TJPB - 0802251-66.2023.8.15.2003
2ª instância - Câmara / Desembargador(a) Joao Batista Barbosa
Processos Relacionados - Outras Instâncias
Polo Ativo
Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
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09/09/2025 00:00
Intimação
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA PARAÍBA TERCEIRA CÂMARA ESPECIALIZADA CÍVEL GABINETE 18 – DES.
JOÃO BATISTA BARBOSA ACÓRDÃO APELAÇÃO CÍVEL N. 0802251-66.2023.8.15.2003 ORIGEM: 1ª Vara Regional Cível de Mangabeira - Acervo A RELATOR: Inácio Jário Queiroz de Albuquerque - Juiz de Direito Substituto em Segundo Grau APELANTE: Taciel José de Figueiredo Souza, pela Defensoria Pública APELADO: Banco Votorantim S/A ADVOGADA: Karina de Almeida Batistuci (OAB/PB 178.033-A) Ementa: DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL.
APELAÇÃO CÍVEL.
AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO.
ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA.
INADIMPLEMENTO COMPROVADO.
NOTIFICAÇÃO EXTRAJUDICIAL ENVIADA AO ENDEREÇO CONTRATUAL.
TEORIA DO ADIMPLEMENTO SUBSTANCIAL.
INAPLICABILIDADE.
PURGAÇÃO DA MORA.
NECESSIDADE DE PAGAMENTO INTEGRAL NO PRAZO LEGAL.
MANUTENÇÃO DA SENTENÇA.
RECURSO DESPROVIDO.
I.
CASO EM EXAME 1.
Apelação Cível interposta por devedor em face de sentença que julgou procedente ação de busca e apreensão ajuizada por instituição financeira com base no Decreto-Lei nº 911/69, em razão de inadimplemento em contrato de financiamento com garantia de alienação fiduciária.
A sentença consolidou a propriedade e posse plena do veículo em favor do credor, rejeitou a aplicação da Teoria do Adimplemento Substancial e determinou que eventual saldo remanescente da venda do bem fosse restituído ao devedor.
II.
QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2.
Há três questões em discussão: (i) verificar se houve ofensa ao princípio da dialeticidade recursal; (ii) definir se a redução da capacidade financeira do devedor afasta a mora e autoriza revisão contratual; (iii) estabelecer se a Teoria do Adimplemento Substancial é aplicável aos contratos de alienação fiduciária regidos pelo Decreto-Lei nº 911/69 e se é possível purgar a mora sem pagamento integral da dívida.
III.
RAZÕES DE DECIDIR 3.
O recurso ataca os fundamentos da sentença de forma suficiente para permitir o exame do mérito, especialmente considerando a atuação da Defensoria Pública em favor de parte hipossuficiente. 4.
A mora foi validamente constituída por notificação extrajudicial enviada ao endereço constante no contrato, sendo desnecessária a notificação pessoal. 5.
A alegada redução de renda não configura caso fortuito ou força maior capaz de afastar o inadimplemento, por se tratar de risco previsível. 6.
A Teoria do Adimplemento Substancial é incompatível com a disciplina da alienação fiduciária no Decreto-Lei nº 911/69, conforme precedentes vinculantes do STJ, exigindo-se a quitação integral da dívida para restituição do bem. 7.
A purgação da mora, nos termos do REsp nº 1.418.593/MS, exige o pagamento da integralidade do débito (parcelas vencidas e vincendas, encargos e despesas) no prazo de 5 dias após a execução da liminar, o que não ocorreu. 8.
A sentença já assegurou a devolução de eventual saldo remanescente da venda do bem, conforme art. 2º do Decreto-Lei nº 911/69 e art. 53 do CDC.
IV.
DISPOSITIVO E TESE 9.
Recurso desprovido.
Tese de julgamento: 1.
O envio de notificação extrajudicial ao endereço contratual é suficiente para constituir o devedor em mora na alienação fiduciária. 2.
A mera redução da capacidade financeira do devedor não caracteriza caso fortuito ou força maior apto a afastar a mora. 3. É inaplicável a Teoria do Adimplemento Substancial aos contratos regidos pelo Decreto-Lei nº 911/69. 4.
A purgação da mora na alienação fiduciária exige o pagamento integral da dívida no prazo legal. 5.
O saldo remanescente da venda do bem deve ser restituído ao devedor, vedada a retenção integral das parcelas pagas.
Dispositivos relevantes citados: CF/1988, art. 5º, XXXV; CC, arts. 394, 395 e 397; CPC, arts. 98, §3º, 99, §3º, 178, 179 e 710; CDC, art. 53; Decreto-Lei nº 911/69, arts. 2º e 3º.
Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp nº 1.418.593/MS, Rel.
Min.
Luis Felipe Salomão, Segunda Seção, j. 14.05.2014; STJ, REsp nº 1.622.555/MG, Rel.
Min.
Marco Buzzi, Segunda Seção, j. 22.02.2017; TJ-MG, AC nº 10000222194623001, Rel.
Des.
Shirley Fenzi Bertão, j. 07.12.2022; STJ, AREsp nº 2439077, Rel.
Min.
Maria Isabel Gallotti, pub. 19.02.2024.
VISTOS, RELATADOS E DISCUTIDOS os presentes autos.
ACORDAM os integrantes da Terceira Câmara Especializada Cível do Tribunal de Justiça do Estado da Paraíba, à unanimidade, em negar provimento ao apelo, nos termos do voto do relator e da certidão de julgamento (ID. *****).
RELATÓRIO Trata-se de Apelação Cível interposta por TACIEL JOSE DE FIGUEIREDO SOUZA (doravante “Apelante” ou “Promovido”) contra a r.
Sentença de ID 36569795, proferida pelo Juízo da 1ª Vara Regional Cível de Mangabeira da Comarca de João Pessoa/PB, nos autos da AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO movida por BANCO VOTORANTIM S.A. (doravante “Apelado” ou “Promovente”).
A demanda originária foi ajuizada pelo BANCO VOTORANTIM S.A. com fundamento no art. 3º do Decreto-Lei n. 911, de 1969, e artigos 294 c.c artigo 300 do C.P.C., visando a busca e apreensão de um veículo financiado mediante alienação fiduciária.
O Promovente alegou que firmou com o Réu a Cédula de Crédito Bancário, contrato n. 12.***.***/0880-31, em que o Réu recebeu R$14.773,66 e se obrigou a restituir em 48 prestações mensais, com o primeiro vencimento em 07/02/2021 e o último em 07/01/2025.
O bem dado em garantia foi um veículo marca CHEVROLET, modelo TRACKER 4X4 2.0 16V 4P (GG) Básico, ano de fabricação 2008, cor PRATA, placa n.
MOS6086, chassi n. 8AG116DJ08R214410.
O Banco Votorantim S.A. afirmou que o financiado deixou de pagar a prestação vencida em 07/09/2022 e as seguintes, o que o obrigou a constituí-lo em mora por notificação extrajudicial enviada ao endereço do Financiado.
O valor total da dívida pendente, na data da petição inicial (31/03/2023), era de R$13.635,52.
O Promovente requereu a concessão de liminar para a busca e apreensão do veículo, a consolidação da propriedade e posse plena e exclusiva do bem em seu patrimônio caso o Réu não efetuasse o pagamento integral da dívida em 5 dias, e a condenação do Réu ao pagamento de multa contratual, encargos, correção monetária, honorários de advogado e custas.
A Sentença (ID 36569795), objeto do presente recurso, inicialmente analisou a preliminar de Concessão de Assistência Judiciária Gratuita.
O Juízo rejeitou a impugnação da parte autora e deferiu o benefício ao Promovido, com base na presunção de veracidade da alegação de insuficiência deduzida por pessoa natural (Art. 99, §3º, CPC) e na ausência de elementos que a afastassem.
No mérito, a Sentença julgou PROCEDENTE o pedido inicial do Banco Votorantim S.A., mantendo a liminar já concedida e consolidando a propriedade e a posse plena e exclusiva do veículo nas mãos do proprietário fiduciário.
A decisão fundamentou-se nos seguintes pontos: • A ação de busca e apreensão, fundada no Decreto-lei 911/69, reveste-se de caráter satisfativo, exigindo apenas a comprovação da mora do devedor e a existência contratual da alienação fiduciária. • O inadimplemento do Promovido foi devidamente evidenciado, justificando a busca e apreensão, uma vez que não houve continuidade no pagamento das parcelas. • A notificação extrajudicial realizada pela parte autora foi considerada adequada para constituir a mora, sendo suficiente o envio para o endereço constante no contrato, não sendo exigível o recebimento pessoal. • A purga da mora exige o depósito integral da dívida no prazo de 5 dias após a execução da liminar, conforme entendimento do STJ (REsp n. 1.418.593/MS), o que não ocorreu no caso. • A Teoria do Adimplemento Substancial é inaplicável aos contratos de alienação fiduciária em garantia regidos pelo Decreto-Lei 911/69, conforme posicionamento do STJ (REsp 1.622.555-MG) e TJMG. • A Sentença determinou que o valor do produto da venda extrajudicial do bem deverá ser aplicado no saldo devedor do contrato, e somente se houver saldo apurado em favor da parte consumidora é que haverá restituição dos valores pagos, conforme art. 2º do Decreto-lei 911/69. • O Promovido foi condenado ao pagamento das custas processuais (adiantadas pela parte autora) e honorários advocatícios, fixados em 20% da condenação, com ressalva do §3º, do Art. 98, do CPC, devido à gratuidade judiciária concedida.
Inconformado, o Apelante interpôs o presente recurso de Apelação Cível, reiterando os argumentos de sua Contestação.
Defende a reforma da sentença para que o bem seja restituído e o contrato readequado.
Alega que a redução de sua renda familiar foi uma eventualidade imprevisível e gravosa, e que o inadimplemento foi parcial, justificando a revisão ou repactuação do contrato antes da medida extrema de busca e apreensão.
O Apelante reitera a essencialidade do veículo para sua subsistência.
Subsidiariamente, caso não seja possível a devolução do bem, requer o reconhecimento de seu direito à restituição proporcional dos valores já pagos após a venda do bem apreendido, vedada qualquer cláusula abusiva de retenção integral, citando o art. 710 do CPC e art. 53 do CDC.
O Apelado, por sua vez, apresentou CONTRARRAZÕES AO RECURSO DE APELAÇÃO, pugnando pela manutenção da Sentença.
Argumentou que: • O contrato é lei entre as partes (pacta sunt servanda) e o Réu não pode se furtar ao cumprimento de suas obrigações unilateralmente. • Não há abusividade nas cláusulas contratuais, e o Réu firmou o contrato de forma espontânea. • A mora está caracterizada e não foi desconfigurada, pois não há abusividade nos encargos do período da normalidade. • As dificuldades financeiras do devedor não configuram imprevisibilidade para afastar a mora. • O pagamento parcial do contrato não é suficiente para afastar a busca e apreensão, e a teoria do adimplemento substancial é inaplicável à alienação fiduciária, reiterando a jurisprudência do STJ. • A ausência de pagamento demonstra a quebra integral da relação contratual, tornando legítima a resolução e a busca e apreensão.
Desnecessidade de remessa dos autos à Procuradoria-Geral de Justiça, porquanto ausente interesse público primário a recomendar a intervenção obrigatória do Ministério Público, nos termos dos arts. 178 e 179 do CPC, ficando assegurada sustentação oral, caso seja de seu interesse . É o relatório.
VOTO – Inácio Jário Queiroz de Albuquerque - Relator De início, o pedido de justiça gratuita foi devidamente deferido ao promovido/apelante pelo Juízo a quo na sentença, que rejeitou a impugnação do Banco.
A decisão de primeiro grau considerou a presunção de veracidade da alegação de insuficiência deduzida por pessoa natural, conforme o art. 99, §3º, do CPC.
Embora o Banco tenha arguido que a renda do Apelante seria superior a R$6.000,00, os documentos juntados pela Defensoria Pública (extrato bancário com movimentações modestas, CTPS com rescisão contratual em 2022 e ausência de novo vínculo, e Declaração de IRPF com imposto a restituir/pagar zerado), bem como a assistência pela Defensoria, corroboram a hipossuficiência.
Dessa forma, a gratuidade judiciária deve ser mantida, inclusive em grau recursal.
Da Preliminar de Ofensa ao Princípio da Dialeticidade Recursal O Apelado, Banco Votorantim S.A., arguiu a preliminar de não conhecimento do recurso por ofensa ao princípio da dialeticidade recursal, sustentando que o Apelante teria se limitado a reproduzir os argumentos da contestação, sem impugnar especificamente os fundamentos da sentença.
O princípio da dialeticidade recursal impõe ao recorrente o dever de demonstrar as razões de seu inconformismo com a decisão recorrida, confrontando-a e indicando os pontos que merecem reforma ou anulação.
Não se exige que o recurso traga argumentos absolutamente novos, mas sim que os argumentos apresentados sejam direcionados a atacar os fundamentos da decisão combatida.
No presente caso, o Apelante, embora reitere teses já expostas na contestação, não se limitou a uma mera reprodução.
Ele expressamente alega que a sentença "desconsiderou" aspectos fundamentais e baseou-se "exclusivamente na tese de inadimplemento absoluto, ignorando os princípios do equilíbrio contratual, função social do contrato e proteção ao consumidor".
Tal formulação, embora genérica em alguns pontos, denota a intenção de impugnar a própria lógica e os fundamentos da decisão judicial, permitindo a este Tribunal ad quem o regular exame do mérito da controvérsia.
Ademais, tratando-se de recurso interposto pela Defensoria Pública, em assistência a parte hipossuficiente, a jurisprudência tem adotado uma interpretação menos formalista das exigências processuais, a fim de garantir o amplo acesso à justiça e o duplo grau de jurisdição.
Desse modo, rejeito a preliminar de ofensa à dialeticidade recursal e conheço do recurso de apelação.
Mérito O contrato de financiamento estabelecido entre as partes é de alienação fiduciária, regido pelo Decreto-Lei nº 911/69.
Para a propositura da Ação de Busca e Apreensão, a comprovação da mora do devedor é requisito essencial.
A sentença de primeiro grau consignou que a mora foi devidamente comprovada por notificação extrajudicial enviada ao endereço contratual.
Este entendimento está em consonância com a jurisprudência pacificada do Superior Tribunal de Justiça (STJ), a qual dispensa a notificação pessoal do devedor, bastando que a notificação seja entregue no endereço indicado no contrato, presumindo-se a validade da constituição em mora.
Embora o Apelante alegue superveniente redução de renda e a ocorrência de caso fortuito ou força maior, a jurisprudência do STJ e dos Tribunais pátrios é firme no sentido de que a mera dificuldade financeira ou diminuição do poder aquisitivo do devedor não configuram fato imprevisível ou extraordinário apto a afastar a mora ou autorizar a revisão unilateral do contrato em ações de busca e apreensão, conforme precedentes destacados nas contrarrazões do Apelado.
A mora, no caso, resta, portanto, plenamente configurada.
Veja-se: EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE COBRANÇA - CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS MÉDICO-HOSPITALARES - INADIMPLÊNCIA CARACTERIZADA - AFASTAMENTO DOS ENCARGOS MORATÓRIOS - IMPOSSIBILIDADE - CRISE FINANCEIRA - CASO FORTUITO OU DE FORÇA MAIOR - NÃO CONFIGURADO - SENTENÇA MANTIDA. 1.
Nos termos do artigo 397 do Código Civil "o inadimplemento da obrigação, positiva e líquida, no seu termo, constitui de pleno direito em mora o devedor". 2 .
A mera alegação de dificuldade financeira não configura caso fortuito ou força maior, e tampouco, induz o afastamento dos encargos de mora. 3.
Verificado o ilícito contratual praticado pela requerida/apelante, em se tratando de dívida líquida e certa, configurada está mora, devendo incidir correção monetária e juros de mora conforme o disposto nos artigos 394 e 395 do Código Civil. 4 .
Recurso não provido. (TJ-MG - AC: 10000222194623001 MG, Relator.: Shirley Fenzi Bertão, Data de Julgamento: 07/12/2022, Câmaras Cíveis / 11ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 07/12/2022) EMENTA: APELAÇÕES CÍVEIS.
CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL.
CDC.
ATRASO NA ENTREGA DA OBRA.
LEGITIMIDADE PASSVA DA CONSTRUTORA.
RESSARCIMENTO DA COMISSÃO DE CORRETAGEM.
PRESCRIÇÃO.
NÃO CONFIGURADA.
CRISE FINANCEIRA.
CASO FORTUITO/FORÇA MAIOR.
NÃO CONFIGURADOS.
INVERSÃO CLÁUSULA PENAL MORATÓRIA.
POSSIBILIDADE.
STJ.
DANOS MORAIS.
DEVIDOS. 1.
A hipótese fática trata de indenização em face do atraso do atraso na entrega da obra. 2.
Afastada a preliminar de ilegitimidade passiva suscitada pela construtora, pois, com base na aplicação do Código de Defesa do Consumidor, é parte integrante da cadeia de consumo, e, portanto, fornecedora do produto, devendo responder solidariamente pelos eventuais danos causados ao adquirente. 3.
Em sede do julgamento do Recurso Repetitivo de Tema 938, o Superior Tribunal de Justiça proferiu entendimento no sentido de que à evidência de inadimplemento da construtora/incorporadora por atraso na entrega do imóvel, a pretensão à restituição dos valores pagos a título de comissão de corretagem é contada da resolução do contrato. 4.
Não operada a rescisão do negócio jurídico, descabe falar em prescrição. 5.
A suposta ocorrência de crise econômica não configura hipótese de caso fortuito ou força maior, porquanto é situação previsível e inerente à atividade da Construtora/incorporadora. 6.
Demonstrada a responsabilidade das promitentes vendedoras pelo atraso, é possível a aplicação inversão da cláusula penal moratória estipulada exclusivamente em desfavor dos adquirentes, como entende o STJ no Recurso Repetitivo de Tema 971. 7.
A mora injustificada e desarrazoada da construtora na entrega dos 02 imóveis adquiridos por mais de 05 anos reflete aborrecimento que extrapola o mero dissabor do cotidiano, frustrando a legítima expectativa do adquirente em usufruir do bem, direito intrinsecamente ligado ao direito à moradia, corolário da dignidade da pessoa humana. (STJ - AREsp: 2439077, Relator.: Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, Data de Publicação: 19/02/2024) O Apelante defende, ainda, a aplicação da Teoria do Adimplemento Substancial, argumentando ter pago 19 de 48 parcelas (quase metade do contrato) e que o veículo é essencial para sua subsistência.
Contudo, este Eg.
Tribunal e o Superior Tribunal de Justiça possuem entendimento consolidado e vinculante sobre a inaplicabilidade da Teoria do Adimplemento Substancial aos contratos de alienação fiduciária regidos pelo Decreto-Lei nº 911/69.
A Segunda Seção do STJ, no julgamento do REsp nº 1.622.555-MG (Rel. para acórdão Min.
Marco Aurélio Bellizze, julgado em 22/02/2017), decidiu expressamente pela incompatibilidade dessa teoria com a legislação específica da alienação fiduciária.
Cite-se: RECURSO ESPECIAL.
AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO.
CONTRATO DE FINANCIAMENTO DE VEÍCULO, COM ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM GARANTIA REGIDO PELO DECRETO-LEI 911/69.
INCONTROVERSO INADIMPLEMENTO DAS QUATRO ÚLTIMAS PARCELAS (DE UM TOTAL DE 48) .
EXTINÇÃO DA AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO (OU DETERMINAÇÃO PARA ADITAMENTO DA INICIAL, PARA TRANSMUDÁ-LA EM AÇÃO EXECUTIVA OU DE COBRANÇA), A PRETEXTO DA APLICAÇÃO DA TEORIA DO ADIMPLEMENTO SUBSTANCIAL.
DESCABIMENTO. 1.
ABSOLUTA INCOMPATIBILIDADE DA CITADA TEORIA COM OS TERMOS DA LEI ESPECIAL DE REGÊNCIA .
RECONHECIMENTO. 2.
REMANCIPAÇÃO DO BEM AO DEVEDOR CONDICIONADA AO PAGAMENTO DA INTEGRALIDADE DA DÍVIDA, ASSIM COMPREENDIDA COMO OS DÉBITOS VENCIDOS, VINCENDOS E ENCARGOS APRESENTADOS PELO CREDOR, CONFORME ENTENDIMENTO CONSOLIDADO DA SEGUNDA SEÇÃO, SOB O RITO DOS RECURSOS ESPECIAIS REPETITIVOS ( REsp n. 1 .418.593/MS). 3.
INTERESSE DE AGIR EVIDENCIADO, COM A UTILIZAÇÃO DA VIA JUDICIAL ELEITA PELA LEI DE REGÊNCIA COMO SENDO A MAIS IDÔNEA E EFICAZ PARA O PROPÓSITO DE COMPELIR O DEVEDOR A CUMPRIR COM A SUA OBRIGAÇÃO (AGORA, POR ELE REPUTADA ÍNFIMA), SOB PENA DE CONSOLIDAÇÃO DA PROPRIEDADE NAS MÃOS DO CREDOR FIDUCIÁRIO . 4.
DESVIRTUAMENTO DA TEORIA DO ADIMPLEMENTO SUBSTANCIAL, CONSIDERADA A SUA FINALIDADE E A BOA-FÉ DOS CONTRATANTES, A ENSEJAR O ENFRAQUECIMENTO DO INSTITUTO DA GARANTIA FIDUCIÁRIA.
VERIFICAÇÃO. 5 .
RECURSO ESPECIAL PROVIDO. 1.
A incidência subsidiária do Código Civil, notadamente as normas gerais, em relação à propriedade/titularidade fiduciária sobre bens que não sejam móveis infugíveis, regulada por leis especiais, é excepcional, somente se afigurando possível no caso em que o regramento específico apresentar lacunas e a solução ofertada pela "lei geral" não se contrapuser às especificidades do instituto regulado pela lei especial (ut Art. 1 .368-A, introduzido pela Lei n. 10931/2004). 1.1 Além de o Decreto-Lei n . 911/1969 não tecer qualquer restrição à utilização da ação de busca e apreensão em razão da extensão da mora ou da proporção do inadimplemento, é expresso em exigir a quitação integral do débito como condição imprescindível para que o bem alienado fiduciariamente seja remancipado.
Em seus termos, para que o bem possa ser restituído ao devedor, livre de ônus, não basta que ele quite quase toda a dívida; é insuficiente que pague substancialmente o débito; é necessário, para esse efeito, que quite integralmente a dívida pendente. 2.
Afigura-se, pois, de todo incongruente inviabilizar a utilização da ação de busca e apreensão na hipótese em que o inadimplemento revela-se incontroverso desimportando sua extensão, se de pouca monta ou se de expressão considerável , quando a lei especial de regência expressamente condiciona a possibilidade de o bem ficar com o devedor fiduciário ao pagamento da integralidade da dívida pendente .
Compreensão diversa desborda, a um só tempo, do diploma legal exclusivamente aplicável à questão em análise (Decreto-Lei n. 911/1969), e, por via transversa, da própria orientação firmada pela Segunda Seção, por ocasião do julgamento do citado Resp n. 1.418 .593/MS, representativo da controvérsia, segundo a qual a restituição do bem ao devedor fiduciante é condicionada ao pagamento, no prazo de cinco dias contados da execução da liminar de busca e apreensão, da integralidade da dívida pendente, assim compreendida como as parcelas vencidas e não pagas, as parcelas vincendas e os encargos, segundo os valores apresentados pelo credor fiduciário na inicial. 3.
Impor-se ao credor a preterição da ação de busca e apreensão (prevista em lei, segundo a garantia fiduciária a ele conferida) por outra via judicial, evidentemente menos eficaz, denota absoluto descompasso com o sistema processual.
Inadequado, pois, extinguir ou obstar a medida de busca e apreensão corretamente ajuizada, para que o credor, sem poder se valer de garantia fiduciária dada (a qual, diante do inadimplemento, conferia-lhe, na verdade, a condição de proprietário do bem), intente ação executiva ou de cobrança, para só então adentrar no patrimônio do devedor, por meio de constrição judicial que poderá, quem sabe (respeitada o ordem legal), recair sobre esse mesmo bem (naturalmente, se o devedor, até lá, não tiver dele se desfeito) . 4.
A teoria do adimplemento substancial tem por objetivo precípuo impedir que o credor resolva a relação contratual em razão de inadimplemento de ínfima parcela da obrigação.
A via judicial para esse fim é a ação de resolução contratual.
Diversamente, o credor fiduciário, quando promove ação de busca e apreensão, de modo algum pretende extinguir a relação contratual .
Vale-se da ação de busca e apreensão com o propósito imediato de dar cumprimento aos termos do contrato, na medida em que se utiliza da garantia fiduciária ajustada para compelir o devedor fiduciante a dar cumprimento às obrigações faltantes, assumidas contratualmente (e agora, por ele, reputadas ínfimas).
A consolidação da propriedade fiduciária nas mãos do credor apresenta-se como consequência da renitência do devedor fiduciante de honrar seu dever contratual, e não como objetivo imediato da ação.
E, note-se que, mesmo nesse caso, a extinção do contrato dá-se pelo cumprimento da obrigação, ainda que de modo compulsório, por meio da garantia fiduciária ajustada. 4 .1 É questionável, se não inadequado, supor que a boa-fé contratual estaria ao lado de devedor fiduciante que deixa de pagar uma ou até algumas parcelas por ele reputadas ínfimas mas certamente de expressão considerável, na ótica do credor, que já cumpriu integralmente a sua obrigação , e, instado extra e judicialmente para honrar o seu dever contratual, deixa de fazê-lo, a despeito de ter a mais absoluta ciência dos gravosos consectários legais advindos da propriedade fiduciária.
A aplicação da teoria do adimplemento substancial, para obstar a utilização da ação de busca e apreensão, nesse contexto, é um incentivo ao inadimplemento das últimas parcelas contratuais, com o nítido propósito de desestimular o credor - numa avaliação de custo-benefício - de satisfazer seu crédito por outras vias judiciais, menos eficazes, o que, a toda evidência, aparta-se da boa-fé contratual propugnada. 4.2 .
A propriedade fiduciária, concebida pelo legislador justamente para conferir segurança jurídica às concessões de crédito, essencial ao desenvolvimento da economia nacional, resta comprometida pela aplicação deturpada da teoria do adimplemento substancial. 5.
Recurso Especial provido. (STJ - REsp: 1622555 MG 2015/0279732-8, Relator.: Ministro MARCO BUZZI, Data de Julgamento: 22/02/2017, S2 - SEGUNDA SEÇÃO, Data de Publicação: DJe 16/03/2017) O racional é que a finalidade do Decreto-Lei nº 911/69 é dar maior efetividade à garantia fiduciária e à rápida recuperação do bem, incentivando o cumprimento integral da obrigação.
Permitir o adimplemento substancial nesses casos criaria um incentivo ao inadimplemento das últimas parcelas e desestimularia o credor a buscar seu crédito por vias mais eficazes.
Dessa forma, ainda que o Apelante tenha efetuado o pagamento de parte das parcelas, e considerando a essencialidade do bem para sua atividade, a jurisprudência dominante não autoriza a flexibilização da medida de busca e apreensão com base na Teoria do Adimplemento Substancial em contratos de alienação fiduciária.
No tocante à purgação da mora, a sentença corretamente aplicou o entendimento do STJ no REsp nº 1.418.593/MS, submetido ao regime dos recursos repetitivos.
Este julgado pacificou a orientação de que a purgação da mora, nos casos de alienação fiduciária sob a égide da Lei nº 10.931/2004, ocorre com o depósito da integralidade da dívida, compreendendo as parcelas vencidas e vincendas, bem como os encargos contratuais, custas processuais e honorários advocatícios, no prazo de 5 (cinco) dias após a execução da liminar.
Veja-se: ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA EM GARANTIA.
RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA.
ART. 543-C DO CPC .
AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO.
DECRETO-LEI N. 911/1969.
ALTERAÇÃO INTRODUZIDA PELA LEI N . 10.931/2004.
PURGAÇÃO DA MORA.
IMPOSSIBILIDADE .
NECESSIDADE DE PAGAMENTO DA INTEGRALIDADE DA DÍVIDA NO PRAZO DE 5 DIAS APÓS A EXECUÇÃO DA LIMINAR. 1.
Para fins do art. 543-C do Código de Processo Civil: "Nos contratos firmados na vigência da Lei n . 10.931/2004, compete ao devedor, no prazo de 5 (cinco) dias após a execução da liminar na ação de busca e apreensão, pagar a integralidade da dívida - entendida esta como os valores apresentados e comprovados pelo credor na inicial -, sob pena de consolidação da propriedade do bem móvel objeto de alienação fiduciária". 2.
Recurso especial provido . (STJ - REsp: 1418593 MS 2013/0381036-4, Relator.: Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Data de Julgamento: 14/05/2014, S2 - SEGUNDA SEÇÃO, Data de Publicação: DJe 27/05/2014 RMP vol. 54 p. 419 RSTJ vol. 235 p . 225) No caso dos autos, o Apelante não purgou a mora na forma e no prazo legal, tornando legítima a consolidação da propriedade e posse plena e exclusiva do bem em favor do credor fiduciário, conforme previsto no art. 3º, §§ 1º e 2º, do Decreto-Lei nº 911/69.
O Apelante pleiteia, alternativamente, o reconhecimento do direito à restituição proporcional dos valores já pagos após a venda do bem, citando o art. 2º do Decreto-Lei nº 911/69, art. 53 do CDC e art. 710 do CPC.
Neste ponto, a sentença de primeiro grau já foi clara e expressa ao determinar que "devendo eventual saldo credor ser restituído à promovida, após a alienação do bem objeto da lide".
Tal disposição está em perfeita consonância com o Art. 2º do Decreto-Lei nº 911/69, que prevê a aplicação do preço da venda do bem no pagamento do crédito do credor e despesas decorrentes, com a obrigação de entregar ao devedor o saldo apurado, se houver.
Trata-se de um direito assegurado ao devedor fiduciante, independentemente de pedido expresso, e que o próprio CDC (art. 53) veda a perda total das prestações pagas.
Portanto, a sentença já contemplou o pedido alternativo do Apelante, não havendo o que ser reformado nesse particular.
Diante do exposto, verifica-se que a sentença de primeiro grau se encontra em perfeita consonância com a legislação aplicável e com o entendimento dominante dos Tribunais Superiores, especialmente no que tange à alienação fiduciária.
As alegações do Apelante, embora compreensíveis em face da sua situação financeira, não encontram amparo para reformar o decidido, haja vista a rigidez e os precedentes específicos que regem os contratos de alienação fiduciária.
DISPOSITIVO Isso posto, VOTO no sentido de que este Colegiado CONHEÇA do recurso de Apelação Cível para rejeitar a preliminar de ofensa ao princípio da dialeticidade e NEGAR PROVIMENTO, mantendo integralmente a sentença de primeiro grau por seus próprios e jurídicos fundamentos.
Mantenho a condenação do Apelante ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, fixados em 20% da condenação, com a ressalva da justiça gratuita já concedida, nos termos do art. 98, §3º, do Código de Processo Civil. É como voto.
João Pessoa/PB, datado e assinado eletronicamente.
Inácio Jário Queiroz de Albuquerque RELATOR -
28/08/2025 21:09
Publicado Intimação de Pauta em 25/08/2025.
-
28/08/2025 21:09
Disponibilizado no DJ Eletrônico em 22/08/2025
-
22/08/2025 00:00
Intimação
Poder Judiciário Tribunal de Justiça da Paraíba Fica Vossa Excelência Intimado(a) da 53ª Sessão Ordinária Virtual, da 3ª Câmara Cível, a realizar-se de 01 de Setembro de 2025, às 14h00 , até 08 de Setembro de 2025. -
21/08/2025 21:19
Expedição de Outros documentos.
-
21/08/2025 19:06
Expedição de Outros documentos.
-
21/08/2025 19:04
Inclusão do processo para julgamento eletrônico de mérito
-
19/08/2025 15:02
Pedido de inclusão em pauta virtual
-
15/08/2025 14:25
Conclusos para despacho
-
14/08/2025 11:00
Concedida a Assistência Judiciária Gratuita a TACIEL JOSE DE FIGUEIREDO SOUZA - CPF: *58.***.*00-45 (APELANTE).
-
14/08/2025 11:00
Pedido de inclusão em pauta virtual
-
13/08/2025 08:18
Conclusos para despacho
-
13/08/2025 08:18
Juntada de Certidão
-
12/08/2025 08:44
Recebidos os autos
-
12/08/2025 08:44
Autos incluídos no Juízo 100% Digital
-
12/08/2025 08:44
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
12/08/2025
Ultima Atualização
09/09/2025
Valor da Causa
R$ 0,00
Documentos
DESPACHO • Arquivo
DECISÃO • Arquivo
ATO ORDINATÓRIO • Arquivo
SENTENÇA • Arquivo
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ATO ORDINATÓRIO • Arquivo
DESPACHO • Arquivo
DECISÃO • Arquivo
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