TJDFT - 0700906-61.2025.8.07.0014
1ª instância - Vara Civel do Guara
Polo Ativo
Polo Passivo
Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
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02/09/2025 03:19
Publicado Sentença em 02/09/2025.
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02/09/2025 03:19
Disponibilizado no DJ Eletrônico em 01/09/2025
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01/09/2025 00:00
Intimação
Poder Judiciário da União TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO DISTRITO FEDERAL E DOS TERRITÓRIOS 1VARCIVGUA Vara Cível do Guará Número do processo: 0700906-61.2025.8.07.0014 Classe judicial: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) AUTOR: GUSTAVO MAIA AGUIAR, BEATRIZ MAIA GARCIA REU: INTERVAL INTERNATIONAL BRASIL SERVICOS LTDA SENTENÇA I.
RELATÓRIO Trata-se de Ação Declaratória de Nulidade de Contrato cumulada com pedido de liminar em sede de tutela de urgência, proposta por GUSTAVO MAIA AGUIAR e BEATRIZ MAIA GARCIA em face de INTERVAL INTERNATIONAL BRASIL SERVICOS LTDA..
Os autores narraram que, em 17 de setembro de 2013, durante um período de férias na Flórida, Estados Unidos, foram convidados a participar de um café da manhã e uma palestra da empresa WESTGATE, com promessas de brindes e vantagens.
Alegaram que, nessa ocasião, foram submetidos a técnicas de venda agressivas, que incluíram oferta de drinques, canapés e sucessivas propostas comerciais, prolongando-se por horas, em um ambiente de pressão.
Afirmaram que não são fluentes em inglês e foram instigados a assinar um extenso contrato redigido em língua estrangeira.
Vencidos pelo cansaço, cederam à pressão e firmaram um contrato de utilização de instalações hoteleiras em regime de multipropriedade (timeshare) com a empresa WESTGATE, sob o número 9018519909, totalizando pagamentos de U$ 20.821,75.
Após uma leitura mais atenta, verificaram que o contrato não previa a possibilidade de cancelamento, exceto em um exíguo prazo.
Diante do arrependimento, pleitearam administrativamente a rescisão do contrato junto à WESTGATE, sem sucesso.
Postularam a declaração de nulidade do contrato e a restituição integral dos valores pagos, além de indenização por danos morais.
Fundamentaram seus pedidos na aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor (CDC), na competência da justiça brasileira (Art. 22, II, do CPC e precedentes do TJSP e STJ), na desnecessidade de tradução juramentada da documentação, e na legitimidade passiva da ré, por ser, supostamente, representante brasileira do Grupo Interval International e controladora da marca Westgate, ou por integrar a cadeia de consumo com a Westgate.
No mérito, alegaram obrigações manifestamente desproporcionais, ausência de previsão de cancelamento do contrato (de duração vitalícia, conforme afirmaram), descumprimento do dever de informações essenciais, venda emocional e vício de consentimento.
Requereram a restituição integral dos valores pagos ou, subsidiariamente, de 90% destes, além de indenização por danos morais pela conduta ilícita da ré e aplicação da teoria do desvio produtivo do consumidor.
Em sede de tutela de urgência, requereram a suspensão imediata das cobranças e a abstenção de inscrição de seus nomes em cadastros de devedores.
A probabilidade do direito foi argumentada com base no ilícito contratual e nas recusas imotivadas de cancelamento, enquanto o perigo de dano estaria na continuidade das cobranças e possível negativação.
Juntaram os autores com a petição inicial, dentre outros documentos: Petição Inicial, Procuraçao, CNH, Comprovante de residência, Contrato, Contrato Interval, Notificação Westgate, email notificação, payment-history-9018519909, e Cálculos.
Inicialmente, o Juízo determinou a emenda da inicial para a juntada de contrato legível e traduzido, bem como comprovante de pagamento das custas e comprovante de endereço atualizado.
Os autores emendaram a inicial, juntando comprovante de pagamento de custas e comprovante de residência atualizado.
Nova decisão reiterou o prazo para juntada do contrato legível e traduzido.
Em resposta, os autores apresentaram a tradução juramentada de parte do contrato.
Foi proferida decisão deferindo a tutela de urgência para: a) suspender imediatamente as cobranças referentes ao contrato nº 9018519909; b) determinar que a ré se abstivesse de inscrever o nome dos autores em cadastros de inadimplentes, sob pena de multa diária.
A decisão inicial dispensou a audiência de conciliação ou mediação.
A ré, INTERVAL INTERNATIONAL BRASIL SERVICOS LTDA, devidamente citada, apresentou contestação, alegando, preliminarmente: 1.
Ilegitimidade Passiva: Argumentou que o contrato objeto da ação foi firmado com a empresa americana WESTGATE VACATION VILLAS, LLC, da qual a INTERVAL não é parte.
Afirmou que a INTERVAL atua exclusivamente como agência prestadora de serviços de intercâmbio, sem comercializar imóveis ou manter vínculo societário ou administrativo com a WESTGATE, refutando a tese de grupo econômico ou "dona da marca".
Mencionou que a afiliação dos autores com a INTERVAL expirou em 21/05/2016.
Juntou o Contrato Social da Interval (Doc. 01) e precedentes do TJSP que reconhecem a ilegitimidade da INTERVAL em casos análogos (Agravo de Instrumento nº 2046027-41.2022.8.26.0000 – Doc. 03; Apelação Cível nº 1056149-24.2022.8.26.0100 – Doc. 04; Apelação Cível nº 1019873-31.2021.8.26.0196 – Doc. 05; Autos n° 1137480-91.2023.8.26.0100 – Doc. 06; Autos n° 1123207-73.2024.8.26.0100 – Doc. 07). 2.
Inépcia da Inicial: Sustentou a inépcia da inicial pela ausência da tradução juramentada integral do contrato de compra e venda (ID 224525843), mencionando que a "página 2" onde se encontram cláusulas da aquisição, não foi traduzida, em violação ao Art. 192, parágrafo único, do CPC. 3.
Incompetência da Autoridade Brasileira e Inaplicabilidade da Lei Brasileira: Alegou a incompetência da justiça brasileira e a inaplicabilidade da lei brasileira, incluindo o CDC, por se tratar de contrato firmado em solo americano, regido pelas leis da Flórida (Cláusula 23 do contrato – ID 224525843), tendo como objeto um direito real de propriedade imóvel situado no exterior, conforme Arts. 9º e 12, §1º, da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB) e precedentes do TJSP. 4.
Incompetência Absoluta em Razão da Matéria: Argumentou que, sendo o objeto um direito real de propriedade imobiliária (multipropriedade) na Flórida, a competência absoluta é do foro de situação da coisa, conforme Art. 47 do CPC. 5.
Decadência ou Prescrição: Afirmou que o contrato foi firmado em 2013 e a ação proposta em 2025, de modo que os prazos de arrependimento (7 dias - Art. 49 CDC), vícios (30/90 dias - Art. 26 CDC), reparação de danos (5 anos - Art. 27 CDC) ou responsabilidade contratual (10 anos - Art. 205 CC) estariam todos expirados.
No mérito, a ré defendeu que a multipropriedade é um direito real (Art. 1.358-B e seguintes do Código Civil), não um mero programa de férias, e que a responsabilidade da empresa de intercâmbio (INTERVAL) é limitada ao seu contrato de afiliação, conforme Art. 1.358-P, inc.
VI, do CC.
Asseverou a ausência de nexo causal entre sua conduta e os fatos narrados na inicial, os quais se referem à WESTGATE.
Rebateu a alegação de abusividade de cláusulas, a qual não autorizaria o desfazimento unilateral da aquisição de imóvel 12 anos depois, e a possibilidade de aluguel ou venda do direito de propriedade pelos autores.
Por fim, contestou o pedido de indenização por dano moral, por considerar os fatos mero descumprimento contratual sem abalo à honra ou dignidade, e vedação ao enriquecimento sem causa (Art. 884 do Código Civil), dado o usufruto da propriedade pelos autores por longos anos.
Pleiteou a extinção do feito sem resolução do mérito ou, subsidiariamente, a improcedência dos pedidos.
A decisão que concedeu a tutela de urgência foi objeto de agravo de instrumento interposto pela ré.
O recurso foi conhecido, mas o pedido de antecipação de tutela recursal foi indeferido, mantendo-se a decisão de primeira instância.
O Relator do agravo de instrumento entendeu que a análise da legitimidade da agravante e sua eventual vinculação ao contrato principal exigia dilação probatória, e que a alegação de ilegitimidade, por si só, não autorizava a suspensão da liminar.
Os autores apresentaram réplica, reiterando suas alegações de legitimidade passiva da ré com base na teoria da aparência e na inserção da INTERVAL na cadeia de consumo, em virtude do contrato de afiliação coligado ao contrato de timeshare.
Insistiram na competência da justiça brasileira e na inaplicabilidade da decadência/prescrição, por entenderem que a rescisão se deu por defeito na prestação de serviços.
Citaram jurisprudência do TJSP e do STJ para reforçar seus argumentos.
Intimadas a especificar provas, ambas as partes informaram que não possuíam mais provas a produzir e requereram o julgamento antecipado do feito. É o relatório.
Decido.
FUNDAMENTAÇÃO A ordem processual impõe que as questões preliminares e prejudiciais de mérito sejam analisadas antes que se adentre ao exame do mérito da causa.
Acolhendo as preliminares e prejudiciais suscitadas pela ré, a resolução do mérito é inviabilizada, levando à extinção do processo sem julgamento de mérito ou à improcedência dos pedidos formulados na inicial.
Da Ilegitimidade Passiva da Ré INTERVAL INTERNATIONAL BRASIL SERVICOS LTDA Os autores fundamentaram a legitimidade passiva da ré na premissa de que a INTERVAL INTERNATIONAL BRASIL SERVICOS LTDA seria "representante brasileira do Grupo Interval International, empresa norte americana com sede em Miami e em São Paulo, dona e detentora da marca Westgate", ou que integraria o mesmo grupo econômico e, por conseguinte, a cadeia de consumo.
Alegaram, ainda, a aplicação da Teoria da Aparência para justificar a inclusão da ré no polo passivo.
Essa questão é de mérito.
E, no mérito, entende que o pedido não pode ser acolhido.
Em uma análise detida dos elementos probatórios e das normas aplicáveis revela que a ré, INTERVAL INTERNATIONAL BRASIL SERVICOS LTDA, não pode responder ao pedido de nulidade ou rescisão do contrato de compra e venda de imóvel em regime de multipropriedade.
Conforme demonstrado pela própria ré em sua contestação e corroborado pelos documentos apresentados, a INTERVAL INTERNATIONAL BRASIL SERVICOS LTDA é uma empresa que não tem como objeto social a comercialização de imóveis.
Sua atuação restringe-se, de forma exclusiva, à prestação de serviços de intercâmbio de hospedagem.
Essa parceria comercial é estabelecida com diversos resorts em várias partes do mundo, sendo a WESTGATE apenas um deles.
Não há qualquer vínculo societário ou administrativo que ligue a INTERVAL à WESTGATE, nem a INTERVAL é "dona e detentora da marca Westgate".
A própria ré, em seu Contrato Social (documento anexo à contestação – Doc. 01), demonstra o seu escopo de atividade, que se distancia da incorporação ou venda de propriedades.
O contrato cuja nulidade ou rescisão os autores buscam é o "Purchase and Sale Agreement" (Contrato de Compra e Venda de Imóvel), celebrado diretamente com a empresa incorporadora americana WESTGATE VACATION VILLAS, LLC.
Este contrato, como bem esclarecido pela ré, encerra a aquisição de uma fração de propriedade imobiliária em regime jurídico de multipropriedade, um direito real.
A própria ré afirma que o contrato com ela não está mais vigente e, por isso, os autores não serão mais dela cobrados ou usufruirão dos serviços de compartilhamento de hospedagem em outros resorts.
A distinção entre as atividades da WESTGATE (venda de propriedade em multipropriedade) e da INTERVAL (serviços de intercâmbio de hospedagem) é fundamental.
O serviço prestado pela INTERVAL é acessório e opcional, de tal forma que a afiliação dos autores a este serviço, que ocorreu entre 09/10/2013 e 21/05/2016, expirou por opção dos próprios autores e não foi renovada.
Este fato por si só já demonstra a ausência de um vínculo duradouro ou essencial da INTERVAL com a essência do negócio de aquisição da propriedade.
Mesmo durante o período de afiliação, a INTERVAL não era a vendedora do imóvel, mas apenas uma facilitadora de trocas de tempo de uso em rede hoteleira.
Não se sustenta a tese de grupo econômico ou cadeia de consumo para justificar a responsabilidade solidária da INTERVAL pela rescisão do contrato de compra de imóvel.
Conforme precedentes do E.
Tribunal de Justiça de São Paulo, em casos fática e juridicamente idênticos ao presente, a ilegitimidade da INTERVAL para responder por contratos de multipropriedade firmados com a WESTGATE tem sido reiteradamente reconhecida.
Precedente: PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS – Ação de anulação contratual c/c rescisão e devolução de valores pagos – Celebração de contrato pelos autores, enquanto estavam nos EUA, pela modalidade time-sharing – Pretensão de rescisão do contrato e restituição do valor que fora pago – Ajuizamento da ação contra a empresa Interval Internacional Brasil Serviços Ltda. – Descabimento – Avença ajustada com a empresa WestGate Lake, com endereço nos EUA – Cláusula contratual prevendo que a negociação seria feita pela empresa Interval Internacional, mas dando expressa ciência aos autores de que essa empresa não é parte do grupo WestGate – Aposição de rubrica ao lado da referida regra contratual – Inexistência de alegação de que a WestGate é empresa insolvente, situação que poderia até justificar a propositura da ação contra a intermediadora – Parceria existente entre tais empresas, o que não as torna pertencentes a um mesmo grupo societário ou econômico – Precedente deste Tribunal de Justiça, no sentido da ilegitimidade da Interval – Ausência de razão que permita responsabilizar a Interval pelo contrato que os autores celebraram com a WestGate – Sentença mantida – Recurso improvido. (TJ-SP - Apelação Cível: 1056149-24.2022 .8.26.0100 São Paulo, Relator.: Caio Marcelo Mendes de Oliveira, Data de Julgamento: 26/10/2023, 32ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 26/10/2023) O Agravo de Instrumento nº 2046027-41.2022.8.26.0000 (Doc. 03 da contestação) estabeleceu que a representante da Interval International no Brasil "não é a empresa responsável pela celebração do negócio que se pretende que seja desfeito, mas apenas aquela que negocia os créditos em uma rede".
A decisão ressaltou a impossibilidade de a empresa com representação no Brasil cumprir a pretensão dos autores, "pois ela não era a detentora da propriedade transferida", e julgou extinto o processo principal sem resolução do mérito por ilegitimidade passiva.
Na Apelação Cível nº 1056149-24.2022.8.26.0100 (Doc. 04 da contestação), o TJSP foi ainda mais explícito ao afirmar que "está claramente demonstrado que eles sabiam que a ré não fazia parte do grupo WestGate, não havendo razão para que optassem por se voltarem contra ela".
A Corte destacou que a parceria comercial entre as empresas não as torna "pertencentes a um mesmo grupo societário e econômico e isto, por si só, não induz à responsabilidade pretendida".
A Apelação Cível nº 1019873-31.2021.8.26.0196 (Doc. 05 da contestação) ratificou esse entendimento, afirmando que "não se vislumbra a aventada existência de grupo econômico que pudesse posicionar a INTERVAL INTERNATIONAL BRASIL SERVICES LTDA como controladora do grupo WESTGATE LAKES".
A atividade da INTERVAL foi resumida a "ampliar as possibilidades de hospedagem dos adquirentes do empreendimento, por meio de negociação de créditos em rede", e não à comercialização de timesharing.
Em sentido consonante, a Sentença dos Autos n° 1137480-91.2023.8.26.0100 (Doc. 06 da contestação) e a Sentença dos Autos n° 1123207-73.2024.8.26.0100 (Doc. 07 da contestação) reiteraram que "o que se discute neste processo não é mero contrato de prestação de serviço ou fornecimento de produtos duráveis/não duráveis.
Discute-se, na verdade, um direito real de propriedade localizado em um Estado estrangeiro".
Ambas as decisões concluíram que "o pedido de desfazimento de propriedade só pode ser atendido por aquele que efetivamente transmitiu o direito real".
A solidariedade prevista no Código de Defesa do Consumidor, embora ampla, é pensada para a dinâmica de responsabilidade por defeitos ou vícios de produtos e serviços, que se inserem em relações jurídicas de natureza pessoal.
No caso de um direito real de propriedade, como a multipropriedade, a solidariedade do CDC não pode desvirtuar a realidade de que a pretensão de desfazimento da propriedade só pode ser direcionada à parte que efetivamente transmitiu o direito real.
Portanto, a ré INTERVAL INTERNATIONAL BRASIL SERVICOS LTDA, não sendo a parte contratante do "Purchase and Sale Agreement" (Contrato de Compra e Venda de Imóvel), nem detendo a propriedade objeto do negócio, e não havendo vínculo de grupo econômico ou controle com a WESTGATE, não possui legitimidade para responder aos pedidos de nulidade ou rescisão deste contrato.
A Teoria da Aparência, invocada pelos autores, não se aplica quando a distinção entre as empresas e a natureza do negócio são claras, como reiteradamente apontado pelos tribunais.
Da Inépcia da Inicial – Ausência de Tradução Juramentada Integral A ré arguiu a inépcia da inicial em razão de não ter sido apresentada a tradução juramentada integral do "Purchase and Sale Agreement" (Contrato de Compra e Venda de Imóvel), em violação ao disposto no Art. 192, parágrafo único, do Código de Processo Civil.
O Art. 192, parágrafo único, do CPC é claro ao determinar que "O documento redigido em língua estrangeira somente poderá ser juntado aos autos quando acompanhado de versão para a língua portuguesa tramitada por via diplomática ou pela autoridade central, ou firmada por tradutor juramentado".
Esta é uma norma processual de observância obrigatória, que visa garantir a compreensão plena e inequívoca dos termos de um documento por todas as partes envolvidas no processo, incluindo os advogados e o próprio juízo.
Embora os autores tenham apresentado uma tradução juramentada de parte do contrato após as determinações judiciais, a ré especificamente contestou a sua integralidade, apontando a ausência da "página 2 do Contrato de Compra e Venda" onde, segundo a contestação, se encontrariam cláusulas essenciais da aquisição.
A legitimidade dessa alegação, por si só, já lança dúvida sobre a possibilidade de uma análise completa e justa dos termos contratuais disputados.
A complexidade de um contrato de compra e venda de propriedade em regime de multipropriedade, firmado em outro país e regido por legislação estrangeira, exige que todos os seus termos estejam acessíveis e inteligíveis na língua vernácula.
A falta de uma tradução juramentada que abranja a integralidade do documento original, especialmente no que tange a cláusulas centrais do negócio jurídico, impede a devida instrução processual e a análise probatória.
Nesse sentido, a jurisprudência, como o julgado do TJSP na Apelação Cível 1001750-55.2021.8.26.0011 (Doc. de contestação), enfatiza a indispensabilidade da tradução juramentada de documentos em língua estrangeira, para a boa-fé processual e a garantia de um julgamento justo.
A alegação dos autores de que a tradução seria dispensável por ser o documento "comum às partes" e que seu teor seria conhecido, não merece acolhimento.
A interpretação de um contrato estrangeiro complexo por um juízo brasileiro, para fins de determinar sua nulidade ou rescisão, não pode prescindir da integralidade de sua tradução juramentada, não apenas para as partes, mas para o sistema de justiça como um todo.
Assim, a falha na apresentação da tradução juramentada integral e incontroversa do contrato obsta a análise completa da matéria, tornando a petição inicial inepta em relação ao objeto do contrato de compra e venda.
Da Decadência ou, Subsidiariamente, Prescrição A ré sustentou a ocorrência de decadência ou, subsidiariamente, de prescrição, argumentando que o contrato foi firmado em 17 de setembro de 2013 e a presente ação somente foi proposta em 03 de fevereiro de 2025.
Mesmo que, hipoteticamente, as leis brasileiras fossem aplicáveis e este juízo fosse competente — premissas já afastadas —, a pretensão dos autores estaria fulminada pelos prazos legais.
Se a relação fosse interpretada puramente sob o prisma consumerista, aplicando-se o Código de Defesa do Consumidor (CDC), os prazos seriam: · Direito de Arrependimento (Art. 49 do CDC): O prazo para o consumidor arrepender-se de contrato firmado fora do estabelecimento comercial é de 7 (sete) dias.
O contrato foi celebrado em 17/09/2013, e a manifestação de arrependimento, por meio da notificação extrajudicial, ocorreu apenas em 13 de setembro de 2019, ou seja, quase seis anos após a assinatura, e a ação judicial apenas em 2025.
Este prazo, portanto, foi largamente superado. · Prazos para Vícios (Art. 26 do CDC): Para reclamar de vícios aparentes ou de fácil constatação, o prazo é de 90 (noventa) dias, tratando-se de produtos ou serviços duráveis.
O contrato é de 2013, e a alegação de "defeito na prestação de serviços" somente veio à tona com a notificação em 2019 e a ação em 2025.
Claramente, o prazo de 90 dias também foi extrapolado. · Prescrição para Reparação de Danos (Art. 27 do CDC): O prazo prescricional para a pretensão à reparação pelos danos causados por fato do produto ou do serviço é de 5 (cinco) anos, contados a partir do conhecimento do dano e de sua autoria.
Mesmo que se considere a data da notificação extrajudicial (13/09/2019) como o termo inicial para o "conhecimento do dano", o prazo de 5 anos se encerraria em 13/09/2024.
A ação, protocolada em 03/02/2025, estaria, portanto, prescrita sob esta ótica.
Se, porventura, a questão fosse enquadrada sob o Código Civil, aplicável de forma supletiva ao direito de multipropriedade e a relações não puramente consumeristas, o prazo geral para as pretensões pessoais, quando a lei não fixe prazo menor, é de 10 (dez) anos, conforme o Art. 205 do Código Civil.
Considerando que o contrato foi firmado em 17 de setembro de 2013, o prazo decenal se esgotaria em 17 de setembro de 2023.
A propositura da ação em 03 de fevereiro de 2025 ocorreu após este termo final.
Desse modo, a pretensão dos autores de rescisão contratual e restituição de valores, mesmo sob a égide do prazo decenal, estaria atingida pela prescrição.
A tese dos autores de que o prazo prescricional teria início a partir da "ciência inequívoca do fato danoso", quando efetuaram a notificação extrajudicial em 2019, não altera a conclusão.
Mesmo adotando esse marco temporal (13/09/2019), o prazo decenal se encerraria em 13/09/2029, mas o prazo de 5 anos do CDC (se aplicável), já se findaria em 13/09/2024, antes do ajuizamento da ação em 2025.
Contudo, prevalece o entendimento de que a pretensão nasce com a violação do direito, que no caso de um vício (ainda que oculto) ou descumprimento, deveria ter sido percebido em tempo hábil, não podendo ser postergado indefinidamente.
O "arrependimento" posterior, após anos de fruição ou possibilidade de fruição do bem (como alegado pela ré sobre o usufruto pelos autores), não pode servir de artifício para revigorar prazos legais já escoados.
Pelo exposto, a presente demanda está fulminada pela prescrição decenal, ou, em uma interpretação mais restrita aos prazos consumeristas (já refutada), pela decadência ou prescrição quinquenal.
Da Revogação da Tutela de Urgência A tutela de urgência foi concedida com base na probabilidade do direito dos autores, em conformidade com a legislação consumerista e a jurisprudência pátria, e no perigo de dano representado pela continuidade das cobranças e possível negativação.
Contudo, a análise das questões preliminares e prejudiciais de mérito demonstrou a ausência de legitimidade passiva da ré INTERVAL INTERNATIONAL BRASIL SERVICOS LTDA, a inépcia da inicial pela falta de tradução juramentada integral do contrato de compra e venda de imóvel, a incompetência da autoridade judiciária brasileira para julgar a demanda e a inaplicabilidade da lei brasileira, e a ocorrência da decadência ou prescrição da pretensão autoral.
Diante da ausência de sustentação dos fundamentos que embasaram a probabilidade do direito dos autores, o requisito para a concessão da tutela de urgência não mais se encontra presente.
Consequentemente, a decisão que deferiu a liminar deve ser revogada, retornando as partes ao status quo ante no que se refere às cobranças e à possibilidade de negativação.
III.
DISPOSITIVO Diante do exposto e por tudo mais que dos autos consta, julgo improcedentes os pedidos contra a ré.
JULGO IMPROCEDENTES OS PEDIDOS formulados por GUSTAVO MAIA AGUIAR e BEATRIZ MAIA GARCIA em face de INTERVAL INTERNATIONAL BRASIL SERVICOS LTDA, com resolução do mérito.
REVOGO a tutela de urgência concedida anteriormente na decisão (ID 228930324), restabelecendo a situação anterior no que se refere às cobranças e à possibilidade de inscrição dos nomes dos autores em cadastros de inadimplentes.
Condeno os autores ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios da parte ré, que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, com base no Art. 85, §2º, do Código de Processo Civil, considerando o zelo profissional, a complexidade da causa e o trabalho realizado.
Documento datado e assinado pelo(a) magistrado(a) conforme certificação digital.
Alex Costa de Oliveira Juiz de Direito -
29/08/2025 11:49
Recebidos os autos
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29/08/2025 11:49
Julgado improcedente o pedido
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08/08/2025 15:49
Conclusos para decisão para Juiz(a) ALEX COSTA DE OLIVEIRA
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22/07/2025 16:54
Juntada de Petição de petição
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03/07/2025 14:31
Juntada de Petição de petição
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01/07/2025 03:08
Publicado Certidão em 01/07/2025.
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01/07/2025 03:08
Disponibilizado no DJ Eletrônico em 30/06/2025
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27/06/2025 15:32
Expedição de Certidão.
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27/06/2025 14:59
Juntada de Petição de réplica
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12/06/2025 02:57
Publicado Certidão em 12/06/2025.
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12/06/2025 02:57
Disponibilizado no DJ Eletrônico em 11/06/2025
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10/06/2025 15:02
Expedição de Certidão.
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10/06/2025 12:57
Juntada de Ofício entre órgãos julgadores
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05/06/2025 22:46
Juntada de Petição de contestação
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19/05/2025 02:22
Juntada de Petição de entregue (ecarta)
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19/05/2025 02:22
Juntada de Petição de entregue (ecarta)
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29/04/2025 12:27
Expedição de Certidão.
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29/04/2025 12:26
Expedição de Aviso de recebimento (AR).
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29/04/2025 12:25
Expedição de Aviso de recebimento (AR).
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28/04/2025 18:53
Juntada de Certidão
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15/04/2025 17:14
Expedição de Outros documentos.
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13/03/2025 15:49
Recebidos os autos
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13/03/2025 15:49
Concedida a tutela provisória
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12/03/2025 17:04
Conclusos para decisão para Juiz(a) ALEX COSTA DE OLIVEIRA
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27/02/2025 16:04
Juntada de Petição de emenda à inicial
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14/02/2025 02:41
Publicado Decisão em 14/02/2025.
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13/02/2025 02:33
Disponibilizado no DJ Eletrônico em 13/02/2025
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10/02/2025 18:12
Recebidos os autos
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10/02/2025 18:12
Determinada a emenda à inicial
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10/02/2025 17:26
Conclusos para decisão para Juiz(a) ALEX COSTA DE OLIVEIRA
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06/02/2025 19:36
Juntada de Petição de certidão
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05/02/2025 13:15
Juntada de Petição de emenda à inicial
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05/02/2025 03:17
Publicado Decisão em 05/02/2025.
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05/02/2025 03:17
Disponibilizado no DJ Eletrônico em 04/02/2025
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03/02/2025 16:22
Recebidos os autos
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03/02/2025 16:22
Determinada a emenda à inicial
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03/02/2025 15:00
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
03/02/2025
Ultima Atualização
02/09/2025
Valor da Causa
R$ 0,00
Detalhes
Documentos
Sentença • Arquivo
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