TJRN - 0897239-05.2022.8.20.5001
2ª instância - Câmara / Desembargador(a) Cornelio Alves
Processos Relacionados - Outras Instâncias
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Polo Passivo
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Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
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02/04/2024 00:00
Intimação
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0897239-05.2022.8.20.5001 Polo ativo JOSE HELIO DO NASCIMENTO Advogado(s): Polo passivo BANCO SANTANDER e outros Advogado(s): PAULO ROBERTO TEIXEIRA TRINO JUNIOR registrado(a) civilmente como PAULO ROBERTO TEIXEIRA TRINO JUNIOR, FELICIANO LYRA MOURA, MARCOS DELLI RIBEIRO RODRIGUES EMENTA: DIREITO PROCESSUAL CIVIL E CONSUMIDOR.
APELAÇÃO CÍVEL EM AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C REVISÃO CONTRATUAL E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS.
PRELIMINAR DE NÃO CONHECIMENTO DO RECURSO ALEGADA PELO BANCO PAN S/A.
REJEIÇÃO.
MÉRITO.
EMPRÉSTIMOS CONSIGNADOS.
RELAÇÃO CONSUMERISTA QUE SE APLICA AO CASO.
OBSERVÂNCIA AO LIMITE DE DESCONTO DE 70% DA REMUNERAÇÃO OU PROVENTOS DO RECORRENTE.
MILITAR DA RESERVA.
MEDIDA PROVISÓRIA Nº 2.215-10/2001.
NORMA ESPECÍFICA.
OUTROS DÉBITOS EM CONTA-CORRENTE RELATIVOS A EMPRÉSTIMOS QUE NÃO SE SUJEITAM AO LIMITE PREVISTO EM LEI.
TEMA 1.085 DO STJ.
IMPOSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DA TEORIA DO SUPERENDIVIDAMENTO.
AUSÊNCIA DE PROCEDIMENTO ESPECÍFICO NA FORMA DO ART. 104-A DO CDC.
TAXA DE JUROS REMUNERATÓRIOS.
ABUSIVIDADE NÃO CONFIGURADA.
DANO MORAL NÃO EVIDENCIADO.
RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.
ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos em que são partes as acima identificadas.
Acordam os Desembargadores que integram a 1ª Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, em Turma, à unanimidade de votos, conhecer desprover a apelação interposta, nos termos do voto do Relator, parte integrante deste.
RELATÓRIO Trata-se de Apelação Cível interposta por José Hélio do Nascimento, em face de sentença proferida pelo Juízo da 5ª Vara Cível da Comarca de Natal/RN que, nos autos deste processo, julgou os pedidos iniciais, nos seguintes termos: Ante o exposto, com arrimo nos dispositivos legais citados, rejeito a impugnação à justiça gratuita e preliminares de falta de interesse e de documento essencial, revogo a antecipação de tutela de id 90022951 e julgo improcedente o pedido autoral.
Condeno a parte autora no pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios sucumbenciais, estes fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa atualizado pelo IPCA em favor de cada réu, conforme art. 85, § 2º, do CPC.
Diante da gratuidade judiciária conferida à parte autora, suspendo a exigibilidade de sua parcela das verbas sucumbenciais, pelo prazo máximo de 5 (cinco) anos, ressalvado o direito do credor demonstrar que deixou de existir a hipossuficiência financeira, conforme art. 98, §§ 2º e 3º, do CPC.
Com o trânsito em julgado, arquive-se.
P.R.I.
Irresignada com o resultado, a parte autora dele apelou, argumentando, em suas razões recursais (Id. 22458210): a) “A Lei do Superendividamento (Lei 14.181/21 entrou em exercício como forma de garantir os direitos daqueles que se encontram em situações de sobrecarga financeira devido a crises econômicas”; b) “em face de seu endividamento, teve suprido o que o ordenamento jurídico brasileiro lê enquanto mínimo existêncial (sic)”; c) é pessoa idosa, possui problemas de saúde como diabetes, é portador de insuficiência vascular, é deficiente físico (sofreu amputação da perna direita) e realiza tratamento contra um linfoma seja condenado privado completamente de sua renda alimentícia em favorecimento a instituições bancárias”.
Sob esses fundamentos, pugnou pela reforma do decisum a quo para julgar procedentes os pedidos iniciais.
Contrarrazões apresentadas pelo Santander (Brasil) S/A ao Id. 22458215, pelo Banco do Brasil S/A ao Id. 22458217 e pelo Banco Pan S/A ao Id. 22458219.
Ausentes as hipótese dos arts. 176 a 178 do CPC a ensejar a intervenção ministerial no feito. É o relatório.
VOTO DA PRELIMINAR DE NÃO CONHECIMENTO DO RECURSO SUSTENTADA PELO BANCO PAN Argumenta a instituição financeira que o recurso não deve ser conhecido haja vista a falta de fundamentação, pois “em momento algum, o recorrente trouxe em sua peça recursal os motivos jurídicos que demonstrem que a r. sentença monocrática merece ser modificada e não forneceu as razões do seu inconformismo”.
Contudo sem razão a insurgente.
Isto porque analisando-se o recurso interposto, observa-se que a teceu considerações sobre os fundamentos de fato e de direito que entende embasar seu pleito, visando reverter as conclusões da origem.
Sem necessidade de maiores digressões, rejeita-se a preliminar.
DO MÉRITO Presentes os requisitos de admissibilidade, conheço do recurso.
Cinge-se a análise do mérito recursal acerca da viabilidade dos descontos em folha de pagamento e conta corrente da parte autora serem limitados em 30% dos seus vencimentos, bem como revisar as cláusulas de dois dos contratos firmados.
Na situação em apreciação, tenho que a relação jurídico-material estabelecida entre as partes litigantes é dotada de caráter de consumo, fazendo subsumir a aplicação do Código de Defesa do Consumidor, consoante traduz o artigo 3º, § 2º, do referido Código.
Em se tratando de relação consumerista, a responsabilização do fornecedor independe da investigação da sua conduta, elemento anímico dos agentes, bastando para sua configuração apenas a existência de danos relacionados a defeitos pela falha na prestação dos serviços, nos moldes do art. 14, § 1º, da Lei nº 8.078/90 – Código de Defesa do Consumidor.
Vê-se, pois, que o fornecedor somente é isento de indenizar eventuais danos causados em caso de excludente de ilicitude, demonstrando que não houve defeito na prestação do serviço, ou que o consumidor tenha sido o único responsável pela situação, ou, ainda, que o prejuízo tenha decorrido exclusivamente de ato de terceiro, sem que aquele tenha concorrido para o evento.
Em que pesem as razões recursais, vislumbra-se que a sentença atacada não merece modificação.
Com efeito, observa-se que o recorrente é militar, pelo que há regramento próprio atinente ao limite de descontos realizados em folha de pagamento, in litteris: Medida Provisória no 2.215-10, de 31 de agosto de 2001: Art. 14.
Descontos são os abatimentos que podem sofrer a remuneração ou os proventos do militar para cumprimento de obrigações assumidas ou impostas em virtude de disposição de lei ou de regulamento. § 1o Os descontos podem ser obrigatórios ou autorizados. § 2o Os descontos obrigatórios têm prioridade sobre os autorizados. § 3o Na aplicação dos descontos, o militar não pode receber quantia inferior a trinta por cento da sua remuneração ou proventos.
Por ser assim, conforme entendimento do STJ os descontos em folha, obrigatórios e autorizados, podem alcançar o percentual de 70% das remunerações ou dos proventos brutos dos servidores militares.
Nesse sentido, os julgados: ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL.
MILITAR.
DESCONTOS EM FOLHA DE PAGAMENTO.
LIMITE DE 70% DA REMUNERAÇÃO OU DOS PROVENTOS.
MEDIDA PROVISÓRIA 2.215-10/2001.
NORMA ESPECÍFICA.
APLICAÇÃO.
ACÓRDÃO RECORRIDO EM CONFORMIDADE COM A JURISPRUDÊNCIA PACIFICADA DO STJ.
INCIDÊNCIA DA SÚMULA 83/STJ.
RECURSO ESPECIAL NÃO CONHECIDO.
I.
Trata-se, na origem, de Ação ajuizada por militar da Marinha contra a Caixa Econômica Federal, o Banco Bradesco S.A. e o Banco BMG, postulando a limitação de desconto, em seus estipêndios, ao percentual de 30% (trinta por cento) do vencimento líquido.
II.
Mantendo a sentença de improcedência da ação, o Tribunal de origem consignou que "é inaplicável à presente demanda a Lei n° 1.046/1950, porquanto, quanto à particular situação jurídica dos militares, tal diploma legal foi derrogado (revogação parcial) pela MP 2.215-10/2001, que é norma especial na espécie.
Também não alcançam os militares a Lei n° 10.820/2003, 'regedora que é de relação jurídica diversa, pertinente aos celetistas.
Jurisprudência do STJ.
A MP n° 2.215-10/2001, ao regrar os descontos autorizados e compulsórios, passíveis de incidirem sobre a remuneração ou o provento de militares, estatuiu, de forma expressa, um patamar remuneratório mínimo, correspondente a 30% (trinta por cento), abaixo do qual veda-se quaisquer descontos estipendiais, do que se infere que a totalidade de descontos obrigatórios e autorizados não pode superar o limite de 70% (setenta por cento) da remuneração ou do provento do militar".
III.
A Corte Especial do STJ, na Questão de Ordem nos EREsp 1.163.337/RS (Rel.
Ministro SIDNEI BENETI, DJe de 12/08/2014), decidiu que "recursos referentes a limite percentual de desconto em pagamento de empréstimo consignado feito por servidor público, com débito em conta-corrente e desconto na folha de pagamento, são da competência da 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça (RISTJ, art. 9º, XI)".
IV.
No caso, defende-se, nas razões recursais, que o Tribunal de origem, "ao decidir que deve ser tão somente aplicada ao caso a Medida Provisória 2215-110/01, violou a interpretação consentânea da legislação existente sobre a matéria dos autos, deixando de considerar o que dispõem as Leis 10.820/03 e 1.046/50", razão pela qual deveria ser determinada "a limitação dos descontos provenientes de mútuos bancários em até 30% dos rendimentos da Parte Recorrente".
V.
A tese recursal contraria a posição adotada pela Primeira Seção do STJ, que, sobre a matéria, tem firme entendimento no sentido de que "os descontos em folha dos militares estão regulados em norma jurídica específica, qual seja: a MP n. 2.215-10/2001.
Por força do art. 14, § 3º, da MP n. 2.215-10/2001, os descontos em folha, juntamente com os descontos obrigatórios, podem alcançar o percentual de 70% das remunerações ou dos proventos brutos dos servidores militares" (STJ, EAREsp 272.665/PE, Rel.
Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, DJe de 18/12/2017).
No mesmo sentido: STJ, AgInt no REsp 1.959.715/RJ, Rel.
Ministro MANOEL ERHARDT (Desembargador Federal convocado do TRF/5ª Região), PRIMEIRA TURMA, DJe de 15/12/2021; AgInt no AREsp 1.386.648/RJ, Rel.
Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA, DJe de 25/03/2019; REsp 1.682.985/RS, Rel.
Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, DJe de 16/10/2017; AgRg no REsp 1.530.406/RJ, Rel.
Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, SEGUNDA TURMA, DJe de 17/03/2016.
Confiram-se, ainda, as seguintes decisões: STJ, REsp 1.992.899/RJ, Rel.
Ministro GURGEL DE FARIA, DJe de 28/06/2022; REsp 1.958.486/RJ, Rel.
Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, DJe de 01/06/2022; REsp 1.961.475/RJ, Rel.
Ministra REGINA HELENA COSTA, DJe de 19/05/2022; REsp 1.939.312/RJ, Rel.
Ministro MANOEL ERHARDT (Desembargador Federal convocado do TRF/5ª Região), DJe de 08/02/2022; REsp 1.835.255/RJ, Rel.
Ministro GURGEL DE FARIA, DJe de 14/12/2021; REsp 1.943.659/RJ, Rel.
Ministro OG FERNANDES, DJe de 05/11/2021; REsp 1.942.695/RJ, Rel.
Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, DJe de 22/10/2021; REsp 1.941.137/RJ, Rel.
Ministro FRANCISCO FALCÃO, DJe de 16/09/2021; REsp 1.888.170/RJ, Rel.
Ministra REGINA HELENA COSTA, DJe de 17/08/2020.
Incidência da Súmula 83/STJ.
VI.
Recurso Especial não conhecido. (REsp n. 1.707.517/RJ, relatora Ministra Assusete Magalhães, Segunda Turma, julgado em 5/9/2023, DJe de 8/9/2023.) PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO.
AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL.
SERVIDOR PÚBLICO.
MILITAR.
DESCONTOS EM FOLHA DE PAGAMENTO.
LIMITE DE 30% (TRINTA POR CENTO) DOS VENCIMENTOS.
MEDIDA PROVISÓRIA 2.215-10/2001.
AGRAVO INTERNO DO PARTICULAR DESPROVIDO. 1.
De acordo com a jurisprudência desta Corte Superior, os descontos na folha de pagamento de Servidor Público devem ser limitados a 30% (trinta por cento) de sua remuneração, em função do princípio da razoabilidade e do caráter alimentar dos vencimentos. 2.
Todavia, a legislação aplicável aos Militares não fixou um limite específico para empréstimos consignados em folha de pagamento, limitando-se a estipular que, aplicados os descontos obrigatórios e autorizados, o integrante das Forças Armadas não poderá perceber quantia inferior a 30% da sua remuneração ou proventos. 3.
Assim, o limite dos descontos em folha do Militar das Forças Armadas corresponde ao máximo de 70% de sua remuneração, aí incluídos os descontos obrigatórios e os descontos autorizados, como aqueles efetuados em favor de entidades consignatárias ou de terceiros, conforme regulamentação de cada Força. 4.
Por fim, verifica-se que em relação aos descontos facultativos em folha de pagamento dos Militares das Forças Armadas, deve ser observada a regra específica prevista no artigo 14, § 3o., da Medida Provisória 2.215-10/2001.
Precedentes: REsp. 1.521.393/RJ, Rei.
Min.
MAURO CAMPBELL MARQUES, DJe 12.5.2015; REsp 1.458.770/RJ, Rei.
Min.
SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 16.4.2015, DJe 23.4.2015; REsp 1.113.576/RJ, Rei.
Min.
ELIANA CALMON, DJe 23.11.2009. 5.
Agravo Interno do Particular a que se nega provimento. (AgInt no REsp n. 1.959.715/RJ, relator Ministro Manoel Erhardt (Desembargador Convocado do TRF5), Primeira Turma, julgado em 13/12/2021, DJe de 15/12/2021.) Compulsando-se os autos, é de se coadunar com o entendimento de origem no sentido de que não foi ultrapassado o limite legal, pois é possível aferir dos contracheques acostados (Id. 22455558), notadamente através da renda bruta e liquida mensal, que os descontos guardam observância ao limite máximo de 70% (setenta por cento) da remuneração.
Não destoa esta Corte de Justiça: APELAÇÃO CÍVEL NA AÇÃO ORDINÁRIA.
EMPRÉSTIMO CONSIGNADO.
MILITAR DA RESERVA DA MARINHA DO BRASIL.
EXCESSO DE PERCENTUAL DE DESCONTO EM MARGEM DE CONSIGNAÇÃO NÃO IDENTIFICADO.
MEDIDA PROVISÓRIA Nº 2.215-10/2001.
NORMA ESPECÍFICA.
LIMITE DE DESCONTO DE 70% DA REMUNERAÇÃO OU PROVENTOS, INCLUÍDOS DESCONTOS OBRIGATÓRIOS E AUTORIZADOS.
RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. (APELAÇÃO CÍVEL, 0816109-90.2022.8.20.5001, Dra.
Martha Danyelle Barbosa substituindo Des.
Amilcar Maia, Terceira Câmara Cível, JULGADO em 03/05/2023, PUBLICADO em 08/05/2023) Por seu turno, mister ressaltar que em sede de Recurso Repetitivo, tema 1.085, o STJ adota o entendimento no sentido de que os empréstimos bancários com pagamento em débito na conta corrente do consumidor não se sujeitam ao limite previsto no art. 1º, §1º, da Lei n.º 10.820/2003.
Vejamos: RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA.
PRETENSÃO DE LIMITAÇÃO DOS DESCONTOS DAS PARCELAS DE EMPRÉSTIMO COMUM EM CONTA-CORRENTE, EM APLICAÇÃO ANALÓGICA DA LEI N. 10.820/2003 QUE DISCIPLINA OS EMPRÉSTIMOS CONSIGNADOS EM FOLHA DE PAGAMENTO.
IMPOSSIBILIDADE.
RATIFICAÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, COM FIXAÇÃO DE TESE REPETITIVA.
RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
PREJUDICADO O RECURSO ESPECIAL DA DEMANDANTE, QUE PLEITEAVA A MAJORAÇÃO DA VERBA HONORÁRIA. 1.
A controvérsia inserta no presente recurso especial repetitivo está em definir se, no bojo de contrato de mútuo bancário comum, em que há expressa autorização do mutuário para que o pagamento se dê por meio de descontos mensais em sua conta-corrente, é aplicável ou não, por analogia, a limitação de 35% (trinta e cinco por cento) prevista na Lei n. 10.820/2003, que disciplina o contrato de crédito consignado em folha de pagamento (chamado empréstimo consignado). 2.
O empréstimo consignado apresenta-se como uma das modalidades de empréstimo com menores riscos de inadimplência para a instituição financeira mutuante, na medida em que o desconto das parcelas do mútuo dá-se diretamente na folha de pagamento do trabalhador regido pela CLT, do servidor público ou do segurado do RGPS (Regime Geral de Previdência Social), sem nenhuma ingerência por parte do mutuário/correntista, o que,
por outro lado, em razão justamente da robustez dessa garantia, reverte em taxas de juros significativamente menores em seu favor, se comparado com outros empréstimos. 2.1 Uma vez ajustado o empréstimo consignado em folha de pagamento, não é dado ao mutuário, por expressa disposição legal, revogar a autorização concedida para que os descontos afetos ao mútuo ocorram diretamente em sua folha de pagamento, a fim de modificar a forma de pagamento ajustada. 2.2 Nessa modalidade de empréstimo, a parte da remuneração do trabalhador comprometida à quitação do empréstimo tomado não chega nem sequer a ingressar em sua conta-corrente, não tendo sobre ela nenhuma disposição.
Sob o influxo da autonomia da vontade, ao contratar o empréstimo consignado, o mutuário não possui nenhum instrumento hábil para impedir a dedução da parcela do empréstimo a ser descontada diretamente de sua remuneração, em procedimento que envolve apenas a fonte pagadora e a instituição financeira. 2.3 É justamente em virtude do modo como o empréstimo consignado é operacionalizado que a lei estabeleceu um limite, um percentual sobre o qual o desconto consignado em folha não pode exceder.
Revela-se claro o escopo da lei de, com tal providência, impedir que o tomador de empréstimo, que pretenda ter acesso a um crédito relativamente mais barato na modalidade consignado, acabe por comprometer sua remuneração como um todo, não tendo sobre ela nenhum acesso e disposição, a inviabilizar, por consequência, sua subsistência e de sua família. 3.
Diversamente, nas demais espécies de mútuo bancário, o estabelecimento (eventual) de cláusula que autoriza o desconto de prestações em conta-corrente, como forma de pagamento, consubstancia uma faculdade dada às partes contratantes, como expressão de sua vontade, destinada a facilitar a operacionalização do empréstimo tomado, sendo, pois, passível de revogação a qualquer tempo pelo mutuário.
Nesses empréstimos, o desconto automático que incide sobre numerário existente em conta-corrente decorre da própria obrigação assumida pela instituição financeira no bojo do contrato de conta-corrente de administração de caixa, procedendo, sob as ordens do correntista, aos pagamentos de débitos por ele determinados, desde que verificada a provisão de fundos a esse propósito. 3.1 Registre-se, inclusive, não se afigurar possível - consideradas as características intrínsecas do contrato de conta-corrente - à instituição financeira, no desempenho de sua obrigação contratual de administrador de caixa, individualizar a origem dos inúmeros lançamentos que ingressam na conta-corrente e, uma vez ali integrado, apartá-los, para então sopesar a conveniência de se proceder ou não a determinado pagamento, de antemão ordenado pelo correntista. 3.2 Essa forma de pagamento não consubstancia indevida retenção de patrimônio alheio, na medida em que o desconto é precedido de expressa autorização do titular da conta-corrente, como manifestação de sua vontade, por ocasião da celebração do contrato de mútuo.
Tampouco é possível equiparar o desconto em conta-corrente a uma dita constrição de salários, realizada por instituição financeira que, por evidente, não ostenta poder de império para tanto.
Afinal, diante das características do contrato de conta-corrente, o desconto, devidamente avençado e autorizado pelo mutuário, não incide, propriamente, sobre a remuneração ali creditada, mas sim sobre o numerário existente, sobre o qual não se tece nenhuma individualização ou divisão. 3.3 Ressai de todo evidenciado, assim, que o mutuário tem em seu poder muitos mecanismos para evitar que a instituição financeira realize os descontos contratados, possuindo livre acesso e disposição sobre todo o numerário constante de sua conta-corrente. 4.
Não se encontra presente nos empréstimos comuns, com desconto em conta-corrente, o fator de discriminação que justifica, no empréstimo consignado em folha de pagamento, a limitação do desconto na margem consignável estabelecida na lei de regência, o que impossibilita a utilização da analogia, com a transposição de seus regramentos àqueles.
Refoge, pois, da atribuição jurisdicional, com indevida afronta ao Princípio da Separação do Poderes, promover a aplicação analógica de lei à hipótese que não guarda nenhuma semelhança com a relação contratual legalmente disciplinada. 5.
Não se pode conceber, sob qualquer ângulo que se analise a questão, que a estipulação contratual de desconto em conta-corrente, como forma de pagamento em empréstimos bancários comuns, a atender aos interesses e à conveniência das partes contratantes, sob o signo da autonomia da vontade e em absoluta consonância com as diretrizes regulamentares expedidas pelo Conselho Monetário Nacional, possa, ao mesmo tempo, vilipendiar direito do titular da conta-corrente, o qual detém a faculdade de revogar o ajuste ao seu alvedrio, assumindo, naturalmente, as consequências contratuais de sua opção. 6.
A pretendida limitação dos descontos em conta-corrente, por aplicação analógica da Lei n. 10.820/2003, tampouco se revestiria de instrumento idôneo a combater o endividamento exacerbado, com vistas à preservação do mínimo existencial do mutuário. 6.1 Essa pretensão, além de subverter todo o sistema legal das obrigações - afinal, tal providência, a um só tempo, teria o condão de modificar os termos ajustados, impondo-se ao credor o recebimento de prestação diversa, em prazo distinto daquele efetivamente contratado, com indevido afastamento dos efeitos da mora, de modo a eternizar o cumprimento da obrigação, num descabido dirigismo contratual -, não se mostraria eficaz, sob o prisma geral da economia, nem sequer sob o enfoque individual do mutuário, ao controle do superendividamento. 6.2 Tal proceder, sem nenhum respaldo legal, importaria numa infindável amortização negativa do débito, com o aumento mensal e exponencial do saldo devedor, sem que haja a devida conscientização do devedor a respeito do dito "crédito responsável", o qual, sob a vertente do mutuário, consiste na não assunção de compromisso acima de sua capacidade financeira, sem que haja o comprometimento de seu mínimo existencial.
Além disso, a generalização da medida - sem conferir ao credor a possibilidade de renegociar o débito, encontrando-se ausente uma política pública séria de "crédito responsável", em que as instituições financeiras,
por outro lado, também não estimulem o endividamento imprudente - redundaria na restrição e no encarecimento do crédito, como efeito colateral. 6.3 A prevenção e o combate ao superendividamento, com vistas à preservação do mínimo existencial do mutuário, não se dão por meio de uma indevida intervenção judicial nos contratos, em substituição ao legislador.
A esse relevante propósito, sobreveio - na seara adequada, portanto - a Lei n. 14.181/2021, que alterou disposições do Código de Defesa do Consumidor, para "aperfeiçoar a disciplina do crédito ao consumidor e dispor sobre a prevenção e o tratamento do superendividamento. 7.
Ratificação da uníssona jurisprudência formada no âmbito das Turmas de Direito Privado do Superior Tribunal de Justiça, explicitada por esta Segunda Seção por ocasião do julgamento do REsp 1.555.722/SP. 8.
Tese Repetitiva: São lícitos os descontos de parcelas de empréstimos bancários comuns em conta-corrente, ainda que utilizada para recebimento de salários, desde que previamente autorizados pelo mutuário e enquanto esta autorização perdurar, não sendo aplicável, por analogia, a limitação prevista no § 1º do art. 1º da Lei n. 10.820/2003, que disciplina os empréstimos consignados em folha de pagamento. 9.
Recurso especial da instituição financeira provido; e prejudicado o recurso especial da demandante. (REsp n. 1.863.973/SP, relator Ministro Marco Aurélio Bellizze, Segunda Seção, julgado em 9/3/2022, DJe de 15/3/2022.) (Grifei) Dessa forma, embora o autor tenha sofrido descontos consignados em sua folha de pagamento, conclui-se que estes não superaram o limite legal.
Outrossim, se mostra inviável a limitação dos créditos bancários contratados como medida de garantia do mínimo existencial neste caso, com base na Lei do Superendividamento (Lei nº 14.181/2021), que alterou o CDC, porque as medidas trazidas por esta legislação somente se aplicam após o requerimento do consumidor perante o Juízo que preside o feito e realização da respectiva audiência conciliatória, sendo imprescindível a apresentação, pelo Consumidor, de proposta de plano de pagamento com prazo máximo de 5 (cinco) anos, preservadas as garantias e as formas de pagamento originalmente pactuadas, consoante dispõe o art. 104-A do CDC, o que inexiste neste caso.
Nessa linha de entendimento: CIVIL.
PROCESSUAL CIVIL.
CONSUMIDOR.
AGRAVO DE INSTRUMENTO.
AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C COM PEDIDO DE REPARAÇÃO DE DANOS MORAIS.
DECISÃO QUE INDEFERIU O PEDIDO LIMINAR.
SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL.
CONTRATO DE EMPRÉSTIMO.
MÚTUO BANCÁRIO.
DESCONTO EM CONTA CORRENTE.
PEDIDO DE LIMITAÇÃO EM 30% (TRINTA POR CENTO) O DESCONTO NOS RENDIMENTOS.
DECRETO Nº 30.352/2021.
INAPLICABILIDADE.
RESTRIÇÃO ADOTADA SOMENTE AOS CONTRATOS DE EMPRÉSTIMOS CONSIGNADOS, COM DESCONTO EM FOLHA DE PAGAMENTO.
RESP. 1.863.973/SP, 1.872.441/SP E 1.877.113/SP, JULGADO SOB O RITO DOS RECURSOS REPETITIVOS.
TEMA 1085.
ALEGAÇÃO DE SUPERENDIVIDAMENTO.
NÃO COMPROVAÇÃO.
AUSÊNCIA DE PLANO DE PAGAMENTO.
IMPOSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DO ART. 104-A DO CDC.
RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (AGRAVO DE INSTRUMENTO, 0807449-41.2023.8.20.0000, Des.
Claudio Santos, Primeira Câmara Cível, JULGADO em 20/10/2023, PUBLICADO em 23/10/2023) Por seu turno, igualmente afastada a existência de abusividade nas taxas de juros dos contratos n°s 110873968 e nº 962064982 firmados com o Banco do Brasil, conforme já bem delineado na origem.
Nesse ponto, por sua pertinência, destaco trecho do julgado singular: Dessa feita, seguindo orientação jurisprudencial vinculante, na forma da legislação processual civil mencionada, reviso meu anterior posicionamento, para considerar abusivas apenas as taxas contratuais de juros superiores a uma vez e meia a média de mercado.
Atento aos contratos de mútuo ora demandados de id 89798630 – páginas 12, 13, 14, 15 e 16 verifico a imposição do percentual de custo efetivo total de 5,99% (cinco vírgula noventa e nove por cento) ao mês e 100,99% (cem vírgula noventa e nove por cento) ao ano para o contrato nº110873968 e 4,39%(quatro vírgula trinta e nove por cento) ao mês e 67,45% (sessenta e sete vírgula quarenta e cinco por cento) ao ano para o contrato nº 962064982 enquanto a taxa média de mercado para empréstimo pessoal não consignado, segundo sítio do Banco Central do Brasil na internet, indicava o patamar de 85,30% (oitenta e cinco vírgula trinta por cento) ao ano em agosto de 2022 e 85,21% ao ano em março de 2021, datas das pactuações litigadas, demonstrando, desta maneira, estarem as taxas contratadas em patamar inferior a uma vez e meia a média praticada pelo mercado, não havendo ilegalidade a ser declarada neste ponto”.
Por fim, ausente falha na prestação do serviço, descabe a indenização dos danos morais.
Ante o exposto, conheço e nego provimento ao apelo, mantendo a sentença recorrida.
Diante do resultado da insurgência, em atenção ao disposto no art. 85, §11, do CPC, majoro para 12% (doze por cento) os honorários advocatícios, ficando suspensa a exigibilidade em razão da Justiça Gratuita, nos termos do art. 98, § 3º do CPC. É como voto.
Natal, data do registro eletrônico.
Desembargador Cornélio Alves Relator Natal/RN, 25 de Março de 2024. -
05/03/2024 00:00
Intimação
Poder Judiciário do Rio Grande do Norte Primeira Câmara Cível Por ordem do Relator/Revisor, este processo, de número 0897239-05.2022.8.20.5001, foi pautado para a Sessão VIRTUAL (votação exclusivamente pelo PJe) do dia 25-03-2024 às 08:00, a ser realizada no Primeira Câmara Cível (NÃO VIDEOCONFERÊNCIA).
Caso o processo elencado para a presente pauta não seja julgado na data aprazada acima, fica automaticamente reaprazado para a sessão ulterior.
No caso de se tratar de sessão por videoconferência, verificar o link de ingresso no endereço http://plenariovirtual.tjrn.jus.br/ e consultar o respectivo órgão julgador colegiado.
Natal, 4 de março de 2024. -
27/11/2023 18:02
Recebidos os autos
-
27/11/2023 18:02
Conclusos para despacho
-
27/11/2023 18:02
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
27/11/2023
Ultima Atualização
01/04/2024
Valor da Causa
R$ 0,00
Documentos
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