TJPI - 0801807-68.2023.8.18.0089
1ª instância - Vara Unica de Caracol
Processos Relacionados - Outras Instâncias
Polo Ativo
Polo Passivo
Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
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01/09/2025 00:00
Intimação
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PIAUÍ ÓRGÃO JULGADOR : 3ª Câmara Especializada Cível APELAÇÃO CÍVEL (198) No 0801807-68.2023.8.18.0089 APELANTE: BANCO PAN S.A.
Advogado(s) do reclamante: GILVAN MELO SOUSA, JOAO VITOR CHAVES MARQUES DIAS APELADO: ALDINE DIAS Advogado(s) do reclamado: CARLOS EDUARDO DE CARVALHO PIONORIO RELATOR(A): Desembargadora LUCICLEIDE PEREIRA BELO EMENTA Ementa: DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR.
APELAÇÃO CÍVEL.
CONTRATO DE EMPRÉSTIMO FIRMADO COM PESSOA ANALFABETA.
AUSÊNCIA DE ASSINATURA A ROGO E TESTEMUNHAS.
NULIDADE DO NEGÓCIO JURÍDICO.
DANO MORAL CONFIGURADO.
REPETIÇÃO DO INDÉBITO EM DOBRO.
RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
I.
CASO EM EXAME 1.
Apelação cível interposta por instituição financeira contra sentença proferida em ação anulatória cumulada com obrigação de fazer, repetição de indébito e indenização por danos morais, ajuizada por consumidora analfabeta.
A sentença reconheceu a nulidade do contrato de empréstimo bancário, condenou o banco à restituição em dobro dos valores descontados e ao pagamento de R$ 2.000,00 por danos morais.
O banco apelou, alegando validade da contratação e inexistência de danos.
II.
QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2.
Há três questões em discussão: (i) verificar se o contrato de empréstimo firmado com pessoa analfabeta é válido sem a observância das formalidades do art. 595 do Código Civil; (ii) apurar se houve dano moral indenizável decorrente dos descontos efetuados; (iii) definir se é cabível a repetição em dobro dos valores descontados.
III.
RAZÕES DE DECIDIR 3.
A instituição financeira é fornecedora de serviços nos termos do art. 3º do CDC, sendo sua responsabilidade objetiva, conforme o art. 14 do mesmo diploma, inclusive quanto à informação adequada e segurança na prestação do serviço. 4.
O contrato juntado aos autos foi firmado por consumidora analfabeta sem a assinatura a rogo e a subscrição de duas testemunhas, conforme exige o art. 595 do Código Civil, razão pela qual é nulo, nos termos de precedentes do STJ (REsp 1907394/MT). 5.
A jurisprudência do TJPI, consolidada na Súmula nº 30, também reconhece a nulidade do contrato nas mesmas condições, ainda que haja prova da disponibilização dos valores em conta da contratante. 6.
Reconhecida a nulidade, a cobrança realizada é indevida, gerando dever de devolução dos valores, nos termos do art. 42, parágrafo único, do CDC.
Embora o STJ tenha modulado os efeitos da tese firmada no EAREsp nº 676.608/RS, a Câmara seguiu sua jurisprudência para reconhecer a repetição em dobro. 7.
Os descontos indevidos sobre verba de natureza alimentar configuram constrangimento apto a ensejar reparação por danos morais, nos termos da doutrina do “damnum in re ipsa”, bastando a comprovação do ilícito. 8.
O valor da indenização por dano moral, fixado em R$ 2.000,00, mostra-se proporcional às circunstâncias do caso, observando os critérios de razoabilidade, a situação econômica das partes e o caráter pedagógico da medida. 9.
Aplicou-se o princípio da congruência (CPC, art. 492) e da proibição da reformatio in pejus, pois apenas a instituição financeira recorreu. 10.
Determinou-se a compensação do valor de R$ 1.694,21, comprovadamente creditado à autora, com a condenação imposta. 11.
A atualização monetária e os juros moratórios devem observar a regra vigente até a entrada em vigor da Lei nº 14.905/2024, a partir de quando passam a incidir o IPCA para correção e a Taxa Selic deduzido o IPCA para juros, conforme nova redação dos arts. 389 e 406 do Código Civil.
IV.
DISPOSITIVO E TESE 12.
Recurso parcialmente provido.
Tese de julgamento: 1. É nulo o contrato firmado com pessoa analfabeta que não contenha assinatura a rogo e subscrição por duas testemunhas, nos termos do art. 595 do Código Civil. 2.
A cobrança decorrente de contrato nulo configura ato ilícito e impõe o dever de devolução em dobro, conforme art. 42, parágrafo único, do CDC. 3.
O desconto indevido em benefício previdenciário acarreta dano moral in re ipsa, passível de indenização, independentemente de prova do abalo psíquico. 4.
A compensação de valores recebidos é admissível e deve ser abatida do montante da condenação, para evitar enriquecimento sem causa.
ACÓRDÃO Acordam os componentes do(a) 3ª Câmara Especializada Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Piauí, por unanimidade, conhecer e dar parcial provimento ao recurso, nos termos do voto do(a) Relator(a).
Participaram do julgamento os(as) Excelentíssimos(as) Senhores(as) Desembargadores(as): FERNANDO LOPES E SILVA NETO, LUCICLEIDE PEREIRA BELO e RICARDO GENTIL EULALIO DANTAS.
Acompanhou a sessão, o(a) Excelentíssimo(a) Senhor(a) Procurador(a) de Justiça, MARTHA CELINA DE OLIVEIRA NUNES.
SALA DAS SESSÕES DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PIAUÍ, em Teresina, 22 de agosto de 2025.
RELATÓRIO Trata-se de Apelação Cível interposta por BANCO PAN S/A em face de sentença proferida nos autos da AÇÃO ANULATÓRIA C.C.
OBRIGAÇÃO DE FAZER E REPETIÇÃO DE INDÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS movida por ALDINE DIAS, ora apelada.
Na Sentença (id 25630438), o juízo singular julgou parcialmente procedentes os pedidos iniciais, nos seguintes termos: DISPOSITIVO Pelo exposto, na forma do art. 487, I, do CPC, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES OS PEDIDOS para: 1) Declarar a nulidade do contrato de empréstimo debatido, devendo o réu ressarcir em dobro os valores das prestações descontadas indevidamente, acrescidos de juros legais a partir do evento danoso e corrigidos monetariamente, a partir do efetivo prejuízo (Súmula 43 do STJ), considerando, ainda, a prescrição quinquenal aplicável e que será abatido/compensado o valor que foi recebido pela parte autora em sua conta bancária (R$ 1.694,21). 2) Condenar a parte ré ao pagamento de indenização a título de danos morais à parte autora, no valor correspondente a R$ 2.000,00 (dois mil reais), acrescido de juros moratórios de 1% (um por cento) ao mês, a partir da data do ato ilícito, incidindo ainda correção monetária a partir do arbitramento (Súmula 362 do STJ).
A correção monetária deve seguir os termos da Tabela de Correção adotada na Justiça Federal (Provimento Conjunto nº 06/2009 do Egrégio TJPI).
O valor a ser compensado/abatido também deve ser corrigido monetariamente desde a disponibilização.
Condeno o requerido ao pagamento de custas e honorários advocatícios que fixo em 15% (quinze por cento) do valor da condenação.
Irresignado com a sentença, o banco réu interpôs recurso (ID 25630448) aduzindo, em síntese, a legitimidade da contratação e a ausência de dano.
O banco suscita que uma das testemunhas é filho da autora, não tendo que se falar em desconhecimento do contrato.
Pugna que sejam compensados os valores da condenação com o valor que foi disponibilizado por meio de depósito nominal à parte autora.
Ao final, requer a reforma da sentença para julgar improcedentes os pedidos iniciais.
Em contrarrazões (id 25630454), a parte autora pugna pelo conhecimento e desprovimento do recurso.
Desnecessário o encaminhamento dos autos ao Ministério Público Superior, por não vislumbrar hipótese que justifique sua intervenção, conforme recomendação contida no Ofício Circular n.º 174/2021, da Presidência deste Egrégio Tribunal de Justiça. É o Relatório.
Inclua-se o presente feito na pauta de julgamento virtual.
VOTO I.
REQUISITOS DE ADMISSIBILIDADE Recurso tempestivo e formalmente regular.
Preparo dispensado em razão da concessão da gratuidade processual ao autor/recorrente.
Preenchidos os demais requisitos necessários à admissibilidade recursal, CONHEÇO do apelo.
II.
MÉRITO Trata-se de ação objetivando a declaração de nulidade de contrato de empréstimo, bem como indenização pelos danos morais e materiais sofridos pela parte autora/apelada, sob a alegação de nulidade do contrato, por não atender os requisitos formais previstos na lei.
De início, vale ressaltar que a matéria em discussão é regida pelas normas pertinentes ao Código de Defesa do Consumidor, porquanto a instituição financeira caracteriza-se como fornecedor de serviços, razão pela qual, sua responsabilidade é objetiva, nos termos dos arts. 3º e 14, da supracitada legislação, como veremos a seguir: Art. 3º Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços. (…) Art. 14.
O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos. §1º.
O serviço é defeituoso quando não fornece a segurança que o consumidor dele pode esperar, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes, entre as quais: I - o modo de seu fornecimento; II - o resultado e os riscos que razoavelmente dele se esperam; §2º.
Omissis; §3º.
O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar: I - que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste; II - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.
Além disso, esta questão já foi sumulada pelo Superior Tribunal de Justiça, na Súmula nº 297: “O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras”.
Diante da incidência da norma consumerista à hipótese em apreço, é cabível a aplicação da regra constante do art. 6º, VIII, do Código de Defesa do Consumidor no tocante ao ônus probatório. É que, como cediço, o instituto da inversão do ônus da prova confere ao consumidor a oportunidade de ver direito subjetivo público apreciado, facilitando a sua atuação em juízo, de modo que tal ônus incumbe ao prestador do serviço, mormente em face da sua hipossuficiência técnica.
Nesse contexto, analisando o conjunto probatório dos autos, verifica-se que o Banco/Apelado acostou aos autos contrato (id. 25630422) em que se observa que a manifestação de vontade da parte Apelante foi realizada pela aposição da sua impressão digital acompanhada de duas testemunhas, mas desacompanhada da assinatura a rogo.
Assim, resta claro que não houve o cumprimento dos requisitos legais exigidos para a contratação, nos termos do art. 595 do Código Civil.
Nula, portanto, a relação contratual.
Embora inserido na parte do Código Civil que trata especificamente do contrato de prestação de serviço, a regra estabelecida no art. 595, do Código Civil é aplicável a todo e qualquer negócio jurídico, conforme entendimento do Superior Tribunal de Justiça.
DIREITO CIVIL.
RECURSO ESPECIAL.
AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE NEGÓCIO JURÍDICO C/C PEDIDOS DE RESTITUIÇÃO DE VALORES E COMPENSAÇÃO POR DANOS MORAIS.
CONTRATO DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO FIRMADO POR IDOSO INDÍGENA ANALFABETO.
VALIDADE.
REQUISITO DE FORMA.
ASSINATURA DO INSTRUMENTO CONTRATUAL A ROGO POR TERCEIRO, NA PRESENÇA DE DUAS TESTEMUNHAS.
ART. 595 DO CC/02.
PROCURADOR PÚBLICO.
DESNECESSIDADE. […] 7.
Embora o referido dispositivo legal se refira ao contrato de prestação de serviços, deve ser dada à norma nele contida o máximo alcance e amplitude, de modo a abranger todos os contratos escritos firmados com quem não saiba ler ou escrever, a fim de compensar, em algum grau, a hipervulnerabilidade desse grupo social. […] (REsp 1907394/MT, Rel.
Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 04/05/2021, DJe 10/05/2021) G.N.
A exigência de cumprimento dos requisitos de validade do negócio jurídico supracitado tem a função de garantir que os idosos analfabetos tenham verdadeiramente conhecimento do que estão contratando, manifestando sua vontade de maneira livre e consciente.
Nesse sentido remansosa jurisprudência da Corte Superior de Justiça: DIREITO CIVIL.
RECURSO ESPECIAL.
AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE NEGÓCIO JURÍDICO C/C PEDIDOS DE RESTITUIÇÃO DE VALORES E COMPENSAÇÃO POR DANOS MORAIS.
CONTRATO DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO FIRMADO POR IDOSO INDÍGENA ANALFABETO.
VALIDADE.
REQUISITO DE FORMA.
ASSINATURA DO INSTRUMENTO CONTRATUAL A ROGO POR TERCEIRO, NA PRESENÇA DE DUAS TESTEMUNHAS.
ART. 595 DO CC/02.
PROCURADOR PÚBLICO.
DESNECESSIDADE. 1. […] 2. […] 3.
Os analfabetos, assim como os índios, detêm plena capacidade civil, podendo, por sua própria manifestação de vontade, contrair direitos e obrigações, independentemente da interveniência de terceiro. 4.
Como regra, à luz dos princípios da liberdade das formas e do consensualismo, a exteriorização da vontade dos contratantes pode ocorrer sem forma especial ou solene, salvo quando exigido por lei, consoante o disposto no art. 107 do CC/02. 5.
Por essa razão, em um primeiro aspecto, à míngua de previsão legal expressa, a validade do contrato firmado por pessoa que não saiba ler ou escrever não depende de instrumento público. 6.
Noutra toada, na hipótese de se tratar de contrato escrito firmado pela pessoa analfabeta, é imperiosa a observância da formalidade prevista no art. 595 do CC/02, que prevê a assinatura do instrumento contratual a rogo por terceiro, com a subscrição de duas testemunhas. 7.
Embora o referido dispositivo legal se refira ao contrato de prestação de serviços, deve ser dada à norma nele contida o máximo alcance e amplitude, de modo a abranger todos os contratos escritos firmados com quem não saiba ler ou escrever, a fim de compensar, em algum grau, a hipervulnerabilidade desse grupo social. 8.
Com efeito, a formalização de negócios jurídicos em contratos escritos - em especial, os contratos de consumo - põe as pessoas analfabetas em evidente desequilíbrio, haja vista sua dificuldade de compreender as disposições contratuais expostas em vernáculo.
Daí porque, intervindo no negócio jurídico terceiro de confiança do analfabeto, capaz de lhe certificar acerca do conteúdo do contrato escrito e de assinar em seu nome, tudo isso testificado por duas testemunhas, equaciona-se, ao menos em parte, a sua vulnerabilidade informacional. 9.
O art. 595 do CC/02 se refere a uma formalidade a ser acrescida à celebração de negócio jurídico por escrito por pessoa analfabeta, que não se confunde com o exercício de mandato.
O contratante que não sabe ler ou escrever declara, por si próprio, sua vontade, celebrando assim o negócio, recorrendo ao terceiro apenas para um auxílio pontual quanto aos termos do instrumento escrito. 10.
O terceiro, destarte, não celebra o negócio em representação dos interesses da pessoa analfabeta, como se mandatário fosse.
Por isso, não é necessário que tenha sido anteriormente constituído como procurador. 11.
Se assim o quiser, o analfabeto pode se fazer representar por procurador, necessariamente constituído mediante instrumento público, à luz do disposto no art. 654, caput, do CC/02.
Nessa hipótese, típica do exercício de mandato, não incide o disposto no art. 595 do Código e, portanto, dispensa-se a participação das duas testemunhas. 12.
Recurso especial conhecido e provido. (REsp 1907394/MT, Rel.
Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 04/05/2021, DJe 10/05/2021) Com efeito, a ausência de assinatura a rogo e subscrição por duas testemunhas nos instrumento de contrato de mútuo bancário atribuídos a pessoa analfabeta torna o negócio jurídico nulo.
Recentemente a matéria foi sumulada pelo Tribunal de Justiça do Estado do Piauí, nos seguintes termos: SÚMULA 30/TJPI - A ausência de assinatura a rogo e subscrição por duas testemunhas nos instrumento de contrato de mútuo bancário atribuídos a pessoa analfabeta torna o negócio jurídico nulo, mesmo que seja comprovada a disponibilização do valor em conta de sua titularidade, configurando ato ilícito, gerando o dever de repará-lo, cabendo ao magistrado ou magistrada, no caso concreto, e de forma fundamentada, reconhecer categorias reparatórias devidas e fixar o respectivo quantum, sem prejuízo de eventual compensação.
Sendo o contrato nulo, em decorrência do vício citado, a cobrança é indevida, tornando-se imperiosa a repetição do indébito e a reparação por danos morais, contrariamente ao que fora determinado na sentença a quo.
Acerca da repetição em dobro, o Colendo STJ fixou a seguinte tese, no julgamento do EAREsp nº 676.608/RS: “A restituição em dobro do indébito (parágrafo único do artigo 42 do CDC) independe da natureza do elemento volitivo do fornecedor que cobrou valor indevido, revelando-se cabível quando a cobrança indevida consubstancia conduta contrária à boa-fé objetiva” .
Contudo, a Corte Especial do STJ decidiu modular os efeitos da tese, restringindo a eficácia temporal dessa decisão, ponderando que, na hipótese de contratos de consumo que não envolvam a prestação de serviços públicos, o entendimento somente poderia ser aplicado aos débitos cobrados após a data da publicação do acórdão paradigma (EAREsp nº 676.608/RS), em 30/03/2021.
Porém, na sessão presencial por videoconferência realizada em 14 de agosto de 2024, no julgamento do Processo nº 0800432-52.2020.8.18.0084, em regime de ampliação de quórum, fui vencida em meu entendimento.
Assim, em razão dos precedentes desta 3ª Câmara Especializada Cível e do princípio da colegialidade, entendo que a repetição deve ocorrer integralmente em dobro.
No que tange aos prejuízos imateriais alegados, o desconto indevido pode gerar danos morais, bastando para isso que o consumidor seja submetido a um constrangimento ilegal, como a cobrança de valores atinentes a um contrato nulo, bem como por tratar-se de dedução efetuada em verba de caráter alimentar.
Ademais, na hipótese dos autos, é certo que o dever de indenizar resulta da própria conduta lesiva evidenciada, independendo de prova dos abalos psíquicos causados, pois, em casos tais, o dano é in re ipsa, isto é, decorre diretamente da ofensa, por comprovação do ilícito, que ficou sobejamente demonstrado nos autos.
O próprio STJ firmou entendimento no sentido de que “a concepção atual da doutrina orienta-se no sentido de que a responsabilização do agente causador do dano moral opera-se por força do simples fato de violação (damnum in re ipsa).
Verificado o evento danoso surge a necessidade de reparação, não havendo que se cogitar da prova do prejuízo, se presentes os pressupostos legais para que haja a responsabilidade civil (nexo de causalidade e culpa)” (RT 746/183, Rel.
Min.
Cesar Asfor Rocha, 4ª Turma).
A respeito da temática, existem diversos julgados dos Tribunais Pátrios (verbi gratia, TJMS: AC nº 0802134-57.2019.8.12.0012, Rel.
Des.
Vilson Bertelli, 2ª Câmara Cível, j. 27/07/2020; e TJCE: APL nº 0000783-69.2017.8.06.0190, Rel.
Des.
Raimundo Nonato Silva Santos, 4ª Câmara de Direito Privado, j. 12/11/2019).
Por estas razões, com esteio na prova dos autos, entendo ser devida a reparação por danos morais, em função das ações lesivas praticadas pela instituição financeira demandada.
Em continuidade, na fixação da indenização por danos morais, o magistrado deve agir com equidade, analisando a extensão do dano, as condições socioeconômicas e culturais dos envolvidos, as condições psicológicas das partes e o grau de culpa do agente, terceiro ou vítima.
Tais critérios podem ser retirados dos artigos 944 e 945, ambos do CC, bem como do entendimento dominante do STJ.
Pacífico também o entendimento a respeito do caráter dúplice (compensatório/pedagógico) da indenização por danos morais, devendo o julgador, quando da sua fixação, se guiar pelas circunstâncias do caso concreto e pelos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, de modo que seu valor não seja excessivo a ponto de gerar enriquecimento ilícito do ofendido, tampouco irrisório para estimular a prática danosa, sob pena de desvirtuamento da natureza do instituto do dano moral.
Vale dizer, deve ser quantia que não seja insignificante, a ponto de não compor o sentimento negativo experimentado pela vítima, e que não seja tão elevada, a ponto de provocar o seu enriquecimento sem causa.
Portanto, para que o arbitramento atenda aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, a orientação de nossos Tribunais exige que seja feito a partir de dois dados relevantes, quais sejam, o nível econômico do ofendido e o porte econômico do ofensor, ambos cotejados com as condições em que se deu a ofensa.
Com efeito, considerando-se as condições das partes, o valor da indenização deve ser compatível com a expressão econômica e com o grau de culpa observado no ato, evidenciada, no caso, pela instituição financeira que realizou descontos no benefício previdenciário da parte autora sem qualquer lastro contratual válido.
Nestas condições, apreciadas todas as questões postas, e levando em consideração o valor de cada desconto, entendo que deve ser arbitrada, a título de indenização do dano moral, a quantia de R$ 2.000,00 (dois mil reais), valor que atende aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, levando-se em consideração a realidade das partes, a situação econômica e as particularidades do caso.
Ressalte-se que o caso em tela exige a aplicação do princípio da proibição da reformatio in pejus, uma vez que somente a instituição financeira interpôs recurso.
Em respeito ao princípio dispositivo e ao princípio do tantum devolutum quantum appellatum, o órgão julgador encontra-se vinculado ao objeto do recurso, não podendo modificar a sentença em prejuízo do recorrente, que, no caso, é a instituição financeira.
Nesse sentido, mesmo que a Câmara possua entendimento consolidado no sentido de fixar danos morais em patamar mais elevado e de reconhecer a repetição do indébito em dobro em casos de descontos indevidos, a ausência de recurso por parte do autor impede que o colegiado adote tais medidas.
Alterar a sentença nesses aspectos, sem provocação do consumidor, configuraria uma decisão ultra petita e violaria o princípio da congruência previsto no art. 492 do CPC.
Registre-se, a fim de evitar o enriquecimento sem causa, que do montante da condenação deverá ser descontado o valor de R$1.694,21 (mil seiscentos e noventa e quatro reais e vinte e um centavos) (ID 25630419 - Pág. 7), comprovadamente transferido à conta bancária da parte autora.
Cumpre salientar que a Lei 14.905/2024, que recentemente entrou em vigor (1º de setembro de 2024), introduziu modificações relevantes no que tange à correção monetária e aos juros moratórios incidentes sobre débitos judiciais.
A nova legislação, modificou o art. 389 e art. 406 ambos do Código Civil, e estabeleceu que, a partir de sua vigência, os débitos deverão ser atualizados monetariamente pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), e os juros moratórios serão aplicados com base na Taxa Selic deduzido o IPCA.
Veja-se: "Art. 389.
Não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos, mais juros, atualização monetária e honorários de advogado.
Parágrafo único.
Na hipótese de o índice de atualização monetária não ter sido convencionado ou não estar previsto em lei específica, será aplicada a variação do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), apurado e divulgado pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), ou do índice que vier a substituí-lo.
Art. 406.
Quando não forem convencionados, ou quando o forem sem taxa estipulada, ou quando provierem de determinação da lei, os juros serão fixados de acordo com a taxa legal. § 1º A taxa legal corresponderá à taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), deduzido o índice de atualização monetária de que trata o parágrafo único do art. 389 deste Código. § 2º A metodologia de cálculo da taxa legal e sua forma de aplicação serão definidas pelo Conselho Monetário Nacional e divulgadas pelo Banco Central do Brasil. § 3º Caso a taxa legal apresente resultado negativo, este será considerado igual a 0 (zero) para efeito de cálculo dos juros no período de referência".
Dessa forma, sobre o montante da condenação deverá incidir correção monetária pela tabela da Justiça Federal, até a data da entrada em vigor da Lei 14.905/2024; juros moratórios de 1% ao mês, também até a vigência da referida lei.
A partir da entrada em vigor da Lei 14.905/2024, incidirão correção monetária com base no IPCA e juros moratórios conforme a Taxa Selic, decotado o IPCA-E, tudo conforme a nova redação dada aos arts. 389 e 406 do Código Civil.
III.
DISPOSITIVO Com estes fundamentos, DOU PROVIMENTO, EM PARTE, ao recurso interposto pela instituição financeira requerida, a fim de que seja compensado o valor de R$1.694,21 (mil seiscentos e noventa e quatro reais e vinte e um centavos).
Mantenho os honorários advocatícios arbitrados na origem. É como voto.
Intimem-se.
Preclusas as vias impugnativas, arquive-se, dando-se baixa na Distribuição de 2º grau, com a consequente remessa dos autos ao Juízo de origem.
Desembargadora LUCICLEIDE PEREIRA BELO Relatora -
07/06/2025 10:46
Remetidos os Autos (em grau de recurso) para à Instância Superior
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07/06/2025 10:33
Expedição de Certidão.
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07/06/2025 10:33
Expedição de Outros documentos.
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07/06/2025 10:33
Ato ordinatório praticado
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07/06/2025 10:31
Expedição de Outros documentos.
-
07/06/2025 10:31
Expedição de Certidão.
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07/06/2025 02:02
Decorrido prazo de ALDINE DIAS em 06/06/2025 23:59.
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06/06/2025 18:40
Juntada de Petição de contrarrazões da apelação
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06/05/2025 13:04
Expedição de Outros documentos.
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06/05/2025 13:03
Ato ordinatório praticado
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06/05/2025 13:01
Juntada de
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24/01/2025 03:18
Decorrido prazo de ALDINE DIAS em 23/01/2025 23:59.
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22/01/2025 03:25
Decorrido prazo de BANCO PAN em 21/01/2025 23:59.
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19/12/2024 11:21
Juntada de Petição de apelação
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23/11/2024 00:14
Expedição de Outros documentos.
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23/11/2024 00:14
Embargos de Declaração Não-acolhidos
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14/05/2024 11:16
Conclusos para julgamento
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14/05/2024 11:16
Expedição de Certidão.
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14/05/2024 11:15
Juntada de Certidão
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06/05/2024 16:11
Juntada de Petição de manifestação
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02/04/2024 13:16
Expedição de Outros documentos.
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02/04/2024 13:15
Expedição de Outros documentos.
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02/04/2024 13:15
Expedição de Certidão.
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10/03/2024 03:52
Decorrido prazo de ALDINE DIAS em 08/03/2024 23:59.
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07/03/2024 05:21
Decorrido prazo de BANCO PAN em 06/03/2024 23:59.
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22/02/2024 16:17
Juntada de Petição de manifestação
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21/02/2024 23:44
Juntada de Petição de petição
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06/02/2024 10:48
Expedição de Outros documentos.
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06/02/2024 10:48
Julgado procedente em parte do pedido
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23/11/2023 11:38
Conclusos para despacho
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23/11/2023 11:38
Expedição de Certidão.
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23/11/2023 11:38
Expedição de Outros documentos.
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23/11/2023 11:38
Expedição de Certidão.
-
23/11/2023 11:37
Expedição de Outros documentos.
-
23/11/2023 11:37
Expedição de Certidão.
-
19/10/2023 03:31
Decorrido prazo de ALDINE DIAS em 18/10/2023 23:59.
-
13/10/2023 23:08
Juntada de Petição de petição
-
15/09/2023 14:36
Expedição de Outros documentos.
-
15/09/2023 14:35
Ato ordinatório praticado
-
29/08/2023 13:25
Juntada de Petição de petição
-
28/07/2023 09:26
Expedição de Outros documentos.
-
28/07/2023 09:24
Ato ordinatório praticado
-
21/07/2023 03:10
Decorrido prazo de BANCO PAN em 20/07/2023 23:59.
-
19/06/2023 19:10
Expedição de Outros documentos.
-
19/06/2023 19:10
Concedida a Assistência Judiciária Gratuita a ALDINE DIAS - CPF: *11.***.*75-96 (AUTOR).
-
19/06/2023 08:22
Conclusos para despacho
-
19/06/2023 08:22
Expedição de Certidão.
-
19/06/2023 08:22
Juntada de Certidão
-
17/06/2023 19:15
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
17/06/2023
Ultima Atualização
01/09/2025
Valor da Causa
R$ 0,00
Detalhes
Documentos
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