TJRN - 0801574-52.2024.8.20.5110
2ª instância - Câmara / Desembargador(a) Virgilio Macedo Junior
Processos Relacionados - Outras Instâncias
Polo Passivo
Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
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07/05/2025 00:00
Intimação
PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO NORTE SEGUNDA CÂMARA CÍVEL Processo: APELAÇÃO CÍVEL - 0801574-52.2024.8.20.5110 Polo ativo ODACI ALVES DE OLIVEIRA FARIAS Advogado(s): HILDERLAN VICTOR DA SILVEIRA BARRETO, VALERIA TORRES MOREIRA PENHA Polo passivo BANCO BRADESCO S/A Advogado(s): ROBERTO DOREA PESSOA registrado(a) civilmente como ROBERTO DOREA PESSOA APELAÇÃO CÍVEL Nº 0801574-52.2024.8.20.5110 APELANTE/APELADO: ODACI ALVES DE OLIVEIRA FARIAS ADVOGADOS: HILDERLAN VICTOR DA SILVEIRA BARRETO, VALERIA TORRES MOREIRA PENHA.
APELANTE/APELADO: BANCO BRADESCO S.A.
ADVOGADO: ROBERTO DOREA PESSOA EMENTA: DIREITO DO CONSUMIDOR E CIVIL.
APELAÇÕES CÍVEIS.
AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA.
DESCONTOS INDEVIDOS EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO.
PEDIDO DE EFEITO SUSPENSIVO AFASTADO.
PRELIMINARES DE CONVERSÃO DO JULGAMENTO EM DILIGÊNCIA, PRESCRIÇÃO E DECADÊNCIA REJEITADAS.
EMPRÉSTIMO CONSIGNADO.
CONTRATO FIRMADO POR IDOSO ANALFABETO.
AUSÊNCIA DE ASSINATURA A ROGO E DUAS TESTEMUNHAS.
INVALIDADE DO NEGÓCIO JURÍDICO.
REPETIÇÃO EM DOBRO DO INDÉBITO.
DANO MORAL IN RE IPSA CONFIGURADO.
REDUÇÃO DO VALOR.
RECURSO DA INSTITUIÇÃO BANCÁRIA CONHECIDO E PROVIDO EM PARTE.
RECURSO DA CONSUMIDORA CONHECIDO E PROVIDO.
I.
CASO EM EXAME 1.
Apelações cíveis interpostas pela consumidora e pela instituição bancária contra sentença que julgou procedente a ação de inexistência de débito cumulada com pedido de indenização por danos materiais/repetição do indébito e danos morais.
A demanda tem por fundamento a inexistência de relação contratual consumerista válida, em virtude da não observância dos aspectos formais da contratação de empréstimo consignado quando se trata de pessoa idosa analfabeta.
II.
QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2.
Há cinco questões em discussão: (i) preliminarmente, avaliar o pedido de efeito suspensivo e se os direitos pretendidos estariam prescritos e/ou decaídos; (ii) definir se o contrato de empréstimo consignado firmado com pessoa analfabeta sem assinatura a rogo e subscrição de testemunhas é válido e eficaz; (iii) apurar a responsabilidade da instituição bancária pelos danos decorrentes de serviços defeituosos prestados na relação de consumo; (iv) determinar se os descontos em conta corrente oriundos do contrato de empréstimo consignado inválido justificam a repetição em dobro do indébito; e (v) determinar se os descontos em conta configuram dano moral, bem como definir o valor da respectiva indenização.
III.
RAZÕES DE DECIDIR 3.
Não há motivos para a suspensão dos efeitos da sentença a quo, haja vista a não configuração dos motivos contidos no art. art. 1.012, § 4º, do CPC.
Os prazos prescricionais e decadenciais devem ser ditados pelo Código de Defesa do Consumidor, haja vista a relação de consumo, além de considerar o fato de que se trata de um contrato de trato sucessivo, ou seja, o prazo deve começar a fluir a partir do último ato que compõe a relação. 4.
A responsabilização da instituição financeira por prejuízos causados ao consumidor fundamenta-se na regra do artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor, bem como na Súmula 479 do Superior Tribunal de Justiça, que reconhecem a responsabilidade objetiva nos casos de prestação de serviços defeituosa. 5.
A contratação de negócio jurídico que não observa as exigências do art. 595 do Código Civil, quando trata-se de pessoa analfabeta, logo não havendo assinatura a rogo nem a presença de duas testemunhas, deve ser considerada nula. 6.
A repetição do indébito em dobro é devida nos termos do art. 42, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor, tornando-se desnecessária a comprovação de má-fé, bastando a ausência de justificativa válida para a cobrança.
Assim costuma decidir o STJ como no EAREsp 676.608/RS. 7.
O desconto indevido em verba alimentar e previdenciária, decorrente de contrato inexistente, compromete a subsistência do consumidor e configura dano moral in re ipsa, ou seja, prescinde de prova do abalo concreto. 8.
O valor da indenização à título de danos morais deve ser ajustado à gravidade do dano, aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade e à finalidade compensatória, punitiva e pedagógica, dessa forma acarretando na redução do valor indenizatório para R$ 4.000,00 (quatro mil reais) em consonância com julgados do TJRN em casos semelhantes.
IV.
DISPOSITIVO E TESE 9.
Recurso da instituição financeira conhecido e provido em parte para reduzir o valor da indenização à título de dano moral.
Apelo da consumidora conhecido e provido para deferir a repetição do indébito em dobro desde o início da relação contratual.
Tese de julgamento: 1.
Não há motivo para a concessão do efeito suspensivo ao recurso, uma vez que não estão presentes os requisitos do art. 1.012, § 4º, do CPC.
A prescrição e a decadência foram afastadas haja vista o trato sucessivo da relação de consumo de empréstimo consignado. 2.
A contratação de empréstimo por pessoa analfabeta sem assinatura a rogo e sem a presença de duas testemunhas é nula de pleno direito. 3.
A repetição do indébito em dobro é devida desde o início dos descontos, quando não comprovado engano justificável pela instituição financeira. 4.
Os descontos indevidos em benefício previdenciário ensejam indenização por dano moral in re ipsa. 5.
O valor da indenização por danos morais deve observar os princípios da razoabilidade, proporcionalidade e a jurisprudência predominante.
Dispositivos relevantes: CDC, arts. 6º, VIII, 14, 27 e 42, parágrafo único; CPC, arts. 1.012, § 4º, e 85, § 11; CC, art. 595.
Julgados relevantes: STJ, EAREsp 676.608/RS, Rel.
Min.
Og Fernandes, Corte Especial, j. 21.10.2020; STJ, Súmula 479; TJRN, Apelação Cível nº 0800569-47.2021.8.20.5159, Rel.
Des.ª Berenice Capuxú, Segunda Câmara Cível, j. 23.05.2024; Apelação Cível nº 0800969-77.2023.8.20.5131, Rel.
Des.ª Sandra Elali, Segunda Câmara Cível, j. 05.12.2024.
ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, em que são partes as acima nominadas.
Acordam os Desembargadores que integram a Segunda Câmara Cível deste Egrégio Tribunal de Justiça, em Turma, por unanimidade de votos, conhecer dos recursos, para dar provimento parcial ao apelo do Banco Bradesco S.A., apenas para minorar o valor da indenização à título de danos morais para R$ 4.000,00 (quatro mil reais), bem como para dar provimento à apelação de Odaci Alves de Oliveira Farias, para determinar a restituição em dobro dos valores indevidamente descontados desde o início da relação contratual, nos termos do voto do relator, parte integrante deste acórdão.
RELATÓRIO Trata-se de recursos de apelação cível interpostos por Odaci Alves de Oliveira Farias e por Banco Bradesco S.A., contra sentença proferida pelo Juízo da Vara Única da Comarca de Alexandria/RN, nos autos da ação declaratória de inexistência de débito cumulada com pedido de indenização por danos materiais/repetição do indébito e danos morais, ajuizada pela primeira contra o segundo.
A sentença de primeiro grau (Id 29703416) julgou a ação procedente para reconhecer a nulidade do contrato de empréstimo consignado, em razão de ter sido firmado por pessoa analfabeta sem as formalidades legais exigidas.
Ato contínuo, condenou a instituição financeira ao pagamento em dobro do montante descontado em relação ao empréstimo questionado a partir de 31/03/2021, devendo eventuais deduções anteriores a essa data serem restituídas de forma simples, mais o valor em dobro dos descontos porventura efetuados durante o trâmite da ação.
Sobre esses valores, incidem juros de 1% a.m. e correção monetária pelo INPC desta a data do efetivo prejuízo, ou seja, os juros ficam na forma do artigo 406, §§ 1º e 2º (SELIC), e a e correção monetária nos termos do artigo 389, parágrafo único (IPCA), ambos do Código Civil.
Ainda, a sentença de primeiro grau condenou o Banco Bradesco S.A. ao pagamento de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), à título de danos morais.
Sobre esse valor, incidem juros de mora a partir do evento danoso e correção monetária a partir do arbitramento.
Também houve condenação da instituição bancária ao pagamento de custas processuais e honorários sucumbenciais, o último no patamar de 10% sobre o valor da condenação, em montante a ser apurado na fase de liquidação de sentença.
No seu apelo (Id 29703826), Odaci Alves de Oliveria Farias alegou que a repetição do indébito deve ser integralmente em dobro, desde o primeiro desconto, ocorrido em março de 2020, uma vez que a instituição bancária não comprovou qualquer engano justificável, sendo, portanto, inaplicável a modulação feita pela sentença recorrida com base no EDRESP nº 676.608/RS.
Por sua vez, o Banco Bradesco S.A. apelou (Id 29703419) insatisfeito com a decisão de primeira instância e requereu o recebimento do recurso com efeito suspensivo.
Preliminarmente, alegou a necessidade de conversão do julgamento em diligência, haja vista a não juntada dos extratos bancários por parte da consumidora, bem como suscitou a prescrição trienal para propositura da ação e a decadência dos direitos postulados.
No mérito, a instituição financeira alegou a legalidade da contratação do empréstimo consignado, inclusive juntando aos autos cópia do contrato (Id 29703408) avençado entre as partes.
Igualmente, pugnou pela inexistência de dano material e pela impossibilidade da restituição em dobro, bem como pela inexistência do dano moral, ou a sua minoração conforme os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.
Requereu a reforma da sentença a quo para julgar totalmente improcedentes os pedidos da autora; ou, subsidiariamente, que a restituição se dê de forma simples, por ausência de má-fé.
Ambas as partes foram regularmente notificadas para apresentar contrarrazões.
A instituição financeira apresentou peça (Id 29703829) pugnando pelo não provimento do recurso da consumidora, para não configurar a repetição em dobro do indébito desde o início da relação jurídica de empréstimo.
Por sua vez, a parte consumidora apresentou peça (Id 29703825) pugnando pelo não provimento do recurso do Banco Bradesco S.A., para afastar as preliminares levantadas e manter íntegra a decisão de primeiro grau.
Os autos não foram encaminhados ao Ministério Público porque em ações semelhantes já consignou que não há interesse público primário que justifique a sua participação no processo. É o relatório.
VOTO Presentes os pressupostos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade recursal, conheço das apelações.
Com efeito, evidencia-se o cabimento dos recursos, a legitimação para recorrer, o interesse recursal, a inexistência de fato impeditivo ou extintivo do poder de recorrer, bem como a tempestividade e a regularidade formal.
No que se refere ao preparo, é fato que a recorrente consumidora é beneficiária da gratuidade da justiça (Id 29703399), e da parte da instituição bancária recorrente houve o regular recolhimento (Id 29703822).
Antes do mérito, no que se refere ao pedido de atribuição de efeito suspensivo por parte da instituição bancária, tal pleito não merece acolhimento.
Analisando a caso em questão, não se vislumbra, nem foi demonstrado pelo recorrente, qualquer risco de dano grave, de difícil ou impossível reparação, nos termos do art. 1.012, § 4º, do Código de Processo Civil.
A sentença impugnada não apresenta efeitos imediatos que justifiquem a suspensão da sua eficácia, uma vez que os valores a serem restituídos são facilmente quantificáveis e não representam risco financeiro substancial à instituição apelante, tratando-se de condenação patrimonial compensável e plenamente reversível.
Ademais, a sentença recorrida está fundamentada em prova documental robusta e que reconheceu a nulidade de contrato firmado com pessoa analfabeta, em manifesta ofensa à legislação civil.
Isto é, indeferido o efeito suspensivo.
No que se refere à arguição do Banco Bradesco S.A. relativa à conversão do julgamento em diligência para a juntada de extratos bancários pela parte autora, entendo que não merece acolhimento. É fato que a consumidora não anexou extratos bancários completos nos autos, no entanto juntou extratos previdenciários (Ids 29703390, 29703391, 29703392, 29703393 e 29703394) comprobatórios da relação jurídica entre as partes, documentos esses emitidos pelo INSS e suficientes para atestar o alegado desfalque em seu benefício de aposentadoria.
Além disso, importa ressaltar que o Juízo a quo determinou a inversão do ônus da prova (Id 29703399), com fulcro no art. 6º, VIII, do Código de Defesa do Consumidor.
Com isso, a responsabilidade de demonstrar a regularidade do contrato — inclusive o eventual repasse dos valores — passou a recair sobre a instituição financeira, o qual não se desincumbiu desse encargo.
Diante disso, a juntada de extratos bancários integrais, embora pudesse contribuir, não era imprescindível ao deslinde da controvérsia, tampouco ao convencimento do magistrado de primeiro grau.
Os documentos já acostados, combinados com a inversão do ônus da prova, constituem provas suficientes para a formação do Juízo quanto à licitude, ou não, dos descontos.
Avançando no apelo do Banco Bradesco S.A., sobre a prejudicial de mérito de prescrição trienal, tal arguição também não merece acolhimento. É importante destacar que, no presente caso, aplicou-se a inversão do ônus da prova prevista no Código de Defesa do Consumidor por se tratar de uma relação de consumo, em que a instituição bancária é fornecedora de serviços e a pessoa consumidora é a destinatária final desses serviços, conforme especificado no art. 3º, § 2º, do mesmo código.
Dessa forma, não se aplicando o prazo prescricional previsto no Código Civil, conforme argumenta o banco apelante.
Aplica-se, portanto, o prazo prescricional de cinco anos, conforme o art. 27 do Código de Defesa do Consumidor, já que o pedido de reparação se baseia em supostos danos causados por falha na prestação do serviço.
Além disso, por se tratar de uma relação contínua, como bem observado na sentença recorrida.
Ainda em prejudicial de mérito, o Banco Bradesco S.A. arguiu a decadência do direito da consumidora.
Logo, mais uma vez, não merece acolhimento tal pleito, uma vez que o prazo decadencial só começa a fluir a partir do último ato que compõe a relação jurídica de trato sucessivo, como no caso do empréstimo consignado.
Dessa forma, não se há falar em decadência com base no prazo previsto no Código Civil, uma vez que cada novo desconto renova o direito de questionar a irregularidade.
Superado esse momento preliminar, importante entrar no mérito do recurso interposto pelo Banco Bradesco S.A.
A controvérsia gira em torno da regularidade da contratação de empréstimo consignado em benefício previdenciário da parte consumidora, assim como da legalidade dos descontos realizados em sua conta bancária.
Essencial gravar que a senhora Odaci Alves de Oliveira Farias é pessoa reconhecidamente analfabeta, fato esse que restou incontroverso nos autos.
Inicialmente, registro que a sentença a quo está adequadamente fundamentada, tendo compreendido com precisão os elementos constitutivos da relação consumerista entre as partes, bem como o vício contratual manifestado no caso em questão.
Observou-se que a validade do contrato de empréstimo (Id 29703408) restou comprometida, pois a contratação se deu sem a observância das exigências do art. 595 do Código Civil, não havendo assinatura a rogo nem a presença de duas testemunhas.
Portanto, configura-se a nulidade do negócio jurídico avençado entre as partes, logo tornando correta a conclusão do Juízo de primeiro grau nesse ponto.
O entendimento majoritário do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte é no sentido de reconhecer a nulidade dos contratos firmados nas condições descritas no presente processo.
Segue o julgado abaixo: EMENTA: DIREITO CONTRATUAL.
EMPRÉSTIMO CONSIGNADO.
PREJUDICIAL DE PRESCRIÇÃO.
REJEIÇÃO.
MÉRITO: PACTO CELEBRADO ENTRE INSTITUIÇÃO FINANCEIRA COM PESSOA IDOSA NÃO ALFABETIZADA.
AUSÊNCIA DE ASSINATURA A ROGO.
CONTRATO NULO DE PLENO DIREITO PORQUE CARENTE DE FORMALIDADE EXIGIDA EM LEI.
INOBSERVÂNCIA DA REGRA PREVISTA NO ART. 595 DO CÓDIGO CIVIL.
PRESENÇA DE APENAS UMA TESTEMUNHA.
CAUSA MADURA.
NULIDADE DO CONTRATO PATENTE.
RESTITUIÇÃO EM DOBRO DAS PARCELAS INDEVIDAMENTE DESCONTADAS.
CONDENAÇÃO EM DANO MORAL.
VIABILIDADE.
QUANTUM INDENIZATÓRIO QUE DEVE OBSERVAR O GRAU DA OFENSA E AS CAPACIDADES ECONÔMICAS DO OFENSOR E OFENDIDO, CONSIDERANDO, AINDA O INTUITO PEDAGÓGICO DA MEDIDA.
FIXAÇÃO EM R$ 2.000,00 (DOIS MIL REAIS).
APELO CONHECIDO E PROVIDO. (Apelação Cível, 0800569-47.2021.8.20.5159, Desª.
Berenice Capuxú, Segunda Câmara Cível, Julgado em 23/05/2024).
Em síntese, diante da incapacidade da instituição financeira comprovar a regularidade da relação de consumo, especialmente que o vínculo foi formado respeitando os requisitos formais atinentes à pessoa analfabeta, não existe outra alternativa a não ser tornar nulo o contrato de empréstimo consignado, assim como considerar indevidos os descontos realizados na conta bancária da consumidora.
Avançando no apelo do Banco Bradesco S.A., no que tange à responsabilidade da instituição financeira, o Superior Tribunal de Justiça pacificou o entendimento de que os bancos respondem objetivamente pelos danos causados aos consumidores em razão dos produtos e serviços bancários prestados de forma defeituosa, conforme prevê o artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor e a Súmula 479 do STJ.
Dessa forma, sobre a questão da repetição do indébito, a sentença de primeiro grau acertou ao configurar o dano material sofrido pela parte consumidora.
Foi evidenciado, no caso em questão, que o parágrafo único do artigo 42 do Código de Defesa do Consumidor precisa ser aplicado, ou seja, “o consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável”.
Logo, uma vez tornado nulo o negócio jurídico, presume-se a ausência de justificativa para a cobrança e, por consequência, a má-fé do fornecedor, a qual decorre da própria negligência em verificar a legitimidade dos descontos antes de executá-los.
O entendimento da Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ.
Corte Especial.
EAREsp. 676.608/RS, Relator Ministro Og Fernandes, julgado em 21/10/2020) e os precedentes desta Corte de Justiça, vão no sentido de que independe da intenção do fornecedor, cabendo a restituição em dobro dos valores descontados quando a cobrança indevida violar a boa-fé objetiva.
Logo, a repetição em dobro do indébito é cabível e precisar ser mantida.
Tratando da questão do dano moral, conforme apelado pelo Banco Bradesco S.A., o entendimento majoritário no Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte é no sentido de que descontos indevidos, sobretudo de contratos bancários não reconhecidos, ensejam, por si só, a reparação por dano moral, pois violam direitos de personalidade e expõem o consumidor a situação de aflição, angústia e sensação de impotência contra o sistema financeiro, ainda mais versando sobre verba de natureza alimentar oriunda da aposentadoria, como é o caso em questão.
O entendimento dessa Corte é firme no sentido de que, nesses casos, o abalo moral é presumido (in re ipsa), dispensando-se a prova do prejuízo extrapatrimonial, conforme se extrai do seguinte julgado: EMENTA: CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL.
APELAÇÕES CÍVEIS.
INSCRIÇÃO INDEVIDA EM CADASTROS DE INADIMPLENTES.
INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO CONTRATUAL.
DECLARAÇÃO DE INEXIGIBILIDADE DO DÉBITO.
DÍVIDA NÃO COMPROVADA.
INAPLICABILIDADE DA SÚMULA 385 DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA.
DISCUSSÃO JUDICIAL DOS DÉBITOS PRETÉRITOS.
INDÍCIOS DE FRAUDE CONTRATUAL.
RESPONSABILIDADE OBJETIVA.
INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA.
DANO MORAL CONFIGURADO.
DANO IN RE IPSA.
DESPROVIMENTO DO RECURSO INTERPOSTO PELA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA.
PROVIMENTO DO RECURSO DE APELAÇÃO DA PARTE AUTORA.I.
CASO EM EXAME1.
Apelações cíveis interpostas contra sentença que julgou parcialmente procedente o pedido de declaração de inexistência de relação contratual e indeferiu o pleito de compensação por danos morais em razão de inscrição indevida em cadastro de inadimplentes, decorrente de dívida não comprovada.II.
QUESTÃO EM DISCUSSÃO2.
Há duas questões em discussão: (i) a validade da inscrição em cadastros restritivos de crédito diante da ausência de comprovação do contrato alegado pela instituição financeira; e (ii) a caracterização do dano moral in re ipsa em face de inscrição indevida.III.
RAZÕES DE DECIDIR3.
A responsabilidade do fornecedor de serviços é objetiva nos termos do art. 14 do CDC, sendo obrigatória a apresentação do contrato como prova da relação jurídica, ônus que não foi cumprido pela instituição financeira.4.
A inversão do ônus da prova em favor da consumidora é cabível no caso, ante a hipossuficiência evidenciada, nos termos do art. 6º, VIII, do CDC.5.
A inscrição indevida em cadastros restritivos gera dano moral presumido (in re ipsa), conforme Súmula 23 do TJRN, sendo desnecessária a demonstração de prejuízo concreto.6.
A incidência da Súmula 385 do STJ é afastada no caso, em razão de a autora questionar judicialmente outras inscrições negativas preexistentes.IV.
DISPOSITIVO E TESE7.
Recurso do Banco Santander desprovido e recurso da autora provido para condenação em danos morais.Tese de julgamento: 1.
A inscrição indevida em cadastro de inadimplentes gera dano moral presumido, sem necessidade de comprovação do prejuízo. 2.
Cabe ao fornecedor de serviços o ônus de provar a existência de relação jurídica que legitime a inscrição de inadimplentes.Dispositivos relevantes citados: CDC, arts. 6º, VIII, e 14; CPC, art. 373, II.Jurisprudência relevante citada: TJRN, Súmula 23; STJ, Súmula 385. ((APELAÇÃO CÍVEL, 0864999-60.2022.8.20.5001, Desª.
Sandra Elali, Segunda Câmara Cível, JULGADO em 02/10/2024, PUBLICADO em 11/10/2024; APELAÇÃO CÍVEL, 0802155-34.2023.8.20.5100, Des.
Virgílio Macêdo, Segunda Câmara Cível, JULGADO em 14/06/2024, PUBLICADO em 17/06/2024; APELAÇÃO CÍVEL, 0804915-06.2021.8.20.5300, Des.
Virgílio Macêdo, Segunda Câmara Cível, JULGADO em 06/03/2023, PUBLICADO em 06/03/2023) (Apelação Cível, 0800969-77.2023.8.20.5131, Desª.
Sandra Elali, Segunda Câmara Cível, Julgado em 05/12/2024).
Uma vez configurado o dano moral, passo a observar o quantum.
A fixação do valor da indenização à título de danos morais deve passar pelo crivo da razoabilidade, da proporcionalidade e da função pedagógica da punição, além de considerar a condição das partes envolvidas, a gravidade do dano e os precedentes dos tribunais.
No caso em questão, assiste razão ao apelo do Banco Bradesco S.A., uma vez que o Juízo a quo fixou o valor de R$ de 5.000,00 (cinco mil reais) ao sofrimento moral que acometeu a parte consumidora.
Considerando os parâmetros jurisprudenciais e a extensão do dano sofrido, percebe-se que o valor atribuído à título de danos morais merece ser reduzido, pois está acima do valor tradicionalmente expresso nos julgados dessa Corte de Justiça.
Tendo em conta os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, o que se constata é que o valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) há de se reduzido para R$ 4.000,00 (quatro mil reais).
Assim, dou provimento ao recurso da instituição financeira nesse ponto.
Pois bem, esgotada a análise da apelação do Banco Bradesco S.A., passo ao recurso de apelação de Odaci Alves de Oliveira Farias.
O pleito reformatório em si recai sobre a questão da indenização à título de danos materiais, isto é, a repetição em dobro dos valores indevidamente descontados da conta bancária da consumidora.
Nesse particular, a sentença de primeiro grau não acolheu inteiramente a pretensão da recorrente, pois modulou o pagamento em dobro apenas para os valores descontados após 31/03/2021, logo, os valores descontados antes dessa data devem ser devolvidos de forma simples.
Nessa questão, reconheço que a decisão a quo merece ser reformada.
Comprovada a nulidade do negócio jurídico, resta caracterizada a ilegitimidade dos descontos efetuados, sem que o banco tenha demonstrado a existência de qualquer erro escusável ou justificável.
A jurisprudência do STJ, mesmo após o julgamento do EDRESP nº 676.608, não afasta a restituição em dobro quando inexistente prova de engano justificável, aplicando-se, portanto, o disposto no art. 42, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor.
No presente caso, a instituição bancária, embora ciente da condição de analfabeta da consumidora, não observou as formalidades legais, o que por si só revela violação ao dever de cuidado e de informação conforme o art. 6° do CDC, suficientes para afastar a tese de boa-fé.
Assim, merece provimento a apelação da parte recorrente, para reformar a sentença a quo e determinar a devolução em dobro dos valores descontados, desde o início dos descontos indevidos.
Diante do exposto, conheço dos recursos.
Em relação ao apelo interposto pelo Banco Bradesco S.A. dou-lhe provimento parcial, apenas para minorar o valor da indenização à título de danos morais, valor esse que passa a ser R$ 4.000,00 (quatro mil reais), acrescido de juros de mora a partir do evento danoso (Súmula 54 do STJ) e correção monetária a partir do arbitramento (Súmula 362 do STJ).
Quanto ao apelo interposto por Odaci Alves de Oliveira Farias, dou-lhe provimento para determinar a restituição em dobro dos valores indevidamente descontados da conta bancária da consumidora, desde o início da relação contratual de empréstimo consignado (art. 42, parágrafo único, do CDC), acrescidos de juros de mora a partir do evento danoso (Súmula 54 do STJ) e correção monetária a partir do efetivo prejuízo (Súmula 43 do STJ).
Os valores aqui elencados deverão ser apurados em fase de liquidação de sentença.
Considerando o provimento parcial do recurso do Banco Bradesco S.A. e o provimento da apelação da parte consumidora, conclui-se que os pleitos da inicial foram julgados totalmente procedentes e, assim, deve-se manter o ônus sucumbencial em desfavor da instituição financeira.
Logo, as custa processuais e os honorários advocatícios devem permanecer nos termos fixados pelo Juízo de primeiro grau.
Em consonância com o entendimento da Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, expresso no Tema Repetitivo 1.059, deixo de majorar os honorários recursais.
A majoração prevista no art. 85, § 11, do Código de Processo Civil, não se aplica ao caso em questão.
Por fim, dou por prequestionados todos os dispositivos indicados pelo recorrente nas razões recursais, registrando que se considera manifestamente procrastinatória a interposição de embargos declaratórios com intuito nítido de rediscutir o decisum, nos termos do art. 1.026, § 2º, do Código de Processo Civil. É como voto.
Natal/RN, data de registro no sistema.
JUIZ CONVOCADO ROBERTO GUEDES Relator 19 Natal/RN, 22 de Abril de 2025. -
09/04/2025 00:00
Intimação
Poder Judiciário do Rio Grande do Norte Segunda Câmara Cível Por ordem do Relator/Revisor, este processo, de número 0801574-52.2024.8.20.5110, foi pautado para a Sessão VIRTUAL (Votação Exclusivamente PJe) do dia 22-04-2025 às 08:00, a ser realizada no 2ª CC Virtual (Votação Exclusivamente PJE).
Caso o processo elencado para a presente pauta não seja julgado na data aprazada acima, fica automaticamente reaprazado para a sessão ulterior.
No caso de se tratar de sessão por videoconferência, verificar o link de ingresso no endereço http://plenariovirtual.tjrn.jus.br/ e consultar o respectivo órgão julgador colegiado.
Natal, 8 de abril de 2025. -
01/03/2025 15:24
Recebidos os autos
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01/03/2025 15:24
Conclusos para despacho
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01/03/2025 15:24
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
01/03/2025
Ultima Atualização
23/06/2025
Valor da Causa
R$ 0,00
Detalhes
Documentos
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