TJRN - 0810860-92.2023.8.20.0000
2ª instância - Câmara / Desembargador(a) Gilson Barbosa
Processos Relacionados - Outras Instâncias
Polo Ativo
Polo Passivo
Advogados
Nenhum advogado registrado.
Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
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30/10/2023 00:00
Intimação
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE CÂMARA CRIMINAL Processo: HABEAS CORPUS CRIMINAL - 0810860-92.2023.8.20.0000 Polo ativo JULIANA XAVIER DA COSTA Advogado(s): PAULO AUGUSTO PINHEIRO DA SILVA Polo passivo Juiza de Direito da 7º Vara Criminal de Natal Advogado(s): PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE Gabinete do Desembargador Gilson Barbosa – Juiz Convocado Ricardo Tinoco Habeas Corpus n. 0810860-92.2023.8.20.0000 Impetrante: Dr.
Paulo Augusto Pinheiro OAB/RN 9790 Paciente: Juliana Xavier da Costa Aut.
Coatora: Juiz de Direito da 7ª Vara Criminal da Comarca de Natal/RN Relator: Juiz Convocado Ricardo Tinoco EMENTA: CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL PENAL.
HABEAS CORPUS.
PACIENTE DENUNCIADA PELO CRIME DE APROPRIAÇÃO INDÉBITA EM RAZÃO DA PROFISSÃO (ART. 168, § 1º, III, C/C ART. 71 (DUAS VEZES), AMBOS DO CP).
PRETENSO TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL POR FALTA DE JUSTA CAUSA.
DESCABIMENTO.
HIPÓTESE APLICÁVEL SOMENTE NOS CASOS DE ATIPICIDADE DA CONDUTA OU QUANDO NÃO HÁ INDÍCIOS DE AUTORIA E EXISTÊNCIA DE MATERIALIDADE DELITIVA.
PRESENÇA DE LASTRO PROBATÓRIO MÍNIMO PARA SUPEDANEAR A DENÚNCIA.
REQUISITOS DO ART. 41 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL ATENDIDOS.
INEXISTÊNCIA DE QUALQUER CAUSA DE REJEIÇÃO DA DENÚNCIA PREVISTA NO ART. 395 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL.
PRETENSA REALIZAÇÃO DO ACORDO DE NÃO PERSECUÇÃO PENAL - ANPP, PREVISTO NO ARTIGO 28-A DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL.
POSSIBILIDADE ATÉ O TRÂNSITO EM JULGADO DA SETENÇA.
RETROATIVIDADE DA LEI PARA CRIMES COMETIDOS ANTES DA VIGÊNCIA DO PACOTE ANTICRIME (LEI 13.964/2019).
OBSERVÂNCIA AO ART. 28-A § 14 DO CPP.
CONSTRANGIMENTO ILEGAL EVIDENCIADO.
ORDEM CONHECIDA E CONCEDIDA PARCIALMENTE.
DISSONÂNCIA COM O PARECER DA 6ª PROCURADORIA DE JUSTIÇA.
ACÓRDÃO Acordam os Desembargadores que integram a Câmara Criminal deste Tribunal de Justiça, por unanimidade, em dissonância com o parecer da 6ª Procuradoria de Justiça, conhecer e conceder parcialmente a ordem de habeas corpus, para determinar que sejam os autos remetidos ao Procurador-Geral de Justiça, com fulcro no art. 28-A, § 14, do Código de Processo Penal nos termos do voto do relator, parte integrante deste.
RELATÓRIO Trata-se de habeas corpus com pedido liminar impetrado pelo advogado Paulo Augusto Pinheiro em favor de Juliana Xavier da Costa, apontando como autoridade coatora o Juízo de Direito da 7ª Vara Criminal da Comarca de Natal.
Nas razões, informou o impetrante que a paciente foi denunciada pela suposta prática do crime previsto no art. 168, § 1º, III, na forma do art. 71 (2x), ambos do Código Penal.
Alegou que a paciente figura como denunciada na Ação Penal n. 0106139-43.2020.8.20.0001, sem qualquer fundamento legal ou fático, ante a ausência de materialidade delitiva e da própria existência de crime.
Asseverou que é totalmente descabida a acusação ministerial, tendo em vista que a imputação se deu pelo fato da paciente, na condição de advogada, não ter repassado, em momento oportuno, os valores recebidos de um acordo firmado entre seus clientes e outra parte.
Destacou que “não obstante, em decorrência da denúncia, mesmo considerando o acordo inserido nos autos, em que a paciente e seus respectivos clientes transigiram no recebimento de valores, inclusive, com depósitos em cumprimento a obrigação” (sic) o juízo a quo recebeu a denúncia ofertada.
Segue narrando sobre a inexistência de justa causa para prosseguimento da presente ação penal.
Acrescentou ainda que “mesmo com documentos que comprovariam a ausência de dolo da ré, e ainda, que a controvérsia tratada foi proveniente de suposta desajuste contratual e mesmo assim, resolvido entre as partes, o ministério público aforou denúncia em desfavor da defendente em situação que jamais poderia configurar crime” (sic) Relatou sobre a ausência de fundamentos na decisão que indeferiu a remessa dos autos ao Ministério Publico em grau de revisão para oferecimento do ANPP.
Ao final, requereu: a) Que, seja SOBRESTADA a tramitação da ação penal nº. 0106139-43.2020.8.20.0001, originada na 7ª vara criminal de Natal/RN, em relação a paciente JULIANA XAVIER DA COSTA até julgamento de mérito do presente writ, tendo em vista, que a audiência de instrução processual foi aprazada para o dia 10/10/2023 às 09:00, podendo gerar prejuízos irreparáveis a paciente, ante a grande probabilidade de persecução infundada e mácula na própria carreira profissional; NO MÉRITO: b) Requer-se o TRANCAMENTO da ação penal nº. 0106139-43.2020.8.20.0001, em relação a JULIANA XAVIER DA COSTA, considerando a ausência da lesão jurídica provocada, visto o adimplemento voluntário (contrato extrajudicial) e no reconhecimento de que o caráter subsidiário do sistema penal reclama e impõe, em função dos próprios objetivos por ele visados, a intervenção mínima do Poder Público, por conseguinte, a atipicidade dos fatos e da manifesta ausência de justa causa, em relação aos crimes tipificados no artigo 168, §1º, inciso III, na forma do artigo 71 (2x), ambos do Código Penal; SUBSIDIARIAMENTE, caso não entenda pelo trancamento, requer, a concessão da ordem, pela não observância do art. 28-A do CPP (introduzido pelo Pacote Anticrime - Lei n. 13.964/2019), e, por conseguinte, que se remeta os autos ao ministério público com suspensão da ação penal acerca de eventual interesse na propositura de acordo de não persecução penal, nos termos do artigo supracitado; c) Declaramos, por fim, a autenticidade dos documentos que instruem a presente ordem; (sic) Acostou aos autos documentos.
No termo de busca, ID. 21238435, expedido pela Secretaria Judiciária deste Tribunal, consta a inexistência de outros processos em nome da paciente.
Liminar indeferida, ID. 21253742.
A autoridade coatora prestou informações, ID. 21468791.
A 6ª Procuradoria de Justiça, no parecer ofertado, ID. 21498931, opinou pelo conhecimento e denegação da ordem impetrada. É o relatório.
VOTO O cerne inicial da presente ação constitucional de habeas corpus consiste no trancamento da Ação Penal 0106139-43.2020.8.20.0001 em relação à paciente.
Razão não assiste ao impetrante.
Registre-se que o trancamento de uma ação penal na esfera estreita do habeas corpus somente é pertinente quando for irrefutável que o fato descrito na denúncia é atípico, ou falta prova da materialidade ou de indícios suficientes de autoria, ou incidir causa extintiva da punibilidade ou, ainda, houver violação dos elementos exigidos para a peça acusatória.
No caso específico dos autos, a controvérsia restringe-se à suposta inépcia da denúncia e consequente ausência de justa causa para a propositura da ação.
Verifica-se, no entanto, do contexto indiciário, que há elementos suficientes para a instauração do processo criminal.
Isso porque se observa da peça acusatória que estão presentes os requisitos do art. 41 do Código de Processo Penal, pois houve a exposição do fato criminoso e as suas circunstâncias, tendo o órgão acusador delimitado a conduta da denunciada de forma clara e apta a ensejar o regular processo e o exercício da ampla defesa, não se constatando a alegada inépcia (ID. 21168330).
Veja-se: " Entre os anos de 2017 e 2018, nesta Capital, a denunciada se apropriou de coisa alheia móvel de que tinha a posse ou detenção em razão de profissão, em prejuízo das vítimas Nélio dos Santos Souza e Maria Lucilene Leandro Souza.
Depreende-se dos autos que em 2006 Nélio e sua esposa firmaram com a COOPHAB/RN contrato de promessa de compra e venda de um imóvel situado no Residencial Esplanada dos Jardins, mediante o pagamento de 130 (cento e trinta) parcelas de R$ 470,57 (quatrocentos e setenta reais e cinquenta e sete centavos), cujo início se deu em 10 de maio daquele ano.
Ao final do prazo estipulado para a entrega do apartamento e já tendo sido quitadas 115 (cento e quinze) parcelas, a cooperativa não entregou o apartamento.
Assim, Nélio contratou a advogada JULIANA, a fim de que ela ajuizasse ação cível contra a cooperativa, buscando o ressarcimento financeiro das despesas decorrentes de alugueis.
Com o êxito do Processo nº 0822334 64.2015.8.20.5004, do 9º Juizado Especial Cível Central de Natal, a COOPHAB foi condenada a ressarcir o montante de R$ 19.345,23 (dezenove mil, trezentos e quarenta e cinco reais e vinte e três centavos) às vítimas.
Assim, em 12/06/2017, foram expedidos dois alvarás: um em favor de Nélio e Maria Lucilene; e outro para a advogada, de R$ 3.869,05 (três mil, oitocentos e sessenta e nove reais e cinco centavos).
Ocorre que JULIANA levantou as quantias mencionadas e repassou para Nélio Souza apenas R$ 15.400,00 (quinze mil e quatrocentos reais), locupletando-se da diferença, que alegou ser devida a título de honorários advocatícios, muito embora a parte ofendida já tivesse pago anteriormente a quantia cobrada pelos serviços. […] Em verdade, JULIANA ajuizou 05 (cinco) ações em favor dos clientes em questão contra a cooperativa, sendo elas: 0855196-97.2015.8.20.5001 (9ª Vara Cível de Natal – extinta sem resolução do mérito, por desistência); 082233464.2015.8.20.5004 (9º JEC Natal – com sentença condenatória do pagamento dos alugueis de 2013 a 2016); 0814979-32.2017.8.20.5004 (3º JEC Natal – extinta sem julgamento do mérito, em razão da desistência da parte autora); 0816615-33.2017.8.20.5004 (3º JEC Natal – extinta sem resolução do mérito por litispendência); e 0814980-17.2017.8.20.5004 (3º JEC Natal – com sentença condenatória de restituição dos valores pagos e dos alugueis de 2016 a 2017, totalizando a quantia de R$ 38.160,00 (trinta e oito mil e cento e sessenta reais) (ID 98751417 - Pág. 39).
Acontece que Maria Lucilene descobriu posteriormente que, nada obstante a existência do título executivo judicial, a acusada havia assinado um acordo com a cooperativa para receber o montante de R$ 35.000,00 (trinta e cinco mil reais).
De fato, a COOPHAB apresentou judicialmente a cópia do referido acordo e os comprovantes de depósitos de três parcelas iguais de R$ 11.666,66 (onze mil seiscentos e sessenta e seis reais e sessenta e seis centavos) na conta bancária da ré, em 20/09/2018, 19/10/2018 e 20/11/2018 (ID 98751417 – Págs. 44 e 48-50).
Assim sendo, pela segunda vez JULIANA se apropriou do crédito devido aos ofendidos […]" Ressalte-se que não é cabível a valoração das provas quando do juízo de admissibilidade da denúncia realizado pela autoridade coatora, devendo esta se limitar ao recebimento da peça de acusação, caso não vislumbrada hipótese de rejeição prevista no art. 395 do CPP, para que, após a instrução processual, possa se concluir pela responsabilidade penal ou não da paciente, como procedido pela magistrada.
Partindo de tais premissas, verifica-se que a situação em apreço narra fato típico, antijurídico e culpável, com o devido zelo, definindo suas circunstâncias, a classificação do crime, o que viabiliza o exercício da ampla defesa e do contraditório pela defesa pessoal e técnica, bem como a aplicação da lei penal.
Igualmente, não se observa a incidência de qualquer causa de rejeição da denúncia prevista no art. 395 do CPP, enquanto se constata a presença de justa causa para o exercício da ação penal, essencialmente porque os fatos descritos na peça acusatória configuram, em tese, o crime de apropriação indébita em razão de profissão.
Por seu turno, a materialidade e os indícios de autoria evidenciam-se pelas provas constantes nos autos, especialmente, cópias das transações de transferências, alvarás judiciais, as declarações das vítimas, além do boletim de ocorrência e demais elementos contidos no inquérito policial.
Dessa forma, presentes a materialidade e os indícios da autoria delitiva, no contexto da denúncia ofertada pelo Ministério Público, evidenciadas diante das provas coletadas, possível a propositura da ação penal, de modo que não se afigura manifestamente ilegal o recebimento da denúncia em desfavor da paciente, razão pela qual não pode ser fulminada de plano pela via estreita do habeas corpus como pretendido.
Ademais, somente a análise mais detida do conjunto probatório, durante a instrução processual, pode levar à conclusão pela existência ou não dos vícios alegados pela defesa.
A propósito: "PROCESSO PENAL.
AGRAVO REGIMENTAL DA DECISÃO QUE NEGOU PROVIMENTO AO RECURSO ORDINÁRIO.
PEDIDO DE SUSTENTAÇÃO ORAL.
IMPOSSIBILIDADE.
AUSÊNCIA DE PREVISÃO REGIMENTAL.
TESE DE VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DA COLEGIALIDADE E DA AMPLA DEFESA.
ARTS. 34, XX, E 202 DO RISTJ.
NÃO OCORRÊNCIA.
INTERPOSIÇÃO DO AGRAVO REGIMENTAL.
SUPERAÇÃO DE EVENTUAIS VÍCIOS.
TESES DE INÉPCIA DA DENÚNCIA E DE AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA.
PEDIDO .DENÚNCIADE TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL.
IMPROCEDENTE APTA.
PROVA DE MATERIALIDADE E INDÍCIOS DE AUTORIA DEMONSTRADOS.
VEROSSIMILHANÇA E PROBABILIDADE DAS IMPUTAÇÕES.
DESCRIÇÃO CONCRETA E PARTICULARIZADA DAS CONDUTAS.
REVOLVIMENTO DE FATOS E PROVAS.
INADMISSÍVEL.
AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. (...).
V - O trancamento da ação penal constitui medida de exceção que se justifica apenas quando estiverem comprovadas, de plano e sem necessidade de exame aprofundado de fatos e provas, a inépcia da exordial acusatória, a atipicidade da conduta, a presença de excludente de ilicitude ou de culpabilidade ou causa de extinção de punibilidade ou, enfim, a ausência de indícios mínimos de .
VI - Justa causa para a ação penal autoria ou de prova de materialidade condenatória é o suporte probatório mínimo ou o conjunto de elementos de fato e de direito (fumus comissi delicti) que evidenciam a probabilidade de confirmar-se a hipótese acusatória deduzida em juízo.
Constitui, assim, uma plausibilidade do direito de punir, extraída dos elementos objetivos coligidos nos autos, os quais devem demonstrar satisfatoriamente a prova de materialidade e os indícios de que o denunciado foi o autor de conduta típica, ilícita (antijurídica) e culpável.
VII- Para o recebimento da peça acusatória, não se exige prova cabal de todas as afirmações de fato e de direito tecidas na denúncia, pois é suficiente a sua verossimilhança, desde que bem assentada no acervo de elementos cognitivos que subsidiam a acusação.
VIII - Com relação à descrição do fato criminoso nos crimes de autoria coletiva, conquanto não se possa exigir a descrição pormenorizada da conduta de cada denunciado, é necessário que a peça acusatória estabeleça, de modo objetivo e direto, a mínima relação entre o denunciado e os crimes que lhe são imputados.
O entendimento decorre tanto da aplicação imediata do art. 41 do Código de Processo Penal como dos princípios constitucionais da ampla defesa, do contraditório, da individualização das penas e da pessoalidade. (...) XIII - A denúncia preenche os requisitos do art. 41 do Código de Processo Penal.
Não se vislumbra ausência de pressuposto ou de condição da ação, nem da justa causa para o processo.
Ademais, não é o caso de nenhuma das hipóteses de absolvição sumária do art. 397 do CPP.
Lado outro, as imputações são suficientemente concretas e particularizadas, a permitir o pleno exercício da ampla defesa e do contraditório.
Por conseguinte, impõe-se o prosseguimento da ação penal, a fim de que sejam efetivamente apuradas as imputações formuladas contra o recorrente.
XIV - A •apreciação das teses veiculadas pelo recorrente, no sentido e na profundidade que pretende, excede os limites da cognição do habeas corpus, que não admite dilação probatória.
Com efeito, o provimento jurisdicional por que a Defesa pugna nesta via é de natureza tal que só pode ser alcançado ao término da instrução processual, por ocasião da sentença, pois exigiria apreciação abrangente e aprofundada do vasto acervo de elementos de cognição que instruem os autos da ação penal na origem.
Agravo regimental desprovido. (AgRg no RHC 130.466/RJ, Rel.
Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 09/12/2020, DJe 15/12/2020) Há, portanto, elementos indiciários suficientes para abalizar o recebimento da peça acusatória.
Desse modo, considerando a existência de justa causa para a persecução penal e a ausência das hipóteses de rejeição da denúncia, a qual delimitou a conduta imputada à paciente de forma a possibilitar a ampla defesa, inviável o trancamento da referida ação penal em desfavor desta, por meio da presente via.
Insurge-se ainda o impetrante, contra ato da magistrada de primeiro grau que indeferiu a remessa dos autos à instância superior do Ministério Público nos termos do art. 28 do Código Penal.
Assiste razão ao impetrante neste ponto.
O acordo de não persecução penal – ou seja, o ajuste entre o Órgão acusador e o investigado, em que este assume a responsabilidade de cumprir condições menos gravosas que a condenação – foi inserido no ordenamento jurídico pela Lei nº 13.964/2019, nos seguintes nos termos: Art. 28-A.
Não sendo caso de arquivamento e tendo o investigado confessado formal e circunstancialmente a prática de infração penal sem violência ou grave ameaça e com pena mínima inferior a 4 (quatro) anos, o Ministério Público poderá propor acordo de não persecução penal, desde que necessário e suficiente para reprovação e prevenção do crime, mediante as seguintes condições ajustadas cumulativa e alternativamente: (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019) [...] § 8º Recusada a homologação, o juiz devolverá os autos ao Ministério Público para a análise da necessidade de complementação das investigações ou o oferecimento da denúncia. [...] § 10.
Descumpridas quaisquer das condições estipuladas no acordo de não persecução penal, o Ministério Público deverá comunicar ao juízo, para fins de sua rescisão e posterior oferecimento de denúncia. (Incluído pela Lei nº13.964, de 2019) [...] § 13.
Cumprido integralmente o acordo de não persecução penal, o juízo competente decretará a extinção de punibilidade. § 14.
No caso de recusa, por parte do Ministério Público, em propor o acordo de não persecução penal, o investigado poderá requerer a remessa dos autos a órgão superior, na forma do art. 28 deste Código.
In casu, constata-se, da decisão de primeiro grau, bem como das informações prestadas pela autoridade coatora, que o processo foi remetido ao Ministério Público para se manifestar quanto ao requerimento formulado pela defesa de proposta de ANPP, tendo o representante ministerial se pronunciado pela impossibilidade em face da suposta habitualidade criminosa da paciente.
Diante disso, a magistrada decidiu, acolhendo a manifestação ministerial, negar a remessa dos autos ao Ministério Público para revisão do pedido de proposta de ANPP, como prevê o art. 28-A, § 14, do Código de Processo Penal.
Veja-se: “Inicialmente ressalto que a representante do Parquet, quando do oferecimento da denúncia, manifestou-se expressamente pelo não oferecimento de ANPP à demandada JULIANA, o que fez com base nos seguintes fatos e fundamentos: (...) Deixo de ofertar o acordo de não persecução penal (ANPP), disposto no artigo 28-A, do CPP, em virtude de haver elementos probatórios que indicam conduta criminal habitual, consoante se detrai da consulta processual abaixo anexada, dos Bos de ID 98751417 - Págs. 29-36 e do anexo 02, o que demonstra não ser o instituto necessário e suficiente para reprovação e prevenção dos crimes. (…) Ademais, ainda que inexistente pronunciamento do Ministério Público acerca da benesse legal, o ANPP não seria cabível na hipótese dos autos em razão de já ter sido oferecida erecebida a peça acusatória.
Explico.
A questão é que, por se tratar de medida visando impedir a judicialização criminal e considerando a limitação imposta pelo legislador ao usar o termo “investigado”, bem como a previsão de homologação pelo juiz de garantias, com atuação apenas na primeira etapa de investigação, em tese, entende-se que o ANPP tem cabimento até o recebimento da peça acusatória e, claro, desde que não seja caso de arquivamento.
O ANPP esgota-se na etapa pré-processual, sobretudo porque a recusa, sua não homologação ou seu descumprimento é inaugurar a fase de oferecimento e de recebimento da denúncia.
Assim, o recebimento da denúncia encerra a etapa pré-processual, devendo ser considerados válidos os atos praticados em conformidade com a lei então vigente. (...) Não há que se falar, aqui, de retroatividade mais benéfica, tendo em vista que não se cuida de regra penal, mas procedimental, sendo bem diferente da suspensão condicional do processo. (...) O que não se pode é, por interpretações isoladas e sem visão sistemática, pretender aplicação retroativa (exclusivamente) da parte penal quando ela se revela absolutamente incompatível com outra exigência existente na mesma norma (que é igualmente constitucional), a não existência de processo, pois se trata de norma híbrida. (...) Não se desconhece que o acordo de não persecução penal, por ser instituto da fase pré-processual, pode alcançar fatos ocorridos antes da vigência da lei, mas desde que a denúncia não tenha sido recebida, o que não é a hipótese dos presentes autos.
Dessa forma, não merece acolhida o pleito da Defesa.”. (sic) A autoridade apontada como coatora, na decisão datada de 27 de julho de 2023, delimitou a possibilidade de proposta do ANPP até o recebimento da denúncia.
Contudo, o entendimento adotado por este tribunal é que é possível a propositura do ANPP até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória.
Sobre o assunto, esta Câmara Criminal, em casos análogos, posicionou-se no sentido de estabelecer como marco para incidir o princípio da retroatividade até o proferimento da sentença penal condenatória, conforme julgados a seguir: EMENTA: CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL PENAL.
HABEAS CORPUS.
CRIME PREVISTO NO ART. 10, DA LEI 7.347/85.
NEGATIVA DE OFERECIMENTO DO ACORDO DE NÃO PERSECUÇÃO PENAL (ANPP) PELO MINISTÉRIO PÚBLICO DE ORIGEM.
ART. 28-A DO CPP.
PRETENSÃO DE REMESSA DO FEITO AO ÓRGÃO MINISTERIAL SUPERIOR PARA OS FINS DO ART. 28-A, § 14, DO CPP.
RECEBIMENTO DA EXORDIAL ACUSATÓRIA E PROLAÇÃO DA SENTENÇA PENAL CONDENATÓRIA NÃO TRANSITADA EM JULGADO.
AUSÊNCIA DE ÓBICES.
PRECEDENTES DO STJ E DA SEGUNDA TURMA DO STF.
INTERPRETAÇÃO MAIS BENÉFICA PARA O ACUSADO.
IMPOSSIBILIDADE DE O PODER JUDICIÁRIO EMITIR JUÍZO DE VALOR ACERCA DO PREENCHIMENTO DE REQUISITOS SUBJETIVOS PARA FINS DE OFERECIMENTO DO ANPP.
INCUMBÊNCIA DO MINISTÉRIO PÚBLICO.
CONSTRANGIMENTO ILEGAL CONFIGURADO.
AUTORIZAÇÃO DE MANIFESTAÇÃO DO ÓRGÃO REVISOR DO MINISTÉRIO PÚBLICO SOBRE A RECUSA DE OFERECIMENTO DO ANPP.
ORDEM CONHECIDA E CONCEDIDA. (HABEAS CORPUS CRIMINAL, 0808631-62.2023.8.20.0000, Des.
Glauber Rêgo, Câmara Criminal, JULGADO em 10/08/2023, PUBLICADO em 10/08/2023) Registre-se aqui que a remessa dos autos para a revisão ministerial não impõe ao órgão acusador a promoção do oferecimento do ANPP, uma vez que se trata de ato de sua discricionariedade, nem tampouco reconhece ou não o preenchimento dos requisitos subjetivos para sua realização, mas tão somente autoriza a possibilidade de que a decisão denegatória seja revista por instância superior.
Assim, viável acolher a tese autoral para possibilitar a paciente pedir a revisão ministerial quanto à negativa do oferecimento do Acordo de Não Persecução Penal, nos termos do art. 28-A, § 14, do Código de Processo Penal.
Ante o exposto, em dissonância com o parecer da 6ª Procuradoria de Justiça, conheço e concedo parcialmente a ordem para determinar à Autoridade Coatora a remessa da Ação Penal ao Procurador-Geral de Justiça, com fulcro no art. 28-A, § 14, do Código de Processo Penal.
Natal, de outubro de 2023.
Juiz Convocado Ricardo Tinoco Relator Natal/RN, 26 de Outubro de 2023. -
03/10/2023 00:24
Decorrido prazo de PAULO AUGUSTO PINHEIRO DA SILVA em 02/10/2023 23:59.
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25/09/2023 19:45
Conclusos para julgamento
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25/09/2023 12:49
Juntada de Petição de parecer
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22/09/2023 09:25
Expedição de Outros documentos.
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22/09/2023 09:21
Juntada de Informações prestadas
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21/09/2023 00:24
Publicado Intimação em 21/09/2023.
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21/09/2023 00:24
Disponibilizado no DJ Eletrônico em 20/09/2023
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20/09/2023 00:00
Intimação
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RIO GRANDE DO NORTE Gabinete do Desembargador Gilson Barbosa - Juiz Convocado Ricardo Tinoco Habeas Corpus n. 0810860-92.2023.8.20.0000 Impetrante: Dr.
Paulo Augusto Pinheiro OAB/RN 9790 Paciente: Juliana Xavier da Costa Aut.
Coatora: Juiz de Direito da 7ª Vara Criminal da Comarca de Natal/RN Relator: Juiz Convocado Ricardo Tinoco DECISÃO Trata-se de habeas corpus com pedido liminar impetrado pelo advogado Paulo Augusto Pinheiro em favor de Juliana Xavier da Costa, apontando como autoridade coatora o Juízo de Direito da 7ª Vara Criminal da Comarca de Natal.
Nas razões, destacou o impetrante que a paciente foi denunciada pela suposta prática do crime previsto no art. 168, § 1º III, na forma do art. 71 (2x), ambos do Código Penal.
Alegou a paciente está figurando como denunciada na Ação Penal n. 0106139-43.2020.8.20.0001, sem qualquer fundamento legal ou fático, ante a ausência de materialidade delitiva e da própria existência de crime.
Asseverou que é totalmente descabida a acusação ministerial, tendo em vista que a imputação se deu pelo fato da paciente, na condição de advogada, não ter repassado, em momento oportuno, o valores recebidos de um acordo firmado entre seus clientes e outra parte.
Destacou que “não obstante, em decorrência da denúncia, mesmo considerando o acordo inserido nos autos, em que a paciente e seus respectivos clientes transigiram no recebimento de valores, inclusive, com depósitos em cumprimento a obrigação” (sic) o juízo a quo recebeu a denúncia ofertada.
Segue narrando sobre a inexistência de justa causa para prosseguimento da presente ação penal.
Acrescentou ainda que “mesmo com documentos que comprovariam a ausência de dolo da ré, e ainda, que a controvérsia tratada foi proveniente de suposta desajuste contratual e mesmo assim, resolvido entre as partes, o ministério público aforou denúncia em desfavor da defendente em situação que jamais poderia configurar crime” (sic) Relatou sobre a ausência de fundamentos na decisão que indeferiu a remessa dos autos ao Ministério Publico em grau de revisão para oferecimento do ANPP.
Ao final, requereu: a) Que, seja SOBRESTADA a tramitação da ação penal nº. 0106139-43.2020.8.20.0001, originada na 7ª vara criminal de Natal/RN, em relação a paciente JULIANA XAVIER DA COSTA até julgamento de mérito do presente writ, tendo em vista, que a audiência de instrução processual foi aprazada para o dia 10/10/2023 às 09:00, podendo gerar prejuízos irreparáveis a paciente, ante a grande probabilidade de persecução infundada e mácula na própria carreira profissional; NO MÉRITO: b) Requer-se o TRANCAMENTO da ação penal nº. 0106139-43.2020.8.20.0001, em relação a JULIANA XAVIER DA COSTA, considerando a ausência da lesão jurídica provocada, visto o adimplemento voluntário (contrato extrajudicial) e no reconhecimento de que o caráter subsidiário do sistema penal reclama e impõe, em função dos próprios objetivos por ele visados, a intervenção mínima do Poder Público, por conseguinte, a atipicidade dos fatos e da manifesta ausência de justa causa, em relação aos crimes tipificados no artigo 168, §1º, inciso III, na forma do artigo 71 (2x), ambos do Código Penal; SUBSIDIARIAMENTE, caso não entenda pelo trancamento, requer, a concessão da ordem, pela não observância do art. 28-A do CPP (introduzido pelo Pacote Anticrime - Lei n. 13.964/2019), e, por conseguinte, que se remeta os autos ao ministério público com suspensão da ação penal acerca de eventual interesse na propositura de acordo de não persecução penal, nos termos do artigo supracitado; c) Declaramos, por fim, a autenticidade dos documentos que instruem a presente ordem; (sic) Acostou aos autos documentos.
No termo de busca, ID. 21238435, expedido pela Secretaria Judiciária deste Tribunal, consta a inexistência de outros processos em nome da paciente. É o que cumpre relatar.
Passo a decidir.
Como é sabido, a concessão de liminares em habeas corpus somente é cabível em casos excepcionalíssimos, máxime, quando o constrangimento ilegal a que é submetido a paciente se apresenta de forma clara e notória, principalmente quando o anseio é a suspensão e/ou o trancamento da ação penal.
Sabe-se que para a concessão de liminar são exigidos o fumus boni iuris e o periculum in mora, devendo a aparência do direito e o perigo ou risco na demora estarem cumulativamente consagrados para se obter prontamente.
Em análise preliminar da denúncia e dos documentos acostados, em especial da decisão ID. 21168339, há indícios de autoria e a presença da materialidade da prática do referido crime por parte da paciente.
Quanto à suspensão do processo entendo como temerária, pois implicaria em atraso da marcha processual, sem olvidar que a realização dos regulares atos processuais, servirá de amparo à autoridade coatora para uma melhor elucidação dos fatos descritos na denúncia, que poderá, inclusive, sanar a suposta ilegalidade apontada.
Com efeito, não vislumbro, neste momento de cognição sumária, os pressupostos legais essenciais à concessão liminar da ordem, vez que inexiste a presença de prova inequívoca do apontado constrangimento ilegal, de modo que não há razão, por ora, para suspensão ou trancamento da ação penal.
Ao revés, de forma superficial, própria desta fase cognitiva, parece-me que o processo vem tramitando nos termos da legalidade.
Portanto, não restando, comprovado os requisitos imprescindíveis à concessão da almejada tutela, devendo ser analisada a tese defensiva por ocasião do julgamento definitivo do presente habeas corpus perante a Câmara Criminal.
Por tais razões, ausente o fumus boni iuris, indefiro o pedido liminar.
Expeça-se ofício à autoridade impetrada, a fim de que preste as informações sobre o alegado na inicial, no prazo de 05 (cinco) dias.
Após, remetam-se os autos à Procuradoria-Geral de Justiça para emissão de parecer.
Em seguida, retornem os autos conclusos.
Publique-se.
Intime-se.
Natal, 11 de setembro de 2023.
Juiz Convocado Ricardo Tinoco Relator -
19/09/2023 09:07
Expedição de Outros documentos.
-
15/09/2023 14:15
Juntada de documento de comprovação
-
15/09/2023 13:18
Expedição de Ofício.
-
15/09/2023 10:10
Não Concedida a Medida Liminar
-
05/09/2023 09:12
Conclusos para decisão
-
05/09/2023 08:54
Expedição de Certidão.
-
04/09/2023 18:44
Proferido despacho de mero expediente
-
30/08/2023 16:16
Conclusos para decisão
-
30/08/2023 16:16
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
30/08/2023
Ultima Atualização
07/10/2024
Valor da Causa
R$ 0,00
Detalhes
Documentos
DECISÃO / DESPACHO • Arquivo
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