TJPB - 0801044-61.2025.8.15.2003
1ª instância - 1ª Vara Regional Civel de Mangabeira
Polo Passivo
Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
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03/09/2025 15:41
Juntada de Petição de petição
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20/08/2025 01:09
Publicado Sentença em 20/08/2025.
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20/08/2025 01:09
Disponibilizado no DJ Eletrônico em 19/08/2025
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19/08/2025 00:00
Intimação
Processo n. 0801044-61.2025.8.15.2003; PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7); [Empréstimo consignado, Indenização por Dano Moral, Indenização por Dano Material, Práticas Abusivas] AUTOR: MANOEL VITORIANO DE LIMA.
REU: BANCO AGIBANK S/A.
SENTENÇA I.
RELATÓRIO Cuida-se de Ação de Cancelamento de Ônus c/c Repetição do Indébito c/c Indenização por Danos Morais, ajuizada por MANOEL VITORIANO DE LIMA em face de BANCO AGIBANK S/A, ambos devidamente qualificados nos autos.
O Autor, em sua peça inicial, apresentou-se como aposentado e beneficiário do INSS sob o número 124.679.580-6, com proventos líquidos mensais no importe de R$ 1.173,31, valor este que, em sua percepção, havia sido indevidamente reduzido.
Sustentou o Demandante que, ao verificar seus extratos de pagamentos, constatou a realização de um empréstimo consignado que jamais contratou ou anuiu, identificado pelo Contrato n.º 1512766086, datado de 05/02/2024, no valor financiado de R$ 2.026,08, a ser quitado em 84 parcelas no valor de R$ 24,12 cada, cujos descontos eram indevidamente efetivados diretamente em seu benefício previdenciário, caracterizando, segundo sua alegação, uma flagrante fraude.
Mencionou ter tentado, sem sucesso, o cancelamento da operação junto ao INSS e, posteriormente, em contato com a instituição financeira Ré, foi-lhe informado que o cancelamento somente ocorreria mediante o pagamento dos valores já depositados, acrescidos dos juros aplicáveis, por ter a operação sido supostamente concretizada.
Diante de tal cenário, o Autor, alegando a usurpação de seu sossego, o abalo de sua autoestima e o constrangimento advindo da redução de sua verba de natureza alimentar, pleiteou a concessão das benesses da Justiça Gratuita, o cancelamento do indigitado contrato, a restituição em dobro dos valores pagos indevidamente e a condenação da Ré ao pagamento de indenização por danos morais no importe de R$ 5.000,00, além das custas processuais e honorários advocatícios, pugnando, desde logo, pela inversão do ônus da prova.
O valor atribuído à causa foi de R$ 5.578,88, conforme se depreende do ID 108147317, páginas 1 a 9.
A gratuidade judiciária foi deferida inicialmente por este Juízo, consoante decisão de ID 108150255, página 1.
Devidamente citado, o BANCO AGIBANK S/A apresentou contestação acompanhada de documentos (ID 110450566, páginas 1 a 11, e ID 110450565, páginas 1 a 61).
Em sua defesa, o Réu argumentou pela absoluta regularidade e validade da contratação do empréstimo consignado de número 1512766086, afirmando que a operação foi firmada mediante assinatura eletrônica com reconhecimento por biometria facial, e que o valor correspondente ao mútuo foi devidamente creditado na conta de titularidade do Autor.
O Banco detalhou as etapas do processo de contratação, desde a procura do cliente em uma de suas lojas até a finalização eletrônica e o recebimento do crédito.
Preliminarmente, suscitou a prescrição quinquenal da pretensão autoral, alegando que o prazo deveria ser contado a partir do primeiro desconto, momento em que a parte autora teria tido conhecimento da suposta lesão.
No mérito, defendeu a validade jurídica da contratação por biometria, citando a Medida Provisória nº 2.200-2/2001, a Lei nº 14.063/2020, a Lei nº 10.931/2004 e as Instruções Normativas do INSS (em especial a INSS/PRES nº 28/2008 e a INSS nº 138), que, em sua visão, conferem validade aos documentos eletrônicos.
Aduziu que a falta de impugnação expressa da assinatura biométrica por parte do Autor deveria ensejar a presunção de autenticidade dos documentos, afastando a alegação de desconhecimento.
Impugnou o pedido de repetição do indébito em dobro, sustentando, subsidiariamente, a tese de "engano justificável", bem como a modulação dos efeitos do EAREsp 600.663/RS do Superior Tribunal de Justiça para cobranças anteriores a 30/03/2021, e que a base de cálculo da dobra deveria incidir apenas sobre o valor pago em excesso após a compensação com o montante recebido, com correção monetária aplicada a cada parcela individualmente.
Quanto aos danos morais, o Banco Réu defendeu a inexistência de prejuízo efetivo que extrapolasse o mero aborrecimento, argumentando que a fraude bancária, por si só, não configura dano moral sem a comprovação de circunstâncias agravantes.
Por fim, o Réu apresentou pedido contraposto, requerendo a condenação do Autor à devolução do valor que lhe foi transferido, com base nos artigos 182 e 884 do Código Civil, a fim de evitar enriquecimento ilícito, solicitando a exibição de extratos bancários pelo Autor.
Adicionalmente, arguiu a ocorrência de advocacia predatória e litigância de má-fé por parte do Autor e de seu patrono, pugnando pela aplicação de multa e indenização, conforme os artigos 80, incisos II e III, e 81 do Código de Processo Civil.
O Autor, em sede de réplica à contestação (ID 110894891, páginas 1 a 5), reiterou a inaplicabilidade da prescrição suscitada pela parte Ré, argumentando que o prazo quinquenal se iniciaria da data do último desconto efetivado no benefício previdenciário e que os descontos impugnados na demanda permanecem ativos.
Rechaçou a validade da contratação apresentada pelo Banco, alegando a ausência de assinatura física e digital efetiva no documento de contratação, bem como a falta de georreferenciamento correspondente ao seu endereço.
Ressaltou a inaplicabilidade de perícia grafotécnica por não haver assinatura para ser periciada no documento apresentado.
Invocou, em seu favor, a Lei Estadual nº 12.027/21 do Estado da Paraíba, que exige a assinatura física de pessoas idosas em contratos de operação de crédito firmados por meio eletrônico ou telefônico, e a decisão do Supremo Tribunal Federal que reconheceu a constitucionalidade de tal norma na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 7027.
Por fim, afirmou que o Banco Promovido não juntou nenhum comprovante de pagamento ou transferência bancária (TED) para comprovar a liberação do valor do empréstimo.
Após a réplica, as partes foram intimadas para especificar as provas que ainda pretendiam produzir, cientes de que o silêncio seria interpretado como ausência de interesse e desejo de julgamento do processo no estado em que se encontrava (ID 111001787, página 1).
Em resposta, o Banco Agibank informou que não havia outras provas a produzir além das já requeridas nos autos, reiterando os termos da contestação e pugnando pela improcedência dos pedidos formulados na inicial (ID 111828315, página 1).
O Autor não se manifestou especificamente sobre a produção de novas provas além daquelas genericamente indicadas na inicial, como juntada de novos documentos, depoimento pessoal e prova pericial, mas não as especificou ou justificou a pertinência em momento oportuno. É o relatório.
Decido.
II.
FUNDAMENTAÇÃO A lide em questão, cuidadosamente analisada em seus termos fáticos e jurídicos, revela-se apta ao julgamento antecipado, conforme preceitua o Código de Processo Civil, uma vez que a matéria em debate prescinde de produção de outras provas, sendo os elementos documentais já carreados aos autos suficientes para a formação do convencimento deste Juízo.
As partes, em suas manifestações posteriores à fase postulatória, não pugnaram pela produção de provas adicionais de forma justificada e específica, ou, como no caso do Réu, expressamente declinaram do interesse em produzi-las, indicando a desnecessidade de dilação probatória.
Assim, o processo encontra-se maduro para a prolação da sentença, em observância aos princípios da celeridade e da economia processual.
A relação jurídica estabelecida entre as partes enquadra-se inequivocamente no âmbito das relações de consumo, regidas pelas disposições do Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/90).
O Autor, na qualidade de tomador de serviços bancários, preenche a definição de consumidor prevista no artigo 2º do CDC, enquanto o Banco Réu, como instituição financeira, é considerado fornecedor de serviços, nos termos do artigo 3º do mesmo diploma legal.
Essa compreensão é reforçada pelo entendimento pacificado na Súmula 297 do Superior Tribunal de Justiça, que estabelece a aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor às instituições financeiras.
No contexto das relações consumeristas, a responsabilidade do fornecedor de serviços é de natureza objetiva, conforme disposto no artigo 14 do CDC.
Isso significa que a reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos, independe da comprovação de culpa.
Basta a existência do dano e do nexo de causalidade entre o serviço prestado e o prejuízo sofrido para que surja o dever de indenizar.
Ademais, a hipossuficiência do consumidor, notadamente do idoso, é um pilar fundamental da proteção consumerista.
A facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, é um direito básico assegurado pelo artigo 6º, inciso VIII, do CDC, quando, a critério do juiz, a alegação for verossímil ou o consumidor for hipossuficiente segundo as regras ordinárias de experiências.
No presente caso, o Autor, nascido em 16/04/1955, é uma pessoa idosa, condição que lhe atribui hipervulnerabilidade, justificando a inversão do ônus da prova.
Cabia, portanto, ao Banco Réu, por possuir todas as ferramentas e informações sobre o processo de contratação, comprovar a regularidade e validade do empréstimo consignado questionado, ônus do qual, como se verá, não se desincumbiu satisfatoriamente, especialmente diante das peculiaridades legislativas aplicáveis.
Passo à análise das questões preliminares suscitadas em sede de contestação.
Da preliminar de prescrição O Banco Réu arguiu a prescrição quinquenal da pretensão autoral, defendendo que o prazo deveria ser contado a partir da data do primeiro desconto efetuado no benefício previdenciário do Autor, momento em que este teria tido inequívoco conhecimento da suposta lesão.
Em contrapartida, o Autor sustentou que a prescrição quinquenal, se aplicável, iniciaria a contagem a partir do último desconto efetivado, enfatizando que os descontos questionados ainda se encontram ativos em seu benefício previdenciário.
Nesse diapasão, cumpre destacar que a pretensão primordial do Autor é a declaração de inexistência de uma relação jurídica contratual, e a consequente nulidade ou inexigibilidade do débito que dela advém.
Em casos que envolvem a discussão da própria existência ou validade de um negócio jurídico e seus efeitos continuados, como os descontos mensais em benefício previdenciário, a pretensão de declaração de inexistência ou nulidade do ato, em regra, é imprescritível.
Os descontos em folha de pagamento, por sua natureza de trato sucessivo e continuado, renovam o suposto ato ilícito a cada competência, afastando a contagem do prazo prescricional desde um marco inicial distante, enquanto a lesão se protrai no tempo.
A jurisprudência pátria tem se consolidado no sentido de que, em se tratando de cobranças indevidas de caráter continuado, o prazo prescricional quinquenal (seja pelo artigo 206, § 5º, inciso I, do Código Civil, ou pelo artigo 27 do Código de Defesa do Consumidor, para reparação do dano) deve ser contado a partir da cessação dos descontos ou, no mínimo, da ciência inequívoca da lesão que se perpetua.
Destarte, considerando que os descontos permanecem ativos e a discussão versa sobre a própria validade do vínculo, a preliminar de prescrição arguida pela parte Ré não merece acolhimento e, por consequência, resta afastada.
Da alegação de advocacia predatória e litigância de má-fé O Banco Réu, em sua peça de defesa, alegou a ocorrência de advocacia predatória e litigância de má-fé por parte do Autor e de seu causídico.
Fundamentou sua argumentação na suposta multiplicidade de demandas, no fracionamento de objetos, em causas de pedir que remariam contra o princípio do venire contra factum proprium, na caracterização de "ações aventureiras" e na alegada alteração da verdade dos fatos, visando a um enriquecimento ilícito.
Para embasar suas alegações, invocou os artigos 80, incisos II e III, e 81 do Código de Processo Civil, bem como o artigo 884 do Código Civil.
Contudo, a condenação por litigância de má-fé, por sua natureza grave, exige a comprovação inequívoca do dolo ou da culpa grave da parte ou de seu patrono na prática de alguma das condutas descritas taxativamente no artigo 80 do Código de Processo Civil.
A mera propositura de uma ação judicial para discutir a validade de um contrato, ainda que, ao final, o pleito não seja integralmente acolhido, não configura, por si só, má-fé processual.
O acesso ao Poder Judiciário é um direito fundamental constitucionalmente assegurado, e a sua busca por parte do cidadão deve ser sempre presumida de boa-fé, salvo prova em contrário robusta e indubitável.
No caso em tela, a análise dos autos não revela elementos concretos que demonstrem a intenção deliberada do Autor de alterar a verdade dos fatos ou de utilizar o processo para alcançar um objetivo ilegal.
O simples fato de haver uma discussão sobre a validade contratual, com o Autor negando a contratação e o Réu apresentando documentos que considera válidos, insere-se no exercício regular do direito de ação e de defesa, típico do processo civil.
Não se verifica, portanto, a presença de dolo processual ou de conduta que extrapole o razoável e configure as hipóteses de litigância de má-fé previstas na legislação processual.
Destarte, a alegação de litigância de má-fé não encontra respaldo nos elementos probatórios e argumentativos constantes dos autos, razão pela qual a preliminar é rejeitada.
Passo ao mérito.
Da validade da contratação e a Lei Estadual nº 12.027/2021 O cerne da controvérsia reside na validade do contrato de empréstimo consignado nº 1512766086, impugnado pelo Autor.
O Banco Réu alegou que a contratação se deu de forma regular, por meio eletrônico e biometria facial, e que o valor do mútuo foi creditado na conta do Autor, apresentando a Cédula de Crédito Bancário (ID 110450565, páginas 18 a 35), o comprovante de transação bancária (ID 110450565, página 57) e o extrato da conta corrente do Autor (ID 110450565, páginas 48 a 56) como provas de suas alegações e da efetiva liberação do valor de R$ 999,35.
Todavia, a situação do Autor, pessoa idosa nascida em 16/04/1955, atrai a incidência de uma legislação específica do Estado da Paraíba, a Lei Estadual nº 12.027/2021, que visa a proteger a população idosa em operações de crédito.
Conforme expressamente invocado pela parte Autora em sua réplica (ID 110894891, páginas 2 e 3), esta lei estabelece em seus artigos 1º e 2º a obrigatoriedade da assinatura física em contratos de operação de crédito firmados por meios eletrônicos ou telefônicos com pessoas idosas, bem como a necessidade de disponibilização do contrato em meio físico e o fornecimento de cópia ao contratante idoso, sob pena de nulidade do compromisso.
Vejamos a literalidade dos dispositivos invocados na impugnação à contestação (ID 110894891, p. 2-3): "LEI Nº 12.027/21 DO ESTADO DA PARAÍBA Art. 1º Fica obrigada, no Estado da Paraíba, a assinatura física das pessoas idosas em contratos de operação de crédito firmado por meio eletrônico ou telefônico com instituições financeiras e de crédito, seus representantes ou prepostos.
Parágrafo único.
Considera se contrato de operação de crédito para fins desta Lei, todo e qualquer tipo de contrato, serviços ou produtos na modalidade de consignação para desconto em aposentadorias, pensões, pecúlios, poupanças, contas correntes, tais com o empréstimos, financiamentos, arrendamentos, hipotecas, seguros, aplicações financeiras, investimentos, ou qualquer outro tipo de operação que possua natureza de crédito.
Art. 2º Os contratos de operação de crédito firmados por meio eletrônico ou telefônico com pessoas idosas devem obrigatoriamente ser disponibilizados em meio físico, para conhecimento das suas cláusulas e conseguinte assinatura do contratante, considerado idoso por Lei própria.
Parágrafo único.
A instituição financeira e de crédito contratada deve fornecer cópia do contrato firmado ao idoso contratante, sob pena de nulidade do compromisso." A constitucionalidade da referida Lei Estadual nº 12.027/2021 foi, inclusive, reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal, conforme amplamente noticiado e invocado nos precedentes jurisprudenciais carreados aos autos pela própria parte Autora, especificamente nas decisões de ID 110894894, páginas 12-16 e ID 110894895, páginas 24-37.
O acórdão de ID 110894894, página 12, por exemplo, faz expressa menção à decisão do STF na ADI 7027: "Frise se que o Supremo Tribunal Federal já reconheceu a constitucionalidade da Lei Nº 12.027/21 do Estado da Paraíba, que exige a assinatura física de idosos em contratos de operação de crédito .
Por maioria, o Plenário julgou improcedente pedido apresentado pela Confederação Nacional do Sistema Financeiro (Consif) na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 7027.".
No caso em análise, o Banco Réu apresentou a Cédula de Crédito Bancário com uma suposta "assinatura eletrônica por biometria facial", realizada por meio de "App do Consultor" (ID 110450565, página 35).
A documentação bancária interna (ID 110450565, páginas 11-17) detalha as etapas da contratação eletrônica, incluindo a coleta de dados, formalização, envio de checklist e reconhecimento biométrico facial.
Contudo, em momento algum o Banco Réu comprovou a existência da assinatura física do Autor, tampouco a disponibilização do contrato em meio físico, conforme exigido pela Lei Estadual nº 12.027/2021.
Ainda que as instruções normativas do INSS e a legislação federal sobre documentos eletrônicos (como a Medida Provisória nº 2.200-2/2001, o artigo 4º, inciso II, da Lei nº 14.063/2020, e o artigo 29, § 5º, da Lei nº 10.931/2004) confiram validade genérica a assinaturas eletrônicas, é imperioso que a contratação se dê em estrita observância à legislação específica de proteção ao consumidor idoso, especialmente quando esta se revela mais protetiva e sua constitucionalidade é chancelada pela Suprema Corte.
A Lei Estadual da Paraíba, em sua clareza, estabelece uma condição de validade particular para contratos de crédito com idosos, qual seja, a assinatura física.
A ausência de tal formalidade, portanto, fulmina de nulidade o negócio jurídico, independentemente de ter havido a liberação do valor.
A vulnerabilidade e hipervulnerabilidade do consumidor idoso no mercado de consumo, um princípio norteador da Política Nacional das Relações de Consumo (Art. 4º, I, CDC), justificam a imposição de cautelas adicionais, como as previstas na legislação estadual em comento.
A não observância dessas cautelas por parte da instituição financeira configura flagrante falha na prestação do serviço.
Dessa forma, conclui-se que o contrato de empréstimo consignado de número 1512766086, supostamente celebrado entre as partes, é nulo de pleno direito, por absoluta inobservância da forma prescrita em lei, especialmente a Lei Estadual nº 12.027/2021.
Do recebimento dos valores pelo Autor e o pedido contraposto Apesar da nulidade do contrato de empréstimo consignado, o Banco Réu logrou comprovar o efetivo crédito do valor de R$ 999,35 (correspondente ao "Valor Liberado" indicado no demonstrativo de evolução da dívida, ID 110450565, p. 58) na conta de titularidade do Autor (ID 110450565, p. 48-56, com o registro "CRED.
CONSIG.
DIG. 1512766086" na data de 05/02/2024, no valor de R$ 999,35; e ID 110450565, p. 57, comprovante de transação bancária).
A declaração de nulidade do negócio jurídico impõe o retorno das partes ao status quo ante, ou seja, ao estado em que se encontravam antes da celebração do contrato, conforme preceitua o artigo 182 do Código Civil.
Não obstante a ilicitude da conduta da instituição financeira na formalização do empréstimo, não se pode admitir o enriquecimento sem causa do Autor, que se beneficiaria do valor creditado sem a devida restituição.
O artigo 884 do Código Civil estabelece que "aquele que, sem justa causa, se enriquecer à custa de outrem, será obrigado a restituir o indevidamente auferido".
Assim, o pedido contraposto formulado pelo Banco Réu, no sentido de que o valor transferido ao Autor seja objeto de compensação, mostra-se plenamente cabível e em consonância com os princípios que regem o ordenamento jurídico.
A compensação é um mecanismo que permite equilibrar as relações obrigacionais, impedindo que uma das partes obtenha vantagem indevida em detrimento da outra.
Portanto, o valor de R$ 999,35 (novecentos e noventa e nove reais e trinta e cinco centavos) comprovadamente creditado na conta do Autor deverá ser compensado com o valor da condenação material a ser imposta ao Réu.
Da repetição do indébito Reconhecida a nulidade do contrato de empréstimo consignado em razão da inobservância da Lei Estadual nº 12.027/2021, os descontos efetuados no benefício previdenciário do Autor são, por conseguinte, indevidos.
A parte Autora pleiteou a restituição em dobro dos valores pagos, com base no artigo 42, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor.
O mencionado dispositivo legal estabelece que "o consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável".
O Banco Réu, buscando afastar a dobra, arguiu a tese do "engano justificável" e a modulação de efeitos do EAREsp 600.663/RS do Superior Tribunal de Justiça.
Contudo, a jurisprudência consolidada do Tribunal de Justiça da Paraíba, conforme os próprios precedentes trazidos aos autos (ID 110894894, páginas 12-22; ID 110894895, páginas 24-37; ID 110894896, páginas 38-52), tem aplicado a restituição em dobro em casos similares.
As ementas e os fundamentos dos acórdãos apresentados são claros ao afirmar que a restituição em dobro do indébito independe da natureza do elemento volitivo (má-fé) do fornecedor, revelando-se cabível quando a cobrança indevida consubstanciar conduta contrária à boa-fé objetiva, conforme tese firmada pelo Superior Tribunal de Justiça no julgamento do EAREsp 676608/RS, com modulação para aplicação a partir de 30 de março de 2021.
A inobservância da Lei Estadual nº 12.027/2021, cuja constitucionalidade foi referendada pelo STF, não pode ser caracterizada como "engano justificável", mas sim como uma falha na prestação do serviço e uma conduta que se opõe à boa-fé objetiva, especialmente em se tratando de consumidor idoso, que se encontra em situação de hipervulnerabilidade.
As decisões do Tribunal de Justiça da Paraíba, como a de ID 110894894, página 13, reiteram: "O STJ fixou a seguinte tese, no julgamento do EARESP 676608/RS 'A restituição em dobro do indébito (parágrafo único do artigo 42 do CDC) independe da natureza do elemento volitivo do fornecedor que realizou a cobrança indevida, revelando se cabível quando a referida cobrança consubstanciar conduta contrária à boa fé objetiva'." E, na mesma toada, a decisão de ID 110894895, página 8, ao se referir ao mesmo entendimento, corrobora: "No caso destes autos, os descontos realizados ocorreram por causa de falha administrativa do fornecedor, com fundamento em contrato inexistente, não se constituindo em engano justificável, sendo cabível a repetição do indébito em dobro, seguindo os precedentes desta Corte de Justiça".
No tocante à base de cálculo da repetição em dobro, o Banco Réu sugeriu que a dobra deveria incidir apenas sobre a quantia paga "em excesso", ou seja, a diferença entre o total descontado e o valor recebido pelo Autor.
Contudo, os precedentes jurisprudenciais apresentados no processo indicam que a restituição em dobro incide sobre o total dos valores indevidamente descontados, e a compensação com o valor recebido pela parte Autora é feita posteriormente.
Assim, o valor a ser restituído em dobro é a totalidade das parcelas indevidamente descontadas do benefício previdenciário do Autor, sobre as quais incidirão os consectários legais.
A compensação com o valor que foi liberado ao Autor será efetuada no momento da liquidação da sentença, evitando-se o enriquecimento sem causa de qualquer das partes.
Sobre os consectários legais da repetição do indébito, os valores a serem restituídos deverão ser corrigidos monetariamente pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) a partir de cada desconto indevido, pois é a partir desse momento que se configura o efetivo prejuízo material, nos termos da Súmula 43 do Superior Tribunal de Justiça.
Os juros de mora, por sua vez, incidirão à taxa de 1% (um por cento) ao mês, também a partir de cada desconto indevido, por se tratar de ilícito contratual que se renova a cada cobrança.
Dos danos morais O Autor buscou a condenação do Banco Réu ao pagamento de indenização por danos morais, alegando abalo à sua autoestima, angústia e privação de verba alimentar essencial à sua subsistência, dado o desconto indevido em seu benefício previdenciário.
O Réu, por sua vez, argumentou que meros aborrecimentos não geram dano moral e que a fraude bancária, por si só, não configura dano moral sem a comprovação de circunstâncias agravantes, não sendo o caso de dano in re ipsa, citando jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça.
No entanto, a situação vivenciada pelo Autor transcende o mero aborrecimento cotidiano, configurando verdadeiro dano moral.
A jurisprudência pátria, e em especial a do Tribunal de Justiça da Paraíba, tem reconhecido que o desconto indevido de valores em proventos de natureza alimentar, como é o caso de benefício previdenciário de idoso, por sua própria natureza, causa abalo moral presumível (in re ipsa), dispensando a produção de provas específicas sobre a dor, o sofrimento ou a angústia.
Tal entendimento decorre da grave violação à dignidade da pessoa humana e ao mínimo existencial do consumidor, que se vê privado de recursos essenciais para sua subsistência e de sua família, máxime quando se trata de pessoa idosa e hipervulnerável.
As decisões do TJ-PB acostadas aos autos corroboram essa compreensão.
O acórdão de ID 110894894, página 13, afirma: "O desconto indevido nos proventos da parte autora decorrente de parcela de produto não contratado configura dano moral indenizável, tendo em vista o suprimento de valores em verba de natureza alimentar." E mais adiante, na página 20: "Os danos morais, no caso são in re ipsa, ou seja, prescindíveis de outras provas".
A decisão monocrática de ID 110894895, página 31, também adota esse posicionamento: "A prática abusiva gera o direito à indenização por danos morais, em caráter punitivo e pedagógico.".
O contexto da fraude e do desconto em verba de caráter alimentar, somado à condição de idoso do Autor, é suficiente para configurar o dano moral, que não se confunde com simples dissabores.
Para a fixação do quantum indenizatório, deve-se observar o binômio compensação-punição, buscando uma quantia que, ao mesmo tempo, compense o sofrimento da vítima e sirva como medida pedagógica para inibir a reiteração de condutas semelhantes pelo ofensor, sem, contudo, ensejar enriquecimento ilícito do lesado.
Deve-se considerar a gravidade do dano, a capacidade econômica do ofensor e a condição pessoal do ofendido.
As decisões do Tribunal de Justiça da Paraíba em casos análogos, presentes nos autos, fixaram valores entre R$ 5.000,00 e R$ 8.000,00.
Diante das peculiaridades do caso concreto, em que o desconto de um empréstimo não contratado incidiu sobre o benefício previdenciário de um idoso, comprometendo sua subsistência, e considerando os critérios de razoabilidade e proporcionalidade, entendo como justa e adequada a fixação da indenização por danos morais no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais).
Quanto aos consectários legais, os juros de mora sobre a indenização por danos morais deverão incidir à taxa de 1% (um por cento) ao mês, a partir do evento danoso, ou seja, de cada desconto indevido, conforme o entendimento da Súmula 54 do Superior Tribunal de Justiça, uma vez que a responsabilidade é de natureza extracontratual (pela falha na prestação do serviço que culminou na nulidade do contrato e nos descontos indevidos).
A correção monetária, por sua vez, incidirá pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), a partir da data do arbitramento da indenização, que é a data da prolação desta sentença, em conformidade com a Súmula 362 do Superior Tribunal de Justiça.
III.
DISPOSITIVO Ante o exposto, e por tudo o mais que dos autos consta, com fulcro no artigo 487, inciso I, do Código de Processo Civil, resolvo o mérito e, por consequência, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados na inicial, ao tempo em que JULGO PROCEDENTE o pedido contraposto apresentado pelo Réu.
Assim, com base na fundamentação supra: I.
REJEITO as preliminares de prescrição e de litigância de má-fé, pelos fundamentos expostos na presente sentença.
II.
DECLARO a NULIDADE do contrato de empréstimo consignado nº 1512766086, supostamente celebrado entre as partes, em virtude da inobservância da forma prescrita na Lei Estadual nº 12.027/2021, devidamente reconhecida como constitucional pelo Supremo Tribunal Federal na ADI 7027.
III.
CONDENO o BANCO AGIBANK S/A à restituição, em dobro, dos valores indevidamente descontados do benefício previdenciário do Autor, MANOEL VITORIANO DE LIMA, a título do contrato ora declarado nulo.
O montante a ser restituído deverá ser apurado em fase de liquidação de sentença, mediante simples cálculo, com base nos comprovantes de descontos efetuados.
Sobre o valor de cada parcela indevidamente descontada, incidirão correção monetária pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) a partir da data de cada desconto e juros de mora de 1% (um por cento) ao mês a partir da data de cada desconto.
IV.
CONDENO o BANCO AGIBANK S/A ao pagamento de indenização por danos morais em favor de MANOEL VITORIANO DE LIMA, que arbitro em R$ 5.000,00 (cinco mil reais).
Sobre este valor, incidirão correção monetária pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) a partir da data da prolação desta sentença (data do arbitramento) e juros de mora de 1% (um por cento) ao mês a partir da data de cada desconto indevido (evento danoso).
V.
ACOLHO o pedido contraposto formulado pelo BANCO AGIBANK S/A para AUTORIZAR a compensação do valor de R$ 999,35 (novecentos e noventa e nove reais e trinta e cinco centavos), comprovadamente creditado na conta do Autor, com o montante da condenação material imposta ao Réu, devidamente atualizado.
A compensação deverá ser realizada no momento da liquidação da sentença.
VI.
CONDENO o BANCO AGIBANK S/A ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, os quais fixo em 15% (quinze por cento) sobre o valor da condenação (somatório da repetição do indébito em dobro, após compensação, com a indenização por danos morais), nos termos do artigo 85, § 2º, do Código de Processo Civil, considerando a natureza da causa, o trabalho realizado e o tempo exigido para o serviço.
Publicada e registrada eletronicamente.
Intime as partes.
João Pessoa/PB, data do protocolo eletrônico. [Documento datado e assinado eletronicamente - art. 2º, lei 11.419/2006] SHIRLEY ABRANTES MOREIRA RÉGIS Juíza de Direito -
18/08/2025 11:38
Expedição de Outros documentos.
-
18/08/2025 11:23
Julgado procedente em parte do pedido
-
13/05/2025 10:06
Conclusos para despacho
-
13/05/2025 10:02
Decorrido prazo de BANCO AGIBANK S/A em 09/05/2025 23:59.
-
13/05/2025 10:02
Decorrido prazo de MANOEL VITORIANO DE LIMA em 09/05/2025 23:59.
-
30/04/2025 14:33
Juntada de Petição de petição
-
14/04/2025 11:55
Expedição de Outros documentos.
-
11/04/2025 11:12
Juntada de Petição de petição
-
07/04/2025 03:35
Decorrido prazo de BANCO AGIBANK S/A em 28/03/2025 23:59.
-
04/04/2025 12:42
Expedição de Outros documentos.
-
03/04/2025 14:38
Juntada de Petição de contestação
-
06/03/2025 10:41
Expedição de Outros documentos.
-
20/02/2025 11:25
Concedida a Assistência Judiciária Gratuita a parte
-
20/02/2025 11:25
Determinada a citação de BANCO AGIBANK S/A - CNPJ: 10.***.***/0001-50 (REU)
-
20/02/2025 11:25
Concedida a Assistência Judiciária Gratuita a MANOEL VITORIANO DE LIMA - CPF: *47.***.*50-78 (AUTOR).
-
20/02/2025 10:56
Autos incluídos no Juízo 100% Digital
-
20/02/2025 10:56
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
20/02/2025
Ultima Atualização
03/09/2025
Valor da Causa
R$ 0,00
Documentos
Sentença • Arquivo
Sentença • Arquivo
Documento Jurisprudência • Arquivo
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Decisão • Arquivo
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