TJRJ - 0809038-93.2022.8.19.0206
2ª instância - Câmara / Desembargador(a) 3ª C Mara de Direito Privado
Processos Relacionados - Outras Instâncias
Polo Ativo
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Polo Passivo
Partes
Advogados
Nenhum advogado registrado.
Assistente Desinteressado Amicus Curiae
Advogados
Nenhum advogado registrado.
Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
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25/09/2025 14:59
Documento
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25/09/2025 14:52
Documento
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03/09/2025 00:05
Publicação
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02/09/2025 00:00
Intimação
*** SECRETARIA DA 3ª CÂMARA DE DIREITO PRIVADO (ANTIGA 18ª CÂMARA CÍVEL) *** ------------------------- DECISÃO ------------------------- - APELAÇÃO 0809038-93.2022.8.19.0206 Assunto: Espécies de Contratos / Obrigações / DIREITO CIVIL Origem: SANTA CRUZ REGIONAL 2 VARA CIVEL Ação: 0809038-93.2022.8.19.0206 Protocolo: 3204/2025.00609778 APELANTE: BANCO DO BRASIL S A ADVOGADO: DIEGO MONTEIRO BAPTISTA OAB/RJ-153999 APELADO: DAMIAO BARBOSA DE MATTOS JUNIOR ADVOGADO: THASSIA LEIRA DOS REIS OAB/RJ-173870 Relator: DES.
FERNANDA XAVIER DE BRITO DECISÃO: Apelação Cível nº 0809038-93.2022.8.19.0206 Apelante: Banco do Brasil S.A.
Apelado: Damião Barbosa de Mattos Junior Relator: Desembargadora FERNANDA XAVIER DECISÃO MONOCRÁTICA APELAÇÃO CÍVEL.
DIREITO DO CONSUMIDOR.
AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZATÓRIA POR DANOS MORAIS.
NEGATIVAÇÃO INDEVIDA EM CADASTRO RESTRITIVO.
CONTRATO DE CARTÃO DE CRÉDITO IMPUGNADO POR FRAUDE.
AUSÊNCIA DE PROVA DA CONTRATAÇÃO REGULAR PELA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA.
DANO MORAL CONFIGURADO.
READEQUAÇÃO DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
SENTENÇA MANTIDA EM PARTE.
RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
I.
Caso em Exame: 1.
O autor relatou que seu nome foi negativado indevidamente em razão de dívida vinculada a contrato de cartão de crédito que desconhece, não tendo recebido ou utilizado o serviço. 2.
Foi proferida sentença de procedência.
II.
Questão em Discussão: 3.
Cinge-se a controvérsia à verificação da existência e regularidade do débito decorrente do contrato de cartão de crédito, à legitimidade da inscrição do nome do autor nos cadastros restritivos de crédito, bem como à análise da configuração do dano moral e da adequação do valor arbitrado a título de honorários sucumbenciais.
III.
Razões de Decidir: 4.
Preliminar de impossibilidade jurídica do pedido rejeitada.
Divergência interpretativa não obsta o exame do mérito. 5.
O réu não se desincumbiu do ônus de comprovar a regularidade da contratação, trazendo provas unilaterais e insuficientes para demonstrar o vínculo contratual, presumindo-se a fraude. 6.
Dano moral configurado em razão da inscrição indevida do nome do autor em cadastro restritivo. 7.
Honorários advocatícios readequados para 10% sobre o valor da condenação, considerando os princípios da razoabilidade e proporcionalidade.
IV.
Dispositivo: 8.
Recurso parcialmente provido.
Dispositivos relevantes citados: artigos 2º; 3º e §2º; 12; 14 e §3º, todos do CDC; artigos 85, §§2º e 11; 373, II, do CPC; Súmula nº 479 do STJ; e Súmula nº 94 do TJ-RJ.
Jurisprudências relevantes citadas: 0810707-84.2022.8.19.0206 - Apelação.
Des(a).
Sérgio Nogueira De Azeredo - Julgamento: 03/07/2025 - Vigésima Câmara De Direito Privado; e 0800556-04.2024.8.19.0040 - Apelação.
Des(a).
Fernanda Fernandes Coelho Arrabida Paes - Julgamento: 28/07/2025 - Nona Câmara De Direito Privado.
RELATÓRIO Trata-se de ação de obrigação de fazer c/c indenização por danos morais, com pedido de tutela antecipada, proposta por DAMIÃO BARBOSA DE MATTOS JUNIOR contra o BANCO DO BRASIL S.A.
Em sua inicial, a autora alegou que é pessoa idônea e que sempre honrou com seus compromissos financeiros, aduzindo que foi surpreendida com a negativa de uma compra a crédito em razão de uma restrição indevida em seu CPF.
Sustentou que, ao consultar seu nome nos órgãos de proteção ao crédito, constatou a existência de um débito no valor de R$869,04 (oitocentos e sessenta e nove reais e quatro centavos), vinculado a um suposto contrato de cartão de crédito firmado com a ré, o qual desconhece.
Relatou que, embora tenha solicitado anteriormente um cartão à empresa ré, a proposta não teria sido aprovada, razão pela qual jamais recebeu o cartão ou usufruiu do serviço.
Pontuou que tentou solucionar o impasse administrativamente, mas não obteve êxito, permanecendo a restrição em vigor.
Assim, requereu a concessão da tutela antecipada de urgência para que fosse determinada, no prazo de 48 horas, a exclusão de seu nome dos cadastros de inadimplentes, em razão da negativação decorrente do contrato nº 000000000001403.
No mérito, pugnou pela procedência do pedido, com a confirmação da tutela anteriormente deferida, o cancelamento do referido contrato e de todas as cobranças a ele vinculadas, a declaração de inexigibilidade do débito e a condenação da ré ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$20.000,00 (vinte mil reais).
Decisão, no índice 22038756, concedendo a gratuidade de justiça e indeferindo o pedido de antecipação de tutela.
Contestação apresentada no índice 26696959, na qual o réu, em preliminar, impugnou a concessão da assistência judiciária gratuita e arguiu a impossibilidade jurídica do pedido.
No mérito, sustentou que o contrato discutido foi regularmente celebrado mediante apresentação de documentação válida, de forma eletrônica, relatando que houve movimentações típicas de uso do cartão, como pagamentos, parcelamento de fatura e tentativa de acordo extrajudicial.
Aduziu que não há elementos que indiquem fraude ou irregularidade, tampouco registro de contestação nos canais de atendimento.
Defendeu a ausência dos requisitos para concessão da tutela de urgência.
Ao final, impugnou o pedido de indenização por danos morais, afirmando que inexiste ato ilícito praticado pela instituição e que o valor pleiteado se mostra excessivo.
Instadas as partes em provas (índice 48391967), o autor informou que não possui outras provas a produzir e declarou concordância com o julgamento antecipado da lide (índice 49245997), enquanto o autor não se manifestou, conforme certificado no índice 83356029.
Réplica apresentada no índice 87653967.
Decisão saneadora no índice 96350632.
Sentença, no índice 101487751, julgando procedentes os pedidos autorais, nos seguintes termos: "(...)É o Relatório.
DECIDO.
Impõe-se o julgamento da lide, diante da desnecessidade de produção de outras provas para o deslinde da controvérsia, com o que anuíram as partes, expressamente, estando o feito suficientemente instruído com os elementos necessários ao convencimento motivado dessa Julgadora.
Sobre esse ponto, destaco entendimento do E.
STJ, consagrado nos autos do Resp nº 1.736.648-RJ, de relatoria da Exma.
Min.
Maria Isabel Galloiti, no sentido de que, embora o juiz tenha ampla iniciativa probatória e, em busca da verdade real e da efetividade da Justiça, possa determinar a realização de provas de ofício, não se pode desconsiderar o ônus probatório que incumbe a cada uma das partes, na esteira do artigo 373 do CPC.
Portanto, oportunizado às partes indicar ou produzir as provas com que pretendem fundamentar suas alegações e, ainda assim, quedando-se inertes, faz-se mister prolatar o julgamento adequado ao conjunto probatório carreado aos autos, haja vista se tratar de direito disponível.
A priori, rejeito a preliminar de impossibilidade jurídica do pedido, porquanto a mera contraposição a legislações não significa que o pleito deduzido afronta o ordenamento jurídico a impedir o seu conhecimento.
Ademais, a existência de previsão legal em sentido contrário ao pretendido pelo demandante não basta, por si só, para embasar o reconhecimento da preliminar suscitada, considerando-se as inúmeras interpretações que lhe podem ser conferidas.
Em seguida, passo ao exame do mérito.
A presente questão versa sobre relação de consumo, pois a parte autora enquadra-se no conceito de consumidor descrito no art. 2º do Código de Proteção e Defesa do Consumidor e a parte ré no de fornecedor, nos termos do art. 3º, § 2º do mesmo diploma legal, pois aquela é a destinatária final do produto ofertado por esta.
Tratando-se de responsabilidade objetiva, com fulcro no artigo 14 do CPCD, que adota a teoria do risco do empreendimento, o fato exclusivo da vítima ou o fato de terceiro é ônus do prestador de serviços, nos termos do §3º da referida norma.
Outrossim, pela teoria do risco do empreendimento, aquele que se dispõe a fornecer bens e serviços tem o dever de responder pelos fatos e vícios resultantes dos seus negócios, independentemente de sua culpa, pois a responsabilidade decorre do simples fato de alguém se dispor a realizar atividade de produzir, distribuir e comercializar ou executar determinados serviços.
Compulsando os autos, verifico que a parte ré não se desincumbiu do ônus probatório que lhe incumbia, na esteira do artigo 373, II do CPC, deixando de desconstituir os fatos que embasam o direito da parte autora, enquanto essa, por sua vez, logrou êxito em acostar lastro de provas suficientes a constituir o seu direito, na forma do inciso I do mencionado dispositivo legal.
E isso, porque, embora acostada a solicitação de cartão de crédito (o que é dito na inicial e em réplica), não há prova efetiva de recebimento e desbloqueio, com assinatura e identificação.
O pagamento parcial da fatura, por si só, não presume a legitimidade do uso pelo demandante.
Nessa linha, com relação à alegação defensiva de segurança do sistema da requerida, no que toca aos cartões com chip, seria possível cogitar variadas hipóteses para justificar o ocorrido, como por exemplo, que o referido sistema pode ter brechas técnicas, que o cartão foi utilizado por terceiros fraudadores.
Aliás, a instituição ré tem o poder de administração do cartão de crédito disponibilizado ao demandante, sendo responsável por ele, inclusive, recebendo pela prestação desse serviço.
Exatamente, por isso, ao autorizar o lançamento/pagamento de qualquer despesa deve justificá-lo de forma pontual, com respaldo fático e não apenas técnico-genérico. É necessário que se prove faticamente o que ocorreu, considerada a responsabilidade objetiva decorrente da atividade econômica prestada em relação ao consumidor hipossuficiente.
Destarte, constato que não basta que se alegue que foram utilizados um cartão e uma senha, esta supostamente pessoal e intransferível, para justificar as despesas impugnadas pela parte autora, pois é notório que quaisquer mecanismos, por mais seguros e tecnologicamente evoluídos que sejam, possuem suas falhas.
Noto que, tanto é assim, que cada caixa/terminal eletrônico possui sua câmera individual, de forma a salvaguardar as instituições financeiras de eventuais fraudes, o que também ocorre nos estabelecimentos comerciais, inclusive, com registro fotográfico no momento da compra.
E mais.
O evento ocorrido é evidentemente de responsabilidade da ré, consoante entendimento consolidado do E.
STJ ao julgar a controvérsia submetida ao Tema 466, cuja tese é a seguinte: "As instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias".
Restou notória, portanto, a falha na prestação de serviços pela parte ré a ensejar a sua responsabilização, que incluiu o nome da autora no banco de dados restritivos de crédito, muito embora não houvesse qualquer inadimplemento.
Friso, ainda, que não se trata de inversão do ônus da prova, como pode pretender alegar a parte ré, mas da distribuição do ônus probatório de acordo com os ditames do Código de Processo Civil, pois, como já dito, na forma do artigo 373 II do mencionado diploma legal, cabe ao réu desconstituir os fatos constitutivos do direito do autor, o que, no caso em tela, entretanto, não ocorreu.
Além disso, não se pode compelir a parte demandante a produzir prova negativa, ou seja, de que não contratou a avença objeto do feito, pois se trata de prova diabólica, inviável de ser produzida pela parte.
Pois bem. É evidente que a atividade empresarial busca auferir bônus, mas, de certo, não pode estar limitada a eles, devendo arcar, também, com os ônus que decorrem do seu exercício.
O caso em tela revela verdadeiro fortuito interno, que não pode ser considerado excludente de responsabilidade do prestador de serviços, pois emerge do risco do negócio desenvolvido, e não há imprevisibilidade ou inevitabilidade que o descaracterizem.
Presentes dois pilares da responsabilidade civil, quais sejam a conduta voluntária e o nexo causal, nos termos do artigo 927 do CCB, mister analisar a existência de danos sofridos pela parte demandante.
Com relação ao dano moral, é evidente que os incisos V e X do artigo 5º da Constituição da República asseguraram a indenização por dano moral como forma de compensar a agressão à dignidade humana, entendendo-se esta como dor, vexame, sofrimento ou humilhação, angústias e aflições sofridas por um indivíduo, fora dos parâmetros da normalidade e do equilíbrio.
Entretanto, ainda que defeituosa a relação jurídica travada entre as partes, sendo, inclusive, capaz de ocasionar danos materiais e aborrecimentos, não se pode banalizar a previsão constitucional da indenização por danos morais, pretendendo condenar qualquer ato que cause o mínimo de aborrecimento, formando-se uma verdadeira indústria do dano moral.
O princípio da dignidade da pessoa humana, evidentemente aplicável ao caso, não pode ser ilimitadamente posto em cena, para justificar toda e qualquer situação que não atinja os traços previamente designados pelas partes.
Em razão disso, há entendimento consolidado no sentido de que não ocasionam dano extrapatrimonial aquelas situações que, não obstante desagradáveis, fazem parte do cotidiano da sociedade contemporânea e constituem tão-somente mero aborrecimento.
In casu, contudo, vislumbro a ocorrência de danos morais, diante da inclusão indevida do nome da parte autora em cadastro protetivo de crédito, violando a honra, o bom nome e a reputação idônea da mesma.
E, mais ainda, incontroverso o fato causador do dano moral, este decorre in re ipsa, não havendo necessidade de comprovação da sua existência, per si, para ensejar a sua compensação.
Quanto ao valor da reparação, o arbitramento judicial do valor dos danos morais deve ser exercido dentro dos limites da razoabilidade e da proporcionalidade.
Devem-se adotar critérios norteadores da fixação do valor da condenação, onde se leve em conta o grau de culpa do agente, eventual culpa concorrente da vítima e as condições econômicas das partes.
Em razão disso, fixo a quantia de R$ 4.000,00 (quatro mil reais), que deverá ser corrigida monetariamente a partir da publicação desta decisão, consoante o verbete 97 da súmula de jurisprudência do TJRJ, e acrescida de juros de mora de 1% ao mês, a contar da citação, por se tratar de relação contratual.
Ante o exposto, nos termos do art. 487, I do Código de Processo Civil, JULGO PROCEDENTE o pedido para: a) determinar a exclusão dos bancos de dados restritivos do apontamento feito pelo banco réu ao nome do autor, referente ao contrato nº 000000000001403, no valor de R$ 1.687,60.
Oficie-se. b) declarar a inexistência do débito pendente em nome da parte autora junto à parte ré, referente ao contrato nº 000000000001403; c) declarar o cancelamento do contrato nº 000000000001403, pendente em nome da autora junto ao banco réu; d) condenar a parte ré a pagar à parte autora, a título de danos morais, a quantia de R$ 4.000,00 (quatro mil reais), corrigida monetariamente a partir da publicação desta sentença, e acrescida de juros de mora, de 1% ao mês, a partir da citação.
Condeno-a, ainda, ao pagamento dos ônus sucumbenciais, fixados os honorários advocatícios em 20% sobre o valor da condenação, observados os requisitos do artigo 85, §2º do CPC.
Certificados o trânsito em julgado, a inexistência de custas pendentes e a inércia das partes, dê-se baixa e remeta-se à Central de Arquivamento.
P.I.".
Inconformado, o réu, ora apelante, interpôs o recurso de apelação, no índice 105825189, sustentando, em preliminar, a impossibilidade jurídica do pedido.
No mérito, argumentou que inexiste suporte fático e jurídico à pretensão autoral, aduzindo que o contrato foi celebrado de forma legítima, mediante apresentação de documentação digitalizada, e que houve utilização regular do cartão, com movimentações, parcelamentos e tentativa de acordo extrajudicial.
Alegou que a instituição bancária agiu dentro da legalidade, observando os princípios contratuais, o dever de informação e o regular exercício de direito, não havendo que se falar em falha na prestação dos serviços.
Relatou ainda que eventual ausência de notificação prévia da negativação seria de responsabilidade exclusiva do órgão mantenedor, afastando qualquer ilicitude de sua conduta.
Invocou, também, excludentes de responsabilidade, como fato de terceiro e culpa exclusiva da vítima, além de impugnar a declaração de inexistência de débito e a configuração de danos morais.
Por fim, requereu a redução do valor fixado a título de honorários sucumbenciais, por considerá-lo exorbitante e desproporcional.
Contrarrazões apresentadas pelo autor no índice 146176975, requerendo o desprovimento do recurso. É O RELATÓRIO.
PASSO A DECIDIR.
Conheço do recurso, eis que preenchidos os seus requisitos intrínsecos e extrínsecos de admissibilidade.
Rejeito, de início, a preliminar de impossibilidade jurídica do pedido.
A existência de previsão legal que, em tese, contrarie a pretensão deduzida em juízo não torna o pedido inadmissível.
O Judiciário não se exime do exame da matéria simplesmente em razão de interpretações divergentes sobre o alcance e aplicação das normas envolvidas.
O que se discute no presente feito insere-se no campo das teses jurídicas passíveis de debate, sendo plenamente viável o seu enfrentamento no mérito.
Ausentes outras questões preliminares a serem enfrentadas, passo ao exame do mérito do recurso.
Cinge-se a controvérsia à verificação da existência e regularidade do débito decorrente do contrato de cartão de crédito, à legitimidade da inscrição do nome do autor nos cadastros restritivos de crédito, bem como à análise da configuração do dano moral e da adequação do valor arbitrado a título de honorários sucumbenciais.
O caso em tela cuida de relação de consumo sobre a qual tem incidência as normas do Código de Defesa do Consumidor, uma vez que se encontram presentes, no caso em comento, os requisitos legais subjetivos (artigos 2º e 3º da Lei 8078/90) e objetivos (artigo 3º, § 2º, do mesmo diploma legal).
Sabe-se que a teoria do risco do empreendimento foi adotada pelo Código de Defesa do Consumidor, o qual estabeleceu a responsabilidade objetiva para todos os casos de acidente de consumo, quer decorrente do fato do produto (CDC, artigo 12), quer do fato do serviço (CDC, artigo 14).
Nessa linha de raciocínio, tem-se que é objetiva a responsabilidade do fornecedor de serviços, conforme dispõe o artigo 14, §3º, do CDC: "Art. 14.
O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos. (...) § 3° O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar: I - que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste; II - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro." Noutro giro, as instituições bancárias, como prestadoras de serviços especialmente contempladas no artigo 3º, § 2º, estão submetidas às disposições do Código de Defesa do Consumidor.
Inteligência do verbete sumular nº 297 do STJ: "O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras".
No caso em análise, o autor alegou que seu nome foi negativado indevidamente em razão de dívida relativa a cartão de crédito que desconhece, vinculada ao contrato nº 000000000001403, atribuindo tal situação à ocorrência de possível fraude.
Aduziu, ainda, que, apesar de ter solicitado cartão junto à instituição financeira ré em momento anterior, sua proposta não foi aprovada, razão pela qual jamais recebeu cartão ou utilizou serviço prestado pela ré.
Em sua defesa, a instituição financeira ré argumentou a regularidade da contratação, trazendo aos autos cópia de documento de identidade e fotografia do autor (índices 26696999 e 26697000), além de telas sistêmicas de extratos, comprovantes de movimentações financeiras e parcelamentos (índice 26696998), os quais, segundo alega, comprovariam o uso do cartão.
Contudo, tais elementos não se mostram suficientes para demonstrar, de forma inequívoca, que a utilização do cartão tenha sido efetivamente realizada pelo autor.
A despeito das movimentações apresentadas, não há prova da entrega física do cartão, nem da realização do desbloqueio mediante identificação pessoal e assinatura do titular.
Ademais, as telas sistêmicas anexadas aos autos não constituem, por si só, prova robusta da contratação, uma vez que são documentos unilaterais, elaborados exclusivamente pela parte ré, sem qualquer chancela externa ou comprovação de autenticidade, o que compromete sua força probatória.
Cumpre destacar, ainda, que, apesar da juntada de cópia do documento de identidade e fotografia do autor (índices 26696999 e 26697000), inexiste qualquer comprovação de que tais documentos tenham sido utilizados para a contratação do cartão em questão.
Tal constatação ganha relevo diante da alegação do autor de que, em oportunidade anterior, teria encaminhado a referida documentação à instituição ré para fins de contratação de cartão, tendo, contudo, sua proposta sido recusada - alegação que, registre-se, não foi impugnada de forma específica pela parte ré.
Dessa forma, o réu não se desincumbiu do ônus que lhe competia, nos termos do artigo 373, inciso II, do Código de Processo Civil, cabendo-lhe, na qualidade de instituição financeira e responsável pela gestão do serviço, apresentar elementos objetivos e idôneos que comprovassem a regularidade da contratação imputada ao autor, o que não se verificou nos autos.
Assim, tem-se que o contrato impugnado é fraudulento, conforme corretamente reconhecido na sentença.
Nesse cenário, a responsabilidade do banco réu é clara, pois, como prestadora de serviços, a instituição financeira deve responder pelos danos causados pela fraude em suas operações, ainda que praticada por terceiros.
Esse entendimento é reforçado pela Súmula nº 479 do STJ, a qual dispõe o seguinte: "As instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados pelo fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias".
No mesmo sentido, a Súmula nº 94 desta Corte Estadual, destaca que: "Cuidando-se de fortuito interno, o fato de terceiro não exclui o dever do fornecedor de indenizar".
Sobre o tema, colaciona-se o seguinte julgado: "Apelação Cível.
Ação Declaratória de Inexistência de Débito c/c Reparatória por Danos Morais.
Relação de Consumo.
Instituição Financeira.
Verbete nº 297 da Súmula do Insigne Tribunal da Cidadania.
Narrativa de negativação dos dados cadastrais do Postulante em virtude de dívida originada por uso cartão de crédito que alega não haver contratado.
Sentença de parcial procedência para: "a) declarar a inexistência do contrato de cartão de crédito discutido nos presentes autos; b) declarar a inexistência de débito em nome do autor, em relação ao contrato de cartão de crédito discutido nos presentes autos, em relação à instituição ré".
Irresignação defensiva.
Não conhecimento da pretensão direcionada ao afastamento da aduzida "devolução em dobro dos valores" e da reparação dos danos extrapatrimoniais.
Requerimento dissociado do contexto fático dos autos.
Decisum meramente declaratório, inexistindo condenação repetitória e reparatória em face do Réu.
Violação ao Princípio da Dialeticidade.
Inadmissibilidade parcial do recurso.
Preliminares.
Efeito suspensivo que, na hipótese, já decorre automaticamente da regra geral prevista no art. 1.012, caput, do CPC.
Rejeição do pedido de revogação da gratuidade de justiça deferida ao Apelado.
Benesse concedida pelo Juízo a quo amparada em prova constante dos autos, notadamente na CTPS e nas declarações de Imposto de Renda adunadas ao feito pelo litigante.
Mérito.
Autor que não negou a existência de anterior relação jurídica com o banco advinda de abertura de conta corrente.
Demandante que rechaça, contudo, a contratação do cartão bancário.
Documentos acostados pelo Apelante que demonstram apenas a celebração do contrato de abertura de conta.
Réu que não adunou qualquer prova que comprovasse a celebração do contrato de cartão de crédito ou o recebimento do plástico pelo consumidor, limitando-se a colacionar faturas produzidas unilateralmente e contratos com cláusulas gerais, sem a assinatura do Apelado.
Recorrente que não se desincumbiu do ônus de demonstrar a existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do Autor, nos termos do art. 373, II, do CPC, ou de excludente de sua responsabilidade objetiva.
Incidência do Verbete Sumular nº 94 deste Nobre Sodalício ("As instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias.") e do Verbete Sumular nº 479 do STJ ("Cuidando-se de fortuito interno, o fato de terceiro não exclui o dever do fornecedor de indenizar.").
Falha na prestação do serviço demonstrada.
Manutenção do decisum recorrido.
Honorários recursais.
Aplicabilidade do disposto no art. 85, §11, do CPC.
Conhecimento parcial e desprovimento do recurso. (0810707-84.2022.8.19.0206 - APELAÇÃO.
Des(a).
SÉRGIO NOGUEIRA DE AZEREDO - Julgamento: 03/07/2025 - VIGESIMA CAMARA DE DIREITO PRIVADO (ANTIGA 11ª CÂMARA CÍVEL))" Assim, reconhecida a fraude que afasta o vínculo contratual entre as partes e inexistindo respaldo legal para a cobrança e a consequente negativação imputada ao autor, revela-se acertada a sentença que determinou o cancelamento do contrato nº 000000000001403, declarou a inexistência do débito e ordenou a exclusão do nome do autor dos bancos de dados restritivos relacionados ao referido contrato.
No que tange à alegação de inexistência de danos morais, tal argumento não merece acolhida.
A inscrição indevida do nome do autor em cadastros restritivos atinge a esfera extrapatrimonial, configurando dano moral passível de reparação.
A esse respeito, destaca-se o entendimento consolidado na Súmula nº 89 deste Tribunal de Justiça, que assim dispõe: "A inscrição indevida de nome do consumidor em cadastro restritivo de crédito configura dano moral, devendo a verba indenizatória ser fixada de acordo com as especificidades do caso concreto, observados os princípios da razoabilidade e proporcionalidade." Nesse sentido, segue julgado deste E.
Tribunal: "DIREITO DO CONSUMIDOR E CIVIL.
APELAÇÃO CÍVEL.
NEGATIVAÇÃO INDEVIDA.
DANO MORAL CONFIGURADO.
INDENIZAÇÃO MANTIDA.
RECURSO DESPROVIDO.
I.
CASO EM EXAME Apelação cível interposta contra sentença que, nos autos de ação indenizatória cumulada com obrigação de fazer e pedido declaratório reconheceu a inexistência de débito e condenou a ré ao pagamento de R$ 10.000,00 a título de danos morais, em razão de negativação indevida do nome do autor junto a cadastros de inadimplentes e protesto extrajudicial, por dívida que o autor comprovadamente não possuía.
II.
QUESTÃO EM DISCUSSÃO Há duas questões em discussão: (i) verificar se a negativação indevida configura ato passível de reparação por danos morais; e (ii) avaliar se o valor indenizatório fixado na sentença atende aos critérios de razoabilidade e proporcionalidade.
III.
RAZÕES DE DECIDIR A concessionária ré não comprova a existência de débito que justificasse a inscrição do nome do autor nos cadastros restritivos de crédito, descumprindo o ônus probatório previsto no art. 14, § 3º, do Código de Defesa do Consumidor (CDC).
A existência de divergência entre as datas alegados pela ré e os registrados nos sistemas de proteção ao crédito evidencia a ausência de substrato fático-jurídico válido para a negativação, o que a torna indevida.
Conforme dispõe a Súmula nº 89 do TJRJ, a negativação indevida configura dano moral in re ipsa, ou seja, prescinde de demonstração do abalo moral concreto, pois o próprio ilícito gera, por si, a lesão à honra e imagem do consumidor.
Quanto ao valor da indenização, a verba de R$10.000,00 está adequada, considerando-se (i) a extensão do dano causado pela manutenção indevida do registro desabonador por meses; (ii) o caráter punitivo-pedagógico da verba indenizatória; e (iii) os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, compatíveis com precedentes análogos desta Câmara.
IV.
DISPOSITIVO Recurso desprovido. (0800556-04.2024.8.19.0040 - APELAÇÃO.
Des(a).
FERNANDA FERNANDES COELHO ARRABIDA PAES - Julgamento: 28/07/2025 - NONA CAMARA DE DIREITO PRIVADO (ANTIGA 2ª CÂMARA CÍVEL))" Importante mencionar, por oportuno, que a inscrição promovida pelo réu ocorreu em 28/09/2021, não havendo, antes dessa data, qualquer débito registrado em nome do autor (índice 21778264).
Dessa forma, não se aplica ao presente caso o entendimento firmado na Súmula 385 do Superior Tribunal de Justiça.
Por fim, no que concerne à verba honorária fixada na sentença, assiste razão ao réu, ora apelante, quanto ao pedido de readequação do percentual arbitrado.
Embora se reconheça o empenho do patrono da parte autora, a controvérsia posta nos autos não apresenta elevada complexidade nem demandou ampla instrução probatória, circunstâncias que não justificam a fixação dos honorários sucumbenciais no patamar de 20% (vinte por cento) sobre o valor da condenação.
Desse modo, mostra-se necessário o ajuste da verba honorária para o percentual de 10% (dez por cento), em conformidade com os parâmetros delineados no § 2º do artigo 85 do Código de Processo Civil, respeitando-se, assim, os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade que devem orientar a fixação dos honorários advocatícios.
Pelo exposto, CONHEÇO e DOU PARCIAL PROVIMENTO ao recurso, para reduzir os honorários advocatícios para 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da condenação, mantendo-se a sentença nos demais termos.
Considerando o parcial provimento do recurso, deixo de majorar a verba honorária, na forma do artigo 85, § 11, do CPC.
Rio de Janeiro, na data da assinatura eletrônica.
Desembargadora FERNANDA XAVIER Relatora Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro Terceira Câmara de Direito Privado AP nº 0809038-93.2022.8.19.0206 (A) -
30/08/2025 16:41
Provimento em Parte
-
29/07/2025 00:05
Publicação
-
24/07/2025 11:07
Conclusão
-
24/07/2025 11:00
Distribuição
-
23/07/2025 15:38
Remessa
-
20/07/2025 15:36
Recebimento
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
20/07/2025
Ultima Atualização
25/09/2025
Valor da Causa
R$ 0,00
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