TRF1 - 1002958-73.2025.4.01.3500
1ª instância - 4ª Goi Nia
Polo Ativo
Assistente Desinteressado Amicus Curiae
Advogados
Nenhum advogado registrado.
Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
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31/07/2025 10:54
Arquivado Definitivamente
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31/07/2025 10:54
Juntada de termo
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30/07/2025 05:14
Juntada de comprovante (outros)
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29/07/2025 00:51
Publicado Intimação em 29/07/2025.
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29/07/2025 00:51
Disponibilizado no DJ Eletrônico em 28/07/2025
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25/07/2025 14:32
Expedição de Outros documentos.
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25/07/2025 14:32
Juntada de ato ordinatório
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25/07/2025 14:31
Transitado em Julgado em 15/07/2025
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15/07/2025 11:40
Decorrido prazo de ANTONIO VALDERI LAURINDO em 14/07/2025 23:59.
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15/07/2025 11:37
Decorrido prazo de FUNDAÇÃO CESGRANRIO em 14/07/2025 23:59.
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23/06/2025 21:04
Publicado Sentença Tipo B em 23/06/2025.
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23/06/2025 21:04
Disponibilizado no DJ Eletrônico em 23/06/2025
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23/06/2025 21:04
Disponibilizado no DJ Eletrônico em 23/06/2025
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12/06/2025 00:00
Intimação
PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA FEDERAL Seção Judiciária de Goiás 4ª Vara Federal Cível da SJGO SENTENÇA TIPO B PROCESSO: 1002958-73.2025.4.01.3500 CLASSE: MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL (120) IMPETRANTE: ANTONIO VALDERI LAURINDO IMPETRADO: FUNDAÇÃO CESGRANRIO e outros (2) SENTENÇA
I- RELATÓRIO Trata-se de mandado de segurança impetrado por Antonio Valderi Laurindo contra ato do Presidente da Comissão de Heteroidentificação da Fundação Cesgranrio, objetivando seja determinado à banca Impetrada que reconheça a autodeclaração do Impetrante na condição de pessoa parda, e, em consequência, adote as providências administrativas necessárias ao seu retorno imediato para a lista de candidatos negros do concurso.
Em seguida, uma vez comprovado que alcança nota suficiente no sistema de cotas raciais, que promova a sua classificação, para que possa concorrer às vagas do certame em regime de igualdade com os demais candidatos assim declarados e classificados.
Sustenta o Impetrante, em síntese, que: a) inscreveu-se no Concurso Público Nacional Unificado do Governo Federal (CPNU) – Bloco 7 – Gestão Governamental e Administração Pública, concorrendo às vagas reservadas para candidatos negros (pretos ou pardos); b) na fase de heteroidentificação, em 13/11/2024, a banca desconsiderou arbitrariamente as características fenotípicas do Impetrante, excluindo-o do certame sem fundamentação clara ou embasamento técnico; c) tal decisão viola o princípio da publicidade e a motivação dos atos administrativos; c) interpôs recurso tempestivo em 29/11/2024, mas foi novamente desclassificado, sem nenhuma justificativa fundamentada; d) a decisão da banca feriu os princípios da igualdade e da dignidade da pessoa humana, além de desrespeitar as normas de ação afirmativa; e) a ausência de motivação para a desclassificação afronta o dever de transparência dos atos administrativos; f) o procedimento de heteroidentificação deveria observar os critérios fenotípicos e assegurar o contraditório e a ampla defesa, o que não ocorreu.
A Inicial foi instruída com documentos.
Indeferida a liminar (ID 2167535019).
O Presidente da Fundação CESGRANRIO apresentou informações aduzindo que: a) o mandado de segurança não é a via adequada para discutir direito que exija dilação probatória; b) o impetrante busca, em verdade, tratamento diferenciado ao buscar o seu reconhecimento judicial como pessoa preta; c) a jurisprudência dos Tribunais Superiores é uníssona no sentido de que o Poder Judiciário não pode substituir a banca examinadora do certame e tampouco se imiscuir nos critérios de eliminação do certame, visto que sua atuação se restringe ao controle jurisdicional da legalidade do concurso público e da observância do princípio da vinculação ao edital; d) é indiscutível a submissão do candidato, ao se inscrever no concurso na modalidade de reserva de vagas para pessoas autodeclaradas negras e pardas, à aferição pela Comissão Específica da Banca Examinadora; e) ao se inscrever no certame, os candidatos aderem ao Edital, anuindo às suas disposições, o que faz com que estejam vinculados às regras nele previstas; f) conforme a Portaria n. 04/2018, a qual dispõe sobre o procedimento de heteroidentificação, é sabido que a autodeclaração do candidato goza de presunção relativa, a qual poderá ser confirmada (ou não) mediante procedimento de heteroidentificação; g) a Banca Examinadora agiu conforme os critérios de legalidade estabelecidos em Edital.
O MPF deixou de manifestar-se sobre o mérito da lide. É o relatório.
II – FUNDAMENTAÇÃO MÉRITO Por ocasião da análise do pedido de liminar, foi proferida a seguinte decisão: "(...) Decido.
Tanto a Lei 12.711/2012 quanto a Lei 12.990/2014 inserem-se entre os mecanismos de ação afirmativa postos em favor daqueles que se autodeclararem pretos ou pardos no ato da inscrição no concurso seletivo, conforme o quesito cor ou raça utilizado pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE.
Sobre o assunto, sabe-se que os direitos fundamentais determinam prestações tanto negativas quanto positivas.
Principalmente os da primeira geração originam deveres de abstenção ou tolerância do Estado frente a comportamentos dos particulares, mas também existem os direitos fundamentais que ensejam a assunção de certas obrigações de fazer.
Nesse campo estão os direitos que geram pretensões a prestações positivas voltadas à satisfação, sobretudo, dos chamados direitos socioeconômicos.
De outro lado, sabe-se também que o princípio isonômico é concebido tanto no sentido formal quanto material.
Por meio dele impõe-se, respectivamente, seja a igualdade na aplicação da lei (“igualdade perante a lei”), seja a igualdade por intermédio da lei (“igualdade na lei”).
Dessarte, em seu aspecto negativo, o princípio da igualdade é encarado quer como exigência de tratamento igual, quer como proibição de tratamento desigual[1].
Além disso, no aspecto positivo, o princípio da isonomia representa o dever de favorecer e de criar pressupostos voltados à correção das distorções que atingem aqueles menos favorecidos por quaisquer dos critérios (biológicos, sociais, econômicos, culturais, políticos) que possam dificultar o surgimento das mesmas “condições de partida” entre as pessoas[2].
A isonomia é cumprida assim tratando igualmente os iguais e desigualmente os desiguais como fornecendo os meios para reduzir ou compensar as dificuldades subjacentes às desigualdades enfrentadas para cada qual. É com referência a esse último esforço que se fala em ação afirmativa por parte dos órgãos públicos.
Ações afirmativas, portanto, são práticas estatais que, por meio de “tratamentos preferenciais”, buscam reequilibrar e/ou redistribuir, num caráter efetivo, as oportunidades disponíveis entre segmentos sociais particularizados.
Nesse sentido, a Constituição de 1988 estabelece vários princípios e regras que se podem traduzir em preocupações com o aspecto positivo ou afirmativo do princípio da isonomia.
Exemplos seriam o objetivo fundamental de erradicação das desigualdades regionais (art. 3º, III), o princípio da ordem econômica de redução das desigualdades sociais (art. 170, VII), bem como o art. 7º, XX, que prevê tratamento especial de proteção do mercado de trabalho feminino e o art. 37, VIII, que manda reservar percentual dos cargos e empregos públicos a pessoas portadoras de deficiência física[3].
Quanto aos objetivos das ações afirmativas, ensina JOAQUIM BARBOSA[4], consistem em: (a) coibir não só as discriminações do presente, mas, sobretudo, eliminar os efeitos persistentes (psicológicos, culturais e comportamentais) da discriminação do passado; (b) implantar uma certa “diversidade” que dê aos grupos minoritários uma maior representatividade nos domínios das atividades pública e privada; (c) eliminar as “barreiras artificiais e invisíveis” (glass ceiling) que, independentemente da existência de uma política oficial marginalizadora; e (d) criar personalidades emblemáticas, por meio dos representantes dos grupos discriminados que alcançarem posições de prestígio e poder, para servirem de modelo (role models) ao projeto de vida das pessoas que integram o restante da comunidade discriminada.
Na mesma linha, na ADPF 186/DF, o Pleno do STF definiu: “ARGUIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL.
ATOS QUE INSTITUÍRAM SISTEMA DE RESERVA DE VAGAS COM BASE EM CRITÉRIO ÉTNICO-RACIAL (COTAS) NO PROCESSO DE SELEÇÃO PARA INGRESSO EM INSTITUIÇÃO PÚBLICA DE ENSINO SUPERIOR.
ALEGADA OFENSA AOS ARTS. 1º, CAPUT, III, 3º, IV, 4º, VIII, 5º, I, II XXXIII, XLI, LIV, 37, CAPUT, 205, 206, CAPUT, I, 207, CAPUT, E 208, V, TODOS DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL.
AÇÃO JULGADA IMPROCEDENTE.
I – Não contraria - ao contrário, prestigia – o princípio da igualdade material, previsto no caput do art. 5º da Carta da República, a possibilidade de o Estado lançar mão seja de políticas de cunho universalista, que abrangem um número indeterminados de indivíduos, mediante ações de natureza estrutural, seja de ações afirmativas, que atingem grupos sociais determinados, de maneira pontual, atribuindo a estes certas vantagens, por um tempo limitado, de modo a permitir-lhes a superação de desigualdades decorrentes de situações históricas particulares.
II – O modelo constitucional brasileiro incorporou diversos mecanismos institucionais para corrigir as distorções resultantes de uma aplicação puramente formal do princípio da igualdade.
III – Esta Corte, em diversos precedentes, assentou a constitucionalidade das políticas de ação afirmativa.
IV – Medidas que buscam reverter, no âmbito universitário, o quadro histórico de desigualdade que caracteriza as relações étnico-raciais e sociais em nosso País, não podem ser examinadas apenas sob a ótica de sua compatibilidade com determinados preceitos constitucionais, isoladamente considerados, ou a partir da eventual vantagem de certos critérios sobre outros, devendo, ao revés, ser analisadas à luz do arcabouço principiológico sobre o qual se assenta o próprio Estado brasileiro.
V - Metodologia de seleção diferenciada pode perfeitamente levar em consideração critérios étnico-raciais ou socioeconômicos, de modo a assegurar que a comunidade acadêmica e a própria sociedade sejam beneficiadas pelo pluralismo de ideias, de resto, um dos fundamentos do Estado brasileiro, conforme dispõe o art. 1º, V, da Constituição.
VI - Justiça social, hoje, mais do que simplesmente redistribuir riquezas criadas pelo esforço coletivo, significa distinguir, reconhecer e incorporar à sociedade mais ampla valores culturais diversificados, muitas vezes considerados inferiores àqueles reputados dominantes.
VII – No entanto, as políticas de ação afirmativa fundadas na discriminação reversa apenas são legítimas se a sua manutenção estiver condicionada à persistência, no tempo, do quadro de exclusão social que lhes deu origem.
Caso contrário, tais políticas poderiam converter-se benesses permanentes, instituídas em prol de determinado grupo social, mas em detrimento da coletividade como um todo, situação – é escusado dizer – incompatível com o espírito de qualquer Constituição que se pretenda democrática, devendo, outrossim, respeitar a proporcionalidade entre os meios empregados e os fins perseguidos.
VIII – Arguição de descumprimento de preceito fundamental julgada improcedente.” Logo se vê, a questão das ações afirmativas está intrinsecamente vinculada ao problema das discriminações inversas.
Afinal, toda política de ação afirmativa acaba por discriminar, direta ou indiretamente, o segmento que por ela não foi contemplado.
Se a lei, atendendo à Constituição, fixa determinada cota de cargos públicos para serem preenchidos por deficientes físicos, está consequentemente discriminando os demais candidatos que concorrerem aos mesmos cargos, e assim por diante.
Destarte, também as ações afirmativas devem satisfazer critérios proporcionais e razoáveis, pois são inconcebíveis arbitrárias discriminações inversas. É dizer, o aspecto afirmativo do princípio da isonomia não exclui o negativo, daí por que o mesmo princípio da isonomia proíbe discriminações arbitrárias em matéria de ações afirmativas.
Nesse rumo, qualquer política de ação afirmativa deve considerar o princípio da proporcionalidade, inclusive aquelas previstas pela própria Constituição.
Logo, se a justificação da ação afirmativa está em atenuar ou superar determinadas dificuldades enfrentadas por cada qual para desenvolver as próprias capacidades que permitiriam disputar, com igualdade de condições, com aqueles que não encararam as mesmas dificuldades, é preciso atentar para o seguinte.
A ação afirmativa só será constitucional à medida que os critérios utilizados na identificação dos respectivos beneficiários sejam condizentes com as dificuldades que a atuação estatal tente atenuar ou remediar.
Caso a desigualdade de “condições de partidas” advenha de motivações financeiras, não haveria por que privilegiar outras pessoas que não as portadoras de dificuldades econômicas, pois a medida seria inadequada para atender à finalidade buscada. À guisa de ilustração, se a justificativa para reservar vagas em instituições públicas de ensino radicar na desigualdade entre os vestibulandos que frequentaram ou não escolas particulares – pois se presumiria que a qualidade destas é superior à das públicas – ou entre os que trabalharam ou não para ajudar a família – daí se presumindo que não tiveram o mesmo tempo útil de preparação para o vestibular –, não faz sentido que tais cotas sejam atribuídas conforme critérios diversos (raciais, por exemplo), pois a medida importaria em discriminação arbitrária de vestibulandos igualmente trabalhadores, pobres e que não tivessem estudado em escola particular, tão somente porque fossem brancos.
Dito isso, vê-se que a presente ação ataca a decisão da Comissão de Heteroidentificação que não reconheceu o Impetrante como pessoa negra (id. 2167359254).
Quanto ao assunto, extrai-se do Edital nº 07/2024 o seguinte: “(...) 3.4.1 - Após a etapa de qualificação técnica e antes da homologação dos resultados finais os candidatos que se autodeclararam negros, aprovados na prova discursiva, serão convocados em Edital específico para aferição presencial da veracidade da autodeclaração prestada, em data, local e horário estabelecidos pela Fundação Cesgranrio, ao procedimento de heteroidentificação complementar à autodeclaração dos candidatos negros conforme disposto no art. 17 da Instrução Normativa MGI nº 23, de 25 de julho de 2023. 3.4.1.1 - Considera-se procedimento de heteroidentificação a identificação por terceiros da condição autodeclarada. 3.4.2 - Para o procedimento de heteroidentificação, o candidato que se autodeclarou negro deverá se apresentar à Comissão de heteroidentificação. (...) 3.4.2.4 - A Comissão de Heteroidentificação utilizará exclusivamente o critério fenotípico para aferição da condição declarada pelo candidato. 3.4.2.4.1 - Serão consideradas as características fenotípicas do candidato ao tempo de realização do procedimento de heteroidentificação. 3.4.2.4.2 - Não serão considerados, para fins do disposto no subitem 3.4.2.4.1 deste Edital, quaisquer registros ou documentos pretéritos eventualmente apresentados, inclusive imagem e certidões referentes a confirmação em procedimentos de heteroidentificação realizados em Concursos Públicos federais, estaduais, distritais e municipais. 3.4.2.4.3 - Não será admitida, em nenhuma hipótese, para aferição da condição declarada pelo candidato no certame, prova baseada em ancestralidade.
Logo se vê, não há ilegalidade no simples ato de realizar a entrevista de confirmação da condição de pessoa negra ou parda.
Isso porque – certamente para evitar fraudes e minorar os mencionados problemas da discriminação inversa subjacentes a esse tipo de ação afirmativa de caráter racial – o legislador teve o cuidado de prever a hipótese da “constatação de declaração falsa” do candidato que se autodeclarara negro ou pardo.
Veja-se o parágrafo único do art. 2º da Lei 12.990/2014, aplicável por analogia: Art. 2º.
Poderão concorrer às vagas reservadas a candidatos negros aqueles que se autodeclararem pretos ou pardos no ato da inscrição no concurso público, conforme o quesito cor ou raça utilizado pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE.
Parágrafo único.
Na hipótese de constatação de declaração falsa, o candidato será eliminado do concurso e, se houver sido nomeado, ficará sujeito à anulação da sua admissão ao serviço ou emprego público, após procedimento administrativo em que lhe sejam assegurados o contraditório e a ampla defesa, sem prejuízo de outras sanções cabíveis.
Daí por que, em tese, a política de ação afirmativa concebida no edital do concurso seletivo atende às disposições contidas na Lei 12.990/2014, aplicável por analogia, na parte em que prevê a possibilidade de eliminação do candidato, se constatada a falsidade da declaração da condição de pessoa preta ou parda.
Os problemas, porém, avançam para outro setor.
Primeiro, a lei permite questionar não só a declaração em si, que pode ser formalmente verdadeira ou falsa, mas sim o próprio conteúdo da declaração, ou seja, a falsidade ideológica do que foi declarado.
De modo que há aí uma inegável contradição: a lei permite que o candidato se autodeclare negro, porém permite que terceiros venham a refutar o conteúdo ideológico da “autodeclaração”? Sim.
Essa é a curiosa sistemática da lei, que permite a inscrição por meio de autodeclaração do candidato, mas depois autoriza a aferição da “veracidade” da condição racial do candidato que se autodeclarara preto ou pardo.
Quer dizer: a autodeclaração tem de ser “confirmada” a posteriori por terceiros!? Daí a necessidade de se definir, então, quais são os critérios que terceiros poderão usar para dizer se o conteúdo da autodeclaração é ou não verdadeira.
Nesse sentido, pela lei, o benefício é destinado àqueles “autodeclarados pretos, pardos e indígenas e por pessoas com deficiência, nos termos da legislação, em proporção ao total de vagas no mínimo igual à proporção respectiva de pretos, pardos, indígenas e pessoas com deficiência na população da unidade da Federação onde está instalada a instituição, segundo o último censo da Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE” (art. 3º da Lei 12.711/2012). À semelhança, o chamado Estatuto da Igualdade Racial (Lei 12.288/2010) considera como população negra “o conjunto de pessoas que se autodeclaram pretas e pardas, conforme o quesito cor ou raça usado pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), ou que adotam autodefinição análoga” (art. 1º, IV).
Ocorre que o IBGE também deixa ao alvedrio da autodeclaração a definição da própria cor ou raça.
O problema já foi alvo de julgamento do STF na ADPF 186/DF, quando se acolheu o voto do Ministro RICARDO LEWANDOWSKI, entre cujos fundamentos está: “(...) Em outras palavras, tratando-se da utilização do critério étnico-racial para o ingresso no ensino superior, é preciso analisar ainda se os mecanismos empregados na identificação do componente étnico-racial estão ou não em conformidade com a ordem constitucional.
Como se sabe, nesse processo de seleção, as universidades têm utilizado duas formas distintas de identificação, quais sejam: a autoidentificação e a heteroidentificação (identificação por terceiros).
Essa questão foi estudada pela mencionada Daniela Ikawa, nos seguintes termos: ‘A identificação deve ocorrer primariamente pelo próprio indivíduo, no intuito de evitar identificações externas voltadas à discriminação negativa e de fortalecer o reconhecimento da diferença.
Contudo, tendo em vista o grau mediano de mestiçagem (por fenótipo) e as incertezas por ela geradas – há (...) um grau de consistência entre autoidentificação e identificação por terceiros no patamar de 79% -, essa identificação não precisa ser feita exclusivamente pelo próprio indivíduo.
Para se coibir possíveis fraudes na identificação no que se refere à obtenção de benefícios e no intuito de delinear o direito à redistribuição da forma mais estreita possível (...), alguns mecanismos adicionais podem ser utilizados como: (1) a elaboração de formulários com múltiplas questões sobre a raça (para se averiguar a coerência da autoclassificação); (2) o requerimento de declarações assinadas; (3) o uso de entrevistas (...); (4) a exigência de fotos; e (5) a formação de comitês posteriores à autoidentificação pelo candidato.
A possibilidade de seleção por comitês é a alternativa mais controversa das apresentadas (...).
Essa classificação pode ser aceita respeitadas as seguintes condições: (a) a classificação pelo comitê deve ser feita posteriormente à autoidentificação do candidato como negro (preto ou pardo), para se coibir a predominância de uma classificação por terceiros; (b) o julgamento deve ser realizado por fenótipo e não por ascendência; (c) o grupo de candidatos a concorrer por vagas separadas deve ser composto por todos os que se tiverem classificado por uma banca também (por foto ou entrevista) como pardos ou pretos, nas combinações: pardo-pardo, pardo-preto ou preto-preto; (d) o comitê deve ser composto tomando-se em consideração a diversidade de raça, de classe econômica, de orientação sexual e de gênero e deve ter mandatos curtos.’ Tanto a autoidentificação, quanto a heteroidentificação, ou ambos os sistemas de seleção combinados, desde que observem, o tanto quanto possível, os critérios acima explicitados e jamais deixem de respeitar a dignidade pessoal dos candidatos, são, a meu ver, plenamente aceitáveis do ponto de vista constitucional.” Logo, o imbróglio continua: a lei permite a terceiros aferir a veracidade da autodeclaração do candidato, mas não traça quais seriam os critérios para se lhe afirmar a falsidade.
No caso, contudo, a Comissão de Heteroidentificação indeferiu a autodeclaração do Impetrante, por considerar que ele não apresentava características fenotípicas condizentes com sua autodeclaração.
Porém, à vista da indefinição dos parâmetros de conferência da veracidade da autodeclaração do candidato, afigura-se adequado o indeferimento por fator fenotípico, sem que se possa, em tese, considerá-lo desproporcional.
Afinal, também foi a cor – i.e., uma das características fenotípicas que delimitam pessoas em função da raça e coloração da pele – o critério (igualmente fenotípico, diga-se novamente) eleito pelo legislador para, bem ou mal, promover discriminações positivas em favor de pretos e pardos, pelo que as características fenotípicas dos candidatos revelam-se igualmente aptas à verificação de que trata o parágrafo único do art. 2º da Lei 12.990/2014.
Ademais, ressalvados aspectos ligados à observância formal das normas que regem o certame, o Judiciário não pode imiscuir-se nos critérios subjetivos de avaliação dos candidatos, sob pena de invadir o âmbito discricionário concedido ao agente público.
Os problemas relativos aos critérios adotados pela Banca Examinadora quanto à aferição da adequação do candidato à concorrência especial das cotas raciais, regra geral, encontram-se fora da órbita de controle do Poder Judiciário.
Nesse sentido: ADMINISTRATIVO.
ENSINO SUPERIOR.
INGRESSO NO ENSINO SUPERIOR PELO SISTEMA DE COTAS.
EXCLUSÃO DO CANDIDATO PELA BANCA EXAMINADORA POR NÃO APRESENTAR AS CARACTERÍSTICAS FENOTÍPICAS.
AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE.
AUSÊNCIA DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO.
I.
A reserva de cotas é uma regra de exceção em relação às regras gerais do vestibular e, como tal, deve ser interpretada de forma restritiva.
Não cabe, portanto, ao poder judiciário ampliar as hipóteses previstas no edital da instituição de ensino superior.
Assim, compete à Universidade avaliar se o impetrante preenche os requisitos para concorrer às vagas do seu sistema de cotas, conforme previsto no edital do certame e com o fim precípuo de evitar fraudes ao sistema de cotas.
II.
In casu a deliberação da banca examinadora foi unânime em considerar o aluno inapto para concorrer ao sistema de cotas para negros após sua entrevista pessoal, portanto a substituição dos critérios utilizados pela banca avaliadora para indeferimento da inscrição de candidato no sistema de cotas da Universidade de Brasília por um outro qualquer escolhido pelo juiz significaria, às claras, invasão do Poder Judiciário no mérito administrativo, o que é vedado.
III.
A decisão da Banca Examinadora, que excluiu o candidato por entender que ele não apresentava fenótipo compatível com os afrodescendentes, agiu de acordo com as normas do edital do certame.
IV.
Apelação que se nega provimento. (AMS 00099292820104013400, DESEMBARGADOR FEDERAL KASSIO NUNES MARQUES, TRF1 - SEXTA TURMA, e-DJF1 DATA:15/09/2014 PAGINA:426.).
Pelo exposto, indefiro o pedido liminar.".
Dessarte, considerando a inexistência de alteração da situação fática e/ou jurídica a justificar posicionamento diverso, adoto, na presente sentença, os mesmos fundamentos da decisão acima transcrita como razões de decidir.
III - DISPOSITIVO Em face do exposto, ratificada a decisão que indeferiu a liminar, DENEGO A SEGURANÇA.
Custas ex lege.
Sem honorários.
Sentença publicada e registrada em meio eletrônico.
Havendo interposição de recurso, intime-se a parte contrária para apresentar contrarrazões no prazo legal.
Transcorrido o prazo para apresentá-las, remetam-se os autos à instância de segundo grau.
Sobrevindo o trânsito em julgado, arquivem-se os autos com as cautelas de praxe.
R.
P.
I.
Goiânia, (data e assinatura eletrônicas). -
11/06/2025 16:03
Processo devolvido à Secretaria
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11/06/2025 16:03
Juntada de Certidão
-
11/06/2025 16:03
Expedição de Publicação ao Diário de Justiça Eletrônico Nacional.
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11/06/2025 16:03
Expedição de Publicação ao Diário de Justiça Eletrônico Nacional.
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11/06/2025 16:03
Denegada a Segurança a ANTONIO VALDERI LAURINDO - CPF: *70.***.*30-44 (IMPETRANTE)
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17/05/2025 11:44
Conclusos para julgamento
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27/03/2025 16:14
Juntada de petição intercorrente
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17/03/2025 14:30
Expedida/certificada a intimação eletrônica
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17/03/2025 14:30
Expedição de Outros documentos.
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11/03/2025 00:55
Decorrido prazo de PRESIDENTE DA BANCA DE HETEROIDENTFICAÇÃO DA FUNDAÇÃO CESGRANRIO em 10/03/2025 23:59.
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10/03/2025 18:26
Juntada de contestação (outros)
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28/02/2025 20:24
Decorrido prazo de FUNDAÇÃO CESGRANRIO em 27/02/2025 23:59.
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25/02/2025 01:44
Decorrido prazo de ANTONIO VALDERI LAURINDO em 24/02/2025 23:59.
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20/02/2025 16:26
Juntada de termo
-
20/02/2025 16:25
Juntada de termo
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24/01/2025 15:09
Juntada de comprovante (outros)
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23/01/2025 20:24
Expedição de Aviso de recebimento (AR).
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23/01/2025 20:24
Expedição de Aviso de recebimento (AR).
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23/01/2025 13:16
Expedida/certificada a intimação eletrônica
-
23/01/2025 13:16
Expedição de Outros documentos.
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22/01/2025 14:54
Processo devolvido à Secretaria
-
22/01/2025 14:54
Não Concedida a Medida Liminar
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21/01/2025 14:28
Conclusos para decisão
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21/01/2025 14:27
Juntada de Certidão
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21/01/2025 08:44
Remetidos os Autos (em diligência) da Distribuição ao 4ª Vara Federal Cível da SJGO
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21/01/2025 08:44
Juntada de Informação de Prevenção
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20/01/2025 21:27
Recebido pelo Distribuidor
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20/01/2025 21:27
Autos incluídos no Juízo 100% Digital
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20/01/2025 21:27
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
20/01/2025
Ultima Atualização
31/07/2025
Valor da Causa
R$ 0,00
Detalhes
Documentos
Ato ordinatório • Arquivo
Sentença Tipo B • Arquivo
Sentença Tipo B • Arquivo
Decisão • Arquivo
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