TJRN - 0806977-40.2023.8.20.0000
2ª instância - Câmara / Desembargador(a) Amaury Moura Sobrinho
Polo Ativo
Advogados
Nenhum advogado registrado.
Polo Passivo
Partes
Assistente Desinteressado Amicus Curiae
Advogados
Nenhum advogado registrado.
Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
-
25/09/2023 00:00
Intimação
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE TERCEIRA CÂMARA CÍVEL Processo: AGRAVO DE INSTRUMENTO - 0806977-40.2023.8.20.0000 Polo ativo ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE Advogado(s): Polo passivo Em segredo de justiça Advogado(s): IARA MYLLEYDE ROCHA OLIVEIRA EMENTA: DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO.
AGRAVO DE INSTRUMENTO.
AÇÃO ORDINÁRIA.
TUTELA DE URGÊNCIA DEFERIDA NA ORIGEM.
DIREITO À VIDA E À SAÚDE.
FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO (RITALINA).
RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA ENTRE OS ENTES PÚBLICOS.
APLICAÇÃO DAS TESES FIRMADOS NO TEMA 793 DO STF, NA SÚMULA 34 DO TJRN E NO IAC 14 DO STJ.
DEVER DA ADMINISTRAÇÃO DE GARANTIR O DIREITO À SAÚDE E AOS MEDICAMENTOS E/OU TRATAMENTOS E PROCEDIMENTOS ÀS PESSOAS CARENTES PORTADORAS DE DOENÇAS.
ARTIGOS 196 E 198 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL.
TERAPIAS MULTIDISCIPLINARES.
MÉTODO ABA.
PACIENTE COM TRANSTORNO ESPECTRO AUTISTA.
AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DA IMPRESCINDIBILIDADE E DO ESPECÍFICO SERVIÇO DE SAÚDE A SER PRESTADO PELA PARTE RÉ/RECORRENTE.
AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE INEFICÁCIA DOS TRATAMENTOS DISPONIBILIZADOS PELO SUS.
IMPRESCINDIBILIDADE DO TRATAMENTO PLEITEADO NÃO DEMONSTRADA.
REFORMA DA DECISÃO RECORRIDA NESTE PONTO.
MULTA COMINATÓRIA.
CABIMENTO.
VALOR E PERIODICIDADE ADEQUADOS PARA IMPOR AO AGRAVANTE O CUMPRIMENTO DA OBRIGAÇÃO.
RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.
ACÓRDÃO ACORDAM os Desembargadores da 3ª Câmara Cível do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Norte, à unanimidade de votos, em consonância com a 6ª Procuradoria de Justiça, conhecer e dar provimento parcial ao agravo de instrumento, nos termos do voto do Relator, que fica fazendo parte integrante deste.
RELATÓRIO Trata-se de Agravo de Instrumento interposto por ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE em face de decisão do Juízo de Direito da 1ª Vara da Comarca de Apodi que, nos autos da ação ordinária ajuizada por D.
E.
V.
M., deferiu a tutela de urgência pleiteada, determinando que os réus “solidariamente, disponibilizem ou custeiem à criança D.
E.
V.
M., o medicamento Ritalina 20mg (uma caixa por mês) e o acompanhamento multidisciplinar com psicólogo, fonoaudiólogo, psicopedagogo terapeuta ocupacional e profissional de educação física para a prática regular de esporte ou psicomotricidade, por tempo indeterminado e enquanto durar o tratamento, em caráter de urgência, independentemente de procedimentos burocráticos, sob pena de aplicação de multa pecuniária de R$ 20.000,00 (vinte mil reais) em desfavor dos entes públicos supracitados, sem prejuízos das demais sanções cabíveis (cíveis, criminais, administrativas, etc.)”.
Nas razões recursais (Id 19896846), o agravante sustenta que “em Nota Técnica apresentada em processo judicial com condições similares, a concepção técnica entendeu desfavoravelmente ao fornecimento de Terapia ABA para portador de Autismo, condição clínica esta que faz parte do Transtorno Global do Desenvolvimento (CID F84)”.
Alega que “o medicamento Ritalina LA e a TERAPIA ABA, ora em obséquio pela parte autora, não estão na lista de protocolos médicos procedimentais do Sistema Único de Saúde.
Portanto, não há legitimidade passiva ad causam referente ao Estado, pois o pedido autoral é referente a uma terapia fora dos protocolos formais do SUS”.
Afirma que “Ao demandar judicialmente o fornecimento de medicamento, a parte promovente claramente ofende o princípio da isonomia, vez que busca tratamento diferenciado em relação aos demais que igualmente se utilizam do Sistema Público de Saúde”.
Aduz que “recentemente houve uma decisão do Supremo Tribunal Federal, de modo que ocorreu uma reinterpretação acerca do Tema 793 para determinar o litisconsórcio passivo necessário da União”, argumentando que “se o medicamento pretendido não está integrado à lista do SUS, não há o que se falar em solidariedade, visto que o único órgão competente para proceder com a inclusão do medicamento é o Ministério da Saúde”.
Defende que “Também necessário que se determine que sejam juntados, ao menos, três orçamentos para realização dos procedimentos ou justificada a impossibilidade de se fazer a prova nos autos, sendo esta uma medida que demonstra razoabilidade, equilíbrio e zelo para com o dispêndio de recursos públicos de elevado vulto.
A transferência de um serviço público para a iniciativa privada é um custo faraônico ao erário”.
Acrescenta que o método ABA está incorporado no SUS apenas para tratamento do comportamento agressivo no TEA, defendo também por esse motivo a inclusão da União no polo passivo.
Diz que o Ministério da Saúde prevê diversas metodologias que podem ser utilizadas para o tratamento de pacientes com autismo, sendo o método ABA tratamento de escolha, não havendo direito à obtenção judicial de tratamento de escolha em face do SUS.
Questiona a possibilidade de o parecer médico prevalecer sobre os profissionais que realizarão o tratamento, quanto à técnica/método a ser utilizada e a duração das sessões, ressaltando o excesso da carga horária prescrita na rotina da criança e da família e a falta de comprovação científica sobre a superioridade do método pleiteado em detrimento dos demais métodos disponíveis.
Menciona que “Necessário se faz observar as considerações feitas no recente precedente respeitante à Suspensão Liminar nº 1.022/DF, destacando-se que o fornecimento de medicamentos que não estão inclusos no protocolo do Sistema Único de Saúde deve ser uma medida excepcional, demandando uma maior dilação probatória com expedição de laudo elaborado por uma junta oficial ligada ao SUS”.
Destaca a ofensa ao princípio da isonomia e a ausência de demonstração da probabilidade do direito, bem como a não comprovação dos requisitos para o fornecimento de tratamento não incorporado na lista do SUS, de acordo com os parâmetros fixados pelo STJ (Tese 106).
Acrescenta que “caso o Estado seja responsabilizado pelo custeio do produto médico, que o este Juízo determine: a) nos próprios autos, a declaração/ressarcimento do valor utilizado no custeio do procedimento; b) para que seja observado o contido no tema 793 - ED no RE 855.178/SE, segundo o qual, compete à autoridade judicial direcionar o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro”.
Pontua que deve se aplicar ao caso o Tema 1.033 do STF sobre o eventual ressarcimento de serviços de saúde prestados por unidade privada em favor de paciente do SUS e que “se determine que sejam juntados, ao menos, três orçamentos para realização dos procedimentos ou justificada a impossibilidade de se fazer a prova nos autos, sendo esta uma medida que demonstra razoabilidade, equilíbrio e zelo para com o dispêndio de recursos públicos de elevado vulto”.
Tece considerações acerca da desnecessidade de fixação de multa cominatória e requer, ao fina, a concessão de efeito suspensivo ao recurso.
No mérito, pede o provimento do recurso, “para reformar a decisão in totum; eventualmente, acaso mantida a ordem, que sejam fixadas medidas de contracautela mínima, bem como urgente determinação de produção de prova pericial e afastamento da aplicação de multa cominatória; Que seja a decisão anulada, para que fixada a competência da Justiça Federal, ou que seja determinada a intimação da parte autora para emendar a inicial, com a citação da União, bem como do Município de residência da parte autora”.
O pedido de efeito suspensivo foi parcialmente deferido (Id 19940142).
Intimada, a parte autora não ofertou contrarrazões (certidão de Id 20771222).
A 6ª Procuradoria de Justiça opinou pelo conhecimento parcial e provimento do recurso (Id 21016028). É o relatório.
VOTO Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço dos recursos.
Como relatado, o objeto da demanda ajuizada na origem é a concessão de ordem judicial em desfavor do Estado do Rio Grande do Norte e do Município de Apodi, para que sejam estes compelidos a fornecer, em favor da ora agravada, o medicamento Ritalina 20mg (uma caixa por mês) e o acompanhamento multidisciplinar com psicólogo, fonoaudiólogo, psicopedagogo terapeuta ocupacional e profissional de educação física para a prática regular de esporte ou psicomotricidade, por tempo indeterminado e enquanto durar o tratamento.
A questão em análise na demanda se encontra delineada no artigo 198, § 1º, da Constituição Federal, verbis: O sistema único de saúde será financiado, nos termos do art. 195, com recursos do orçamento da seguridade social, da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, além de outras fontes.
Importante esclarecer que o texto legal faz referência às três esferas do Poder Executivo, no intuito de ampliar a responsabilidade, de tal forma que não é possível se falar em litisconsórcio, pois o(a) autor(a) pode requerer o custeio de medicamentos e a realização de tratamentos a qualquer um dos entes federados, seja de forma simultânea ou separadamente.
Assim, em demandas dessa natureza, cabe ao autor escolher contra qual Ente Público vai ajuizar a ação, podendo o Poder Público demandado, se for o caso, buscar dos demais o seu respectivo ressarcimento.
Além do mais, o texto do artigo 196 da Constituição Federal, ao falar genericamente em Estado, tem cunho geral, preconizando que o custeio do Sistema Único de Saúde se dê por meio de recursos orçamentários da seguridade social, comum a todos os entes federados; regionalização e hierarquização nele referidas, devem ser compreendidas sempre como intenção de descentralizar e garantir sua efetividade.
Sendo assim, é evidente que o Estado do Rio Grande do Norte possui legitimidade passiva para a presente ação, pois como dito, todos os entes federados possuem responsabilidades em relação ao fornecimento de tratamentos/medicamentos decorrentes da gestão do SUS a nível Municipal, Estadual e Federal, não havendo que se falar em remessa dos autos à Justiça Federal.
Sobre o tema, o STF, a partir do julgamento do RE 855.178, sob o regime da repercussão geral (TEMA 793), ratificou pronunciamentos anteriormente proferidos em demandas individuais para assentar a solidariedade entre União, Estados, Distrito Federal e Municípios na saúde: EMENTA: RECURSO EXTRAORDINÁRIO.
CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO.
DIREITO À SAÚDE.
TRATAMENTO MÉDICO.
RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES FEDERADOS.
REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA.
REAFIRMAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA.
O tratamento médico adequado aos necessitados se insere no rol dos deveres do Estado, porquanto responsabilidade solidária dos entes federados.
O polo passivo pode ser composto por qualquer um deles, isoladamente, ou conjuntamente. (RE 855.178 RG.
Rel.
Min.
Luiz Fux.
DJe 16/3/2015).
Em seguida, o entendimento acima transcrito foi reafirmado pelo acórdão proferido nos Embargos de Declaração no RE 855.178, no sentido da solidariedade, estabelecendo algumas premissas que precisam ser levadas em consideração pelas instâncias inferiores para definir o responsável principal e aquele que é garantidor subsidiário, sem contudo alterar o entendimento acerca da solidariedade entre os entes públicos, litteris: EMENTA: CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO.
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA.
AUSÊNCIA DE OMISSÃO, CONTRADIÇÃO OU OBSCURIDADE.
DESENVOLVIMENTO DO PROCEDENTE.
POSSIBILIDADE.
RESPONSABILIDADE DE SOLIDÁRIA NAS DEMANDAS PRESTACIONAIS NA ÁREA DA SAÚDE.
DESPROVIMENTO DOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. 1. É da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal que o tratamento médico adequado aos necessitados se insere no rol dos deveres do Estado, porquanto responsabilidade solidária dos entes federados.
O polo passivo pode ser composto por qualquer um deles, isoladamente, ou conjuntamente. 2.
A fim de otimizar a compensação entre os entes federados, compete à autoridade judicial, diante dos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização, direcionar, caso a caso, o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro. 3.
As ações que demandem fornecimento de medicamentos sem registro na ANVISA deverão necessariamente ser propostas em face da União.
Precedente específico: RE 657.718, Rel.
Min.
Alexandre de Moraes. 4.
Embargos de declaração desprovidos. (RE 855178 ED, Relator(a): LUIZ FUX, Relator(a) p/ Acórdão: EDSON FACHIN, Tribunal Pleno, julgado em 23/05/2019, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-090 DIVULG 15-04-2020 PUBLIC 16-04-2020) De igual modo, vale destacar o teor da Súmula 34 desta Corte de Justiça, conforme abaixo transcrito: Súmula 34 do TJRN: A ação que almeja a obtenção de medicamentos e tratamentos de saúde pode ser proposta, indistintamente, em face de qualquer dos entes federativos.
Por fim, o Superior Tribunal de Justiça, dirimindo quaisquer dúvidas que ainda existissem sobre a matéria, decidiu, nos autos do Incidente de Assunção de Competência nº 187276/RS (Tema IAC 14), pela inexistência de litisconsorte passivo necessário, sendo a competência, nestes casos, da Justiça Estadual.
Confira-se : PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO.
INCIDENTE DE ASSUNÇÃO DE COMPETÊNCIA.
DIREITO À SAÚDE.
DISPENSAÇÃO DE MEDICAMENTO NÃO INCORPORADO AO SUS.
REGISTRO NA ANVISA.
TEMA 793 DA REPERCUSSÃO GERAL.
SOLIDARIEDADE ENTRE OS ENTES DA FEDERAÇÃO.
OCORRÊNCIA.
INTERESSE JURÍDICO DA UNIÃO.
EXAME.
JUSTIÇA FEDERAL.
CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA.
LITISCONSÓRCIO PASSIVO NECESSÁRIO.
INEXISTÊNCIA.
JUSTIÇA ESTADUAL.
COMPETÊNCIA. 1.
O STF, embora tenha mantido a orientação dominante nas Cortes Superiores acerca da responsabilidade solidária dos entes federados em matéria de saúde, com fundamento nos arts. 23, II, e 198 da CF/1988, quando julgou os EDcl no RE n. 855.178/SE (Tema 793), acabou inovando o cenário jurídico, ao exigir, de forma expressa, que o magistrado direcione o cumprimento da obrigação, segundo as normas de repartição de competências do SUS, assim como determine à pessoa política legalmente responsável pelo financiamento da prestação sanitária ressarcir a quem suportou tal ônus. 2.
Essa mudança de cenário, por sua vez, acarretou uma divergência de interpretação do Tema 793 do STF entre as Justiças estadual e Federal e fez renascer a discussão relacionada à natureza do litisconsórcio formado em tais casos, há muito pacificada nos tribunais superiores. 3.
Não obstante o disposto nos arts. 109, I, da CF/1988 e 45 do CPC/2015, bem como o entendimento consolidado pelo Superior Tribunal de Justiça nas Súmulas 150 e 254, imensa quantidade de conflitos de competência a respeito da aludida matéria começou a chegar diariamente a esta Corte de Justiça, notadamente após o julgamento do Tema 793 (Emb.
Decl. no RE 855.178/SE) pelo STF. 4.
No julgamento do Tema 793, o STF não avançou nas questões de natureza processual que normalmente são debatidas no âmbito do conflito de competência, a título de exemplo: a) a maneira como a União irá assumir a posição de parte nos processos relativos à saúde, vale dizer, a modalidade de intervenção, b) a competência estabelecida no art. 109, I, da CF/1988 (ratione personae) e c) o juízo competente para decidir sobre eventual formação de litisconsórcio passivo. 5.
A Primeira Seção desta Corte de Justiça, com fulcro nos arts. 947 do Código de Processo Civil/2015 e 271-B do RISTJ, afetou os Conflitos de Competência n. 187.276/RS, 187.533/SC e 188.002/SC à sistemática do incidente de assunção de competência (IAC 14), para definir o juízo competente para o julgamento de demanda relativa à dispensação de tratamento médico não incluído nas políticas públicas, sendo o conflito de competência a via adequada para dirimir a questão de direito processual controvertida. 6.
A controvérsia objeto do RE 1.366.243/SC - Tema 1234 do STF - não prejudica o exame da temática delimitada no IAC 14/STJ por esta Corte de Justiça, já que a suspensão ali determinada é dirigida aos recursos especiais e recursos extraordinários em que haja discussão sobre a necessidade de inclusão da União no polo passivo da demanda. 7.
Embora seja possível aos entes federais organizarem-se de maneira descentralizada com relação às políticas públicas na área da saúde, essa organização administrativa não afasta o dever legal de o Estado (latu sensu) assegurar o acesso à medicação ou ao tratamento médico a pessoas desprovidas de recursos financeiros, em face da responsabilidade solidária entre eles.
Em outras palavras, a possibilidade de o usuário do SUS escolher quaisquer das esferas de poder para obter a medicação e/ou os insumos desejados, de forma isolada e indistintamente - conforme ratificado pelo próprio STF no julgamento do Tema 793 -, afasta a figura do litisconsórcio compulsório ou necessário, por notória antinomia ontológica. 8.
A dispensação de medicamentos é uma das formas de atender ao direito à saúde, que compõe a esfera dos direitos fundamentais do indivíduo, mas não é, em si, o objeto principal da obrigação de prestar assistência à saúde de que trata o art. 196 da Constituição Federal. 9.
As regras de repartição de competência administrativa do SUS não devem ser invocadas pelos magistrados para fins de alteração do polo passivo delineado pela parte no momento do ajuizamento da demanda, mas tão somente para redirecionar o cumprimento da sentença ou de determinar o ressarcimento da entidade federada que suportou o ônus financeiro no lugar do ente público competente, nos termos do decidido no julgamento do Tema 793 do STF. 10.
O julgamento do Tema 793 do STF não modificou a regra de que compete à Justiça Federal decidir sobre a existência de interesse jurídico que justifique a presença, no processo, da União, suas autarquias ou empresas públicas (Súmula 150 do STJ), bem como de que não cabe à Justiça estadual reexaminar a decisão, manifestando-se contrariamente (Súmula 254 do STJ). 11.
Quanto ao ônus financeiro da dispensação do medicamento, insumos e tratamentos médicos, nada impede que o ente demandado se valha do estatuído no art. 35, VII, da Lei n. 8.080/1990, que prevê a possibilidade de "ressarcimento do atendimento a serviços prestados para outras esferas de governo" caso, ao final, demonstre não ser sua a atribuição para o fornecimento do fármaco, assim como do disposto nos arts. 259, parágrafo único, 285 do Código Civil/2002 e 23 do Decreto n. 7.508/2011. 12.
Ainda que haja entraves burocráticos para o ressarcimento, a solução para o problema não é transferir a demanda para a Justiça Federal em situações em que isso não é cabível, ao arrepio da legislação processual civil e da Constituição Federal, sob pena de impor diversos obstáculos ao paciente que depende de fármaco e/ou tratamento médico urgente para evitar o agravamento de sua doença ou até mesmo o risco de morte. 13.
Quando o magistrado determinar que a obrigação de fornecer medicamento fora da lista do SUS seja cumprida por determinado ente público, nada impede que, posteriormente, reconheça-se a possibilidade de ressarcimento por outro, caso se entenda ser deste último o dever de custeio.
Precedente do STJ. 14.
A jurisprudência desta Corte, consolidada no REsp n. 1.203.244/SC, no sentido de inadmitir o chamamento ao processo dos demais devedores solidários em demandas de saúde contra o SUS, na forma do art. 130 do CPC/2015, deve ser mantida, exceto se houver posterior pronunciamento do STF em sentido contrário. 15.
Solução do caso concreto: na hipótese, a parte autora escolheu litigar contra o Estado do Rio Grande do Sul e o Município de Vacaria.
Contudo, o Juiz estadual determinou a remessa dos autos à Justiça Federal, por entender que a União deve figurar no polo passivo da demanda, sem que haja nenhuma situação de fato ou de direito que imponha a formação de litisconsórcio passivo necessário, de modo que a ação deve ser processada na Justiça estadual. 16.
Tese jurídica firmada para efeito do artigo 947 do CPC/2015: a) Nas hipóteses de ações relativas à saúde intentadas com o objetivo de compelir o Poder Público ao cumprimento de obrigação de fazer consistente na dispensação de medicamentos não inseridos na lista do SUS, mas registrado na ANVISA, deverá prevalecer a competência do juízo de acordo com os entes contra os quais a parte autora elegeu demandar; b) as regras de repartição de competência administrativas do SUS não devem ser invocadas pelos magistrados para fins de alteração ou ampliação do polo passivo delineado pela parte no momento da propositura da ação, mas tão somente para fins de redirecionar o cumprimento da sentença ou determinar o ressarcimento da entidade federada que suportou o ônus financeiro no lugar do ente público competente, não sendo o conflito de competência a via adequada para discutir a legitimidade ad causam, à luz da Lei n. 8.080/1990, ou a nulidade das decisões proferidas pelo Juízo estadual ou federal, questões que devem ser analisada no bojo da ação principal. c) a competência da Justiça Federal, nos termos do art. 109, I, da CF/88, é determinada por critério objetivo, em regra, em razão das pessoas que figuram no polo passivo da demanda (competência ratione personae), competindo ao Juízo federal decidir sobre o interesse da União no processo (Súmula 150 do STJ), não cabendo ao Juízo estadual, ao receber os autos que lhe foram restituídos em vista da exclusão do ente federal do feito, suscitar conflito de competência (Súmula 254 do STJ). 17.
Conflito de competência conhecido para declarar competente para o julgamento da causa o Juízo de Direito do Juizado Especial Cível Adjunto da Comarca de Vacaria/RS. (CC n. 187.276/RS, relator Ministro Gurgel de Faria, Primeira Seção, julgado em 12/4/2023, DJe de 18/4/2023.) Ultrapassada tal questão, é sabido que a saúde é um direito público subjetivo indisponível, assegurado a todos e consagrado no artigo 196 da Constituição Federal.
Assim, é dever da Administração garantir o direito à saúde e à aquisição de medicamentos e tratamentos às pessoas carentes portadoras de doenças, tutelado pela lei maior, de maneira que não pode ser inviabilizado através de entraves burocráticos, máxime quando se trata de direito fundamental, qual seja, a vida humana.
Necessário esclarecer que a Lei nº 8.080/90, que instituiu o Sistema Único de Saúde, em decorrência das exigências do parágrafo único do artigo 198 da Constituição Federal, reforça a obrigação do Estado à política de gestão de aplicação de recursos mínimos para as ações e serviços públicos de saúde.
Logo, tendo em vista tratar-se de direito à saúde, indisponível, nos termos da Constituição Federal, derivado da força impositiva dos preceitos de ordem pública que regulam a matéria, restou demonstrado que a parte autora possui direito à prestação de saúde pleiteada.
Com efeito, verifica-se que, na espécie, restou comprovada a prescrição do medicamento requerido (Ritalina LA), frisando a médica assistente, inclusive, a urgência no fornecimento do fármaco, “pois o desenvolvimento neuropsicomotor do paciente depende inteiramente do uso da medicação”, conforme Laudo de ID 99739158 - autos de origem.
A aplicação de tais instrumentos normativos devem levar em conta o fim social e a concretização do bem comum, por força do disposto no artigo 5º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, de modo especial quando se está diante de ser humano com a sua saúde debilitada.
Por tais circunstâncias, entendo ser inconteste o direito da paciente receber do Estado do Rio Grande do Norte o medicamento recomendado pelo médico, essencial ao tratamento de sua enfermidade, considerando ainda a inexistência de medicação similar que pudesse ser utilizada no seu caso, o laudo médico circunstanciado e a hipossuficiência financeira em arcar com o medicamento.
Logo, comprovada a necessidade do tratamento médico prescrito para a garantia da saúde do paciente, bem como estampada a sua impossibilidade de custeá-lo, deve o ente público suportar esse ônus.
A propósito, é a jurisprudência desta Corte, mutatis mutandis: EMENTA: CONSTITUCIONAL, ADMINISTRATIVO E PROCESSO CIVIL.
APELAÇÃO CÍVEL.
AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER COM PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA.
SAÚDE.
PACIENTE MENOR DE IDADE.
PORTADOR DE ESQUIZOFRENIA (CID F20).
NECESSIDADE DO MEDICAMENTO “RESPIRIDONA” 1MG, DOIS FRASCOS AO MÊS.
LAUDO MÉDICO CIRCUNSTANCIADO ACOSTADO AOS AUTOS.
RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES FEDERADOS.
SENTENÇA PROCEDENTE.
MANUTENÇÃO.
APELO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. (APELAÇÃO CÍVEL, 0801443-13.2021.8.20.5133, Des.
Vivaldo Pinheiro, Terceira Câmara Cível, JULGADO em 16/05/2023, PUBLICADO em 16/05/2023).
Ressalte-se, ainda, que não há que se falar em afronta aos Princípios da Legalidade Orçamentária e da Reserva do Possível e da Isonomia, uma vez que se está diante do conflito de normas referentes à saúde e, principalmente, o direito fundamental à vida, que não pode restar inviabilizado pela simples argumentação de impossibilidade financeira. É também incontestável o periculum in mora inverso, haja vista que a parte autora comprovou a gravidade de seu quadro clínico e a necessidade do tratamento, além de demonstrar sua condição de hipossuficiência financeira.
Noutro giro, com relação ao tratamento multidisciplinar pleiteado (método ABA), entendo que é necessário aguardar o contraditório e produção de provas, especialmente a realização de perícia técnica, para que seja verificado, com base em critérios científicos, se a terapia pretendida possui eficácia superior em relação às padronizadas e de igual finalidade já regularmente oferecidas no Sistema Único de Saúde (SUS), e se é imprescindível ao menor, ora agravado, ainda que eventualmente em complementação ao tratamento multidisciplinar especializado que já é fornecido pela rede pública a justificar o custeio pelo Poder Público.
Ressalto que, reconhece-se a urgência e a importância do cuidado médico à parte autora.
No entanto, é necessário salientar que a implementação de decisões judiciais que determinam tratamentos específicos, sem uma avaliação técnica robusta, podem causar prejuízos ao sistema de saúde público como um todo, ainda mais considerando o alto custo e a sua duração por tempo indeterminado.
Além do potencial impacto financeiro, a concessão de tratamentos específicos sem uma avaliação técnica acerca de sua necessidade e eficácia pode gerar discrepâncias no atendimento à população e uma desestruturação da política de saúde.
Neste sentido: AGRAVO DE INSTRUMENTO - Ação de obrigação de fazer proposta por menor diagnosticada com Síndrome de Charge (CID Q87.8) e atraso no desenvolvimento neuro psicomotor (CID F84.8) - Pretensão de disponibilização do tratamento multidisciplinar pelo método Therasuit, Fonoterapia (2 a 3 vezes por semana); Fisioterapia Motora de 2 a 3 vezes por semana; Fisioterapia respiratória; Acompanhamento com Nutricionista e Acompanhamento com Psicólogo – Relatórios que não indicam a ineficácia dos tratamentos disponibilizados pelo SUS nem a imprescindibilidade para melhora do infante – Necessidade de realização de perícia médica – Precedentes desta C.
Câmara Especial - Probabilidade do direito que nesta fase processual não está caracterizada – Decisão modificada - Recurso provido. (TJSP; Agravo de Instrumento 3007655-06.2022.8.26.0000; Relator (a): Ana Luiza Villa Nova; Órgão Julgador: Câmara Especial; Foro de Paulínia - 2ª Vara; Data do Julgamento: 03/06/2023; Data de Registro: 03/06/2023).
Por fim, no presente recurso, o recorrente sustenta a impossibilidade de arbitrar multa por descumprimento no caso concreto.
Com efeito, é preciso registrar que a fixação da multa para o caso de descumprimento da medida é perfeitamente cabível, nos termos dos artigos 297, 536, § 1º e 537, caput, todos do CPC/2015.
Ademais, não é necessário que se aguarde o descumprimento da decisão judicial para só então aplicar sanções por descumprimento, como pretende o agravante.
Em relação ao valor e à periodicidade da multa, o legislador deixou tal tarefa ao arbítrio do Juiz.
No caso concreto, o valor de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), a princípio, mostra-se adequado.
Isto posto, dou provimento parcial ao presente agravo de instrumento, tão somente para desobrigar o agravante de fornecer ao agravado o tratamento multidisciplinar com psicólogo, fonoaudiólogo, psicopedagogo terapeuta ocupacional e profissional de educação física para a prática regular de esporte ou psicomotricidade, mantendo a decisão recorrida em seus demais termos. É como voto.
Natal, data da sessão.
Desembargador Amaury Moura Sobrinho Relator 3 Natal/RN, 18 de Setembro de 2023. -
29/08/2023 00:00
Intimação
Poder Judiciário do Rio Grande do Norte Terceira Câmara Cível Por ordem do Relator/Revisor, este processo, de número 0806977-40.2023.8.20.0000, foi pautado para a Sessão VIRTUAL (votação exclusivamente pelo PJe) do dia 18-09-2023 às 08:00, a ser realizada no Terceira Câmara Cível.
Caso o processo elencado para a presente pauta não seja julgado na data aprazada acima, fica automaticamente reaprazado para a sessão ulterior.
No caso de se tratar de sessão por videoconferência, verificar o link de ingresso no endereço http://plenariovirtual.tjrn.jus.br/ e consultar o respectivo órgão julgador colegiado.
Natal, 28 de agosto de 2023. -
22/08/2023 21:33
Conclusos para decisão
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22/08/2023 12:05
Juntada de Petição de Sob sigilo
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09/08/2023 03:08
Expedição de Outros documentos.
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09/08/2023 03:07
Decorrido prazo de Sob sigilo em 17/07/2023.
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04/08/2023 00:00
Decorrido prazo de Sob sigilo em 03/08/2023 23:59.
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04/08/2023 00:00
Decorrido prazo de Sob sigilo em 03/08/2023 23:59.
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18/07/2023 00:11
Decorrido prazo de Sob sigilo em 17/07/2023 23:59.
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15/06/2023 00:43
Publicado Intimação em 15/06/2023.
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15/06/2023 00:43
Disponibilizado no DJ Eletrônico em 14/06/2023
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14/06/2023 00:00
Intimação
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE Gab.
Des.
Amaury Moura Sobrinho na Câmara Cível Agravo de Instrumento nº 0806977-40.2023.8.20.0000 Origem: 1ª Vara da Comarca de Apodi (0801819-91.2023.8.20.5112) Agravante: ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE Procurador: Procuradoria Geral do Estado Agravado: D.
E.
V.
M.
Advogado: Defensoria Pública do Estado do Rio Grande do Norte – Núcleo de Apodi Relator: Desembargador Amaury Moura Sobrinho DECISÃO Trata-se de Agravo de Instrumento interposto por ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE em face de decisão do Juízo de Direito da 1ª Vara da Comarca de Apodi que, nos autos da ação ordinária ajuizada por D.
E.
V.
M., deferiu a tutela de urgência pleiteada, determinando que os réus “solidariamente, disponibilizem ou custeiem à criança D.
E.
V.
M., o medicamento Ritalina 20mg (uma caixa por mês) e o acompanhamento multidisciplinar com psicólogo, fonoaudiólogo, psicopedagogo terapeuta ocupacional e profissional de educação física para a prática regular de esporte ou psicomotricidade, por tempo indeterminado e enquanto durar o tratamento, em caráter de urgência, independentemente de procedimentos burocráticos, sob pena de aplicação de multa pecuniária de R$ 20.000,00 (vinte mil reais) em desfavor dos entes públicos supracitados, sem prejuízos das demais sanções cabíveis (cíveis, criminais, administrativas, etc.)”.
Nas razões recursais (Id 19896846), o agravante sustenta que “em Nota Técnica apresentada em processo judicial com condições similares, a concepção técnica entendeu desfavoravelmente ao fornecimento de Terapia ABA para portador de Autismo, condição clínica esta que faz parte do Transtorno Global do Desenvolvimento (CID F84)”.
Alega que “o medicamento Ritalina LA e a TERAPIA ABA, ora em obséquio pela parte autora, não estão na lista de protocolos médicos procedimentais do Sistema Único de Saúde.
Portanto, não há legitimidade passiva ad causam referente ao Estado, pois o pedido autoral é referente a uma terapia fora dos protocolos formais do SUS”.
Afirma que “Ao demandar judicialmente o fornecimento de medicamento, a parte promovente claramente ofende o princípio da isonomia, vez que busca tratamento diferenciado em relação aos demais que igualmente se utilizam do Sistema Público de Saúde”.
Aduz que “recentemente houve uma decisão do Supremo Tribunal Federal, de modo que ocorreu uma reinterpretação acerca do Tema 793 para determinar o litisconsórcio passivo necessário da União”, argumentando que “se o medicamento pretendido não está integrado à lista do SUS, não há o que se falar em solidariedade, visto que o único órgão competente para proceder com a inclusão do medicamento é o Ministério da Saúde”.
Defende que “Também necessário que se determine que sejam juntados, ao menos, três orçamentos para realização dos procedimentos ou justificada a impossibilidade de se fazer a prova nos autos, sendo esta uma medida que demonstra razoabilidade, equilíbrio e zelo para com o dispêndio de recursos públicos de elevado vulto.
A transferência de um serviço público para a iniciativa privada é um custo faraônico ao erário”.
Acrescenta que o método ABA está incorporado no SUS apenas para tratamento do comportamento agressivo no TEA, defendo também por esse motivo a inclusão da União no polo passivo.
Diz que o Ministério da Saúde prevê diversas metodologias que podem ser utilizadas para o tratamento de pacientes com autismo, sendo o método ABA tratamento de escolha, não havendo direito à obtenção judicial de tratamento de escolha em face do SUS.
Questiona a possibilidade de o parecer médico prevalecer sobre os profissionais que realizarão o tratamento, quanto à técnica/método a ser utilizada e a duração das sessões, ressaltando o excesso da carga horária prescrita na rotina da criança e da família e a falta de comprovação científica sobre a superioridade do método pleiteado em detrimento dos demais métodos disponíveis.
Menciona que “Necessário se faz observar as considerações feitas no recente precedente respeitante à Suspensão Liminar nº 1.022/DF, destacando-se que o fornecimento de medicamentos que não estão inclusos no protocolo do Sistema Único de Saúde deve ser uma medida excepcional, demandando uma maior dilação probatória com expedição de laudo elaborado por uma junta oficial ligada ao SUS”.
Destaca a ofensa ao princípio da isonomia e a ausência de demonstração da probabilidade do direito, bem como a não comprovação dos requisitos para o fornecimento de tratamento não incorporado na lista do SUS, de acordo com os parâmetros fixados pelo STJ (Tese 106).
Acrescenta que “caso o Estado seja responsabilizado pelo custeio do produto médico, que o este Juízo determine: a) nos próprios autos, a declaração/ressarcimento do valor utilizado no custeio do procedimento; b) para que seja observado o contido no tema 793 - ED no RE 855.178/SE, segundo o qual, compete à autoridade judicial direcionar o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro”.
Pontua que deve se aplicar ao caso o Tema 1.033 do STF sobre o eventual ressarcimento de serviços de saúde prestados por unidade privada em favor de paciente do SUS e que “se determine que sejam juntados, ao menos, três orçamentos para realização dos procedimentos ou justificada a impossibilidade de se fazer a prova nos autos, sendo esta uma medida que demonstra razoabilidade, equilíbrio e zelo para com o dispêndio de recursos públicos de elevado vulto”.
Tece considerações acerca da desnecessidade de fixação de multa cominatória e requer, ao fina, a concessão de efeito suspensivo ao recurso.
No mérito, pede o provimento do recurso, “para reformar a decisão in totum; eventualmente, acaso mantida a ordem, que sejam fixadas medidas de contracautela mínima, bem como urgente determinação de produção de prova pericial e afastamento da aplicação de multa cominatória; Que seja a decisão anulada, para que fixada a competência da Justiça Federal, ou que seja determinada a intimação da parte autora para emendar a inicial, com a citação da União, bem como do Município de residência da parte autora”. É o relatório.
A permissibilidade de concessão do efeito suspensivo ao agravo de instrumento decorre dos preceitos insculpidos nos artigos 995, parágrafo único, e 1.019, ambos do Código de Processo Civil/2015, sendo condicionado o deferimento da suspensividade à demonstração, pelo recorrente, da possibilidade de ocorrência de grave lesão, de difícil ou impossível reparação, sendo ainda relevante à fundamentação do pedido para fins de provável provimento do recurso.
No caso sob exame, presente o pedido de suspensividade, observo que a parte agravante cuidou, satisfatoriamente, em demonstrar a existência dos requisitos necessários a alcançar parcialmente o pleito.
Como relatado, o objeto da demanda ajuizada na origem é a concessão de ordem judicial em desfavor do Estado do Rio Grande do Norte e do Município de Apodi, para que sejam estes compelidos a fornecer, em favor da ora agravada, o o medicamento Ritalina 20mg (uma caixa por mês) e o acompanhamento multidisciplinar com psicólogo, fonoaudiólogo, psicopedagogo terapeuta ocupacional e profissional de educação física para a prática regular de esporte ou psicomotricidade, por tempo indeterminado e enquanto durar o tratamento.
Com efeito, o Estado tem o dever constitucional de garantir a saúde de todos, “mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação” (art. 196, CF).
Assim, a robustez do direito invocado pela parte Autora, ora Agravada, encontra-se evidenciada, uma vez que, ante a impossibilidade material de o cidadão adquirir medicamentos, fazer exames, ou utilizar quaisquer outros meios terapêuticos para restabelecer sua saúde ou prolongar sua vida, em razão do seu alto custo, deverá o Poder Público providenciar os meios necessários, porquanto se trata de direito fundamental emanado de norma constitucional auto-aplicável, e, como tal, independe de regulamentação, passível, pois, de aplicação imediata.
Nesta toada, constata-se que a obrigação de prestação de serviços e a prática de ações que visem a resguardar a saúde dos cidadãos é solidária entre a União, os Estados, os Municípios e Distrito Federal, podendo, portanto, ser exigida de cada um dos entes ora elencados isoladamente.
Neste sentido, vale destacar a Súmula 34 desta Corte de Justiça, conforme abaixo transcrito: Súmula 34 do TJRN: A ação que almeja a obtenção de medicamentos e tratamentos de saúde pode ser proposta, indistintamente, em face de qualquer dos entes federativos.
Também sobre a matéria, é o Tema 793 do STF, que dispõe: “Os entes da federação, em decorrência da competência comum, são solidariamente responsáveis nas demandas prestacionais na área da saúde, e diante dos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização, compete à autoridade judicial direcionar o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro”.
Mais recentemente, o STF, em votação finalizada em 19/04/2023, no âmbito do RE 1366243, fixou novos parâmetros sobre a temática até o julgamento definitivo do Tema 1234, tendo assim decidido: (...) conceder parcialmente o pedido formulado em tutela provisória incidental neste recurso extraordinário, "para estabelecer que, até o julgamento definitivo do Tema 1234 da Repercussão Geral, a atuação do Poder Judiciário seja regida pelos seguintes parâmetros: (i) nas demandas judiciais envolvendo medicamentos ou tratamentos padronizados: a composição do polo passivo deve observar a repartição de responsabilidades estruturada no Sistema Único de Saúde, ainda que isso implique deslocamento de competência, cabendo ao magistrado verificar a correta formação da relação processual, sem prejuízo da concessão de provimento de natureza cautelar ainda que antes do deslocamento de competência, se o caso assim exigir; (ii) nas demandas judiciais relativas a medicamentos não incorporados: devem ser processadas e julgadas pelo Juízo, estadual ou federal, ao qual foram direcionadas pelo cidadão, sendo vedada, até o julgamento definitivo do Tema 1234 da Repercussão Geral, a declinação da competência ou determinação de inclusão da União no polo passivo; (iii) diante da necessidade de evitar cenário de insegurança jurídica, esses parâmetros devem ser observados pelos processos sem sentença prolatada; diferentemente, os processos com sentença prolatada até a data desta decisão (17 de abril de 2023) devem permanecer no ramo da Justiça do magistrado sentenciante até o trânsito em julgado e respectiva execução (adotei essa regra de julgamento em: RE 960429 ED-segundos Tema 992, de minha relatoria, DJe de 5.2.2021); (iv) ficam mantidas as demais determinações contidas na decisão de suspensão nacional de processos na fase de recursos especial e extraordinário".
Diante deste cenário, resta configurada a legitimidade do Estado do Rio Grande do Norte para figurar no polo passivo da lide ante a solidariedade existente no âmbito do direito à saúde, denotando a competência da Justiça Estadual.
Superada essa questão, verifico que restou comprovada a prescrição do medicamento requerido (Ritalina LA), frisando a médica assistente, inclusive, a urgência no fornecimento do fármaco, “pois o desenvolvimento neuropsicomotor do paciente depende inteiramente do uso da medicação”, conforme Laudo de ID 99739158 - autos de origem.
Logo, comprovada a necessidade do tratamento médico prescrito para a garantia da saúde do paciente, bem como estampada a sua impossibilidade de custeá-lo, deve o ente público suportar esse ônus.
A propósito, é a jurisprudência desta Corte, mutatis mutandis: EMENTA: CONSTITUCIONAL, ADMINISTRATIVO E PROCESSO CIVIL.
APELAÇÃO CÍVEL.
AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER COM PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA.
SAÚDE.
PACIENTE MENOR DE IDADE.
PORTADOR DE ESQUIZOFRENIA (CID F20).
NECESSIDADE DO MEDICAMENTO “RESPIRIDONA” 1MG, DOIS FRASCOS AO MÊS.
LAUDO MÉDICO CIRCUNSTANCIADO ACOSTADO AOS AUTOS.
RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES FEDERADOS.
SENTENÇA PROCEDENTE.
MANUTENÇÃO.
APELO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. (APELAÇÃO CÍVEL, 0801443-13.2021.8.20.5133, Des.
Vivaldo Pinheiro, Terceira Câmara Cível, JULGADO em 16/05/2023, PUBLICADO em 16/05/2023).
Ressalte-se, ainda, que não há que se falar em afronta aos Princípio da Legalidade Orçamentária e da Reserva do Possível e da Isonomia, uma vez que se está diante do conflito de normas referentes à saúde e, principalmente, o direito fundamental à vida, que não pode restar inviabilizado pela simples argumentação de impossibilidade financeira. É também incontestável o periculum in mora inverso, haja vista que a parte autora comprovou a gravidade de seu quadro clínico e a necessidade do tratamento, além de demonstrar sua condição de hipossuficiência financeira.
Noutro giro, com relação ao tratamento multidisciplinar pleiteado (método ABA), entendo que é necessário aguardar o contraditório e produção de provas, especialmente a realização de perícia técnica, para que seja verificado, com base em critérios científicos, se a terapia pretendida possui eficácia superior em relação às padronizadas e de igual finalidade já regularmente oferecidas no Sistema Único de Saúde (SUS), e se é imprescindível ao menor, ora agravado, ainda que eventualmente em complementação ao tratamento multidisciplinar especializado que já é fornecido pela rede pública a justificar o custeio pelo Poder Público.
Ressalto que, reconhece-se a urgência e a importância do cuidado médico à parte autora.
No entanto, é necessário salientar que a implementação de decisões judiciais que determinam tratamentos específicos, sem uma avaliação técnica robusta, podem causar prejuízos ao sistema de saúde público como um todo, ainda mais considerando o alto custo e a sua duração por tempo indeterminado.
Além do potencial impacto financeiro, a concessão de tratamentos específicos sem uma avaliação técnica acerca de sua necessidade e eficácia pode gerar discrepâncias no atendimento à população e uma desestruturação da política de saúde.
Neste sentido: AGRAVO DE INSTRUMENTO - Ação de obrigação de fazer proposta por menor diagnosticada com Síndrome de Charge (CID Q87.8) e atraso no desenvolvimento neuro psicomotor (CID F84.8) - Pretensão de disponibilização do tratamento multidisciplinar pelo método Therasuit, Fonoterapia (2 a 3 vezes por semana); Fisioterapia Motora de 2 a 3 vezes por semana; Fisioterapia respiratória; Acompanhamento com Nutricionista e Acompanhamento com Psicólogo – Relatórios que não indicam a ineficácia dos tratamentos disponibilizados pelo SUS nem a imprescindibilidade para melhora do infante – Necessidade de realização de perícia médica – Precedentes desta C.
Câmara Especial - Probabilidade do direito que nesta fase processual não está caracterizada – Decisão modificada - Recurso provido. (TJSP; Agravo de Instrumento 3007655-06.2022.8.26.0000; Relator (a): Ana Luiza Villa Nova; Órgão Julgador: Câmara Especial; Foro de Paulínia - 2ª Vara; Data do Julgamento: 03/06/2023; Data de Registro: 03/06/2023).
Ante o exposto, defiro parcialmente o pedido de efeito suspensivo ao agravo de instrumento, tão somente para desobrigar o agravante de fornecer ao agravado o tratamento multidisciplinar com psicólogo, fonoaudiólogo, psicopedagogo terapeuta ocupacional e profissional de educação física para a prática regular de esporte ou psicomotricidade, mantendo a decisão recorrida em seus demais termos.
Comunique-se ao Juízo de primeiro grau, para conhecimento e cumprimento.
Intime-se a parte agravada, para que responda o agravo de instrumento no prazo de 15 (quinze) dias, facultando-lhe juntar a documentação que entender necessária ao julgamento do recurso (art. 1.019, II, CPC/2015).
Independentemente de novo ordenamento, cumpridas as determinações, remetam-se à Procuradoria Geral de Justiça para emissão de parecer (art. 1019, III, CPC/2015).
Publique-se.
Intime-se.
Natal/RN, data da assinatura eletrônica.
Desembargador Amaury Moura Sobrinho Relator -
13/06/2023 14:19
Juntada de documento de comprovação
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13/06/2023 13:17
Expedição de Ofício.
-
13/06/2023 13:15
Expedição de Outros documentos.
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13/06/2023 12:45
Concedida em parte a Medida Liminar
-
08/06/2023 09:23
Conclusos para decisão
-
08/06/2023 09:23
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
08/06/2023
Ultima Atualização
25/09/2023
Valor da Causa
R$ 0,00
Documentos
ACÓRDÃO • Arquivo
ACÓRDÃO • Arquivo
DECISÃO • Arquivo
DECISÃO • Arquivo
OUTROS DOCUMENTOS • Arquivo
OUTROS DOCUMENTOS • Arquivo
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