TJPI - 0800416-47.2024.8.18.0088
1ª instância - Vara Unica de Capitao de Campos
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Polo Ativo
Polo Passivo
Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
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01/09/2025 00:00
Intimação
poder judiciário tribunal de justiça do estado do piauí GABINETE DO Desembargador ANTONIO LOPES DE OLIVEIRA PROCESSO Nº: 0800416-47.2024.8.18.0088 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) ASSUNTO(S): [Contratos Bancários, Indenização por Dano Material, Empréstimo consignado] APELANTE: MARIA JOSE OLIVEIRA APELADO: BANCO BRADESCO S.A.
EMENTA APELAÇÃO CÍVEL.
AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL E MATERIAL.
EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO.
EXIGÊNCIA DE PROCURAÇÃO PÚBLICA.
SUSPEITA DE LITIGÂNCIA PREDATÓRIA.
MERA MULTIPLICIDADE DE AÇÕES.
INSUFICIÊNCIA PARA CARACTERIZAÇÃO DE ABUSO DO DIREITO DE AÇÃO.
CONTEXTO DE FRAUDES BANCÁRIAS CONTRA IDOSOS.
EXCESSO DE FORMALISMO.
VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DO ACESSO À JUSTIÇA, DA PRIMAZIA DO MÉRITO E DA COOPERAÇÃO.
VALIDADE DA PROCURAÇÃO PARTICULAR.
ART. 595 DO CÓDIGO CIVIL.
PRECEDENTES DO TJPI.
SENTENÇA ANULADA.
RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.
DECISÃO MONOCRÁTICA RELATÓRIO Trata-se de Apelação Cível interposta por MARIA JOSE OLIVEIRA contra a sentença proferida pelo Juízo da Vara Única da Comarca de Capitão de Campos/PI, que extinguiu o processo sem resolução do mérito, nos autos da AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL E MATERIAL, ajuizada em desfavor do BANCO BRADESCO S.A.
Em sua petição inicial (ID 20921790), a Apelante, qualificada como aposentada, idosa e semianalfabeta/analfabeta funcional, narrou ter sido surpreendida por descontos indevidos em seu benefício previdenciário, referentes a um empréstimo consignado (contrato nº 0123416142083) que afirma categoricamente jamais ter contratado ou recebido o valor correspondente.
Destacou que, antes de buscar a via judicial, tentou resolver a questão administrativamente, por meio de reclamação no site proteste.org.br, solicitando ao Banco Bradesco S.A. cópia do contrato assinado e o comprovante de transferência dos valores, mas não obteve qualquer resposta.
Requereu a concessão dos benefícios da justiça gratuita e a prioridade na tramitação do feito, em razão de sua idade, conforme previsão legal.
Pleiteou a declaração de inexistência do débito, a restituição em dobro dos valores indevidamente descontados (R$ 4.575,78), e indenização por danos morais no valor de R$ 10.000,00.
Ao receber a inicial, o Juízo de primeira instância proferiu despacho (ID 20921796) alertando sobre a suspeita de "advocacia predatória", com base na Nota Técnica nº 06 do TJPI.
Determinou que a Apelante, no prazo de 15 (quinze) dias, emendasse a inicial apresentando procuração pública, sob pena de indeferimento da inicial e possível aplicação de multa por litigância de má-fé.
A justificativa para tal exigência baseou-se no fato de que a parte requerente possuía 06 (seis) processos referentes a empréstimos consignados, o que, na visão do magistrado, levantava indícios de demanda predatória.
Inconformada com a determinação, a Apelante interpôs Agravo de Instrumento (ID 20921801), argumentando que a exigência de procuração pública era excessiva e que a procuração particular já acostada aos autos era plenamente válida, mesmo para pessoas analfabetas, nos termos do art. 595 do Código Civil e da jurisprudência do TJPI.
Sustentou, ainda, que a multiplicidade de ações não configurava, por si só, litigância predatória, mas sim um reflexo do alarmante aumento de fraudes bancárias contra idosos no estado do Piauí.
Este Relator, em decisão monocrática no Agravo de Instrumento (ID 16125636 do processo 0753214-47.2024.8.18.0000), negou conhecimento ao recurso, sob o fundamento de que o ato judicial impugnado consistia em mero despacho de saneamento, irrecorrível por Agravo de Instrumento, e que não restou evidenciada a urgência decorrente da inutilidade do julgamento da questão em sede de apelação.
A referida decisão transitou em julgado em 08/05/2024 (ID 17097741 do processo 0753214-47.2024.8.18.0000).
Após o trânsito em julgado do Agravo de Instrumento, o Juízo de primeira instância proferiu sentença (ID 20921806) extinguindo o processo sem resolução do mérito, com fundamento no art. 321, parágrafo único, e art. 485, I e IV, ambos do Código de Processo Civil.
A sentença reiterou que a Apelante não cumpriu a determinação de apresentar procuração pública, mantendo a tese de suspeita de litigância predatória e a necessidade de procuração pública para autores com elevado número de demandas, citando as Notas Técnicas nº 04 e 06 do TJPI.
Irresignada, a Apelante interpôs a presente Apelação Cível (ID 20921808), reiterando os argumentos de que a sentença de extinção não merece prosperar.
Argumenta que a interpretação da Nota Técnica nº 06 do TJPI pelo Juízo a quo foi equivocada, pois a mera multiplicidade de ações não caracteriza litigância predatória, especialmente diante do cenário de aumento de fraudes bancárias no Piauí.
Insiste na validade da procuração particular já acostada aos autos, alegando que não é analfabeta e que, mesmo se fosse, o art. 595 do Código Civil permite a procuração particular com assinatura a rogo e duas testemunhas, o que afasta a necessidade de procuração pública.
Cita precedentes do próprio TJPI que afastam o excesso de formalismo e reconhecem a validade de procurações particulares.
Requer o conhecimento e provimento do recurso para anular a sentença e determinar o regular processamento do feito, em observância aos princípios do acesso à justiça e da primazia do mérito.
O Apelado, Banco Bradesco S.A., apresentou contrarrazões (ID 20921812), pugnando pela manutenção da sentença.
Defendeu a legitimidade da exigência de procuração pública como medida de segurança jurídica e proteção contra fraudes, especialmente para analfabetos, e que a Apelante não sanou a irregularidade apontada. É o relatório.
FUNDAMENTAÇÃO O presente recurso de Apelação Cível é tempestivo e preenche os requisitos de admissibilidade, razão pela qual dele conheço.
A controvérsia central do presente recurso reside na legalidade da extinção do processo sem resolução do mérito, motivada pela não apresentação de procuração pública pela Apelante, sob a alegação de suspeita de litigância predatória.
Do Acesso à Justiça e da Primazia do Mérito O Código de Processo Civil de 2015 (CPC/2015) trouxe como um de seus pilares o princípio da primazia do mérito, expresso no art. 4º, que determina que as partes têm o direito de obter em prazo razoável a solução integral do mérito, incluída a atividade satisfativa.
Esse princípio orienta o magistrado a buscar, sempre que possível, a resolução da controvérsia principal, evitando que o processo seja extinto por vícios sanáveis ou por formalismos excessivos.
A Constituição Federal, em seu art. 5º, inciso XXXV, garante o amplo acesso à justiça, estabelecendo que "a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito".
Tal garantia fundamental impõe ao Judiciário o dever de remover obstáculos que impeçam ou dificultem o exercício do direito de ação, especialmente por partes em situação de vulnerabilidade.
No caso em tela, a extinção do processo por uma questão formal – a não apresentação de procuração pública – sem que houvesse um vício insanável ou uma real impossibilidade de prosseguimento, contraria frontalmente esses princípios.
Da Litigância Predatória e da Multiplicidade de Ações É inegável a importância do combate à litigância predatória, que visa coibir o abuso do direito de ação e a sobrecarga indevida do Poder Judiciário.
As Notas Técnicas do TJPI, como a NT nº 06, e a Súmula nº 33, são instrumentos válidos para orientar os magistrados nesse sentido.
Contudo, a aplicação dessas diretrizes deve ser feita com discernimento e cautela, distinguindo o abuso do direito de ação da mera multiplicidade de demandas que, por vezes, é reflexo de um problema social ou de uma prática ilícita reiterada.
A própria Nota Técnica nº 08 do TJPI, que adere à Nota Técnica 02/2021 do CIJUSPE, esclarece que a litigância predatória se caracteriza por "demandas judicializadas de forma reiterada e, em regra, em massa, fundadas em teses genéricas, desprovidas das particularidades do caso concreto, com simples substituição dos dados pessoais da parte autora, de modo a dificultar o pleno exercício do contraditório e da ampla defesa".
E, mais importante, ressalta que a multiplicidade de ações sobre a mesma matéria não deve ser confundida com litigância predatória.
No contexto atual, o aumento exponencial de fraudes bancárias contra idosos, especialmente no Piauí, é um fato notório e amplamente divulgado, inclusive com recentes sanções legais (Lei nº 8.281/2024) e operações policiais (Operação Chassifá).
A Apelante, em sua inicial, detalha a suposta fraude e a tentativa de resolução administrativa, o que demonstra que sua demanda não se baseia em meras alegações genéricas.
Presumir a má-fé do jurisdicionado apenas pela quantidade de processos, sem uma análise aprofundada dos elementos concretos de cada demanda e do cenário fático que a envolve, pode gerar um obstáculo indevido ao acesso à justiça e punir a vítima em vez do fraudador.
A litigância predatória deve ser combatida, mas não pode servir de pretexto para negar a tutela jurisdicional a quem busca a reparação de um direito supostamente lesado.
Da Validade da Procuração Particular e do Excesso de Formalismo A exigência de procuração pública para a Apelante, sob pena de extinção do processo, configura um excesso de formalismo que não encontra respaldo na legislação processual civil e na jurisprudência dominante.
O art. 654 do Código Civil estabelece que "Todas as pessoas capazes são aptas para dar procuração mediante instrumento particular, que valerá desde que tenha a assinatura do outorgante".
O parágrafo primeiro do mesmo artigo detalha os requisitos do instrumento particular, que foram observados na procuração acostada aos autos.
Mesmo para pessoas que não sabem ler ou escrever, o art. 595 do Código Civil é claro ao dispor que "No contrato de prestação de serviço, quando qualquer das partes não souber ler, nem escrever, o instrumento poderá ser assinado a rogo e subscrito por duas testemunhas".
A Apelante, inclusive, afirma não ser analfabeta, o que reforça a validade da procuração particular.
Mesmo que fosse, a lei não exige a forma pública para o mandato judicial, bastando a observância do art. 595 do CC.
A jurisprudência deste Egrégio Tribunal de Justiça do Piauí tem se posicionado reiteradamente contra o excesso de formalismo e em favor da validade da procuração particular, mesmo em casos envolvendo pessoas analfabetas ou com baixa escolaridade, desde que observados os requisitos legais.
Cito, a título de exemplo: TJPI | Agravo de Instrumento Nº 0759909-51.2023.8.18.0000 | Relator: Desembargador Francisco Antônio Paes Landim Filho | 3ª CÂMARA ESPECIALIZADA CÍVEL | Data de Julgamento: 08/03/2024: 1.
Segundo o art. 5°, do Estatuto da OAB, a procuração para o foro em geral habilita o advogado a praticar todos os atos judiciais, em qualquer juízo ou instância, salvo os que exijam poderes especiais, podendo, inclusive, afirmando urgência, atuar sem procuração, obrigando-se a apresentá-la no prazo de quinze dias, prorrogável por igual período. 2.
Com efeito, o ordenamento jurídico pátrio tende à maior proteção do lesado ou sob o risco premente de dano, ademais, o hipossuficiente, pelo que seria ilógico e desproporcional a exigência de um formalismo excessivo que viesse a onerar, dificultar ou mesmo inviabilizar seu ingresso em juízo e a consequente persecução de seus direitos. 3.
Recurso conhecido e provido.
TJPI | Apelação Cível Nº 0710096-31.2018.8.18.0000 | Relator: Des.
Francisco Antônio Paes Landim Filho | 3ª Câmara Especializada Cível | Data de Julgamento: 20/03/2020: "Ademais, a procuração outorgada a advogado, que é sucedâneo do contrato de prestação de serviços advocatícios, conferida por pessoa analfabeta pode ser feita por instrumento particular, desde que cumpridos os requisitos do art. 595 do Código Civil, quais sejam: a assinatura a rogo e a subscrição de duas testemunhas." A presunção de autenticidade dos documentos acostados aos autos, até que haja impugnação pela parte contrária, é a regra no processo civil.
A exigência de procuração pública, sem que houvesse uma fundada dúvida sobre a autenticidade da procuração particular já apresentada ou sobre a manifestação de vontade da Apelante, impõe um ônus desnecessário e oneroso ao jurisdicionado, em especial àqueles em situação de vulnerabilidade.
A extinção do processo, neste caso, impede a análise de uma questão de grande relevância social, que é a alegada fraude em empréstimos consignados contra idosos.
A busca pela verdade real e a efetividade da prestação jurisdicional devem prevalecer sobre formalismos que não se justificam no caso concreto.
Diante do exposto, entendo que a sentença de primeiro grau, ao extinguir o processo sem resolução do mérito com base na não apresentação de procuração pública e na mera suspeita de litigância predatória, incorreu em excesso de formalismo e violou os princípios do acesso à justiça e da primazia do mérito.
A procuração particular apresentada pela Apelante é válida e suficiente para a representação em juízo, e a multiplicidade de ações, por si só, não é prova cabal de má-fé.
DISPOSITIVO Isso posto, com fundamento no art. 932, inciso IV, alínea "a", do Código de Processo Civil, e em consonância com a jurisprudência consolidada deste Egrégio Tribunal de Justiça, CONHEÇO do recurso de Apelação Cível interposto por MARIA JOSE OLIVEIRA e a ele DOU PROVIMENTO para: 1.
ANULAR a sentença proferida pelo Juízo da Vara Única da Comarca de Capitão de Campos/PI (ID 20921806). 2.
DETERMINAR o retorno dos autos à origem para o regular processamento do feito, com a devida análise do mérito da demanda.
Deixo de fixar honorários recursais, nos termos da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, uma vez que o presente recurso não pôs fim à demanda.
Intimem-se as partes.
Cumpra-se.
TERESINA-PI, 18 de agosto de 2025. -
25/10/2024 10:41
Remetidos os Autos (em grau de recurso) para à Instância Superior
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25/10/2024 10:40
Expedição de Certidão.
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25/10/2024 10:40
Expedição de Certidão.
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11/10/2024 17:34
Juntada de Petição de contrarrazões da apelação
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23/09/2024 15:05
Expedição de Outros documentos.
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23/08/2024 03:13
Decorrido prazo de BANCO BRADESCO S.A. em 22/08/2024 23:59.
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12/08/2024 17:22
Juntada de Petição de apelação
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31/07/2024 10:56
Expedição de Outros documentos.
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31/07/2024 10:56
Indeferida a petição inicial
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01/07/2024 14:46
Conclusos para julgamento
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01/07/2024 14:46
Expedição de Certidão.
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15/05/2024 09:10
Expedição de Certidão.
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25/03/2024 11:31
Juntada de Petição de petição
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23/02/2024 10:03
Expedição de Outros documentos.
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23/02/2024 10:03
Determinada Requisição de Informações
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17/02/2024 11:49
Conclusos para despacho
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17/02/2024 11:49
Expedição de Certidão.
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17/02/2024 09:40
Expedição de Certidão.
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08/02/2024 23:03
Juntada de Petição de certidão de distribuição anterior
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08/02/2024 11:22
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
08/02/2024
Ultima Atualização
01/09/2025
Valor da Causa
R$ 0,00
Documentos
Sentença • Arquivo
Sentença • Arquivo
Despacho • Arquivo
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