/05/2023).
Com efeito, tendo em vista que a agravante se encontra em tratamento para o transtorno do espectro autista, entendo ser evidente a existência de óbice à descontinuidade da cobertura contratual enquanto pendente o respectivo tratamento.
Por fim, é importante salientar que eventual cancelamento do plano, sem a realização efetiva da migração para outra modalidade, implicaria em deixar a parte autora sem cobertura de tratamento, imputando-lhe prejuízos ao seu desenvolvimento e a sua saúde.
Diante do exposto, conheço e dou provimento ao recurso, confirmando a tutela outrora deferida para determinar que as agravadas mantenham o contrato de saúde firmado com a parte autora ou lhe possibilite a migração para um plano de saúde individual com as mesmas condições ofertadas no coletivo vigente, inclusive sem novo prazo de carência, bem como a continuidade na realização dos tratamentos em curso, restando prejudicado o agravo interno. É como voto.
Desembargadora BERENICE CAPUXÚ RELATORA VOTO VENCIDO VOTO Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço do recurso.
Inicialmente, recebo o pedido de reconsideração (Id. 25717896) como se agravo interno fosse.
O cerne da controvérsia se baseia em aferir a possibilidade de manutenção de contrato coletivo de saúde, após a realização de rescisão unilateral pela operadora.
Antes de adentrar no mérito da demanda, compulsando os diversos laudos médicos dispostos nos autos (Id. 25437770), vejo se tratar de criança diagnosticada com autismo CID-10 F84.4 que, conforme pontuado pelo médico que a acompanha (Id. 25437770, pág. 1): “necessita tratamento multiprofissional intensivo semanal sob pena de piora e descompensação do quadro” Além disso, entendo ser pertinente consignar que os contratos de plano de saúde se submetem ao Código de Defesa do Consumidor (art. 3º, § 2º), conforme disposição do Enunciado n° 608 da Súmula do STJ, e, em razão disso, as cláusulas devem respeitar as formas de elaboração e interpretação previstas na lei consumerista, não podendo ameaçar seu objeto ou equilíbrio contratual que, nesse caso específico, corresponde ao dever contratual do convênio em proporcionar os meios necessários ao restabelecimento da saúde do paciente.
A priori, a conduta perpetrada pela operadora de saúde quanto ao cancelamento unilateral do contrato coletivo referido, sem motivação, encontra amparo na Resolução Normativa da ANS nº 557/2022, desde que os respectivos termos estejam previstos expressamente no respectivo instrumento contratual.
Entretanto, o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp 1.846.123/SP, sob a relatoria do Ministro Luis Felipe Salomão, firmou tese vinculante – Tema 1082 – nos seguintes termos: “A operadora, mesmo após o exercício regular do direito à rescisão unilateral de plano coletivo, deverá assegurar a continuidade dos cuidados assistenciais prescritos a usuário internado ou em pleno tratamento médico garantidor de sua sobrevivência ou de sua incolumidade física, até a efetiva alta, desde que o titular arque integralmente com a contraprestação devida.” Eis a ementa do referido acórdão repetitivo: RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA.
PLANO DE SAÚDE COLETIVO.
CANCELAMENTO UNILATERAL.
BENEFICIÁRIO SUBMETIDO A TRATAMENTO MÉDICO DE DOENÇA GRAVE. 1.
Tese jurídica firmada para fins do artigo 1.036 do CPC: "A operadora, mesmo após o exercício regular do direito à rescisão unilateral de plano coletivo, deverá assegurar a continuidade dos cuidados assistenciais prescritos a usuário internado ou em pleno tratamento médico garantidor de sua sobrevivência ou de sua incolumidade física, até a efetiva alta, desde que o titular arque integralmente com a contraprestação (mensalidade) devida." 2.
Conquanto seja incontroverso que a aplicação do parágrafo único do artigo 13 da Lei 9.656/1998 restringe-se aos seguros e planos de saúde individuais ou familiares, sobressai o entendimento de que a impossibilidade de rescisão contratual durante a internação do usuário - ou a sua submissão a tratamento médico garantidor de sua sobrevivência ou da manutenção de sua incolumidade física - também alcança os pactos coletivos. 3.
Isso porque, em havendo usuário internado ou em pleno tratamento de saúde, a operadora, mesmo após exercido o direito à rescisão unilateral do plano coletivo, deverá assegurar a continuidade dos cuidados assistenciais até a efetiva alta médica, por força da interpretação sistemática e teleológica dos artigos 8º, § 3º, alínea "b", e 35-C, incisos I e II, da Lei n. 9.656/1998, bem como do artigo 16 da Resolução Normativa DC/ANS n. 465/2021, que reproduz, com pequenas alterações, o teor do artigo 18 contido nas Resoluções Normativas DC/ANS n. 428/2017, 387/2015 e 338/2013. 4.
A aludida exegese também encontra amparo na boa-fé objetiva, na segurança jurídica, na função social do contrato e no princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, o que permite concluir que, ainda quando haja motivação idônea, a suspensão da cobertura ou a rescisão unilateral do plano de saúde não pode resultar em risco à preservação da saúde e da vida do usuário que se encontre em situação de extrema vulnerabilidade. 5.
Caso concreto: (i) a autora aderiu, em 1º.12.2012, ao seguro-saúde coletivo empresarial oferecido pela ré, do qual o seu empregador era estipulante; (ii) no aludido pacto, havia cláusula expressa prevendo que, após o período de 12 meses de vigência, a avença poderia ser rescindida imotivadamente por qualquer uma das partes, mediante notificação por escrito com no mínimo 60 dias de antecedência; (iii) diante da aludida disposição contratual, a operadora enviou carta de rescisão ao estipulante em 14.12.2016, indicando o cancelamento da apólice em 28.2.2017; (iv) desde 2016, a usuária encontrava-se afastada do trabalho para tratamento médico de câncer de mama, o que ensejou notificação extrajudicial - encaminhada pelo estipulante à operadora em 11.1.2017 - pleiteando a manutenção do seguro-saúde até a alta médica; (v) tendo em vista a recusa da ré, a autora ajuizou a presente ação postulando a sua migração para plano de saúde individual; (vi) desde a contestação, a ré aponta que não comercializa tal modalidade contratual; e (vii) em 4.4.2017, foi deferida antecipação da tutela jurisdicional pelo magistrado de piso - confirmada na sentença e pelo Tribunal de origem - determinando que "a ré mantenha em vigor o contrato com a autora, nas mesmas condições contratadas pelo estipulante, ou restabeleça o contrato, se já rescindido, por prazo indeterminado ou até decisão em contrário deste juízo, garantindo integral cobertura de tratamento à moléstia que acomete a autora" (fls. 29-33). 6.
Diante desse quadro, merece parcial reforma o acórdão estadual a fim de se afastar a obrigatoriedade de oferecimento do plano de saúde individual substitutivo do coletivo extinto, mantendo-se, contudo, a determinação de continuidade de cobertura financeira do tratamento médico do câncer de mama - porventura em andamento -, ressalvada a ocorrência de efetiva portabilidade de carências ou a contratação de novo plano coletivo pelo atual empregador. 7.
Recurso especial parcialmente provido. (REsp n. 1.846.123/SP, relator Ministro Luis Felipe Salomão, Segunda Seção, julgado em 22/6/2022, DJe de 1/8/2022.) Assim, estando a usuária do plano coletivo internada ou em pleno tratamento de saúde, a operadora, mesmo após exercer o direito à rescisão unilateral, deverá assegurar a continuidade dos cuidados assistenciais até a efetiva alta médica, por força da interpretação sistemática e teleológica do art. 8º, § 3º, alínea “b”, e art. 35-C, incisos I e II, da Lei nº 9.656/98, bem como do art. 16 da Resolução Normativa DC/ANS n. 465/2021.
No mesmo sentido, colaciono precedentes desta Corte Estadual sobre o tema: CONSUMIDOR.
PLANO DE SAÚDE.
CANCELAMENTO UNILATERAL.
BENEFICIÁRIO SUBMETIDO A TRATAMENTO MÉDICO DE DOENÇA GRAVE (CÂNCER).
MANUTENÇÃO DO CONTRATO DE PLANO DE SAÚDE.
PLANO EMPRESARIAL.
MANUTENÇÃO DO PLANO PELO PRAZO DE UM ANO.
AVISO PRÉVIO DE CANCELAMENTO DE 60 DIAS.
CANCELAMENTO ANTES DO PREVISTO.
SUPOSTA MIGRAÇÃO PARA PLANO SUPERIOR.
PACIENTE FICOU SEM ASSISTÊNCIA DURANTE A MIGRAÇÃO DO PLANO.
DESPESAS DECORRENTES DA DOENÇA CUSTEADAS PELA AUTORA.
NECESSIDADE DE RESSARCIMENTO.
POSIÇÃO DO STJ ACERCA DA MATÉRIA.
INCIDÊNCIA DA TESE FIXADA NO TEMA 1082 (RESP 1.846.123/SP).
CONHECIMENTO E DESPROVIMENTO DO RECURSO.
PRECEDENTES. - Ao julgar o REsp 1.846.123/SP - Relator Ministro Luis Felipe Salomão - Segunda Seção - j. em 22/06/2022 – Tema 1082, o Superior Tribunal de Justiça fixou-se tese segundo a qual, “a operadora, mesmo após o exercício regular do direito à rescisão unilateral de plano coletivo, deverá assegurar a continuidade dos cuidados assistenciais prescritos a usuário internado ou em pleno tratamento médico garantidor de sua sobrevivência ou de sua incolumidade física, até a efetiva alta, desde que o titular arque integralmente com a contraprestação devida.” - No caso, o plano do agravado foi assinado em 24 de setembro de 2020, conforme documento na fl. 39 – ID 89545318 do Primeiro Grau.
Garantiu-se a notificação com antecedência mínima de 60 (sessenta) dias.
Todavia, a rescisão do caso é obstada pelo fato do contratante ser portador de doença grave (câncer) e estar submetido a tratamento médico.
Portanto, eventual rescisão deve aguardar a conclusão do tratamento do consumidor, com sua alta definitiva.” (TJRN - AC nº 0863025-85.2022.8.20.5001 – Relator Desembargador João Rebouças - 3ª Câmara Cível - j. em 28/06/2023).
CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL.
AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER.
TUTELA DE URGÊNCIA.
DEFERIMENTO NA ORIGEM.
AGRAVO DE INSTRUMENTO.
CONTRATO DE PLANO DE SAÚDE COLETIVO.
RESCISÃO UNILATERAL.
NÃO COMPROVAÇÃO DA ALEGADA INADIMPLÊNCIA.
AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE NOTIFICAÇÃO PRÉVIA E PESSOAL NO PRAZO LEGAL.
NECESSIDADE (ART. 13, INCISO II, DA LEI 9.656/98).
BENEFICIÁRIO SUBMETIDO A TRATAMENTO MÉDICO DE DOENÇA GRAVE.
IMPOSSIBILIDADE DE RESCISÃO UNILATERAL.
TEMA 1.082 DO STJ.
RECURSO DESPROVIDO.” (TJRN – AI nº 0806020-39.2023.8.20.0000 – Relator Desembargador Ibanez Monteiro - 2ª Câmara Cível – j. em 04/08/2023).
PROCESSUAL CIVIL E CONSUMIDOR.
AGRAVO DE INSTRUMENTO.
AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS.
PLANO DE SAÚDE.
CANCELAMENTO UNILATERAL POR INADIMPLÊNCIA.
TUTELA DE URGÊNCIA CONCEDIDA NA ORIGEM.
AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE NOTIFICAÇÃO PRÉVIA E PESSOAL NO PRAZO LEGAL.
NECESSIDADE.
DEVER DE OBSERVÂNCIA ART. 13, INCISO II, DA LEI 9.656/98.
CRIANÇA EM TRATAMENTO MULTIDICIPLINAR.
CONTINUIDADE.
TEMA 1.082 DO STJ.
MANUTENÇÃO DA DECISÃO ATACADA QUE SE IMPÕE.
CONHECIMENTO E DESPROVIMENTO DO INSTRUMENTAL.
AGRAVO INTERNO PREJUDICADO.” (TJRN – AI nº 0811632-89.2022.8.20.0000 – Relator Desembargador Cornélio Alves - 1ª Câmara Cível – j. em 31/05/2023).
Com efeito, tendo em vista que a agravante se encontra em tratamento para o transtorno do espectro autista, entendo ser evidente a existência de óbice à descontinuidade da cobertura contratual enquanto pendente o respectivo tratamento.
Por fim, é importante salientar que eventual cancelamento do plano, sem a realização efetiva da migração para outra modalidade, implicaria em deixar a parte autora sem cobertura de tratamento, imputando-lhe prejuízos ao seu desenvolvimento e a sua saúde.
Diante do exposto, conheço e dou provimento ao recurso, confirmando a tutela outrora deferida para determinar que as agravadas mantenham o contrato de saúde firmado com a parte autora ou lhe possibilite a migração para um plano de saúde individual com as mesmas condições ofertadas no coletivo vigente, inclusive sem novo prazo de carência, bem como a continuidade na realização dos tratamentos em curso, restando prejudicado o agravo interno. É como voto.
Desembargadora BERENICE CAPUXÚ RELATORA Natal/RN, 26 de Agosto de 2024. -
05/08/2024 00:00
Intimação
Poder Judiciário do Rio Grande do Norte Segunda Câmara Cível Por ordem do Relator/Revisor, este processo, de número 0808020-75.2024.8.20.0000, foi pautado para a Sessão VIRTUAL (Votação Exclusivamente PJe) do dia 26-08-2024 às 08:00, a ser realizada no 2ª CC Virtual (Votação Exclusivamente PJE).
Caso o processo elencado para a presente pauta não seja julgado na data aprazada acima, fica automaticamente reaprazado para a sessão ulterior.
No caso de se tratar de sessão por videoconferência, verificar o link de ingresso no endereço http://plenariovirtual.tjrn.jus.br/ e consultar o respectivo órgão julgador colegiado.
Natal, 2 de agosto de 2024. -
25/07/2024 16:24
Juntada de Petição de agravo interno
-
25/07/2024 16:16
Juntada de Petição de contrarrazões
-
15/07/2024 18:41
Conclusos para decisão
-
15/07/2024 12:33
Juntada de Petição de outros documentos
-
11/07/2024 18:34
Juntada de Petição de petição
-
11/07/2024 07:19
Expedição de Outros documentos.
-
10/07/2024 18:41
Proferido despacho de mero expediente
-
09/07/2024 10:57
Conclusos para decisão
-
08/07/2024 11:47
Juntada de Petição de petição
-
01/07/2024 00:14
Publicado Intimação em 01/07/2024.
-
01/07/2024 00:14
Disponibilizado no DJ Eletrônico em 28/06/2024
-
28/06/2024 09:47
Juntada de documento de comprovação
-
28/06/2024 09:27
Expedição de Ofício.
-
28/06/2024 00:00
Intimação
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE Gab.
Desª.
Berenice Capuxú na Câmara Cível Agravo de Instrumento nº 0808020-75.2024.8.20.0000 Agravante: A.
C.
D.
C.
S., representada por sua genitora CRISTIANA CRISTINE DA COSTA MELO Advogado: ALLAN CÁSSIO DE OLIVEIRA LIMA e FÁBIO ALEX DA SILVA SANTOS Agravados: UNIMED NATAL SOCIEDADE COOPERATIVA DE TRABALHO MEDICO e QUALICORP ADMINISTRADORA DE BENEFÍCIOS S.A.
Relatora: Desembargadora BERENICE CAPUXÚ DECISÃO Agravo de Instrumento (Id. 25437612) interposto por A.
C.
D.
C.
S., representada por sua genitora CRISTIANA CRISTINE DA COSTA MELO, contra decisão (Id. 25437781) proferida pelo Juízo da 1ª Vara Cível da Comarca de Mossoró/RN que, nos autos da Ação nº 0814059-96.2024.8.20.5106, proposta em face da UNIMED NATAL SOCIEDADE COOPERATIVA DE TRABALHO MÉDICO e da QUALICORP ADMINISTRADORA DE BENEFÍCIOS S.A., indeferiu o pleito liminar de urgência formulado pela autora, nos seguintes termos: A parte autora requereu liminar objetivando: ‘Que seja deferida liminar (Antecipação de Tutela) inaudita altera parte para que as Requeridas se abstenham de procederem com o cancelamento do plano de saúde da autora, mantendo integralmente o contrato e o tratamento da requerente de acordo com a prescrição médica, efetuando a emissão dos boletos para pagamento dos meses subsequentes, ou, caso já tenham efetuado o cancelamento, restabeleçam com urgência o presente contrato, bem como seja aplicada multa diária em valor a ser estipulado por Vossa Excelência para o caso de descumprimento da ordem judicial’ (…) No que tange ao direito à manutenção do plano de saúde em razão de a parte autora estar em tratamento médico atualmente, o laudo médico (ID nº 123888837) demonstra que a autora está em tratamento para Transtorno do Espectro Autista (CID 11 – 6A02).
Nesse sentido, em que pese a sensibilidade desse juízo ao quadro da parte autora, não se trata de doença grave (risco à vida), sendo que a obrigação da operadora quanto à continuidade dos cuidados assistenciais restringe-se à situações nas quais haja risco à sobrevivência ou à incolumidade física do beneficiário, o que não é o caso dos autos. (…) Posto isto, indefiro o pedido de tutela de urgência” Em suas razões, a recorrente alegou a necessidade urgente de manter as obrigações contratuais, determinando que a operadora do plano se abstenha de promover o cancelamento imotivado do contrato de plano de saúde da autora, eis que se encontra em tratamento do Autismo.
Ademais, aduziu que “a Unimed Natal de forma injustificada informou a Autora que seu plano de saúde junto a QUALICORP a partir da data de 23 de junho de 2024, será cancelado, ficando todos os serviços/atendimentos que o menor necessita prejudicado”.
Outrossim, informou que o “Superior Tribunal de Justiça (STJ), sob o rito dos recursos repetitivos (Tema 1.082), estabeleceu a tese de que a operadora, mesmo após rescindir unilateralmente o plano ou o seguro de saúde coletivo, deve garantir a continuidade da assistência a beneficiário internado ou em tratamento de doença grave, até a efetiva alta, desde que ele arque integralmente com o valor das mensalidades”.
Portanto, pugnou liminarmente a concessão da tutela liminar de urgência para que as agravadas se abstenham de proceder com o cancelamento do plano de saúde da autora, aqui agravante, com a posterior confirmação da liminar em decisão colegiada, para reformar a decisão combatida.
Gratuidade deferida na origem. É o que importa relatar.
Decido.
De acordo com a redação do art. 300, caput, do CPC, para a concessão da tutela de urgência antecipatória é necessária a presença dos pressupostos de probabilidade do direito e do perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo.
Destaco: Art. 300.
A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.
Registro, também, que a possibilidade da concessão do efeito suspensivo/ativo ao agravo de instrumento decorre dos preceitos constantes nos artigos 995, parágrafo único1, e 1.019, inciso I2, ambos do Código de Processo Civil, sendo o seu deferimento condicionado à comprovação, pelo recorrente, da possibilidade de ocorrência de grave lesão, de difícil ou impossível reparação e ficar demonstrada a probabilidade de provimento do recurso.
Superada tais premissas, ressalto que, uma vez se tratando de agravo de instrumento, sua análise deve se limitar, nesse momento processual, ao preenchimento dos requisitos imprescindíveis à concessão do efeito recursal pretendido, quais sejam, a existência concreta de risco de dano grave, de difícil ou impossível reparação caso mantida a eficácia da decisão nos mesmos termos e a demonstração a probabilidade dos fundamentos levantados no instrumental, consubstanciada na possibilidade concreta de êxito recursal.
Dessa forma, o cerne da controvérsia se baseia em aferir a possibilidade de manutenção de contrato coletivo de saúde, após a realização de rescisão unilateral pela operadora.
A priori, a conduta perpetrada pela operadora de saúde quanto ao cancelamento unilateral do contrato coletivo referido, sem motivação, encontra amparo na Resolução Normativa da ANS nº 557/2022, desde que os respectivos termos estejam previstos expressamente no respectivo instrumento contratual.
Entretanto, o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp 1.846.123/SP, sob a relatoria do Ministro Luis Felipe Salomão, firmou tese vinculante – Tema 1082 – nos seguintes termos: “A operadora, mesmo após o exercício regular do direito à rescisão unilateral de plano coletivo, deverá assegurar a continuidade dos cuidados assistenciais prescritos a usuário internado ou em pleno tratamento médico garantidor de sua sobrevivência ou de sua incolumidade física, até a efetiva alta, desde que o titular arque integralmente com a contraprestação devida.” Eis a ementa do referido acórdão repetitivo: RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA.
PLANO DE SAÚDE COLETIVO.
CANCELAMENTO UNILATERAL.
BENEFICIÁRIO SUBMETIDO A TRATAMENTO MÉDICO DE DOENÇA GRAVE. 1.
Tese jurídica firmada para fins do artigo 1.036 do CPC: "A operadora, mesmo após o exercício regular do direito à rescisão unilateral de plano coletivo, deverá assegurar a continuidade dos cuidados assistenciais prescritos a usuário internado ou em pleno tratamento médico garantidor de sua sobrevivência ou de sua incolumidade física, até a efetiva alta, desde que o titular arque integralmente com a contraprestação (mensalidade) devida." 2.
Conquanto seja incontroverso que a aplicação do parágrafo único do artigo 13 da Lei 9.656/1998 restringe-se aos seguros e planos de saúde individuais ou familiares, sobressai o entendimento de que a impossibilidade de rescisão contratual durante a internação do usuário - ou a sua submissão a tratamento médico garantidor de sua sobrevivência ou da manutenção de sua incolumidade física - também alcança os pactos coletivos. 3.
Isso porque, em havendo usuário internado ou em pleno tratamento de saúde, a operadora, mesmo após exercido o direito à rescisão unilateral do plano coletivo, deverá assegurar a continuidade dos cuidados assistenciais até a efetiva alta médica, por força da interpretação sistemática e teleológica dos artigos 8º, § 3º, alínea "b", e 35-C, incisos I e II, da Lei n. 9.656/1998, bem como do artigo 16 da Resolução Normativa DC/ANS n. 465/2021, que reproduz, com pequenas alterações, o teor do artigo 18 contido nas Resoluções Normativas DC/ANS n. 428/2017, 387/2015 e 338/2013. 4.
A aludida exegese também encontra amparo na boa-fé objetiva, na segurança jurídica, na função social do contrato e no princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, o que permite concluir que, ainda quando haja motivação idônea, a suspensão da cobertura ou a rescisão unilateral do plano de saúde não pode resultar em risco à preservação da saúde e da vida do usuário que se encontre em situação de extrema vulnerabilidade. 5.
Caso concreto: (i) a autora aderiu, em 1º.12.2012, ao seguro-saúde coletivo empresarial oferecido pela ré, do qual o seu empregador era estipulante; (ii) no aludido pacto, havia cláusula expressa prevendo que, após o período de 12 meses de vigência, a avença poderia ser rescindida imotivadamente por qualquer uma das partes, mediante notificação por escrito com no mínimo 60 dias de antecedência; (iii) diante da aludida disposição contratual, a operadora enviou carta de rescisão ao estipulante em 14.12.2016, indicando o cancelamento da apólice em 28.2.2017; (iv) desde 2016, a usuária encontrava-se afastada do trabalho para tratamento médico de câncer de mama, o que ensejou notificação extrajudicial - encaminhada pelo estipulante à operadora em 11.1.2017 - pleiteando a manutenção do seguro-saúde até a alta médica; (v) tendo em vista a recusa da ré, a autora ajuizou a presente ação postulando a sua migração para plano de saúde individual; (vi) desde a contestação, a ré aponta que não comercializa tal modalidade contratual; e (vii) em 4.4.2017, foi deferida antecipação da tutela jurisdicional pelo magistrado de piso - confirmada na sentença e pelo Tribunal de origem - determinando que "a ré mantenha em vigor o contrato com a autora, nas mesmas condições contratadas pelo estipulante, ou restabeleça o contrato, se já rescindido, por prazo indeterminado ou até decisão em contrário deste juízo, garantindo integral cobertura de tratamento à moléstia que acomete a autora" (fls. 29-33). 6.
Diante desse quadro, merece parcial reforma o acórdão estadual a fim de se afastar a obrigatoriedade de oferecimento do plano de saúde individual substitutivo do coletivo extinto, mantendo-se, contudo, a determinação de continuidade de cobertura financeira do tratamento médico do câncer de mama - porventura em andamento -, ressalvada a ocorrência de efetiva portabilidade de carências ou a contratação de novo plano coletivo pelo atual empregador. 7.
Recurso especial parcialmente provido. (REsp n. 1.846.123/SP, relator Ministro Luis Felipe Salomão, Segunda Seção, julgado em 22/6/2022, DJe de 1/8/2022.) Assim, estando a usuário do plano coletivo internado ou em pleno tratamento de saúde, a operadora, mesmo após exercer o direito à rescisão unilateral, deverá assegurar a continuidade dos cuidados assistenciais até a efetiva alta médica, por força da interpretação sistemática e teleológica do art. 8º, § 3º, alínea “b”, e art. 35-C, incisos I e II, da Lei nº 9.656/98, bem como do art. 16 da Resolução Normativa DC/ANS n. 465/2021.
No mesmo sentido, colaciono precedentes desta Corte Estadual sobre o tema: CONSUMIDOR.
PLANO DE SAÚDE.
CANCELAMENTO UNILATERAL.
BENEFICIÁRIO SUBMETIDO A TRATAMENTO MÉDICO DE DOENÇA GRAVE (CÂNCER).
MANUTENÇÃO DO CONTRATO DE PLANO DE SAÚDE.
PLANO EMPRESARIAL.
MANUTENÇÃO DO PLANO PELO PRAZO DE UM ANO.
AVISO PRÉVIO DE CANCELAMENTO DE 60 DIAS.
CANCELAMENTO ANTES DO PREVISTO.
SUPOSTA MIGRAÇÃO PARA PLANO SUPERIOR.
PACIENTE FICOU SEM ASSISTÊNCIA DURANTE A MIGRAÇÃO DO PLANO.
DESPESAS DECORRENTES DA DOENÇA CUSTEADAS PELA AUTORA.
NECESSIDADE DE RESSARCIMENTO.
POSIÇÃO DO STJ ACERCA DA MATÉRIA.
INCIDÊNCIA DA TESE FIXADA NO TEMA 1082 (RESP 1.846.123/SP).
CONHECIMENTO E DESPROVIMENTO DO RECURSO.
PRECEDENTES. - Ao julgar o REsp 1.846.123/SP - Relator Ministro Luis Felipe Salomão - Segunda Seção - j. em 22/06/2022 – Tema 1082, o Superior Tribunal de Justiça fixou-se tese segundo a qual, “a operadora, mesmo após o exercício regular do direito à rescisão unilateral de plano coletivo, deverá assegurar a continuidade dos cuidados assistenciais prescritos a usuário internado ou em pleno tratamento médico garantidor de sua sobrevivência ou de sua incolumidade física, até a efetiva alta, desde que o titular arque integralmente com a contraprestação devida.” - No caso, o plano do agravado foi assinado em 24 de setembro de 2020, conforme documento na fl. 39 – ID 89545318 do Primeiro Grau.
Garantiu-se a notificação com antecedência mínima de 60 (sessenta) dias.
Todavia, a rescisão do caso é obstada pelo fato do contratante ser portador de doença grave (câncer) e estar submetido a tratamento médico.
Portanto, eventual rescisão deve aguardar a conclusão do tratamento do consumidor, com sua alta definitiva.” (TJRN - AC nº 0863025-85.2022.8.20.5001 – Relator Desembargador João Rebouças - 3ª Câmara Cível - j. em 28/06/2023).
CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL.
AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER.
TUTELA DE URGÊNCIA.
DEFERIMENTO NA ORIGEM.
AGRAVO DE INSTRUMENTO.
CONTRATO DE PLANO DE SAÚDE COLETIVO.
RESCISÃO UNILATERAL.
NÃO COMPROVAÇÃO DA ALEGADA INADIMPLÊNCIA.
AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE NOTIFICAÇÃO PRÉVIA E PESSOAL NO PRAZO LEGAL.
NECESSIDADE (ART. 13, INCISO II, DA LEI 9.656/98).
BENEFICIÁRIO SUBMETIDO A TRATAMENTO MÉDICO DE DOENÇA GRAVE.
IMPOSSIBILIDADE DE RESCISÃO UNILATERAL.
TEMA 1.082 DO STJ.
RECURSO DESPROVIDO.” (TJRN – AI nº 0806020-39.2023.8.20.0000 – Relator Desembargador Ibanez Monteiro - 2ª Câmara Cível – j. em 04/08/2023).
PROCESSUAL CIVIL E CONSUMIDOR.
AGRAVO DE INSTRUMENTO.
AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS.
PLANO DE SAÚDE.
CANCELAMENTO UNILATERAL POR INADIMPLÊNCIA.
TUTELA DE URGÊNCIA CONCEDIDA NA ORIGEM.
AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE NOTIFICAÇÃO PRÉVIA E PESSOAL NO PRAZO LEGAL.
NECESSIDADE.
DEVER DE OBSERVÂNCIA ART. 13, INCISO II, DA LEI 9.656/98.
CRIANÇA EM TRATAMENTO MULTIDICIPLINAR.
CONTINUIDADE.
TEMA 1.082 DO STJ.
MANUTENÇÃO DA DECISÃO ATACADA QUE SE IMPÕE.
CONHECIMENTO E DESPROVIMENTO DO INSTRUMENTAL.
AGRAVO INTERNO PREJUDICADO.” (TJRN – AI nº 0811632-89.2022.8.20.0000 – Relator Desembargador Cornélio Alves - 1ª Câmara Cível – j. em 31/05/2023).
Com efeito, a agravante se encontra em tratamento para o transtorno do espectro autista, razão pela qual tenho por evidente a existência de óbice à descontinuidade da cobertura contratual enquanto pendente o respetivo tratamento.
Por fim, além da existência de probabilidade do direito nos termos dos argumentos acima, evidente a urgência (perigo de dano) como requisito a concessão da liminar recursal, pois eventual cancelamento do plano, sem a realização efetiva da migração para outro, deixaria a parte autora sem cobertura de tratamento, impingindo-lhe prejuízos ao seu desenvolvimento e a sua saúde.
Diante do exposto, a tutela antecipara recursal para determinar que as agravadas mantenham o contrato de saúde firmado com o autor ou lhe possibilite a migração para um plano de saúde individual nas mesmas condições ofertadas no coletivo vigente, inclusive sem novo prazo de carência.
Comunique-se o inteiro teor desta decisão ao Juízo de origem, para o devido cumprimento.
Intime-se a parte agravada para oferecer resposta ao presente recurso no prazo de 15 (quinze) dias, sendo-lhe facultado juntar os documentos que entender conveniente.
Ultimada a diligência acima, remetam-se os autos à Procuradoria de Justiça para o parecer de estilo, no prazo de 15 (quinze) dias, conforme estabelece o art. 1.019, inciso III do CPC.
Cumpridas as determinações, voltem-me conclusos.
Publique-se.
Cumpra-se.
Desembargadora BERENICE CAPUXÚ RELATORA -
27/06/2024 15:14
Expedição de Outros documentos.
-
26/06/2024 09:40
Concedida a Medida Liminar
-
21/06/2024 16:53
Conclusos para decisão
-
21/06/2024 16:53
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
21/06/2024
Ultima Atualização
05/09/2024
Valor da Causa
R$ 0,00
Detalhes
Documentos
ACÓRDÃO • Arquivo
ACÓRDÃO • Arquivo
DESPACHO • Arquivo
DESPACHO • Arquivo
DESPACHO • Arquivo
DESPACHO • Arquivo
DOCUMENTO DE COMPROVAÇÃO • Arquivo
DOCUMENTO DE COMPROVAÇÃO • Arquivo
DECISÃO • Arquivo
DECISÃO • Arquivo
Informações relacionadas
Processo nº 0801584-74.2023.8.20.5161
Maria Pereira da Silva Carvalho
Banco Bradesco S/A.
Advogado: Antonio de Moraes Dourado Neto
1ª instância - TJRN
Ajuizamento: 23/06/2025 12:32
Processo nº 0815013-84.2020.8.20.5106
Hapvida Assistencia Medica LTDA.
Ana Lucia Monteiro da Silva Lima
Advogado: Igor Macedo Faco
2ª instância - TJRN
Ajuizamento: 09/09/2024 10:36
Processo nº 0815013-84.2020.8.20.5106
Ana Lucia Monteiro da Silva Lima
Hapvida Assistencia Medica LTDA.
Advogado: Nelson Wilians Fratoni Rodrigues
1ª instância - TJRN
Ajuizamento: 28/09/2020 15:47
Processo nº 0103770-57.2012.8.20.0001
Maria Ferro Peron
Personal Courier Comercio e Servico LTDA
Advogado: Juliano Ricardo Schmitt
1ª instância - TJRN
Ajuizamento: 01/02/2012 14:58
Processo nº 0803480-16.2024.8.20.5001
Jose Rufino Filho
Fundo de Investimento em Direitos Credit...
Advogado: Lindaiara Anselmo de Melo
1ª instância - TJRN
Ajuizamento: 22/01/2024 15:28