TJPI - 0807527-27.2022.8.18.0032
2ª instância - Câmara / Desembargador(a) Gabinete do Des. Agrimar Rodrigues de Araujo
Processos Relacionados - Outras Instâncias
Polo Passivo
Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
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08/07/2025 11:18
Arquivado Definitivamente
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08/07/2025 11:18
Baixa Definitiva
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08/07/2025 11:18
Remetidos os Autos (outros motivos) para a instância de origem
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08/07/2025 11:17
Transitado em Julgado em 08/07/2025
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08/07/2025 11:17
Expedição de Certidão.
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08/07/2025 03:03
Decorrido prazo de BANCO BRADESCO FINANCIAMENTOS S.A em 07/07/2025 23:59.
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13/06/2025 12:20
Juntada de Petição de ciência
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12/06/2025 00:00
Publicado Intimação em 12/06/2025.
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12/06/2025 00:00
Disponibilizado no DJ Eletrônico em 12/06/2025
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11/06/2025 00:00
Intimação
poder judiciário tribunal de justiça do estado do piauí GABINETE DO Desembargador AGRIMAR RODRIGUES DE ARAÚJO PROCESSO Nº: 0807527-27.2022.8.18.0032 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) ASSUNTO(S): [Abatimento proporcional do preço] APELANTE: EDILEUZA ANTONIA SOARES APELADO: BANCO BRADESCO FINANCIAMENTOS S.A DECISÃO TERMINATIVA DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR.
APELAÇÃO CÍVEL.
CONTRATO BANCÁRIO.
PESSOA ANALFABETA.
NULIDADE CONTRATUAL.
DESCONTOS INDEVIDOS EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO.
LITIGÂNCIA PREDATÓRIA.
SENTENÇA ANULADA.
JULGAMENTO DE MÉRITO PELA CAUSA MADURA.
CONTRATAÇÃO COM PESSOA NÃO ALFABETIZADA SEM RESPEITO AS FORMALIDADES LEGAIS.
ART. 595 DO CÓDIGO CIVIL.
AUSÊNCIA DE INSTRUMENTO PÚBLICO.
APLICAÇÃO DA SÚMULA 30 E 37 DO TJPI.
REPETIÇÃO DO INDÉBITO EM DOBRO.
DANOS MORAIS CONFIGURADOS.
RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.
I.
CASO EM EXAME 1.
Apelação Cível interposta por Edileuza Antonia Soares contra sentença que extinguiu, sem resolução de mérito, ação declaratória ajuizada em face do Banco Bradesco Financiamentos S.A., sob fundamento de inépcia da inicial por ausência de individualização dos fatos e suposta litigância predatória.
A autora, pessoa idosa e analfabeta, alega não ter contratado os serviços bancários que motivaram descontos em seu benefício previdenciário, e pleiteia a nulidade do contrato, repetição em dobro dos valores descontados e indenização por danos morais.
II.
QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2.
Há duas questões em discussão: (i) verificar a validade da extinção do processo sem resolução de mérito com fundamento em inépcia da petição inicial; (ii) examinar a existência de contrato válido firmado com pessoa analfabeta, bem como a responsabilidade da instituição financeira pelos descontos indevidos.
III.
RAZÕES DE DECIDIR 3.
A extinção do feito sem resolução de mérito carece de fundamentação concreta, baseando-se apenas em trechos genéricos da Recomendação CNJ nº 159/2024 e da Nota Técnica do TJPI, sem qualquer análise individualizada dos fatos, em afronta aos arts. 321 e 489, § 1º, do CPC. 4.
A jurisprudência do STJ (Tema Repetitivo nº 1.198) exige demonstração objetiva e fundamentada para caracterizar litigância predatória, o que não foi observado no caso concreto. 5.
A causa se encontra madura para julgamento do mérito pelo Tribunal, conforme art. 1.013, § 3º, I, do CPC. 6.
A autora, pessoa analfabeta, firmou contrato bancário sem as formalidades exigidas pelo art. 595 do Código Civil, inexistindo assinatura a rogo e assinatura de duas testemunhas, tornando nulo o contrato. 7.
Conforme as Súmulas nº 30 e 37 do TJPI e o entendimento do STJ (REsp 1954424/PE), a ausência das formalidades legais invalida o contrato e gera o dever de reparação. 8.
A repetição do indébito é devida em dobro, nos termos do art. 42, parágrafo único, do CDC, dada a cobrança indevida sem engano justificável e com base em negócio jurídico nulo. 9.
A responsabilidade civil por danos morais é objetiva e in re ipsa, resultando da falha na formalização contratual que comprometeu a renda da parte autora, justificando a indenização fixada em R$ 3.000,00. 10.
A atualização dos valores deve observar a sistemática introduzida pela Lei nº 14.905/2024, utilizando o IPCA como índice de correção monetária e a taxa Selic deduzida do IPCA como juros moratórios, aplicável desde o evento danoso.
IV.
DISPOSITIVO E TESE 11.
Recurso conhecido e provido monocraticamente.
Tese de julgamento: 1.
A extinção do processo por inépcia da inicial exige fundamentação concreta, com demonstração individualizada da existência de litigância predatória. 2.
Contrato bancário firmado com pessoa analfabeta é nulo se não atender às formalidades do art. 595 do Código Civil, mesmo na modalidade digital. 3.
A repetição do indébito é devida em dobro quando configurada cobrança indevida fundada em contrato nulo. 4.
A falha na formalização do contrato com consumidor hipossuficiente enseja indenização por danos morais. 5.
A atualização dos valores devidos deve seguir os parâmetros da Lei nº 14.905/2024, com correção pelo IPCA e juros pela taxa Selic deduzida do IPCA.
Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, incisos LIV e LV; CC, arts. 368, 389, p. único, 406, § 1º, 595 e 944; CPC, arts. 321, 485, I, 489, § 1º, 1.013, § 3º, I e 932, V, “a”; CDC, art. 42, parágrafo único.
Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp 1954424/PE, Rel.
Min.
Ricardo Villas Bôas Cueva, j. 07.12.2021, DJe 14.12.2021; STJ, REsp 2021665/MS (Tema 1.198); STJ, EAREsp 676.608/RS; STJ, AgRg no AREsp 576.225/SP, j. 13.03.2018; TJPI, Súmulas nº 30 e 37. 1.
RELATÓRIO Trata-se de APELAÇÃO CÍVEL interposta por EDILEUZA ANTONIA SOARES contra sentença proferida nos autos da AÇÃO DECLARATÓRIA proposta em face de BANCO BRADESCO FINANCIAMENTOS S.A., extinguiu o feito sem resolução do mérito, conforme cito: “(…) Diante do exposto, concluo que a inicial é inepta, uma vez que carece de individualização dos fatos e não atende às diligências exigidas para garantir a integridade e a autenticidade processual, em consonância com a recomendação 159/2024 do CNJ.
Por estas razões, JULGO EXTINTO o processo sem resolução de mérito, com fulcro no art. 485, inciso I, c/c art. 330, § 1º, incisos I e II do Código de Processo Civil, reconhecendo a inépcia da petição inicial. (...)” Em suas razões recursais, o Apelante aduz, em síntese, que: i) é pessoa idosa, analfabeta e hipossuficiente, não tendo condições técnicas ou econômicas de apresentar os extratos bancários exigidos pelo juízo a quo, sendo imprescindível a inversão do ônus da prova em seu favor; ii) a sentença violou o direito constitucional de acesso à justiça ao condicionar a continuidade da ação à juntada de documentos que a parte não tem como obter, especialmente em demandas dessa natureza envolvendo consumidores vulneráveis; iii) a relação jurídica é nula de pleno direito, pois inexistente assinatura válida da parte autora, analfabeta, no suposto contrato, em afronta às normas legais que exigem forma pública nesses casos; iv) o banco recorrido deve ser responsabilizado por conduta abusiva, pois firmou contrato com pessoa vulnerável sem os requisitos legais de validade e sem demonstrar a entrega do valor contratado.
Contrarrazões no ID de origem n° 70908474.
Em razão da recomendação contida no Ofício Circular n.º 174/2021, da Presidência deste Egrégio Tribunal de Justiça, não há necessidade de encaminhamento dos autos ao Ministério Público Superior, por não vislumbrar hipótese que justifique sua intervenção. É o que basta relatar.
Decido. 2.
CONHECIMENTO O presente recurso deve ser conhecido, tendo em vista o cumprimento de seus requisitos previstos no Código de Processo Civil.
Preparo dispensado em razão da gratuidade de justiça concedida em sentença.
Portanto, conheço do presente recurso. 3.
FUNDAMENTAÇÃO 3.1.
DO JULGAMENTO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO A controvérsia dos autos gira em torno da extinção prematura da ação, sob o argumento genérico de que a inicial apresentaria elementos padronizados e ausência de conteúdo individualizante, caracterizando suposta litigância predatória.
Contudo, razão assiste à parte apelante.
A sentença ora combatida, embora extensa, carece de fundamentação concreta quanto à existência de má-fé processual ou de elementos objetivos que caracterizem a demanda como predatória, restringindo-se a reproduzir trechos da Nota Técnica nº 06/2023 do Centro de Inteligência do TJPI, bem como excertos da Recomendação CNJ nº 159/2024, sem, no entanto, estabelecer qualquer correlação direta com o caso concreto.
Não se pode perder de vista que, nos termos do REsp nº 2021665/MS (Tema Repetitivo nº 1.198) do Superior Tribunal de Justiça, restou assentado que: “Constatados indícios de litigância abusiva, o juiz pode exigir, de modo fundamentado e com observância à razoabilidade do caso concreto, a emenda da petição inicial a fim de demonstrar o interesse de agir e a autenticidade da postulação, respeitadas as regras de distribuição do ônus da prova.” Dessa forma, a jurisprudência da Corte Cidadã firmou-se no sentido de que o reconhecimento de litigância predatória exige demonstração objetiva, concreta e individualizada, a partir de uma análise casuística das circunstâncias da demanda, não sendo suficiente a mera constatação de padrões genéricos, tampouco a simples invocação de notas técnicas ou diretrizes administrativas, como a Recomendação CNJ nº 159/2024.
No mesmo sentido, a Súmula nº 33 do TJPI estabelece que: “Em caso de fundada suspeita de demanda repetitiva ou predatória, é legítima a exigência dos documentos recomendados pelas Notas Técnicas do Centro de Inteligência da Justiça Estadual Piauiense, com base no artigo 321 do Código de Processo Civil.” Ora, a própria súmula condiciona tal exigência à existência de fundada suspeita, o que pressupõe elementos mínimos de convicção extraídos do caso concreto, circunstância que, data vênia, não se verifica na sentença recorrida.
O Juízo singular extinguiu o feito sem resolução do mérito, de forma prematura, e sem sequer oportunizar à parte autora a possibilidade de emendar a petição inicial, conforme impõe o art. 321 do Código de Processo Civil.
A decisão, ademais, carece de fundamentação concreta e específica, limitando-se a fazer menções genéricas à suposta padronização da peça inaugural e à existência de demandas semelhantes, sem, no entanto, realizar qualquer análise dos fatos particulares da lide, tampouco identificar elementos objetivos que evidenciassem desvio de finalidade ou uso abusivo da jurisdição.
Trata-se, portanto, de sentença genérica e desatenta às peculiaridades do caso concreto, proferida em violação aos princípios constitucionais do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal (Constituição da República, art. 5º, incisos LIV e LV,), bem como em afronta ao dever de motivação das decisões judiciais previsto no art. 489, § 1º, do Código de Processo Civil.
Acrescente-se que o simples fato de haver múltiplas ações com pedidos semelhantes não constitui, por si só, elemento caracterizador de litigância abusiva, devendo-se respeitar o direito de acesso à justiça, em especial quando se trata de hipossuficientes econômicos, como na hipótese dos autos — em que o autor, pessoa idosa, alegou descontos indevidos em benefício previdenciário, sem ter contratado os serviços bancários.
A supressão indevida da análise de mérito, com base em presunções genéricas e desatentas ao conteúdo fático da lide, configura vício insanável, impondo-se a anulação da sentença. 3.2.
DA CAUSA MADURA – ART. 1.013, §3º, I, DO CPC O código de processo civil, em seu art. 1.013, §3º, I, determina que, quando o processo estiver em condições de imediato julgamento, o tribunal deve decidir desde logo o mérito, conforme cito: Art. 1.013.
A apelação devolverá ao tribunal o conhecimento da matéria impugnada. § 3º Se o processo estiver em condições de imediato julgamento, o tribunal deve decidir desde logo o mérito quando: I - reformar sentença fundada no art. 485 ; De análise dos autos, percebo que já houve contestação e réplica, o processo está devidamente instruído.
Assim, considerando as características do processo, entendo que a demanda se encontra madura para julgamento, razão pela qual passo a analisar o mérito. 3.3.
MÉRITO – DA LEGALIDADE, OU NÃO, DO CONTRATO DE EMPRÉSTIMO Em suma, insurge-se a parte Apelante contra sentença que, ao julgar improcedentes os pedidos constantes na inicial, reconheceu a validade do contrato n° 813114841.
Em análise detida dos autos, percebe-se que a sentença deve ser reformada.
De antemão, verifico que o Requerente, ora Apelante, não é alfabetizado, visto que o seu documento de identidade, bem como os demais documentos acostados ao processo, não estão assinados.
Acerca do tema, o STJ pacificou o entendimento de que o contrato de empréstimo consignado firmado por pessoa analfabeta deve observar as formalidades do artigo 595 do Código Civil, que prevê a assinatura do instrumento a rogo por terceiro e, também, por duas testemunhas (STJ – REsp: 1954424 PE 2021/0120873-7, Relator: Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, Data de Julgamento: 07/12/2021, T3 – TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 14/12/2021).
No mesmo sentido foram editadas as súmulas 30 e 37 deste Tribunal, impondo a nulidade contratual e o dever indenizatório pelo descumprimento dos requisitos do art. 595 do Código Civil, conforme cito: SÚMULA 30 - A ausência de assinatura a rogo e subscrição por duas testemunhas nos instrumento de contrato de mútuo bancário atribuídos a pessoa analfabeta torna o negócio jurídico nulo, mesmo que seja comprovada a disponibilização do valor em conta de sua titularidade, configurando ato ilícito, gerando o dever de repará-lo, cabendo ao magistrado ou magistrada, no caso concreto, e de forma fundamentada, reconhecer categorias reparatórias devidas e fixar o respectivo quantum, sem prejuízo de eventual compensação.
SÚMULA 37 - Os contratos firmados com pessoas não alfabetizadas, inclusive os firmados na modalidade nato digital, devem cumprir os requisitos estabelecidos pelo artigo 595, do Código Civil.
Em análise da jurisprudência, percebe-se três requisitos fundamentais para a validade do contrato de empréstimo com pessoa não alfabetizada, inclusive na modalidade cartão de crédito consignado, quando realizado sem procuração pública: i) oposição de digital da pessoa contratante; ii) que uma terceira pessoa assine com o nome do mutuário a seu mando (assinatura a rogo); e iii) que duas testemunhas atestem também a contratação assinando o documento.
No caso em comento, verifica-se que o Banco Réu fez juntada do contrato impugnado (ID de origem n° 44903503), todavia, apesar de constar assinatura duas testemunhas, é ausente a assinatura do rogado, o que não é suficiente para validar a contratação.
Assim, o Banco réu sequer fez prova da celebração do contrato válido, como se demonstra pelo não atendimento das formalidades exigidas para a espécie, pelo que a mera prova do depósito do valor do mútuo na conta corrente da parte Autora (ID de origem n° 53919470) não é suficiente para se concluir pela contratação e aceitação dos termos postos pela instituição financeira, como entendeu o juízo a quo.
Desse modo, reformo a sentença para reconhecer a inexistência do contrato objeto da presente demanda, o que gera o dever do Banco Apelante devolver o valor descontado indevidamente do benefício previdenciário da parte Autora, ora Apelante. 3.4. o direito da parte Autora à repetição do indébito No que toca ao pedido de restituição do indébito em dobro, com fulcro no art. 42 do CDC, é cabível se ficar demonstrada a má-fé do credor.
Nessa linha, são os seguintes precedentes da Corte Especial: STJ, AgRg no AREsp 576.225/SP, Rel.
Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA, julgado em 13/03/2018, DJe 22/03/2018; STJ, AgRg no AREsp 713.764/PB, Rel.
Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, QUARTA TURMA, julgado em 15/03/2018, DJe 23/03/2018.
Na espécie, a má-fé da instituição financeira é evidente, na medida em que autorizou os descontos no benefício da parte Autora, sem que tenha formalizado corretamente o contrato.
Destarte, é devida a restituição em dobro dos valores descontados, a teor do disposto no parágrafo único do art. 42, do CDC.
Frisa-se que a restituição do indébito é consequência lógica da relação jurídica aqui discutida, considerando que o contrato é nulo em decorrência da ausência de formalização válida, nos termos do art. 595 do Código Civil. e restou comprovada a realização indevida de descontos.
Esclareço ainda que de acordo com o CDC, a “penalidade” da restituição do indébito na forma dobrada depende de alguns requisitos: i) consumidor cobrado em quantia indevida; ii) consumidor ter efetivamente pago; iii) não ocorrência de engano justificável por parte do cobrador.
Nesse sentido, o STJ, até a data do julgamento dos EAREsp nº 676.608/RS, divergia sobre a necessidade, ou não, de configuração da má-fé para restituição do indébito em dobro, pacificando, a partir daí, seu entendimento, para determinar que não se exige a demonstração de má-fé, ou seja, da intenção do fornecedor de cobrar um valor indevido.
Não é necessário, atualmente, se perquirir qualquer elemento volitivo por parte do fornecedor.
Desse modo, a partir de 30.03.2021, havendo cobrança indevida contrária à boa-fé objetiva, efetivamente paga pelo consumidor, é cabível a restituição em dobro do indébito, independentemente da configuração da má-fé.
Isso significa dizer que as decisões judiciais anteriores serão mantidas em atenção ao princípio da segurança jurídica, considerassem a necessidade do elemento volitivo ou não.
Nesse sentido, esta Relatoria entende que reconhecida a inexistência do contrato, ante a contratação com pessoa não alfabetizada sem seguir os requisitos do art. 595 do Código Civil, resta presente a má-fé da instituição financeira na cobrança de valores pelo negócio jurídico nulo.
Se basta a violação à boa-fé objetiva, com muito mais razão basta a caracterização da má-fé.
Nota-se que a supracitada súmula 30 prevê ainda o dever indenizatório, devendo incidir a repetição do indébito e danos morais nos termos do CDC.
Com efeito, é medida de justiça a devolução do indébito em dobro, razão pela qual condeno o Banco réu a repetição do indébito dos valores indevidamente descontados pelo negócio discutido, nos termos do art. 42 do CDC.
Em contrapartida, ante o repasse do valor do empréstimo de R$ 1.225,62 através de transferência bancária comprovada por documento válido (ID de origem n° 53919470), deve ser este valor compensado, nos termos do art. 368 do CC, antes da incidência dos encargos moratórios e do cálculo da repetição do indébito em dobro, sob pena de enriquecimento ilícito, já que não há nos autos comprovação de prévia devolução do crédito, a fim de que se retorne ao status quo ante.
Ademais, não há que se falar em devolução de qualquer outro valor, tendo em vista que o contrato não respeitou as formalidades do art. 595 do Código Civil. 3.5.
DOS DANOS MORAIS No que se refere aos danos morais, a responsabilidade do banco é in re ipsa, advinda da responsabilidade objetiva da instituição financeira que não diligenciou no sentido de efetuar o depósito diretamente na conta de titularidade da parte Autora, sem a contratação válida.
A responsabilidade civil do banco, no presente caso, decorre da teoria objetiva, sendo classificada como in re ipsa, pois resulta diretamente da falha na prestação do serviço — a instituição financeira não promoveu a contratação respeitando as formalidades legais.
Ressalta-se que a indenização por danos morais deve obedecer aos princípios do caráter compensatório, voltado à vítima, e punitivo-pedagógico, dirigido ao ofensor.
A quantificação do valor da indenização por danos morais deve observar as peculiaridades do caso concreto, de modo a evitar tanto o enriquecimento indevido da parte quanto a fixação de quantias irrisórias que esvaziem o caráter reparatório da medida.
Conforme o art. 944 do Código Civil, a indenização será medida pela extensão do dano, o que exige ponderação sobre a gravidade da lesão, o bem jurídico atingido e a duração dos efeitos do dano.
No presente feito, o prejuízo material e imaterial sofrido pela Autora foi acentuado, pois sua renda previdenciária foi indevidamente reduzida, comprometendo sua subsistência.
Por fim, embora este relator entendesse anteriormente pela fixação do quantum indenizatório em R$ 5.000,00, a 3ª Câmara Especializada Cível, por meio de sucessivos precedentes (AC nº 0800447-95.2021.8.18.0048; 0801034-54.2021.8.18.0069; 0800735-12.2023.8.18.0068; 0801361-90.2021.8.18.0071; 0800611-93.2022.8.18.0058; 0805747-31.2022.8.18.0039), firmou entendimento pela quantia de R$ 3.000,00 em casos análogos.
Assim, com base no art. 926 do CPC e na Súmula 568 do STJ, que autorizam decisão monocrática quando houver jurisprudência consolidada, e em respeito ao princípio da colegialidade, a indenização por danos morais é arbitrada no patamar de R$ 3.000,00, conforme alinhado ao entendimento dominante no colegiado. 3.6.
DOS JUROS E DA CORREÇÃO MONETÁRIA Recentemente, a Lei nº 14.905/24 alterou alguns artigos do Código Civil, especialmente aqueles que disciplinam a correção monetária e os juros moratórios incidentes nas relações cíveis, padronizando a utilização de índices específicos.
Anteriormente, antes da entrada em vigor da Lei n° 14.905/2024, quanto aos encargos moratórios dos danos morais, esta Relatoria fixava os juros de mora em 1% ao mês, desde o evento danoso até o arbitramento por esta Corte, e a partir deste momento, aplicado apenas a taxa SELIC - que abrangia juros e correção monetária, nos termos da súmula 54 do STJ.
Não obstante, com a alteração legal da Lei n° 14.905/2024, que entrou em vigor em 30/08/2024, a atualização dos débitos judiciais, na ausência de convenção ou de lei especial em sentido contrário, passa a se dar pelos índices legais de correção monetária e/ou de juros de mora previstos nos arts. 389, p. único, e 406, § 1º, ambos do CC, sendo estes: IPCA para correção monetária e Taxa Selic - deduzido o IPCA - para os juros moratórios.
Com a alteração legislativa, essa sistemática deve ser revista para se adequar ao novo regime legal.
Dessa forma, a atualização da indenização por danos morais deve observar, a partir do arbitramento, a correção monetária pelo IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo), conforme divulgado pelo IBGE, e os juros moratórios, a contar do evento danoso, com base na taxa Selic deduzida do índice de correção monetária (IPCA), nos termos do art. 389, parágrafo único, e do art. 406, § 1º, ambos do Código Civil, conforme redação dada pela Lei nº 14.905/2024.
O mesmo critério deve ser observado para os danos materiais, com termo inicial dos juros e correção na data do ato ilícito, ou seja, da ocorrência de cada desconto indevido. 3.7.
DO JULGAMENTO MONOCRÁTICO DO MÉRITO Conforme exposto nos fundamentos acima, o julgamento da presente demanda está pautado nas súmulas 30 e 37 deste tribunal de justiça, e súmula 297 do STJ.
Assim, consigno que o art. 932, V, “a”, do CPC/2015 autoriza ao relator a dar provimento ao recurso se a decisão recorrida for contrária à súmula deste Tribunal de Justiça, como se lê: Art. 932.
Incumbe ao relator: V - depois de facultada a apresentação de contrarrazões, dar provimento ao recurso se a decisão recorrida for contrária a: a) súmula do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça ou do próprio tribunal; Ressalto ainda que a súmula 297 do STJ determinada a aplicação do CDC às demandas bancárias, corroborando com a tese aqui adotada de que a repetição do indébito e danos morais são consequência lógicas da realização de descontos nos proventos do consumidor baseadas em contratos nulos.
Diante do exposto, dou provimento ao Recurso do Autor, com base nas súmulas 30 e 37 do TJPI e 568 e 297 do STJ. 4.
DECISÃO Forte nessas razões, conheço da presente Apelação Cível e monocraticamente dou-lhe provimento, para declarar a nulidade da sentença que julgou pela inépcia da inicial sem oportunizar a manifestação das partes e, aplicando a causa madura, julgo parcialmente procedentes os pleitos autorais para: i) decretar a nulidade do contrato questionado na presente, eis que celebrado por analfabeto, sem respeito aos requisitos do art. 595 do Código Civil, ou, ainda, por meio de procurador constituído através de instrumento público; ii) condenar o Banco Réu à devolução em dobro dos valores indevidamente descontados do benefício da parte Autora, ora Apelada, respeitando a prescrição quinquenal, após compensação do valor efetivamente depositado em sua conta bancária; iii) que a compensação dos valores pagos à parte Autora (R$ 1.225,62), nos termos do art. 368 do CC, antes da incidência dos encargos moratórios e do cálculo da repetição do indébito em dobro, sob pena de enriquecimento ilícito, já que não há nos autos comprovação de prévia devolução do crédito, a fim de que se retorne ao status quo ante; iv) condenar o Banco Apelado, ao pagamento de R$ 3.000,00 (três mil reais) a título de danos morais; v) no tocante aos danos morais, necessário que o pagamento da indenização seja acrescido de correção monetária pelo IPCA, desde o arbitramento, mais juros de mora pela taxa legal que corresponde à taxa Selic com dedução do índice de atualização monetária (IPCA), a contar da data do evento danoso, de acordo com as Súmulas 54 e 362 do Superior Tribunal de Justiça, desconsiderando-se eventuais juros negativos (artigo 389, parágrafo único combinado com o artigo 406 e seus parágrafos, ambos do Código Civil).
Para os danos materiais, os mesmos critérios para correção monetária e juros moratórios, a contar do ato ilício, ou seja, data de cada desconto.
Condeno o Banco Réu ao pagamento de honorários advocatícios, em favor do causídico da parte Autora, ora Apelante, no percentual de 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação.
Publique-se.
Intime-se.
Cumpra-se.
Transcorrido o prazo sem interposição de recurso, arquivem-se os autos e dê-se baixa na distribuição.
Teresina, data e hora no sistema.
Desembargador AGRIMAR RODRIGUES DE ARAÚJO RELATOR -
10/06/2025 08:35
Expedição de Outros documentos.
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03/06/2025 18:37
Conhecido o recurso de EDILEUZA ANTONIA SOARES - CPF: *13.***.*08-20 (APELANTE) e provido
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21/05/2025 10:01
Conclusos para julgamento
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20/05/2025 01:07
Decorrido prazo de EDILEUZA ANTONIA SOARES em 19/05/2025 23:59.
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20/05/2025 01:02
Decorrido prazo de BANCO BRADESCO FINANCIAMENTOS S.A em 19/05/2025 23:59.
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26/04/2025 00:47
Publicado Intimação em 24/04/2025.
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26/04/2025 00:47
Disponibilizado no DJ Eletrônico em 26/04/2025
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26/04/2025 00:32
Publicado Intimação em 24/04/2025.
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26/04/2025 00:32
Disponibilizado no DJ Eletrônico em 26/04/2025
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23/04/2025 00:00
Intimação
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PIAUÍ GABINETE DO DESEMBARGADOR AGRIMAR RODRIGUES DE ARAÚJO Processo nº 0807527-27.2022.8.18.0032 APELAÇÃO CÍVEL (198) Assunto: [Abatimento proporcional do preço] APELANTE: EDILEUZA ANTONIA SOARES APELADO: BANCO BRADESCO FINANCIAMENTOS S.A DECISÃO MONOCRÁTICA APELAÇÃO CÍVEL.
REGULARIDADE FORMAL.
AUSENTES AS HIPÓTESES DO ART. 1.012, §1°, DO CPC/15.
RECEBIMENTO DA APELAÇÃO NOS EFEITOS DEVOLUTIVO E SUSPENSIVO.
Atendidos os pressupostos de admissibilidade recursal e ausentes as hipóteses do art. 1.012, §1°, do CPC, recebo a Apelação em ambos os efeitos legais.
Em razão da recomendação contida no Ofício Circular n.º 174/2021, da Presidência deste Egrégio Tribunal de Justiça, deixo de encaminhar os autos ao Ministério Público Superior, por não vislumbrar hipótese que justifique sua intervenção.
Intime-se.
Após, voltem-me conclusos os autos.
Teresina-PI, data e assinatura no sistema.
Desembargador Agrimar Rodrigues de Araújo Relator -
22/04/2025 15:12
Expedição de Outros documentos.
-
22/04/2025 15:12
Expedição de Outros documentos.
-
28/03/2025 09:48
Recebido o recurso Com efeito suspensivo
-
16/02/2025 23:00
Juntada de Certidão de distribuição anterior
-
16/02/2025 09:50
Recebidos os autos
-
16/02/2025 09:50
Conclusos para Conferência Inicial
-
16/02/2025 09:50
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
16/02/2025
Ultima Atualização
03/06/2025
Valor da Causa
R$ 0,00
Documentos
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