TJCE - 3000048-90.2023.8.06.0087
2ª instância - Câmara / Desembargador(a) 5ª Turma Recursal dos Juizados Especiais
Processos Relacionados - Outras Instâncias
Polo Ativo
Polo Passivo
Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
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18/09/2024 09:09
Remetidos os Autos (por julgamento definitivo do recurso) para juízo de origem
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18/09/2024 09:09
Juntada de Certidão
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18/09/2024 09:09
Transitado em Julgado em 17/09/2024
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18/09/2024 00:01
Decorrido prazo de FRANCISCO RODRIGUES DE SOUSA em 17/09/2024 23:59.
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18/09/2024 00:01
Decorrido prazo de BANCO BRADESCO S/A em 17/09/2024 23:59.
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27/08/2024 00:00
Publicado Intimação em 27/08/2024. Documento: 13998744
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26/08/2024 00:00
Intimação
ESTADO DO CEARÁ PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA FÓRUM DAS TURMAS RECURSAIS PROF.
DOLOR BARREIRA GABINETE 2 DA QUINTA TURMA RECURSAL PROCESSO N°. 3000048-90.2023.8.06.0087 RECURSO INOMINADO REQUERENTE: BANCO BRADESCO S/A REQUERIDO(A): FRANCISCO RODRIGUES DE SOUSA JUIZ RELATOR: MARCELO WOLNEY A P DE MATOS EMENTA RECURSO INOMINADO.
AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO COM REPARAÇÃO DE DANOS MORAIS E PEDIDO DE RESTITUIÇÃO DO INDÉBITO.
EMPRÉSTIMO CONSIGNADO.
SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS LANÇADOS NA PEÇA INICIAL.
RECURSO DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA.
APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR.
RELAÇÃO DE CONSUMO.
INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA.
RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO FORNECEDOR DE SERVIÇOS.
CONTRATO NÃO APRESENTADO PELA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA.
CONTRATAÇÃO COM ANALFABETO.
INSTRUMENTO CONTRATUAL QUE OBEDECE ÀS EXIGÊNCIAS DO ART. 595 DO CÓDIGO CIVIL NÃO APRESENTADO.
PRECEDENTE FIRMADO PELO TJCE EM INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS.
CRÉDITO NÃO COMPROVADO.
FALHA NA PRESTAÇÃO DOS SERVIÇOS.
IRREGULARIDADE NA CONTRATAÇÃO.
NEGÓCIO JURÍDICO FRAUDULENTO.
DETERMINAÇÃO DA REPETIÇÃO DO INDÉBITO EM DOBRO NA ORIGEM.
REFORMA.
DEVOLUÇÃO DOS VALORES DESCONTADOS DE FORMA SIMPLES, EM RELAÇÃO AOS ANTERIORES A MARÇO DE 2021.
DANO MORAL CONFIGURADO.
QUANTUM INDENIZATÓRIO COMPATÍVEL COM A EXTENSÃO DO DANO MORAL.
VALOR DA MULTA POR NÃO CUMPRIMENTO DA OBRIGAÇÃO DE CESSAR OS DESCONTOS PAUTADO NA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE.
APLICAÇÃO DO PRECEITO CONSTANTE DO ENUNCIADO 103 DO FONAJE.
RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.
SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA.
DECISÃO MONOCRÁTICA R E L A T Ó R I O 01.
FRANCISCO RODRIGUES DE SOUSA ingressou com AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO COM REPARAÇÃO DE DANOS MORAIS E PEDIDO DE RESTITUIÇÃO DO INDÉBITO em face do BANCO BRADESCO S.A., arguindo em sua peça inicial, que teve descontos indevidos em seu benefício previdenciário, devido a contrato de empréstimo consignado de nº 0123356947067, no valor total de R$ 6.822,72, com 72 (setenta e duas) parcelas de R$ 94,76, o qual alega não ter contratado. 02.
A peça inicial veio instruída com o extrato de consignados emitido pelo INSS (id 8349089), no qual se vê a presença do contrato em discussão, bem como documentos pessoais do autor com indicação de não ser alfabetizado (analfabeto) (id 8349085). 03.
Por tais razões, ingressou com a presente ação requerendo a declaração de nulidade do negócio jurídico supracitado, a restituição em dobro dos valores descontados indevidamente em seu benefício e a condenação da instituição financeira promovida ao pagamento de indenização por danos morais. 04.
Em sede de contestação (id 8349205), a instituição financeira argui, preliminarmente, a ausência de interesse processual, haja vista a falta de requerimento administrativo; a prescrição trienal.
No que se refere a preliminar de conexão, aduz que o autor ajuizou outra demanda, sob o n° 3000049-75.2023.8.06.0087, com causa de pedir semelhante à desta ação. 05.
No tocante ao mérito, alegou que o contrato de empréstimo foi realizado na forma devida, pois a parte autora assinou com sua digital a avença, que possui também a assinatura de duas testemunhas e se beneficiou do valor do empréstimo, estando os descontos em exercício regular de direito.
Destaca-se que o banco não anexou o contrato de empréstimo consignado aos autos. 06.
Sentença de primeiro grau (id 8349214) julgou procedente os pedidos formulados pelo autor, reconhecendo a irregularidade da contratação estando ausente o contrato sobre o empréstimo, entendeu por: a) declarar a nulidade do negócio jurídico (contrato nº 0123356947067); b) condenar a instituição financeira à restituição, em dobro, dos valores indevidamente descontados no benefício previdenciário da parte autora; e c) danos morais na quantia de R$ 4.000,00 (quatro mil reais).
Por fim, determinou que a instituição financeira cessasse os descontos na conta bancária de titularidade da parte autora, a partir da intimação da sentença, sob pena de incidência de multa, no importe de R$ 500,00 (quinhentos reais) a cada desconto, limitado a R$ 10.000,00 (dez mil reais). 07.
Irresignada, a instituição financeira interpôs recurso inominado (id 8349221), arguindo, preliminarmente, a concessão de efeito suspensivo.
No mérito, pugna pela reforma da sentença para julgar totalmente improcedentes os pedidos formulados em peça inicial, ratificando a regularidade da contratação.
Por fim, requer a minoração do valor da multa estipulada, visto que desatende aos critérios de razoabilidade e proporcionalidade. 08.
Contrarrazões em id 8349248, pela manutenção da decisão proferida pelo juízo a quo, tendo em vista a irregularidade da contratação. 09.
Presentes os requisitos de admissibilidade dispostos no artigo 42 (tempestividade) e 54, parágrafo único (preparo) da Lei nº 9.099/95, conheço do Recurso Inominado. 10.
Inicialmente anoto que dou o efeito apenas devolutivo ao recurso, por expressa disposição legal, nos moldes do art. 43, da Lei nº 9.099/95, bem como por ausência de situação possível de causar dano irreparável para a parte, razão pela qual fica superado o pedido acerca da concessão de efeito suspensivo. 11.
Entendo que ante os respeitáveis argumentos levantados aos autos pela parte recorrente, o presente recurso inominado merece prosperar, devendo ser parcialmente reformada a sentença atacada. 12.
Anote-se de início, que a matéria posta em análise, se trata, obviamente, de uma relação tipicamente consumerista, situação reconhecida na sentença atacada, impondo-se a inversão do ônus da prova e responsabilidade objetiva do fornecedor de serviços. 13.
Registre-se que consagra o CDC, a responsabilidade objetiva do fornecedor de serviços, de acordo com o expresso no art. 14, caput, ou seja, "responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços". 14.
No entanto, ainda que se trate de relação de consumo e de responsabilidade objetiva da ré, não isenta o consumidor de produzir a prova mínima do fato constitutivo de seu direito, consoante artigo 373, I do CPC, comprovando, pois, os elementos ensejadores da responsabilidade civil, a saber, a conduta, o dano e o nexo de causalidade. 15.
Evidenciado o direito da parte autora, cabe a parte promovida provar a existência de fato extintivo desse direito, consoante disposto no art. 373, II, do CPC. 16.
Assim, cabe ao autor trazer aos autos a demonstração de fatos constitutivos de seu direito, mas se a ré alega, em contestação, a existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor, atrai para si o ônus de provar tais circunstâncias, sob pena de sucumbir aos articulados da inicial (art. 373 do CPC). 17.
O cerne da controvérsia envolve a definição da regularidade da contratação de empréstimo consignado pelo autor para com a instituição financeira promovida. 18.
O caso em tela enquadra-se na tese firmada nos autos de Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR), recentemente julgado pelo TJCE (Processo nº 0630366-67.2019.8.06.0000), nos seguintes termos: É CONSIDERADO LEGAL O INSTRUMENTO PARTICULAR ASSINADO A ROGO E SUBSCRITO POR DUAS TESTEMUNHAS PARA A CONTRATAÇÃO DE EMPRÉSTIMOS CONSIGNADOS ENTRE PESSOAS ANALFABETAS E INSTITUIÇÕES FINANCEIRAS, NOS DITAMES DO ART. 595 DO CC, NÃO SENDO NECESSÁRIO INSTRUMENTO PÚBLICO PARA A VALIDADE DA MANIFESTAÇÃO DE VONTADE DO ANALFABETO NEM PROCURAÇÃO PÚBLICA DAQUELE QUE ASSINA A SEU ROGO, CABENDO AO PODER JUDICIÁRIO O CONTROLE DO EFETIVO CUMPRIMENTO DAS DISPOSIÇÕES DO ARTIGO 595 DO CÓDIGO CIVIL. 19.
A existência do incidente faz com que todos os processos que tratem sobre tais casos na área de abrangência do estado do Ceará fiquem suspensos, nos termos do art. 313, IV c/c art. 982, I, ambos do Código de Processo Civil - CPC. 20.
Contudo, faz-se necessário consignar aqui o distinguishing, deixando de suspender esta ação, eis que, conforme será analisado de forma mais aprofundada a seguir, a instituição financeira não juntou aos autos o contrato de empréstimo consignado. 21.
Por tais razões, deixo de suspender a presente demanda e passo a analisar o recurso, o qual, merece parcial acolhimento, devendo ser parcialmente reformada a sentença atacada, nos exatos termos exarados nesta decisão. 22.
O analfabeto não se encontra elencado no Código Civil como incapaz, portanto, perfeitamente possível firmar negócios bancários como no caso em concreto, através do instrumento contratual, formalizado nos termos do normativo civil acima. 23.
A assinatura a rogo não consiste em mera aposição de digital, pois, apesar de ser ato corriqueiro para fazer prova da efetiva presença do contratante não alfabetizado no momento da concretização do negócio jurídico, é manifestamente insuficiente para assegurar o conhecimento de suas cláusulas e o consentimento dos termos escritos a que se vincularam as partes. 24.
O ato a ser praticado por terceiro de confiança do analfabeto deve, nessa hipótese, ser testemunhado por outras duas pessoas que, nessa condição, declaram que o contratante tomou conhecimento de todo o conteúdo do documento e a ele anuiu de forma livre e consciente. 25.
A parte promovente, em sua peça inicial, demonstrou o fato constitutivo do seu direito, mais precisamente que há o lançamento do contrato nº 0123356947067 em seu extrato de empréstimos consignados, o qual ela aponta como fraudulento, pois não reconhece tal contratação, cabendo a parte contrária demonstrar ser regular o contrato discutido nos autos, sendo um dos ônus de prova da instituição financeira a apresentação do contrato e do comprovante do crédito do valor mutuado em favor do consumidor. 26.
No presente caso, há fácil solução, pois a instituição financeira deixou de apresentar o devido instrumento contratual originador dos descontos, o que mostra claramente a origem fraudulenta do contrato de empréstimo discutido. 27.
No caso em tela, estamos diante de uma relação consumerista, onde o ônus da prova é invertido, cabendo ao banco provar a existência de relação jurídica contratual com a parte autora. 28.
Entretanto, deixando transcorrer o prazo sem apresentar provas da existência de contrato celebrado entre as partes, o recorrente permite concluir pela veracidade dos fatos alegados pelo recorrido na peça vestibular. 29.
O que se observa, portanto, é que, diante da inversão do ônus da prova, o promovido não se desincumbiu em provar a existência de relação jurídica com a parte autora. 30.
Ademais, o contrato a ser anexado pela instituição financeira deve cumprir os requisitos previstos no art. 595 do Código Civil, o qual apresenta a seguinte redação: Art. 595.
No contrato de prestação de serviço, quando qualquer das partes não souber ler, nem escrever, o instrumento poderá ser assinado a rogo e subscrito por duas testemunhas. 31.
Cumpre-me consignar, nessa perspectiva, que a anulação de tal modalidade de negócio jurídico demanda a demonstração de vício de consentimento.
O fato de a parte autora ser analfabeta, por si só, não macula o contrato de empréstimo consignado, se firmado com observância das exigências previstas no art. 595 do Código Civil. 32.
No caso em apreço, a instituição financeira precisa demonstrar a validade da contratação por meio da apresentação de cópia do instrumento contratual, constando a digital da parte autora, assinatura a rogo e de duas testemunhas, aquela devidamente qualificada, bem como dos seus respectivos documentos pessoais. 33.
Por último, exige-se a apresentação do comprovante de disponibilização do montante contratado em favor da parte promovente. 34.
Quanto ao crédito do valor do empréstimo, a instituição financeira não conseguiu demonstrar fato impeditivo do direito autoral, pois não trouxe aos autos provas que atestem que houve a transferência do valor pactuado em favor da parte autora. 35.
No presente caso, impõe-se a apresentação de um instrumento que demonstre a efetiva compensação da transação, nele constando o número da ficha de compensação e o número de controle SPB, o que não veio aos autos. 36.
Portanto, não há qualquer prova hábil a demonstrar que o titular do benefício de fato recebeu o valor negociado no contrato de empréstimo.
Poderia o réu, para se desincumbir satisfatoriamente do seu ônus probatório, juntar cópias válidas da transferência bancária ou depósito do valor mutuado, mas assim não o fez. 37.
Segundo a doutrina consolidada, o contrato de mútuo exige, para a sua a concretização, a tradição, sendo, por essa razão, classificado como real: Trata-se de contrato real, tal qual o comodato, porque somente estará aperfeiçoado o mútuo com a efetiva entrega da propriedade da coisa mutuada, sendo o acordo de vontade insuficiente para a formação contratual.
Enquanto a coisa não for transferida para o domínio do mutuário, o contrato é juridicamente inexistente. (FARIAS, Cristiano Chaves, Curso de Direito Civil, volume 4, Ed.
Juspodivm, 2012, p.773) 38.
Vejamos alguns Julgados sobre a matéria, com destaques inovados: Agravo de instrumento.
Seis contratos bancários de crédito consignado arguidos fraudulentos.
Alegação de uso inadvertido do dinheiro que não colmata a pretensão neste contexto.
Exigência de depósito dos valores mutuados.
Art. 300, § 1º, do CPC.
Decisão mantida.
Recurso improvido. (TJSP - AI: 22497424420218260000 SP 2249742-44.2021.8.26.0000, Relator: Luís Fernando Camargo de Barros Vidal, Data de Julgamento: 16/11/2021, 14ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 16/11/2021) APELAÇÃO CÍVEL 1.
AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE/INEXIGIBILIDADE DE DESCONTO EM FOLHA DE PAGAMENTO CUMULADA COM REPETIÇÃO DE INDÉBITO E DANOS MORAIS.
EMPRÉSTIMO CONSIGNADO.
CONTRATO ASSINADO.
AUSÊNCIA DE COMPROVANTE DA DISPONIBILIZAÇÃO DO CRÉDITO.
IRREGULARIDADE DOS DESCONTOS EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO.
COMPENSAÇÃO DE VALORES.
IMPOSSIBILIDADE.
INEXISTÊNCIA DE CRÉDITO A SER COMPENSADO.
SENTENÇA MANTIDA.
RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.
APELAÇÃO CÍVEL 2.
AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE/INEXIGIBILIDADE DE DESCONTO EM FOLHA DE PAGAMENTO CUMULADA COM REPETIÇÃO DE INDÉBITO E DANOS MORAIS.
EMPRÉSTIMO CONSIGNADO.
DEVOLUÇÃO SIMPLES.
MÁ-FÉ NÃO COMPROVADA NO CASO CONCRETO.
DANO MORAL.
NÃO OCORRÊNCIA.
MERO ABORRECIMENTO.
PRECEDENTES.
SENTENÇA MANTIDA.
RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.
Havendo o contrato, mas não provada a prestação devida com o depósito do valor mutuado, não pode o Banco exigir a contraprestação, daí porque a situação difere daquelas em que não há contrato e traduz ilícito simples, sem presença de culpa grave, dolo ou má-fé suficientes a impor devolução em dobro. (TJPR - 13ª Câmara Cível - 0005644-17.2021.8.16.0017 - Maringá - Rel.: DESEMBARGADOR FÁBIO ANDRÉ SANTOS MUNIZ - J. 30.09.2022). (TJPR - APL: 00056441720218160017 Maringá 0005644-17.2021.8.16.0017 (Acórdão), Relator: Fábio André Santos Muniz, Data de Julgamento: 30/09/2022, 13ª Câmara Cível, Data de Publicação: 30/09/2022) E M E N T A - RECURSO INOMINADO - AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - PRELIMINAR - CERCEAMENTO DE DEFESA - REJEITADA - MÉRITO - CONSUMIDOR - CONTRATO DE MÚTUO BANCÁRIO - AUSÊNCIA DE DEPÓSITO DO VALOR PACTUADO - DANO MATERIAL E MORAL CONFIGURADO - VALOR DA INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL MINORADO PARA ATENDER AOS PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE - INSURGÊNCIA QUANTO ÀS ASTREINTES - VALOR E LIMITAÇÃO FIXADOS DE FORMA PROPORCIONAL - RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. (TJMS - Obrigação de Fazer: 08039243920208120110 Campo Grande, Relator: Juiz Vitor Luís de Oliveira Guibo, Data de Julgamento: 16/12/2020, 1ª Turma Recursal Mista, Data de Publicação: 17/12/2020) 39.
A ausência do devido contrato e do comprovante da disponibilização ao autor do valor de tal acordo leva a concluir pela natureza fraudulenta do tal empréstimo consignado. 40.
Concluindo-se pela irregular contratação, ficam comprovados a falha na prestação do serviço e os danos dela provenientes, e com supedâneo no art. 14 do CDC e na súmula 479 do STJ, deve ser reconhecida a responsabilidade civil do banco demandado, de forma objetiva, pelos danos materiais e morais sofridos pelo consumidor. 41.
A súmula 479 do STJ não deixa dúvidas quanto à objetividade da responsabilidade do banco pelos danos causados por estelionatários ao consumidor, senão vejamos: Súmula 479 do STJ - As instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias. 42.
Desta forma, a comprovação da falha na prestação do serviço e os danos dela provenientes, com supedâneo no art. 14 do CDC e na súmula 479 do STJ, impõe o reconhecimento da responsabilidade civil do banco recorrente, de forma objetiva, pelos danos materiais e morais sofridos pelo recorrido. 43.
A ausência de contrato válido traz como consequências a procedência da ação e o reconhecimento da má-fé da instituição financeira ré ante a falta de comprovante da relação jurídica entre as partes que provocou a inclusão do empréstimo consignado e dos descontos em benefício de caráter eminentemente alimentar. 44.
A negligência no dever de cuidado e segurança nas transações bancárias tornam injustificáveis os erros cometidos pela instituição acionada, de modo que, com base no entendimento assentado no STJ, a devolução dos valores indevidamente descontados deve se dar em dobro. 45.
No tocante à restituição em dobro, havia entendimento do Superior Tribunal de Justiça no sentido de se exigir a comprovação da má-fé do fornecedor para aplicação do parágrafo único do art. 42 do Código de Defesa do Consumidor.
Ou seja, deveria ser demonstrado o dolo do fornecedor em cobrar indevidamente determinado valor. 46.
Em mudança de posicionamento, a Corte Especial do STJ sedimentou que a restituição de valores pagos indevidamente pelo consumidor independe da motivação do agente que fez a cobrança, bastando a configuração de conduta contrária à boa-fé objetiva (EAREsp 676608/RS). 47.
Assim, determino que a instituição financeira promova a devolução dos valores descontados do benefício previdenciário da parte autora, relativos ao contrato ora em discussão, de forma simples, se o desconto se deu até março de 2021, e de forma dobrada, se posterior a essa data, conforme contido na decisão da Corte Especial do STJ, no EARESP 676.608/RS, que deu modulação ao seu entendimento para operar efeitos "aos indébitos não-decorrentes da prestação de serviço público a partir da publicação do acórdão", datado de 30/03/2021. 48.
Como no presente caso, o desconto da primeira parcela por força do contrato em discussão, se deu em dezembro de 2018, estando ainda o contrato ativo, a restituição do indébito deve se dar de forma simples, sobre os descontos ocorridos até março de 2021, e de forma dobrada sobre os seguintes. 49.
Avançando na apreciação da matéria, em relação à indenização por danos morais, reconheço que tais fatos são suficientes para causar danos de ordem moral a qualquer homem médio não sendo diferente com o autor.
Além de ser surpreendido com o irregular negócio jurídico contratado em seu nome, teve subtraído de seus já parcos rendimentos débitos referentes a contratação de empréstimo que nunca solicitou e se viu obrigado a buscar o ressarcimento dos valores indevidamente descontados de sua conta em juízo, demandando-lhe tempo e lhe causando desgaste por um erro na prestação de serviços bancários. 50.
Desse modo, no que tange ao quantum, a doutrina e a jurisprudência são pacíficas no sentido de que na fixação deste, em dano moral, prevalecerá o prudente arbítrio do julgador, que levará em consideração as circunstâncias do caso para evitar que a condenação represente enriquecimento ilícito de uma das partes. 51.
Ademais, a valoração da compensação moral deve ser motivada pelo princípio da razoabilidade, observando-se ainda a gravidade e repercussão do dano, bem como a intensidade e os seus efeitos. 52.
A finalidade compensatória, por sua vez, deve ter caráter didático-pedagógico, evitando o valor excessivo ou ínfimo, objetivando o desestimulo à conduta lesiva. 53.
Por fim, a indenização por dano moral deve, ainda, obedecer aos princípios da proporcionalidade (intensidade do dano, da culpa, dos transtornos), da exemplaridade (desestimulo à conduta) e da razoabilidade (adequação e modicidade). 54.
Neste ponto, entendo que o valor de R$ 4.000,00 (quatro mil reais) fixado na origem é proporcional à extensão do dano.
Fixo a atualização dos danos morais pelo INPC, desde o arbitramento (Súmula 362 STJ) e acrescidos de juros moratórios de 1% a.m., a partir da data do último débito (art. 398 do CC e Súmula 54 do STJ). 55.
Sem compensação de valores, posto não ter ficado comprovado regular relação bilateral entre as partes com transferência de crédito. 56.
Por fim, em razão da inexistência de negócio jurídico ocasionador dos descontos na conta do autor, mantenho a determinação para que a instituição financeira se abstenha de realizar novos descontos referentes ao empréstimo consignado não contratado. 57.
A cominação de multa em ação de obrigação de fazer é admitida como meio de garantir a efetividade e rapidez do cumprimento da decisão proferida.
Neste contexto, os artigos 139, IV, 536, § 1º e 537, do Código de Processo Civil, dispõem que cabe ao juiz determinar todas as medidas coercitivas necessárias ao efetivo cumprimento de decisão judicial, podendo haver a estipulação da multa a requerimento da parte ou de ofício, em valor pautado na razoabilidade e proporcionalidade, a qual pode ser reformada ou excluída caso se comprove justa causa para o descumprimento da medida. 58.
Assim, no caso em tela, entendo que o juízo de primeiro grau foi razoável ao determinar que a instituição financeira cessasse os descontos na conta bancária de titularidade da parte autora, relativos ao empréstimo consignado, a partir da intimação da sentença, sob pena de incidência de multa no importe de R$ 500,00 (quinhentos reais) a cada desconto, limitado a R$ 10.000,00 (dez mil reais). 59.
Neste contexto, não há nos autos elementos que indiquem que o prazo estipulado para cumprimento da tutela de urgência deferida seja insuficiente para a efetivação do comando judicial.
Desse modo, o prazo concedido pelo juízo a quo se mostra adequado para que a instituição financeira proceda com o cancelamento dos descontos do empréstimo consignado em seu sistema. 60.
Ademais, a referida multa foi fixada em consonância com o caráter pedagógico e coercitivo das multas cominatórias, não se configurando ônus financeiro excessivo à instituição financeira.
Ressalta-se, inclusive, que a multa cominatória foi fixada de forma mais benéfica ao banco, uma vez que não sendo diária, incidirá menos vezes. 61.
Com estas balizas, existe ambiente fático processual apto a modificar o entendimento demonstrado pelo juiz monocrático na sentença de mérito ora combatida, consoante orientação firmada por esta 5ª Turma Recursal. 62.
Saliente-se que, nos casos desse jaez, está dentro das atribuições do relator dar provimento ao recurso inominado por decisão monocrática, conforme entendimento do Enunciado 103 do FONAJE, com a seguinte redação: ENUNCIADO 103 - O relator, nas Turmas Recursais Cíveis, em decisão monocrática, poderá dar provimento a recurso se a decisão estiver em manifesto confronto com Súmula do Tribunal Superior ou Jurisprudência dominante do próprio juizado, cabendo recurso interno para a Turma Recursal, no prazo de 5 dias (alterado no XXXVI Encontro - Belém/PA) 63.
Aplica-se ainda, por empréstimo, a regra prevista no art. 932, V, "a", parte final do CPC: Art. 932.
Incumbe ao relator: (…) V - depois de facultada a apresentação de contrarrazões, dar provimento ao recurso se a decisão recorrida for contrária a: a) súmula do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça ou do próprio tribunal. 64.
Ante o exposto, estando o recurso fundado em tese contrária ao entendimento firmado pelo Tribunal de Justiça em IRDR e tendo em conta a procedência da irresignação recursal, pois a 5ª Turma Recursal já pacificou o entendimento exposto na presente decisão, com estas mesmas balizas, CONHEÇO do recurso inominado para, DAR-LHE PARCIAL PROVIMENTO, o que faço monocraticamente, reformando parcialmente a sentença atacada, estando a presente decisão monocrática dentro das atribuições do relator, conforme entendimento do Enunciado 103 do FONAJE, para: a) DETERMINAR ao banco recorrente a restituição do indébito, de forma simples, em relação aos descontos ocorridos até março de 2021, e dobrada, para os posteriores a tal data, atualizados com correção monetária pelo INPC e juros de mora no percentual de 1% ao mês, a contar da data do efetivo prejuízo (Súmulas 43 e 54 do STJ).
No mais, mantenho os demais termos da sentença por seus próprios e jurídicos fundamentos. 65.
Sem custas processuais e honorários advocatícios.
Fortaleza, data registrada no sistema.
MARCELO WOLNEY A P DE MATOS Juiz de Direito - Relator -
26/08/2024 00:00
Disponibilizado no DJ Eletrônico em 26/08/2024 Documento: 13998744
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23/08/2024 08:54
Expedida/certificada a comunicação eletrôinica Documento: 13998744
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22/08/2024 15:05
Conhecido o recurso de BANCO BRADESCO S/A - CNPJ: 60.***.***/0001-12 (RECORRENTE) e provido em parte
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20/08/2024 13:44
Conclusos para decisão
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20/08/2024 13:41
Cancelada a movimentação processual Conclusos para despacho
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09/11/2023 10:43
Cancelada a movimentação processual
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01/11/2023 11:35
Recebidos os autos
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01/11/2023 11:35
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
01/11/2023
Ultima Atualização
22/08/2024
Valor da Causa
R$ 0,00
Documentos
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