TJPI - 0801041-82.2022.8.18.0078
1ª instância - 2ª Vara de Valenca do Piaui
Processos Relacionados - Outras Instâncias
Polo Passivo
Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
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28/07/2025 00:00
Intimação
poder judiciário tribunal de justiça do estado do piauí GABINETE DO Desembargador RICARDO GENTIL EULÁLIO DANTAS PROCESSO Nº: 0801041-82.2022.8.18.0078 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) ASSUNTO(S): [Empréstimo consignado] APELANTE: FRANCISCA BATISTA DO NASCIMENTO APELADO: BANCO PAN S.A.
REPRESENTANTE: BANCO PAN S.A.
DECISÃO TERMINATIVA Apelação parcialmente provida para declarar a nulidade do contrato de empréstimo impugnado, em razão do descumprimento da regra prevista no art. 595 do Código Civil, condenando o banco à restituição em dobro dos valores indevidamente descontados, bem como ao pagamento de R$ 3.000,00 a título de indenização por danos morais, com determinação de compensação dos valores repassados à parte autora com base no contrato objeto da lide.
E, ainda, para excluir a multa por litigância de má-fé atribuída à parte autora/recorrente e ao seu patrono, e manter o benefício da justiça gratuita anteriormente deferido à parte autora.
I.
RELATÓRIO Trata-se de apelação interposta por FRANCISCA BATISTA DO NASCIMENTO contra sentença que julgou improcedente a AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE NEGÓCIO JURÍDICO CC REPETIÇÃO DE INDÉBITO, CUMULADA COM DANOS MORAIS ajuizada em face do BANCO PAN S/A, ora apelado.
Em suas razões recursais (ID 20909575), defende a parte autora/apelante, em síntese, que o contrato impugnado não seguiu as formalidades para contratação com pessoa analfabeta, devendo ser declarada a sua nulidade.
Ademais, sustenta que a sentença deve ser reformada, a fim que sejam restaurados os benefícios da justiça gratuita à parte autora, pois, além de ser rurícola, não houve qualquer alteração na sua condição econômica que justificasse a revogação do benefício.
Por fim, aduz a impossibilidade de condenação da parte autora por litigância de má-fé, tendo em vista inexistir dolo processual; bem como a impossibilidade de condenação do advogado por litigância de má-fé.
Com isso, requer o provimento do recurso, para que seja reformada a sentença a quo e julgados procedentes os pedidos iniciais, com a declaração da nulidade do contrato, condenação do réu ao pagamento de indenização por danos morais, bem ainda para devolver, em dobro, os valores descontados com arrimo no contrato questionado na lide; e, ainda, para retirar a litigância de má-fé imposta pelo juiz de origem, retirar a condenação imposta ao advogado da parte autora, e manter o benefício da assistência judiciária gratuita.
A parte apelada apresentou contrarrazões (ID 20909593), pugnando pela manutenção da sentença. É o relato do necessário.
Decido.
II.
FUNDAMENTAÇÃO II.A.
DOS REQUISITOS DE ADMISSIBILIDADE DO RECURSO Presentes os requisitos da tempestividade, cabimento, legitimidade e interesse, sendo dispensada a comprovação de recolhimento do preparo, em decorrência da gratuidade da justiça, impõe-se reconhecer o juízo de admissibilidade positivo.
Conheço da apelação, em razão do cumprimento de seus requisitos de admissibilidade.
II.B.
DO MÉRITO II.B.1.
DAS NORMAS APLICÁVEIS AO CASO Cumpre pôr em relevo que à situação em apreço aplica-se o Código de Defesa do Consumidor.
Os partícipes da relação processual têm suas situações amoldadas às definições jurídicas de consumidor e fornecedor, previstas, respectivamente, nos artigos 2º e 3º do CDC.
Ressalte-se, neste passo, que a aplicação do CDC às instituições financeiras reflete-se na Súmula nº 297 do Superior Tribunal de Justiça.
Como consequência, incidem normas específicas, atributivas de matiz diferenciada às normas de direito comum.
Com efeito, especificamente no ambiente contratual, derroga-se a ideia da existência de uma abstrata paridade de forças entre pactuantes que acreditadamente autodirigem suas vontades e passa-se a considerar as subjetividades dos contratantes, especificidades e desigualdades.
Trata-se de disciplina especial que é toda sedimentada no reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor em face do fornecedor, e que encontra eco nos arts. 4º, I, e 39, IV, ambos do CDC.
Devidamente reconhecidas as premissas da incidência das normas de proteção do consumidor, bem como da vulnerabilidade como fundamento de sua aplicação, passa-se ao exame da controvérsia central deste recurso, qual seja, se existe contrato de empréstimo regularmente firmado entre os litigantes.
O art. 932 do CPC prevê a possibilidade do relator proferir decisão monocrática para proceder ao julgamento do recurso nas seguintes hipóteses: Art. 932.
Incumbe ao relator: [...] IV - negar provimento a recurso que for contrário a: a) súmula do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça ou do próprio tribunal; b) acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos; c) entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência; V - depois de facultada a apresentação de contrarrazões, dar provimento ao recurso se a decisão recorrida for contrária a: a) súmula do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça ou do próprio tribunal; b) acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de recursos repetitivos; c) entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção de competência; [...] No presente caso, a matéria se encontra sumulada no Tribunal de Justiça do Piauí, nos seguintes termos: SÚMULA 30 – A ausência de assinatura a rogo e subscrição por duas testemunhas nos instrumento de contrato de mútuo bancário atribuídos a pessoa analfabeta torna o negócio jurídico nulo, mesmo que seja comprovada a disponibilização do valor em conta de sua titularidade, configurando ato ilícito, gerando o dever de repará-lo, cabendo ao magistrado ou magistrada, no caso concreto, e de forma fundamentada, reconhecer categorias reparatórias devidas e fixar o respectivo quantum, sem prejuízo de eventual compensação.
Assim, passo a apreciar o mérito do presente recurso, nos termos do art. 932, do CPC.
II.B.2.
DA INVALIDADE DO CONTRATO: AUSÊNCIA DE OBSERVÂNCIA DO ART. 595 DO CÓDIGO CIVIL Em análise dos autos, verifica-se que a parte autora/apelante conseguiu demonstrar documentalmente a incidência de descontos de parcelas de empréstimo consignado, de responsabilidade do banco réu, em seu benefício previdenciário, desincumbindo-se do ônus de comprovar minimamente os fatos constitutivos do seu direito.
Diante de tal contexto, ao banco réu cabia, por imposição do art. 373, II, do CPC, a demonstração de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito da parte autora.
Competia ao banco demandado a demonstração da existência/regularidade do contrato, bem ainda a comprovação de que o valor do empréstimo foi transferido à parte autora.
Entretanto, de tal ônus não se desincumbiu a contento.
Verifica-se que a parte autora é pessoa não alfabetizada.
Assim, para ser considerado válido, o contrato bancário deveria ter sido assinado a rogo e subscrito por duas testemunhas. É o que professa o art. 595 do Código Civil: Art. 595.
No contrato de prestação de serviço, quando qualquer das partes não souber ler, nem escrever, o instrumento poderá ser assinado a rogo e subscrito por duas testemunhas.
As exigências ora mencionadas têm por objetivo compensar a hipossuficiência daquele que sequer pode tomar conhecimento por si mesmo dos termos obrigacionais a que está aderindo.
Não é outro o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, consubstanciado no excerto abaixo transcrito: RECURSO ESPECIAL.
PROCESSUAL CIVIL.
DIREITO CIVIL.
AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA.
RESTITUIÇÃO DE INDÉBITO.
CONTRATO DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO.
IDOSO E ANALFABETO.
VULNERABILIDADE.
REQUISITO DE FORMA.
ASSINATURA DO INSTRUMENTO CONTRATUAL A ROGO POR TERCEIRO.
PRESENÇA DE DUAS TESTEMUNHAS.
ART. 595 DO CC/02.
ESCRITURA PÚBLICA.
NECESSIDADE DE PREVISÃO LEGAL. 1.
Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código de Processo Civil de 2015 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ). 2.
Os analfabetos podem contratar, porquanto plenamente capazes para exercer os atos da vida civil, mas expressam sua vontade de forma distinta. 3.
A validade do contrato firmado por pessoa que não saiba ler ou escrever não depende de instrumento público, salvo previsão legal nesse sentido. 4.
O contrato escrito firmado pela pessoa analfabeta observa a formalidade prevista no art. 595 do CC/02, que prevê a assinatura do instrumento contratual a rogo por terceiro, com a firma de duas testemunhas. 5.
Recurso especial não provido. (STJ - REsp: 1954424 PE 2021/0120873-7, Relator: Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, Data de Julgamento: 07/12/2021, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 14/12/2021) Verifica-se, a partir do contrato juntado aos autos, que a manifestação de vontade da parte autora, pessoa analfabeta, ocorreu por meio da aposição de sua impressão digital.
Contudo, o documento, em que pese apresentar subscrição por duas testemunhas, não contém a assinatura a rogo, em descumprimento ao disposto no art. 595 do Código Civil. (ID 20909360) Diante desse contexto, não há nos autos comprovação de contratação realizada de forma regular.
Assim, impõe-se o reconhecimento da nulidade do contrato em questão, aplicando-se ao caso a súmula 30 deste TJPI, que dispõe: SÚMULA 30 – A ausência de assinatura a rogo e subscrição por duas testemunhas nos instrumento de contrato de mútuo bancário atribuídos a pessoa analfabeta torna o negócio jurídico nulo, mesmo que seja comprovada a disponibilização do valor em conta de sua titularidade, configurando ato ilícito, gerando o dever de repará-lo, cabendo ao magistrado ou magistrada, no caso concreto, e de forma fundamentada, reconhecer categorias reparatórias devidas e fixar o respectivo quantum, sem prejuízo de eventual compensação.
Isto posto, não se pode considerar válido, sob a lente do sistema consumerista, o contrato que não ostenta os requisitos necessários para contratação com pessoa não alfabetizada.
II.B.3.
DOS DANOS MORAIS E DA REPETIÇÃO DO INDÉBITO EM DOBRO Restando caracterizada a nulidade do contrato de empréstimo consignado objeto da lide, em razão do descumprimento da regra prevista no art. 595 do Código Civil, conclui-se que os descontos no benefício previdenciário da parte apelante foram realizados à míngua de lastro jurídico, impondo-lhe uma arbitrária redução, fato gerador de angústia e sofrimento, mormente por se tratar de parca remuneração, absolutamente não condizente, como é cediço, com o mínimo necessário para uma existência digna.
Inequívoco que os descontos indevidos perpetrados na remuneração da parte apelante caracterizaram ofensa à sua integridade moral, extrapolando, em muito, a esfera do mero dissabor inerente às agruras do cotidiano, e acabando por torná-la cativa de uma situação de verdadeira incerteza quanto a sua própria subsistência.
Destaque-se a desnecessidade de prova da ocorrência da dor moral, porquanto tratar-se de dano in re ipsa, sendo, pois, suficiente, a comprovação da ocorrência do seu fato gerador, qual seja, o ato dissonante do ordenamento jurídico materializado nos descontos indevidos.
Sobre a responsabilidade do banco apelado, o artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor claramente estatui, nos termos que seguem, tratar-se de responsabilidade objetiva: Art. 14.
O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos. [...] § 3° O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar: I - que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste; II - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro. […] No que concerne ao valor da indenização por danos morais, em consonância com os parâmetros adotados por este órgão colegiado em demandas semelhantes, mostra-se revestida de razoabilidade e proporcionalidade a quantia de R$ 3.000,00 (três mil reais).
Quanto à repetição do indébito, resta demonstrada a ilegitimidade dos descontos no benefício previdenciário da parte autora, decotes oriundos da conduta negligente do banco, que autorizou a realização dos descontos mesmo sem fundamento válido, o que caracteriza a má-fé da instituição financeira, diante da cobrança sem amparo legal, e dada ainda a inexistência de engano justificável para tal atuação, cabível é a restituição em dobro.
Assim estabelece o art. 42 do CDC, doravante transcrito: Art. 42.
Na cobrança de débitos, o consumidor inadimplente não será exposto a ridículo, nem será submetido a qualquer tipo de constrangimento ou ameaça.
Parágrafo único.
O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável.
Mutatis mutandis: APELAÇÃO CÍVEL.
CIVIL.
PROCESSO CIVIL.
CONSUMIDOR.
CONTRATO DE ADESÃO.
EMPRÉSTIMO.
NULIDADE DO CONTRATO.
INEXISTÊNCIA DA DÍVIDA.
FRAUDE.
RESTITUIÇÃO EM DOBRO DOS VALORES DESCONTADOS.
BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO.
ART. 373, II, DO CPC.
PRESCRIÇÃO.
INOCORRÊNCIA.
ART. 169 DO CÓDIGO CIVIL.
SENTENÇA MANTIDA. 1.
Consoante prevê o art. 169 do Código Civil, o negócio jurídico nulo não é suscetível de confirmação, nem convalesce pelo decurso do tempo.
Logo, a falsidade da assinatura torna o contrato nulo, inválido, insuscetível de confirmação ou validação pelo decurso do tempo.
Na hipótese, a pretensão não é de anulação, mas de declaração de inexistência de relação jurídica entre as partes, de modo que não se aplica o prazo disposto no art. 178 do Código Civil. 2.
O art. 6º, III e V, do CDC, proclama ser direito básico do consumidor a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade e preço.
Do mesmo modo, nos serviços de outorga de crédito, o art. 52 do CDC preconiza a necessidade do fornecedor de informar prévia e adequadamente os termos contratuais e encargos devidos, fato não ocorrido na hipótese dos autos. 3.
Diante da alegação de fraude, incumbiria à ré comprovar a autenticidade do contrato, com fulcro no art. 429, II, do CPC.
Apesar disso, o banco não de desincumbiu de seu encargo, devendo arcar com o ônus processual de sua inércia. 4.
O parágrafo único do art. 42 do CDC dispõe que o consumidor cobrado em quantia indevida tem direito a repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, salvo engano justificável. 5.
Recurso conhecido e desprovido. (Acórdão 1706799, 07048206520228070006, Relator: SONÍRIA ROCHA CAMPOS D'ASSUNÇÃO, 6ª Turma Cível, data de julgamento: 24/5/2023, publicado no PJe: 7/6/2023.
Pág.: Sem Página Cadastrada.) Não é outra a orientação adotada por este Egrégio Tribunal de Justiça: CONSUMIDOR.
CIVIL.
EMPRÉSTIMO.
ANALFABETO.
APLICAÇÃO DO CDC.
PROCURAÇÃO PÚBLICA.
NULIDADE.
CONFISSÃO DO AUTOR QUANTO À EXISTÊNCIA DO CONTRATO.
IRRELEVANTE.
DANOS MORAIS CONFIGURADOS.
REPETIÇÃO DO INDÉBITO.
INTELIGÊNCIA DO ART. 42 DO CDC.
CONDENAÇÃO DO VENCIDO NAS CUSTAS E HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. (…) 8.
Defiro, ainda, constatada a má-fé do Banco, o pedido de restituição do indébito em dobro, eis que cobrar empréstimo, com base em contrato nulo, afronta o direito do consumidor, e, nesse caso, deve o Banco devolver em dobro os valores descontados, na forma do parágrafo único do art. 42 do Código de Defesa do Consumidor. (...) (TJPI | Apelação Cível Nº 2017.0001.012344-4 | Relator: Des.
Francisco Antônio Paes Landim Filho | 3ª Câmara Especializada Cível | Data de Julgamento: 13/03/2019) II.B.4.
DA COMPENSAÇÃO É certo que o reconhecimento da nulidade contratual não afasta a imperiosidade de devolução pelo consumidor dos valores então recebidos, sob pena de enriquecimento ilícito.
Há demonstração nos autos da transferência de valores em favor da parte autora com relação ao contrato em debate, consoante documento de ID 20909362.
Assim, revela-se devida a compensação dos valores, aplicando-se o que dispõe o artigo 182 do Código Civil: “anulado o negócio jurídico, restituir-se-ão as partes ao estado em que antes dele se achavam”.
Logo, os valores repassados em favor da parte autora, quais sejam, R$ 1.500,00 (mil e quinhentos reais), deverão ser compensados dos valores a serem pagos pelo banco réu a título de danos materiais/morais em decorrência da nulidade do contrato objeto da lide.
Ademais, referido valor deve ser acrescido de atualização monetária pelo IPCA (art. 389, parágrafo único, do CC), a partir da data da transferência ou depósito.
Ressalte-se que, não tendo havido o cometimento de ato ilícito pela parte apelante, não são devidos juros de mora ao apelado.
II.B.5.
LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ E GRATUIDADE DA JUSTIÇA No presente recurso, o apelante sustenta que a sentença deve ser reformada, a fim que sejam restaurados os benefícios da justiça gratuita à parte autora, pois, além de ser rurícola, não houve qualquer alteração na sua condição econômica que justificasse a revogação do benefício.
Além disso, aduz a impossibilidade de condenação da parte autora por litigância de má-fé, tendo em vista inexistir dolo processual; bem como a impossibilidade de condenação do advogado por litigância de má-fé.
Pois bem.
Quanto à condenação por litigância de má-fé, o art. 80 do Código de Processo Civil prescreve: Art. 80.
Considera-se litigante de má-fé aquele que: I - deduzir pretensão ou defesa contra texto expresso de lei ou fato incontroverso; II - alterar a verdade dos fatos; III - usar do processo para conseguir objetivo ilegal; IV - opuser resistência injustificada ao andamento do processo; V - proceder de modo temerário em qualquer incidente ou ato do processo; VI - provocar incidente manifestamente infundado; VII - interpuser recurso com intuito manifestamente protelatório.
Como é cediço, além das condutas elencadas, faz-se necessário também que haja a comprovação do dolo processual e/ou do prejuízo à parte adversa.
No caso em exame, não é possível inferir que a parte recorrente tenha incorrido em qualquer uma das hipóteses do citado art. 80 do CPC, tampouco que tenha havido dolo processual ou prejuízo ao banco réu.
Logo, por não estar presente algum dos requisitos contidos no art. 80 do CPC, sequer o dolo processual ou prejuízo à parte contrária, impõe-se o acolhimento da irresignação, para reformar a sentença a quo e afastar a condenação da parte autora ao pagamento de multa por litigância de má-fé.
Igualmente incabível a condenação do advogado à sanção processual da litigância de má-fé.
O Código de Processo Civil, em seu 77, §6º, de maneira expressa regulamenta que os advogados públicos ou privados e os membros da Defensoria Pública e do Ministério Público não serão sujeitos às penas processuais em decorrência de sua atuação profissional, devendo eventual responsabilidade disciplinar ser apurada pelo respectivo órgão de classe ou corregedoria, ao qual o juiz oficiará.
Nesse sentido também tem se posicionado a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça: PROCESSUAL CIVIL.
RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA.
ATO JUDICIAL.
IMPETRAÇÃO.
EXCEPCIONAL CABIMENTO.
ILEGALIDADE, TERATOLOGIA OU ABUSO DE PODER.
ADVOGADO.
TERCEIRO INTERESSADO.
SÚMULA N. 202/STJ.
LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ.
IMPOSIÇÃO DE MULTA AO PROFISSIONAL.
IMPOSSIBILIDADE.
RECURSO PROVIDO. 1. É excepcional o cabimento de mandado de segurança contra ato judicial impugnável por recurso em relação ao qual se faz possível atribuir efeito suspensivo.
A impetração, nessa hipótese, somente é admitida em casos de flagrante ilegalidade, teratologia ou abuso de poder. 2.
Os advogados, públicos ou privados, e os membros da Defensoria Pública e do Ministério Público não estão sujeitos à aplicação de pena por litigância de má-fé em razão de sua atuação profissional.
Eventual responsabilidade disciplinar decorrente de atos praticados no exercício de suas funções deverá ser apurada pelo respectivo órgão de classe ou corregedoria, a quem o magistrado oficiará.
Aplicação do art. 77, § 6º, do CPC/2015.
Precedentes do STJ. 3.
A contrariedade direta ao dispositivo legal antes referido e à jurisprudência consolidada desta Corte Superior evidencia flagrante ilegalidade e autoriza o ajuizamento do mandado de segurança, em caráter excepcional. 4. "A impetração de segurança por terceiro, contra ato judicial, não se condiciona à interposição de recurso" (Súmula n. 202/STJ).
O advogado, representante judicial de seu constituinte, é terceiro interessado na causa originária em que praticado o ato coator, e, nessa condição, tem legitimidade para impetrar mandado de segurança para defender interesse próprio. 5.
Recurso provido. (STJ - RMS: 59322 MG 2018/0298229-5, Relator: Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, Data de Julgamento: 05/02/2019, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 14/02/2019) Desse modo, é evidente que a multa atribuída ao patrono da parte apelante mostra-se indevida.
Acrescente-se que o artigo 32, parágrafo único, da Lei n.º 8.906/94 autoriza a responsabilização solidária do advogado por atos que praticar com dolo ou culpa no exercício de sua profissão.
Todavia, a conduta temerária deverá ser apurada em ação própria, e não da maneira como se deu no presente caso.
Por fim, verifico que incorreu o juízo em erro de procedimento ao revogar a gratuidade da justiça antes de oportunizar a manifestação da autora, e sem que houvesse quaisquer indícios de mudança na situação financeira da parte.
A conclusão pela improcedência dos pedidos autorais não revela, de maneira alguma, que a parte possui condições de arcar com as custas processuais, sendo errônea a revogação da gratuidade da justiça como espécie de “punição” pela suposta litigância de má-fé, se ainda persiste a situação de hipossuficiência financeira.
Nesse sentido já decidiu o STJ: PROCESSUAL CIVIL.
NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL.
SÚMULA 284/STF.
LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ.
PARTE BENEFICIÁRIA DA GRATUIDADE DE JUSTIÇA.
REVOGAÇÃO DO BENEFÍCIO.
DESCABIMENTO. 1.
Ação ajuizada em 31/07/2019, do qual foi extraído o presente recurso especial interposto em 14/12/2021 e concluso ao gabinete em 25/03/2022. 2.
O propósito recursal consiste em dizer se a) houve negativa de prestação jurisdicional; b) deve ser afastada a aplicação de multa por litigância de má-fé e c) o reconhecimento de que a parte beneficiária da gratuidade de justiça agiu contrariamente à boa-fé implica a revogação do benefício. 3.
Não se pode conhecer do recurso especial quanto à alegada violação ao art. 1.022 do CPC, pois as alegações que o fundamentam são genéricas, sem discriminação específica e inteligível do que efetivamente se revelaria omisso, contraditório ou obscuro.
Incide, no caso, por analogia, a Súmula 284/STF. 4.
Na espécie, é inviável a análise acerca da caracterização da litigância de má-fé, em razão do óbice veiculado pela Súmula 7/STJ. 5.
As sanções aplicáveis ao litigante de má-fé são aquelas taxativamente previstas pelo legislador, não comportando interpretação extensiva.
Assim, apesar de reprovável, a conduta desleal, ímproba, de uma parte beneficiária da assistência judiciária gratuita não acarreta, por si só, a revogação do benefício, atraindo, tão somente, a incidência das penas expressamente cominadas no texto legal. 6.
A revogação do benefício - importante instrumento de concretização do acesso à justiça - pressupõe prova da inexistência ou do desaparecimento da incapacidade econômica, não estando atrelada à eventual conduta improba da parte no processo. 7.
Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, parcialmente provido. (STJ - REsp: 1989076 MT 2022/0058171-1, Data de Julgamento: 17/05/2022, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 19/05/2022) Grifou-se.
Sendo assim, deve ser restabelecido o benefício da gratuidade da justiça à parte autora/apelante.
III.
DECISÃO Diante do exposto, CONHEÇO e DOU PARCIAL PROVIMENTO à presente apelação, para reformar a sentença recorrida, a fim de: a) DECLARAR A NULIDADE DO CONTRATO objeto da lide; b) Condenar o banco apelado na RESTITUIÇÃO DO INDÉBITO EM DOBRO, quanto aos valores descontados do benefício previdenciário da parte autora, observada a prescrição das parcelas que antecedem a 05(cinco) anos do ajuizamento da ação.
Os valores acima deverão ser acrescidos de: b.1) Juros legais pela taxa Selic, deduzido o IPCA (art. 406 c/c art. 389, parágrafo único, do CC), contados a partir da citação (art. 405 do CC); b.2) Correção monetária pelo IPCA (art. 389, parágrafo único, do CC), contada da data do efetivo prejuízo, ou seja, da data de cada desconto indevidamente efetuado (Súmula 43 do STJ); c) Condenar o banco apelado a pagar INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS no valor de R$ 3.000,00 (três mil reais).
O montante da indenização será acrescido de: c.1) Juros legais pela taxa Selic, deduzido o IPCA (art. 406 c/c art. 389, parágrafo único, do CC), contados da data da citação (art. 405 do CC); c.2) Correção monetária pelo IPCA (art. 389, parágrafo único, do CC), contada a partir do arbitramento (Súmula 362 do STJ); d) Determinar, a título de compensação e para evitar enriquecimento sem causa, a devolução do valor transferido pelo banco réu à parte autora em decorrência do contrato declarado inválido, valor este a ser acrescido de atualização monetária pelo IPCA (art. 389, parágrafo único, do CC), a partir da data da transferência ou depósito; e) excluir a multa por litigância de má-fé atribuída à parte autora/recorrente e ao seu patrono, bem ainda para manter o benefício da justiça gratuita anteriormente deferido à parte autora.
Ademais, condeno o banco apelado a pagar as custas processuais, bem como honorários sucumbenciais, que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação.
Teresina-PI, data registrada no sistema.
Desembargador RICARDO GENTIL EULÁLIO DANTAS Relator -
24/10/2024 16:33
Remetidos os Autos (em grau de recurso) para à Instância Superior
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24/10/2024 16:33
Expedição de Certidão.
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24/10/2024 16:33
Juntada de Petição de Contra-razões
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23/10/2024 03:06
Decorrido prazo de BANCO PAN em 22/10/2024 23:59.
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15/10/2024 15:55
Juntada de Petição de petição
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30/09/2024 09:13
Expedição de Outros documentos.
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30/09/2024 09:10
Ato ordinatório praticado
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30/09/2024 09:10
Expedição de Certidão.
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06/09/2024 09:43
Juntada de Petição de petição
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29/08/2024 03:05
Decorrido prazo de BANCO PAN em 28/08/2024 23:59.
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06/08/2024 09:47
Expedição de Outros documentos.
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06/08/2024 09:47
Julgado improcedente o pedido
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12/04/2024 09:58
Conclusos para despacho
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12/04/2024 09:58
Expedição de Certidão.
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12/04/2024 09:57
Juntada de Petição de contestação
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27/02/2024 12:40
Juntada de Petição de petição
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27/02/2024 12:34
Juntada de Petição de petição
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24/02/2024 03:30
Decorrido prazo de BANCO PAN em 23/02/2024 23:59.
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21/02/2024 09:46
Juntada de Petição de contestação
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29/01/2024 23:32
Expedição de Outros documentos.
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29/01/2024 23:32
Proferido despacho de mero expediente
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04/12/2023 21:31
Conclusos para despacho
-
04/12/2023 21:31
Expedição de Certidão.
-
30/08/2023 13:45
Recebidos os autos
-
30/08/2023 13:45
Juntada de Petição de decisão
-
23/09/2022 12:31
Remetidos os Autos (em grau de recurso) para à Instância Superior
-
23/09/2022 12:31
Expedição de Certidão.
-
23/09/2022 12:30
Expedição de Certidão.
-
23/09/2022 12:30
Expedição de Certidão.
-
17/09/2022 10:59
Expedição de Outros documentos.
-
17/09/2022 10:58
Ato ordinatório praticado
-
24/08/2022 00:26
Decorrido prazo de BANCO PAN em 23/08/2022 23:59.
-
27/07/2022 11:48
Juntada de Petição de petição
-
22/07/2022 11:37
Expedição de Outros documentos.
-
22/07/2022 11:37
Declarada decadência ou prescrição
-
06/07/2022 17:46
Conclusos para julgamento
-
06/04/2022 13:27
Conclusos para despacho
-
06/04/2022 13:26
Juntada de Certidão
-
18/03/2022 10:05
Proferido despacho de mero expediente
-
21/02/2022 17:18
Conclusos para despacho
-
21/02/2022 17:17
Juntada de Certidão
-
21/02/2022 11:21
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
21/02/2022
Ultima Atualização
28/07/2025
Valor da Causa
R$ 0,00
Documentos
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