TJRN - 0800210-43.2023.8.20.5122
2ª instância - Câmara / Desembargador(a) Expedito Ferreira de Souza
Processos Relacionados - Outras Instâncias
Polo Ativo
Polo Passivo
Assistente Desinteressado Amicus Curiae
Advogados
Nenhum advogado registrado.
Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
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17/10/2023 00:00
Intimação
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE PRIMEIRA CÂMARA CÍVEL Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0800210-43.2023.8.20.5122 Polo ativo MARIA DAS GRACAS FERREIRA GOMES Advogado(s): GIOVANI FORTES DE OLIVEIRA Polo passivo BANCO MERCANTIL DO BRASIL SA Advogado(s): MARCOS DELLI RIBEIRO RODRIGUES EMENTA: DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL.
APELAÇÃO CÍVEL.
DESCONTO NA CONTA BANCÁRIA DA PARTE AUTORA POR CONTRATAÇÃO DE EMPRÉSTIMO.
RESPONSABILIDADE CIVIL RECONHECIDA NA SENTENÇA.
COBRANÇA INDEVIDA DE VALORES PELA PARTE DEMANDADA.
ATUAÇÃO ILEGÍTIMA QUE SE RECONHECE.
DEVOLUÇÃO EM DOBRO DOS VALORES DESCONTADOS INDEVIDAMENTE.
PRECEDENTES DESTA CORTE DE JUSTIÇA.
DANO MORAL CONFIGURADO.
INDENIZAÇÃO QUE SE IMPÕE.
QUANTUM ESTABELECIDO EM OBSERVÂNCIA AOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE.
APELO CONHECIDO E PROVIDO.
ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos em que são partes as acima identificadas: Acordam os Desembargadores que integram a 2ª Turma da 1ª Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, à unanimidade de votos, em conhecer do apelo da parte autora, para, no mérito, julgá-lo provido, nos termos do voto do relator.
RELATÓRIO Trata-se de apelação cível interposta pela parte autora em face de sentença proferida pelo Juízo da Vara Única da Comarca de Martins/RN (ID 21087169), que julgou parcialmente procedentes os pleitos iniciais, reconhecendo a nulidade da contratação de cartão de crédito, condenando a parte demandada a restituir na forma simples os valores descontados indevidamente e indeferindo o pedido de indenização por danos morais.
No mesmo dispositivo, a parte demandada foi condenada ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação.
A parte autora apresentou recurso no ID 21087772, onde alega que a sentença deve ser reformada para estabelecer o dano moral, discorrendo acerca da responsabilidade objetiva da parte demandada.
Afirma que a repetição do indébito deve ser em dobro.
Termina requerendo o provimento do recurso.
A parte demandada apresentou contrarrazões no ID 21087773, ratificando a legalidade da contratação.
Justifica a inexistência de danos morais, tendo em vista que os descontos foram autorizados e são lícitos, não havendo que se falar em qualquer irregularidade, existindo apenas o mero aborrecimento da parte autora.
Prequestiona a matéria discutida nos autos.
Pondera sobre a compensação dos valores recebidos pela parte autora.
Explica que o valor emprestado foi devidamente recebido pela parte autora em sua conta corrente.
Postula, por fim, pelo desprovimento do recurso.
Instado a se manifestar, o Ministério Público afirmou inexistir interesse público hábil a justificar sua intervenção no feito (ID 14917102). É o que importa relatar.
VOTO Restando preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço do recurso.
Cinge-se o mérito recursal em perquirir acerca da existência de dano moral no caso concreto, bem como se a repetição do indébito deve ser em dobro.
Preambularmente, cumpre fixar que o caso vertente deve ser apreciado sob o manto da teoria da responsabilidade objetiva, aplicando-se os preceitos insculpidos pelo Código de Defesa do Consumidor, sobretudo o disposto em seu art. 14, caput, que prescreve: Art. 14.
O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.
Em extrato, pode-se afirmar que a teoria da responsabilidade objetiva está vinculada à ideia do risco, de modo que quem provoca uma lesão ao valor alheio é, ipso facto, responsável pelo ressarcimento decorrente.
Essa obrigação pela recomposição do prejuízo independerá da verificação – comprovação – de culpa na conduta do agente lesante.
Tem-se, pois, como dispensada a demonstração da culpa, sendo suficiente a ocorrência do dano e sua associação à conduta que o causou (nexo de causalidade) para haver a responsabilidade.
Portanto, a responsabilidade objetiva se caracteriza por ser independente da presença de culpa no agir do que ocasionou a lesão, mas não prescinde da presença dos demais elementos da responsabilidade civil, tendo que haver nexo causal adequado entre a atividade do que causou o dano e a lesão provocada ao acervo jurídico do lesado.
Cumpre, pois, examinar a existência dos caracteres identificadores da responsabilidade civil na espécie, analisando se houve realmente o ato lesivo, identificando-se a parte responsável pelo ato, e, por fim, o nexo de causalidade entre a conduta e o possível dano experimentado.
A ilegalidade da cobrança foi reconhecida na sentença e não houve interposição de recurso pela parte demandada.
Destarte, constata-se que a parte demandada causou diversos constrangimentos à parte autora, descontando valores de sua conta bancária sem respaldo em avença estabelecida entre os litigantes, sendo-lhe, portanto, devida a indenização correspondente à situação vexatória pela qual foi submetida, bem como o direito de ser ressarcido pelos valores descontados indevidamente, não sendo afastada a responsabilidade civil consignada na sentença.
Evidencia-se, pois, que a parte demandada não agiu no exercício regular de seus direitos, tendo empreendido conduta ilegítima e passível de censura pela norma jurídica.
Desta feita, os descontos especializaram-se de forma ilegítima, desatendendo às cautelas reclamadas pelo ordenamento jurídico, razão pela qual se traduz em atuação irregular da parte demandada, advindo, como consequência, efeitos negativos sobre a esfera material e moral da parte autora.
Quanto à repetição do indébito, considerando que os descontos na conta bancária do autor estavam sendo efetuados sem que houvesse previsão contratual a embasá-los, resta evidenciada a má-fé da parte demandada na conduta, devendo a condenação ser em dobro, reformando-se a sentença neste ponto.
Ademais, considerando que o atual entendimento do Superior de Justiça impõe a repetição do indébito, na forma do art. 42, parágrafo único do Código de Defesa do Consumidor, independente da má-fé do credor, a repetição em dobro dos valores indevidamente descontados deve ser determinada.
Neste diapasão, válidas as transcrições: AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NOS EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL.
DIREITO DO CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL.
TELEFONIA.
COBRANÇA INDEVIDA.
REPETIÇÃO DE INDÉBITO EM DOBRO.
PROVA DE MÁ-FÉ DO CREDOR.
DESNECESSIDADE.
PRECEDENTE DA CORTE ESPECIAL.
MANUTENÇÃO DA DECISÃO AGRAVADA MANTIDA. 1. "A repetição em dobro, prevista no parágrafo único do art. 42 do CDC, é cabível quando a cobrança indevida consubstanciar conduta contrária à boa-fé objetiva, ou seja, deve ocorrer independentemente da natureza do elemento volitivo" (EAREsp 600.663/RS, Rel.
Min.
MARIA TEREZA DE ASSIS MOURA, Rel. para Acórdão Min.
HERMAN BENJAMIN, CORTE ESPECIAL, julgado em 21/10/2020, DJe de 30/03/2021). 2.
Na hipótese, o acórdão embargado exigiu como requisito a má-fé, para fins de aplicação do parágrafo único do art. 42 do CDC, com a orientação firmada pela Corte Especial do STJ. 3.
AGRAVO INTERNO A QUE SE NEGA PROVIMENTO (AgInt nos EDcl nos EAREsp 656.932/RS, Rel.
Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, CORTE ESPECIAL, julgado em 08/09/2021, DJe 10/09/2021 – Destaque acrescido).
DIREITO PROCESSUAL CIVIL E DO CONSUMIDOR.
EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA.
HERMENÊUTICA DAS NORMAS DE PROTEÇÃO DO CONSUMIDOR.
REPETIÇÃO DE INDÉBITO.
DEVOLUÇÃO EM DOBRO.
PARÁGRAFO ÚNICO DO ART. 42 DO CDC.
REQUISITO SUBJETIVO.
DOLO/MÁ-FÉ OU CULPA.
IRRELEVÂNCIA.
PREVALÊNCIA DO CRITÉRIO DA BOA-FÉ OBJETIVA.
MODULAÇÃO DE EFEITOS PARCIALMENTE APLICADA.
ART. 927, § 3º, DO CPC/2015. [...] TESE FINAL 28.
Com essas considerações, conhece-se dos Embargos de Divergência para, no mérito, fixar-se a seguinte tese: A REPETIÇÃO EM DOBRO, PREVISTA NO PARÁGRAFO ÚNICO DO ART. 42 DO CDC, É CABÍVEL QUANDO A COBRANÇA INDEVIDA CONSUBSTANCIAR CONDUTA CONTRÁRIA À BOA-FÉ OBJETIVA, OU SEJA, DEVE OCORRER INDEPENDENTEMENTE DA NATUREZA DO ELEMENTO VOLITIVO.
MODULAÇÃO DOS EFEITOS 29.
Impõe-se MODULAR OS EFEITOS da presente decisão para que o entendimento aqui fixado - quanto a indébitos não decorrentes de prestação de serviço público - se aplique somente a cobranças realizadas após a data da publicação do presente acórdão.
RESOLUÇÃO DO CASO CONCRETO 30.
Na hipótese dos autos, o acórdão recorrido fixou como requisito a má-fé, para fins do parágrafo único do art. 42 do CDC, em indébito decorrente de contrato de prestação de serviço público de telefonia, o que está dissonante da compreensão aqui fixada.
Impõe-se a devolução em dobro do indébito.
CONCLUSÃO 31.
Embargos de Divergência providos (STJ - EREsp: 1413542 RS 2013/0355826-9, Relator: Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, Data de Julgamento: 21/10/2020, CE - CORTE ESPECIAL, Data de Publicação: DJe 30/03/2021 – Realce proposital).
Noutro quadrante, a decisão hostilizada deve ser alterada, também, para reconhecer a obrigação de reparar o dano moral reclamado pela parte autora.
Cotejando-se os elementos probantes trazidos aos autos, dessume-se restar presente o menoscabo moral suportado pela parte autora, decorrente do fato de ter sido cobrada indevidamente por um débito que não contraiu, sendo inconteste o abalo causado ao seu acervo de direitos, notadamente pela exposição a situação vexatória.
Na forma como anteriormente referido, presente se verifica o nexo de causalidade, estando patente no corpo dos autos que fora a atitude desidiosa da parte demandada a responsável pela concretização de danos imateriais suportados pela demandante.
Assim, presentes, in casu, os requisitos necessários para o reconhecimento do dever de indenizar e inexistindo qualquer causa excludente da responsabilidade, insurge-se forçosa a obrigação da parte apelante de reparar o dano moral que deu ensejo.
Sobre o quantum indenizatório, ainda que não exista imperativo legal para se chegar ao arbitramento da indenização pelos danos morais, deve o julgador valer-se de parâmetros que revelem a apreciação das circunstâncias que identifiquem a perfectibilização do dano, examinando-se a conduta da parte vitimada e do causador do gravame, analisando, ainda, as características pessoais de cada parte; a repercussão social do abalo; a capacidade econômica da parte vitimada e do causador da lesão, e da possibilidade de composição do agravo em pecúnia.
Acerca da fixação do valor da indenização pelos danos morais, Sílvio de Salvo Venosa leciona que "(...) Qualquer indenização não pode ser tão mínima a ponto de nada reparar, nem tão grande a ponto de levar à penúria o ofensor, criando para o estado mais um problema social.
Isso é mais perfeitamente válido no dano moral.
Não pode igualmente a indenização ser instrumento de enriquecimento sem causa para a vítima; nem ser de tal forma insignificante ao ponto de ser irrelevante ao ofensor, como meio punitivo e educativo, uma vez que a indenização desse jaez tem também essa finalidade" (Direito Civil – Teoria Geral das Obrigações e Teoria Geral dos Contratos, Ed.
Atlas, 2004, p. 269).
Na reparação pelo dano moral, não se busca a composição completa do gravame, mas se intenta operar uma justa compensação pelos prejuízos experimentados pela parte.
Não deve se comportar a indenização pecuniária arbitrada pelo magistrado como uma forma de premiar a parte ofendida.
Guarda a prestação reparatória relação íntima com a compensação pelo dano experimentado, sendo este o pressuposto para a sua concessão.
De acordo com a orientação adotada, os danos morais devem ser arbitrados em obediência aos critérios da razoabilidade e proporcionalidade, de modo a fazer com que nem os prejuízos morais gerados ao ofendido sejam relegados a segundo plano, nem a conjuntura econômica do ofensor seja exorbitada.
Assim sendo, fixo o valor da prestação indenizatória no montante de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), o qual se mostra compatível com os danos morais ensejados, consentâneo com a gravidade do ato lesivo e com as repercussões decorrentes da lesão causada, atendendo, pois, aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, bem como com os precedentes desta Corte de Justiça sobre o tema.
Referido valor deve ser atualizado, incidindo correção monetária a partir do arbitramento, conforme Súmulas nº 362 do Superior Tribunal de Justiça, e juros de mora a partir do evento danoso, de acordo com a Súmula nº 54 do referido Tribunal.
Desta feita, a sentença deve ser reformada para determinar a restituição do indébito em dobro e fixar o valor indenizatório do dano moral em R$ 5.000,00 (cinco mil reais), devidamente atualizado, dando-se provimento ao apelo da parte autora, restando autorizada a compensação de eventuais valores depositados na conta bancária da parte autora, sob pena de enriquecimento ilícito da parte autora.
Por fim, deixo de aplicar o § 11 do art. 85 do Código de Ritos, com base no entendimento do Superior Tribunal de Justiça, em face do provimento do recurso.
Ante o exposto, voto pelo provimento do apelo da parte autora, para determinar a repetição do indébito em dobro e o pagamento de indenização por dano moral em R$ 5.000,00 (cinco mil reais), devidamente atualizado na forma da lei. É como voto.
Natal/RN, 9 de Outubro de 2023. -
25/08/2023 13:34
Proferido despacho de mero expediente
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25/08/2023 11:56
Recebidos os autos
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25/08/2023 11:56
Conclusos para despacho
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25/08/2023 11:56
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
25/08/2023
Ultima Atualização
16/10/2023
Valor da Causa
R$ 0,00
Documentos
ACÓRDÃO • Arquivo
DESPACHO • Arquivo
DESPACHO • Arquivo
SENTENÇA • Arquivo
DECISÃO • Arquivo
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