TJPI - 0808069-63.2022.8.18.0026
2ª instância - Câmara / Desembargador(a) Gabinete do Des. Agrimar Rodrigues de Araujo
Processos Relacionados - Outras Instâncias
Polo Ativo
Polo Passivo
Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
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28/07/2025 09:14
Arquivado Definitivamente
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28/07/2025 09:14
Baixa Definitiva
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28/07/2025 09:14
Remetidos os Autos (por julgamento definitivo do recurso) para a instância de origem
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28/07/2025 09:13
Transitado em Julgado em 25/06/2024
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28/07/2025 09:13
Expedição de Certidão.
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27/07/2025 04:25
Decorrido prazo de BANCO BRADESCO S.A. em 24/07/2025 23:59.
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27/07/2025 04:25
Decorrido prazo de FRANCISCA PAULA MORAES SOUSA em 24/07/2025 23:59.
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03/07/2025 00:05
Publicado Intimação em 03/07/2025.
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03/07/2025 00:05
Disponibilizado no DJ Eletrônico em 03/07/2025
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03/07/2025 00:05
Publicado Intimação em 03/07/2025.
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03/07/2025 00:05
Disponibilizado no DJ Eletrônico em 03/07/2025
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02/07/2025 00:00
Intimação
poder judiciário tribunal de justiça do estado do piauí GABINETE DO Desembargador AGRIMAR RODRIGUES DE ARAÚJO PROCESSO Nº: 0808069-63.2022.8.18.0026 CLASSE: APELAÇÃO CÍVEL (198) ASSUNTO(S): [Inclusão Indevida em Cadastro de Inadimplentes, Indenização por Dano Material, Empréstimo consignado] APELANTE: FRANCISCA PAULA MORAES SOUSA APELADO: BANCO BRADESCO S.A.
REPRESENTANTE: BANCO BRADESCO FINANCIAMENTOS S.A DECISÃO TERMINATIVA DIREITO CIVIL E DO CONSUMIDOR.
APELAÇÃO CÍVEL.
CONTRATO DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO.
PESSOA IDOSA E ANALFABETA.
INOBSERVÂNCIA DAS FORMALIDADES DO ART. 595 DO CÓDIGO CIVIL.
AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DO REPASSE DOS VALORES.
NULIDADE DO CONTRATO.
RESTITUIÇÃO DO INDÉBITO EM DOBRO.
DANOS MORAIS CONFIGURADOS.
SÚMULAS 18,26, 30 E 37 DO TJPI.
RECURSO CONHECIDO E PROVIDO MONOCRATICAMENTE.
I.
CASO EM EXAME 1.
Apelação Cível interposta por FRANCISCA PAULA MORAES SOARES contra sentença proferida nos autos da AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO CONTRATUAL C/C PEDIDO DE REPETIÇÃO DO INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS movida em desfavor do BANCO BRADESCO S.A., que julgou improcedentes os pedidos iniciais, reconhecendo a validade do contrato e condenando a autora ao pagamento de custas, honorários e multa por litigância de má-fé.
II.
QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2.
Há três questões em discussão: (i) definir se o contrato de empréstimo consignado firmado com pessoa analfabeta é válido, ante a ausência das formalidades legais do art. 595 do CC; (ii) estabelecer se é devida a restituição em dobro dos valores descontados indevidamente; (iii) determinar se estão configurados os danos morais passíveis de indenização.
III.
RAZÕES DE DECIDIR 3.
O contrato de empréstimo consignado firmado com pessoa analfabeta deve observar, obrigatoriamente, as formalidades do art. 595 do Código Civil, com assinatura a rogo e presença de duas testemunhas, sob pena de nulidade do negócio jurídico. 4.
A ausência da assinatura a rogo, ainda que presentes testemunhas e a impressão digital da autora, compromete a validade do contrato, não suprindo a exigência legal prevista para contratos com pessoa não alfabetizada. 5.
A instituição financeira não comprovou o repasse dos valores contratados. 6.
A inexistência de contrato válido e a ausência de prova do repasse dos valores configuram má-fé do fornecedor, justificando a restituição em dobro dos valores indevidamente descontados do benefício previdenciário da autora, nos termos do art. 42, parágrafo único, do CDC. 7.
A redução do benefício previdenciário de pessoa idosa e hipossuficiente, em decorrência de descontos indevidos, caracteriza dano moral indenizável, sendo fixado o valor de R$ 3.000,00 conforme jurisprudência consolidada da Câmara Julgadora. 8.
A correção monetária incide pelo IPCA a partir do arbitramento e os juros moratórios aplicam-se pela taxa Selic deduzido o IPCA, desde o evento danoso, em conformidade com a Lei n.º 14.905/2024 e os arts. 389, parágrafo único, e 406 do Código Civil. 9.
A condenação por litigância de má-fé deve ser afastada, uma vez que a parte autora exerceu legitimamente o direito de ação em face de dúvida fundada sobre a existência da relação jurídica. 10.
Em razão da reforma da sentença, inverte-se o ônus sucumbencial e condena-se o Banco Apelado ao pagamento de honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor da condenação.
IV.
DISPOSITIVO E TESE 11.
Recurso conhecido e provido monocraticamente.
Tese de julgamento: 1.
A ausência de assinatura a rogo em contrato firmado por pessoa analfabeta torna o negócio jurídico nulo, ainda que haja assinatura de testemunhas e impressão digital. 2.
A instituição financeira que não comprova a formalização válida do contrato e o repasse dos valores contratados age em má-fé, sendo devida a repetição do indébito em dobro. 3.
A realização de descontos indevidos em benefício previdenciário de pessoa idosa e hipossuficiente enseja indenização por danos morais, em valor proporcional ao abalo sofrido.
Dispositivos relevantes citados: CC, arts. 595, 389, parágrafo único, e 406, § 1º; CDC, arts. 42, parágrafo único, e 27; CPC, art. 487, I; Lei n.º 14.905/2024; Resolução BACEN n.º 256/2022.
Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp 1954424/PE, Rel.
Min.
Ricardo Villas Bôas Cueva, T3, j. 07.12.2021, DJe 14.12.2021; STJ, AgRg no AREsp 713.764/PB, Rel.
Min.
Antonio Carlos Ferreira, T4, j. 15.03.2018, DJe 23.03.2018; STJ, EDcl no AgRg 1.363.193/RS, Rel.
Min.
Gurgel de Faria, T1, j. 08.10.2019, DJe 23.10.2019; STJ, Súmulas 54, 362 e 568.
Trata-se de Apelação Cível interposta por FRANCISCA PAULA MORAES SOUSA, em face de sentença, nos autos da AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO CONTRATUAL C/C PEDIDO DE REPETIÇÃO DO INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS, movida em desfavor de BANCO BRADESCO S.A., que julgou improcedentes os pedidos formulados na inicial, nos termos do art. 487, I, do CPC, nos seguintes termos: “Assim, forte nas razões expostas, JULGO IMPROCEDENTE O PEDIDO AUTORAL, resolvendo assim o mérito do processo, com supedâneo no artigo 487, I do Código de Processo Civil.
Por todas as razões antes expostas, condeno a parte autora, por litigância de má-fé ao pagamento de multa de 2% (dois por cento) sobre o valor da causa, bem como condeno, mais, a parte autora ao pagamento de indenização para a parte demandada, do valor correspondente a 01 (um) salário-mínimo.
Confirmo o pedido de justiça gratuita, razão pela qual fica suspensa a cobrança das custas processuais, nos termos do art. 12 da Lei n. 1.060/50, c/c §3º do art. 93 do CPC.” apelação cível: inconformada, a parte Autora, Ora Apelante, argumenta em suas razões que: i) o contrato foi regularmente firmado, havendo prova de aceitação eletrônica com geolocalização e IP ii) a sentença desconsiderou elementos de prova que demonstram a legalidade da contratação iii) a condenação por danos morais é indevida, por ausência de comprovação de conduta ilícita por parte do banco iv) na eventual manutenção da condenação, requer a redução do valor da indenização por danos morais v) não há má-fé do banco, devendo a devolução dos valores ser simples, e não em dobro, conforme jurisprudência do STJ.
Com base nisso, requereu o provimento do recurso, com a procedência dos pleitos autorais.
CONTRARRAZÕES: o Banco demandado, ora Apelado, apresentou contrarrazões (ID de origem n° 75569648), requerendo a manutenção da sentença guerreada.
Em razão da recomendação contida no Ofício Circular n.º 174/2021, da Presidência deste Egrégio Tribunal de Justiça, não houve necessidade de encaminhar os autos ao Ministério Público Superior, por não vislumbrar hipótese que justifique sua intervenção. É o relatório.
Passo ao julgamento do mérito, nos termos do art. 932 do CPC. 1.
CONHECIMENTO DA APELAÇÃO CÍVEL Ao analisar os pressupostos objetivos, verifica-se que o recurso é cabível, adequado e tempestivo.
Além disso, não se verifica a existência de algum fato impeditivo de recurso, e não ocorreu nenhuma das hipóteses de extinção anômala da via recursal (deserção, desistência e renúncia).
Quanto ao preparo, a parte autora, ora Apelante, é beneficiária da gratuidade recursal ante o deferimento da justiça gratuita na sentença apelada.
Em que pese a impugnação do Apelado de que a parte autora não demonstrou seus recebimentos e é acompanhada por advogado particular e, diante disso, não seria cabível a manutenção do benefício da justiça gratuita, os documentos colacionados aos autos demonstram que a parte autora faz jus a justiça gratuita.
Ora, no caso vertente, verifico que a parte apelante demonstrou junto a exordial ter como renda apenas 1 (um) salário mínimo, proveniente de sua pensão por morte previdenciária, razão pela qual entendo demonstrada a sua hipossuficiência econômico-financeira a justificar a manutenção do deferimento do benefício.
Além disso, o fato da parte autora se encontrar assistida por advogado é irrelevante, pois, nos termos do art. 99, §3º, do CPC, “a assistência do requerente por advogado particular não impede a concessão de gratuidade da justiça”.
Assim, mantenho o benefício da justiça gratuita à parte autora Apelante.
Noutro passo, não há como negar o atendimento dos pressupostos subjetivos da Apelação, pois o Apelante é parte legítima e o interesse, decorrente da sucumbência, é indubitável.
Destarte, a demandada apelada suscita, em contrarrazões, preliminar de não conhecimento do recurso interposto, sob o argumento de ter reproduzido os argumentos da exordial, o que inviabiliza o exercício do princípio do contraditório e da ampla defesa.
O art. 932, inc.
III, do Código de Processo Civil, determina o não conhecimento do recurso que não impugna especificamente os fundamentos da decisão recorrida.
O princípio da dialeticidade impõe que o apelante apresente os fundamentos de fato e de direito pelos quais busca a reforma da decisão recorrida.
O recurso deve conter as razões que amparam o inconformismo da parte recorrente e possibilitam a necessidade de reforma da decisão.
Quando, em sede recursal, verificar-se que os fundamentos da parte Recorrente são essenciais e suficientes para proporcionar a análise do pedido de reforma da decisão, não há falar em inépcia recursal ou violação ao Princípio da Dialeticidade, sendo este o entendimento da jurisprudência pátria, in verbis: APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE COBRANÇA – VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE – INÉPCIA DA INICIAL – PRELIMINARES REJEITADAS – PRESCRIÇÃO NÃO CONSTATADA – APÓLICES VENCIDAS E NÃO PAGAS – PROCEDÊNCIA MANTIDA.
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE COBRANÇA – VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE – INÉPCIA DA INICIAL – PRELIMINARES REJEITADAS – PRESCRIÇÃO NÃO CONSTATADA – APÓLICES VENCIDAS E NÃO PAGAS – PROCEDÊNCIA MANTIDA EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE COBRANÇA – VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE – INÉPCIA DA INICIAL – PRELIMINARES REJEITADAS – PRESCRIÇÃO NÃO CONSTATADA – APÓLICES VENCIDAS E NÃO PAGAS – PROCEDÊNCIA MANTIDA.
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL – AÇÃO DE COBRANÇA – VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE – INÉPCIA DA INICIAL – PRELIMINARES REJEITADAS – PRESCRIÇÃO NÃO CONSTATADA – APÓLICES VENCIDAS E NÃO PAGAS – PROCEDÊNCIA MANTIDA – Se o recurso dirigido ao segundo grau de jurisdição foi interposto com os fundamentos necessários e suficientes para proporcionar a análise do pedido de reforma da decisão, não há falar em inépcia recursal ou violação ao princípio da dialeticidade – Estando a exordial devidamente fundamentada, sendo claros e inteligíveis o pedido e a causa de pedir, não há que se falar em inépcia da inicial. (TJ-MG – AC: 10000204905103001 MG, Relator: Valdez Leite Machado, Data de Julgamento: 19/11/2020, Câmaras Cíveis / 14ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 19/11/2020) Os fundamentos, por razões lógicas, se referem ao teor da decisão atacada.
A linha de confronto entre o posicionamento jurídico buscado e o adotado pela decisão recorrida deve ser demonstrada.
No caso, as razões recursais apresentaram todos os pontos de seu inconformismo com o julgado, extensão da matéria devolvida pode ser extraída, com clareza, dos fundamentos jurídicos deduzidos na apelação, o que possibilitou, inclusive, a manifestação da parte apelada em contrarrazões, em respeito ao contraditório e a ampla defesa.
A negativa de conhecimento do recurso por ausência de fundamentação específica se dá somente quando as razões de apelo se mostram completamente dissociadas da matéria tratada na sentença, não sendo esse o caso.
Deste modo, conheço do presente recurso. 2.
DO MÉRITO 2.1.
DA LEGALIDADE, OU NÃO, DO CONTRATO DE EMPRÉSTIMO Em suma, insurge-se a parte Apelante contra sentença que, ao julgar improcedentes os pedidos constantes na inicial, reconheceu a validade do contrato firmado entre as partes.
Em análise detida dos autos, percebe-se que a sentença deve ser reformada.
De antemão, verifico que o Requerente, ora Apelante, não é alfabetizado, visto que o seu documento de identidade, bem como os demais documentos acostados ao processo, não estão assinados.
Acerca do tema, o STJ recentemente pacificou o entendimento de que o contrato de empréstimo consignado firmado por pessoa analfabeta deve observar as formalidades do artigo 595 do Código Civil, que prevê a assinatura do instrumento a rogo por terceiro e, também, por duas testemunhas (STJ – REsp: 1954424 PE 2021/0120873-7, Relator: Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, Data de Julgamento: 07/12/2021, T3 – TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 14/12/2021).
Em análise da jurisprudência, percebe-se três requisitos fundamentais para a validade do contrato de empréstimo com pessoa não alfabetizada, inclusive na modalidade cartão de crédito consignado, quando realizado sem procuração pública: i) oposição de digital da pessoa contratante; ii) que uma terceira pessoa assine com o nome do mutuário a seu mando (assinatura a rogo); e iii) que duas testemunhas atestem também a contratação assinando o documento.
No mesmo sentido foram editadas as súmulas 30 e 37 deste Tribunal, impondo a nulidade contratual e o dever indenizatório pelo descumprimento dos requisitos do art. 595 do CC., conforme cito: SÚMULA 30 - A ausência de assinatura a rogo e subscrição por duas testemunhas nos instrumento de contrato de mútuo bancário atribuídos a pessoa analfabeta torna o negócio jurídico nulo, mesmo que seja comprovada a disponibilização do valor em conta de sua titularidade, configurando ato ilícito, gerando o dever de repará-lo, cabendo ao magistrado ou magistrada, no caso concreto, e de forma fundamentada, reconhecer categorias reparatórias devidas e fixar o respectivo quantum, sem prejuízo de eventual compensação.
SÚMULA 37 - Os contratos firmados com pessoas não alfabetizadas, inclusive os firmados na modalidade nato digital, devem cumprir os requisitos estabelecidos pelo artigo 595, do Código Civil.
Nota-se que a súmula 30 prevê ainda o dever indenizatório, devendo incidir a repetição do indébito e danos morais nos termos do CDC.
No caso em comento, verifica-se que o Banco fez juntada do contrato de empréstimo questionado (ID de origem n° 63670565), no entanto, apesar da assinatura de duas testemunhas e oposição da digital, restou ausente a assinatura a rogo.
Assim, a contratação não respeitou as formalidades do 595 do Código Civil ou foi realizada por procurador munido de procuração pública, não demonstrando, assim, a formalização legal do negócio jurídico, impondo-se a nulidade contratual.
Assim, o Banco Apelado sequer fez prova da celebração do contrato válido, como se demonstra pelo não atendimento das formalidades exigidas para a espécie.
Noutro passo, o Apelado não demonstrou o efetivo pagamento em favor da parte autora, não apresentando nenhum documento válido que confirme o repasse dos valores contratados durante a instrução do feito.
No que tange ao suposto comprovante de valores juntado aos autos (ID de origem 75569652), cumpre ressaltar que é documento juntado em grau recursal, sendo inadmissível sua análise, por preclusão temporal, ante a ausência de juntada de documentos durante a instrução do feito.
A regra prevista no art. 434 do CPC, segundo a qual incumbe à parte instruir a inicial ou a contestação com os documentos que forem necessários para provar o direito alegado, somente pode ser excepcionada se, após o ajuizamento da ação, surgirem documentos novos, ou seja, decorrentes de fatos supervenientes ou que somente tenham sido conhecidos pela parte em momento posterior, nos termos do art. 435 do CPC, o que não se aplica na espécie.
Precedentes STJ. (STJ - AgInt no AREsp: 1302878 RS 2018/0131403-4, Relator: Ministro RAUL ARAÚJO, Data de Julgamento: 17/09/2019, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 03/10/2019).
Portanto, havendo indício de ausência de consentimento do consumidor e inexistindo a prova do pagamento, deve ser declarada a inexistência do negócio jurídico, o que, por consequência, gera para o banco o dever de devolver o valor descontado indevidamente do benefício previdenciário da parte Autora/Apelante. 2.2. o direito da parte Autora à repetição do indébito Quanto ao pedido de restituição do indébito em dobro, com fulcro no art. 42 do CDC, em razão da fraude, a Corte Superior de Justiça consolidou entendimento de que para que haja a condenação em repetição do indébito, faz-se necessária a demonstração da má-fé.
Na hipótese dos autos, tem-se por intencional a conduta do banco em autorizar empréstimo sem a existência de contrato válido, configurando, sem dúvida, sua má-fé.
Assim, impõe-se a restituição em dobro dos valores descontados indevidamente, nos termos do parágrafo único do art. 42, do CDC.
Desse modo, caracterizada a má-fé na conduta da instituição financeira em autorizar descontos no benefício do consumidor sem seu real consentimento, e ante a inexistência do contrato de empréstimo entre as partes, devido a condenação do Banco Réu, ora Apelado, na devolução em dobro das parcelas descontadas indevidamente.
Frisa-se que a restituição do indébito é consequência lógica da relação jurídica aqui discutida, considerando que o contrato é nulo em decorrência da ausência de formalização válida, nos termos do art. 595 do Código Civil e ausência de comprovante de repasse dos valores e restou comprovada a realização indevida de descontos.
Esclareço ainda que de acordo com o CDC, a “penalidade” da restituição do indébito na forma dobrada depende de alguns requisitos: i) consumidor cobrado em quantia indevida; ii) consumidor ter efetivamente pago; iii) não ocorrência de engano justificável por parte do cobrador.
Nesse sentido, o STJ, até a data do julgamento dos EAREsp nº 676.608/RS, divergia sobre a necessidade, ou não, de configuração da má-fé para restituição do indébito em dobro, pacificando, a partir daí, seu entendimento, para determinar que não se exige a demonstração de má-fé, ou seja, da intenção do fornecedor de cobrar um valor indevido.
Não é necessário, atualmente, se perquirir qualquer elemento volitivo por parte do fornecedor.
Desse modo, a partir de 30.03.2021, havendo cobrança indevida contrária à boa-fé objetiva, efetivamente paga pelo consumidor, é cabível a restituição em dobro do indébito, independentemente da configuração da má-fé.
Isso significa dizer que as decisões judiciais anteriores serão mantidas em atenção ao princípio da segurança jurídica, considerassem a necessidade do elemento volitivo ou não.
Nesse sentido, esta Relatoria entende que reconhecida a inexistência do contrato, ante a inexistência de instrumento contratual válido e ausente de comprovante de repasse dos valores, resta presente a má-fé da instituição financeira na cobrança de valores pelo negócio jurídico nulo.
Se basta a violação à boa-fé objetiva, com muito mais razão basta a caracterização da má-fé.
Nota-se que a supracitada súmula 30 prevê ainda o dever indenizatório, devendo incidir a repetição do indébito e danos morais nos termos do CDC.
Com efeito, é medida de justiça a devolução do indébito em dobro, razão pela qual condeno o Banco réu à repetição do indébito dos valores indevidamente descontados pelo negócio discutido, nos termos do art. 42 do CDC, respeitada a prescrição quinquenal, art. 27 do CDC.
Não deve haver compensação de valores, haja vista não comprovado cabalmente a transferência dos valores contratados em favor da parte autora.
Ademais, não há que se falar em devolução de qualquer outro valor, tendo em vista que o contrato não respeitou as formalidades do art. 595 do Código Civil. 2.3.
DOS DANOS MORAIS No que se refere aos danos morais, é evidente a incidência no caso em comento, visto que os descontos se deram em verbas de natureza alimentar de pessoa hipossuficiente, de modo que a redução da sua capacidade financeira, por mínima que seja, enseja-lhe dor e sofrimento geradores de ofensa moral.
Nesse passo, frise-se que a verba indenizatória a título de danos morais deve ser fixada tendo em vista dois parâmetros: o caráter compensatório para a vítima e o caráter punitivo para o causador do dano.
Logo, o valor indenizatório deve atender aos fins a que se presta a indenização, considerando as peculiaridades de cada caso concreto, de modo a evitar que se converta em enriquecimento injusto da vítima, ou, ainda, que o valor seja tão ínfimo, que se torne inexpressivo.
Assim como externaliza o art. 944 do Código Civil: “a indenização mede-se pela extensão do dano”.
Na espécie, como outrora afirmado, a Apelante sobrevive de renda mínima da Previdência Social, teve reduzido o valor do seu benefício previdenciário, o que lhe acarretou redução do seu poder de compra e, por conseguinte, alterou sobremaneira a sua renda básica, de caráter alimentar, cuja gravidade interferiu na sua subsistência.
Anteriormente, em casos semelhantes, este órgão fracionário entendia cabível a fixação do valor da compensação por danos morais em R$ 5.000,00 (cinco mil reais), montante que este magistrado subscritor, em seu entendimento pessoal, considerava ser razoável e adequado para casos como o em análise.
Contudo, em que pese o exposto, a 3ª Câmara Especializada Cível firmou diversos precedentes mais recentemente, em que fui vencido, considerando como adequado o valor de R$ 3.000,00 (três mil reais) a título de reparação moral em hipóteses como a em apreço. É o que se observa dos recentes julgados: AC nº 0800447-95.2021.8.18.0048; 0801034-54.2021.8.18.0069; 0800735-12.2023.8.18.0068; 0801361-90.2021.8.18.0071; 0800611-93.2022.8.18.0058; 0805747-31.2022.8.18.0039.
Além disso, a teor do preceituado pelo art. 926 do CPC, quanto ao dever dos tribunais de manter íntegra, uniforme, estável e coerente sua jurisprudência, ressalto que a matéria versada nestes autos já foi objeto de reiterados julgamentos nesta Corte de Justiça, o que torna possível o julgamento monocrático segundo interpretação à Súmula 568 do c.
STJ.
Vejamos: Art. 926.
Os tribunais devem uniformizar sua jurisprudência e mantê-la estável, íntegra e coerente.
Sum. 568: O relator, monocraticamente e no Superior Tribunal de Justiça, poderá dar ou negar provimento ao recurso quando houver entendimento dominante acerca do tema. (STJ Súmula 568, CORTE ESPECIAL, julgado em 16/03/2016, DJe 17/03/2016). É que, havendo orientação consolidada neste Sodalício sobre a matéria aqui em análise, a presente decisão monocrática certamente será a mesma proferida pelo órgão colegiado, considerando a inexistência de divergência na Câmara quanto ao valor do dano moral em casos análogos.
Nesse contexto, em atenção ao princípio da colegialidade, fixo o valor de R$ 3.000,00 (três mil reais) a título de danos morais. 2.4.
DOS JUROS E DA CORREÇÃO MONETÁRIA Recentemente, a Lei nº 14.905/24 alterou alguns artigos do Código Civil, especialmente aqueles que disciplinam a correção monetária e os juros moratórios incidentes nas relações cíveis, padronizando a utilização de índices específicos.
Anteriormente, antes da entrada em vigor da Lei n° 14.905/2024, quanto aos encargos moratórios dos danos morais, esta Relatoria fixava os juros de mora em 1% ao mês, desde o evento danoso até o arbitramento por esta Corte, e a partir deste momento, aplicado apenas a taxa SELIC - que abrangia juros e correção monetária, nos termos da súmula 54 do STJ.
Não obstante, com a alteração legal da Lei n° 14.905/2024, que entrou em vigor em 30/08/2024, a atualização dos débitos judiciais, na ausência de convenção ou de lei especial em sentido contrário, passa a se dar pelos índices legais de correção monetária e/ou de juros de mora previstos nos arts. 389, p. único, e 406, § 1º, ambos do CC, sendo estes: IPCA para correção monetária e Taxa Selic - deduzido o IPCA - para os juros moratórios.
Com a alteração legislativa, essa sistemática deve ser revista para se adequar ao novo regime legal.
Dessa forma, a atualização da indenização por danos morais deve observar, a partir do arbitramento, a correção monetária pelo IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo), conforme divulgado pelo IBGE, e os juros moratórios, a contar do evento danoso, com base na taxa Selic deduzida do índice de correção monetária (IPCA), nos termos do art. 389, parágrafo único, e do art. 406, § 1º, ambos do Código Civil, conforme redação dada pela Lei nº 14.905/2024.
O mesmo critério deve ser observado para os danos materiais, com termo inicial dos juros e correção na data do ato ilícito, ou seja, da ocorrência de cada desconto indevido. 2.5.
HONORÁRIOS Inverto o ônus sucumbencial e deixo de arbitrar honorários recursais, nos termos da tese do Tema 1.059 do STJ, que foi fixada nos seguintes termos: "A majoração dos honorários de sucumbência prevista no artigo 85, parágrafo 11, do CPC pressupõe que o recurso tenha sido integralmente desprovido ou não conhecido pelo tribunal, monocraticamente ou pelo órgão colegiado competente.
Não se aplica o artigo 85, parágrafo 11, do CPC em caso de provimento total ou parcial do recurso, ainda que mínima a alteração do resultado do julgamento ou limitada a consectários da condenação". 3.
DECISÃO Forte nessas razões, conheço da presente Apelação Cível e lhe dou provimento, para reformar a sentença e: i) decretar a nulidade do contrato questionado na presente, eis que celebrado por analfabeto, sem observância dos requisitos do art. 595 do Código Civil, ou, ainda, por meio de procurador constituído através de instrumento público, bem como não haver comprovação do repasse do valor do empréstimo à parte Autora; ii) condenar o Banco Apelado a restituir, em dobro (parágrafo único do art. 42 do CDC), o valor descontado indevidamente do benefício previdenciário da parte autora, com juros e correção monetária, a partir do evento danoso; iii) condenar o Banco Apelado em danos morais no importe de R$ 3.000,00 (cinco mil reais); iv) no tocante aos danos morais, necessário que o pagamento da indenização seja acrescido de correção monetária pelo IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo), divulgado pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), desde o arbitramento, mais juros de mora pela taxa legal que corresponde à taxa Selic com dedução do índice de atualização monetária (IPCA), a contar da data do evento danoso, de acordo com as Súmulas 54 e 362 do Superior Tribunal de Justiça, desconsiderando-se eventuais juros negativos (artigo 389, parágrafo único combinado com o artigo 406 e seus parágrafos, ambos do Código Civil).
Para os danos materiais, os mesmos critérios para correção monetária e juros moratórios, a contar do ato ilício, ou seja, data de cada desconto; v) afastar a condenação por litigância de má-fé.
Por fim, inverto o ônus sucumbencial e condeno o Banco Réu, ora Apelado, ao pagamento de honorários advocatícios, em favor do causídico da parte Autora, ora Apelante, no percentual de 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação.
Custas pelo Apelado.
Publique-se.
Intime-se.
Cumpra-se.
Transcorrido o prazo sem interposição de recurso, arquivem-se os autos e dê-se baixa na distribuição.
Teresina, data e hora no sistema.
Desembargador Agrimar Rodrigues de Araújo Relator -
01/07/2025 09:23
Expedição de Outros documentos.
-
01/07/2025 09:23
Expedição de Outros documentos.
-
29/06/2025 17:13
Conhecido o recurso de FRANCISCA PAULA MORAES SOUSA - CPF: *17.***.*72-50 (APELANTE) e provido
-
14/05/2025 09:42
Conclusos para admissibilidade recursal
-
14/05/2025 08:51
Recebidos os autos
-
14/05/2025 08:51
Processo Desarquivado
-
14/05/2025 08:51
Juntada de sistema
-
07/06/2024 12:20
Arquivado Definitivamente
-
07/06/2024 12:20
Baixa Definitiva
-
07/06/2024 12:20
Remetidos os Autos (outros motivos) para a instância de origem
-
07/06/2024 12:19
Transitado em Julgado em 05/06/2024
-
07/06/2024 12:19
Expedição de Certidão.
-
05/06/2024 03:03
Decorrido prazo de BANCO BRADESCO S.A. em 04/06/2024 23:59.
-
30/05/2024 03:02
Decorrido prazo de FRANCISCA PAULA MORAES SOUSA em 29/05/2024 23:59.
-
08/05/2024 07:06
Expedição de Outros documentos.
-
08/05/2024 07:06
Expedição de Outros documentos.
-
07/05/2024 11:42
Conhecido o recurso de FRANCISCA PAULA MORAES SOUSA - CPF: *17.***.*72-50 (APELANTE) e provido
-
29/04/2024 15:34
Deliberado em Sessão - Julgado - Mérito
-
29/04/2024 15:29
Juntada de Petição de certidão de julgamento
-
11/04/2024 09:14
Expedição de Outros documentos.
-
11/04/2024 09:14
Expedição de Outros documentos.
-
11/04/2024 09:14
Expedição de Intimação de processo pautado.
-
10/04/2024 11:37
Inclusão do processo para julgamento eletrônico de mérito
-
05/04/2024 17:52
Pedido de inclusão em pauta virtual
-
14/01/2024 11:18
Conclusos para o Relator
-
14/12/2023 03:15
Decorrido prazo de FRANCISCA PAULA MORAES SOUSA em 13/12/2023 23:59.
-
06/12/2023 03:02
Decorrido prazo de BANCO BRADESCO S.A. em 05/12/2023 23:59.
-
10/11/2023 08:55
Expedição de Outros documentos.
-
10/11/2023 08:55
Expedição de Outros documentos.
-
03/11/2023 10:25
Recebido o recurso Com efeito suspensivo
-
26/09/2023 12:32
Recebidos os autos
-
26/09/2023 12:32
Conclusos para Conferência Inicial
-
26/09/2023 12:32
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
26/09/2023
Ultima Atualização
28/07/2025
Valor da Causa
R$ 0,00
Documentos
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