TJPI - 0801408-68.2024.8.18.0068
1ª instância - Vara Unica de Porto
Polo Ativo
Polo Passivo
Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
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05/09/2025 00:00
Intimação
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO PIAUÍ Vara Única da Comarca de Porto Centro, 212, Avenida Presidente Vargas, PORTO - PI - CEP: 64145-000 PROCESSO Nº: 0801408-68.2024.8.18.0068 CLASSE: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) ASSUNTO(S): [Dever de Informação] AUTOR: BENEDITA CARDOSO LOURENCO REU: BANCO BRADESCO S.A.
SENTENÇA I – RELATÓRIO PROCESSO PELO RITO ORDINÁRIO Parte autora, já devidamente qualificada nos autos, ajuizou AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE CONTRATUAL C/C REPETIÇÃO DO INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS em desfavor da parte requerida, também já qualificada nos autos na forma da lei.
A parte autora narra que tomou conhecimento de diversos descontos realizados em sua conta (agência 5792 – conta 581475-8 Bradesco) referente a descontos mensais de anuidade de crédito que não contratou.
Ao final, requer o cancelamento do contrato, repetição do indébito em dobro e indenização por danos morais.
Para provar o alegado, juntou documentos.
Foi determinada a citação da parte requerida.
Citada, a requerida apresentou contestação e documentos alegando inexistência de ato ilícito e a não incidência de dano material.
Ressalta ainda a impossibilidade de repetição do indébito em dobro e, ausência de danos morais.
Parte requerida juntou faturas do cartão de crédito.
Parte requerente intimada apresentou réplica. É o breve relatório.
Passo a decidir.
II – FUNDAMENTAÇÃO Inicialmente, verifico a possibilidade de julgamento antecipado da lide, uma vez que, sendo a matéria de direito e de fato, não há necessidade de produção de provas em audiência, pois os documentos que constam no feito são suficientes para a formação de um juízo seguro a respeito da melhor solução para o caso em tela (art. 355, I, do CPC).
DA AUSÊNCIA DE PRETENSÃO RESISTIDA Não merece prosperar também a alegação da defesa quanto a falta de interesse da autora, pois nesses tipos de ações o requerimento administrativo não é condição da ação sob pena de violar o princípio da inafastabilidade da jurisdição, havendo interesse de agir, nos termos informados na inicial (teoria da asserção).
PRESCRIÇÃO Compulsando os autos, verifico que o desconto questionado nos autos teve seu primeiro desconto em julho de 2019, a presente demanda foi protocolada em julho de 2024.
Nisso, o art. 27 do CDC reza que, prescreve em cinco anos a pretensão à reparação pelos danos causados por fato do produto ou do serviço prevista na Seção II deste Capítulo, iniciando-se a contagem do prazo a partir do conhecimento do dano e de sua autoria.
Assim, tenho que o conhecimento e a sua autoria se dá a partir de cada desconto realizado.
Diante disso, não reconheço a prescrição apontada pela requerida.
Do mérito Cumpre registrar que a relação jurídico-material deduzida na inicial se enquadra como relação de consumo, nos termos do § 2º, do artigo 3º, da Lei nº 8.078/90, e neste caso, a responsabilidade do fornecedor é de ordem objetiva.
Segundo inteligência do artigo 14 do CDC, que trata da responsabilidade objetiva do fornecedor de serviço, funda-se na teoria do risco do empreendimento, segundo a qual todo aquele que se dispõe a exercer alguma atividade no campo do fornecimento de bens e serviços tem o dever de responder pelos fatos e vícios resultantes do empreendimento independentemente de culpa.
E, de acordo com § 3º, II, do mesmo artigo, cabe ao Banco prestador de serviço provar a culpa exclusiva do consumidor, para que possa eximir-se do dever de indenizar.
A parte autora alega que vem observando descontos indevidos em sua conta bancária, referente à anuidade de cartão de crédito não ajustadas, uma vez usa o seu cartão apenas para recebimento do benefício.
Em contestação, o Banco defende a regularidade dos descontos das anuidades.
O valor questionado pela autora refere-se à cobrança de anuidade de cartão de crédito, debitada de sua conta bancária por serviços que afirma não ter contratado.
Através do extrato bancário acostado pela requerente (ID 60393694), verifica-se que a requerente efetivamente sofreu descontos referentes à anuidade do cartão de crédito, fato incontroverso diante da ausência de impugnação pelo demandado.
De acordo com as regras de distribuição do ônus da prova, contempladas no art. 333, I e II do CPC, cabe ao autor demonstrar os fatos constitutivos do seu direito e ao réu comprovar a existência dos fatos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito do autor.
Uma vez comprovados os descontos efetuados, a parte autora cumpriu com o ônus que a legislação processual civil lhe confere, não cabendo imputar-lhe a produção de prova de fato negativo, qual seja, a ausência de contratação.
Assim, cabia ao requerido demonstrar a contratação do produto/serviço, conforme determinado pelo juízo.
Contudo, o banco não apresentou o suposto contrato firmado entre as partes, não se desincumbindo do ônus que lhe competia.
Destaque-se que, embora às instituições bancárias seja legítimo realizar a cobrança correspondente aos serviços prestados ao correntista, tais encargos devem ser previamente pactuados entre as partes.
Além disso, o demandado não comprovou o fornecimento de serviços referentes a cartão de crédito, deixando de demonstrar a contratação por instrumento escrito, eletrônico ou telefônico.
Também não acostou prova do recebimento do cartão de crédito e de seu desbloqueio e uso, apenas juntou as faturas que comprovam unicamente a cobrança de anuidade, não demonstrando a utilização de crédito, do que resulta a impossibilidade da cobrança.
Importante ressaltar que constitui prática abusiva, em conformidade ao art. 39, IV e VI, do CDC, impor ao consumidor serviço não autorizado expressamente e prevalecendo-se de sua fraqueza ou ignorância: Art. 39. É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas:… IV – prevalecer-se da fraqueza ou ignorância do consumidor, tendo em vista sua idade, saúde, conhecimento ou condição social, para impingir-lhe seus produtos ou serviços; VI – executar serviços sem a prévia elaboração de orçamento e autorização expressa do consumidor, ressalvadas as decorrentes de práticas anteriores entre as partes.” Portanto, na ausência de contrato, as alegações da parte autora adquirem caráter de verossimilhança, reputando-se indevidos os descontos impugnados.
Em consequência, o valor correspondente deve ser ressarcido.
Dessa forma, ante a não comprovação da contratação, são indevidos os descontos efetuados na conta do requerente.
DA REPETIÇÃO DE INDÉBITO No que concerne à repetição do indébito, o art. 42, parágrafo único, da Lei nº 8.078/90 prevê que o consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável.
Interpretando o dispositivo, o Superior Tribunal de Justiça no julgamento do EAREsp nº 676.608/RS, em 21/10/2020, firmou entendimento no sentido de que a restituição em dobro do indébito, prevista no parágrafo único do art. 42 do CDC, independe da natureza do elemento volitivo do fornecedor que cobrou o valor indevidamente, mostrando-se cabível quando a cobrança indevida consubstanciar conduta contrária à boa-fé objetiva.
Considerando que o réu sequer apresentou prova da contratação, não há como considerar justificável o engano.
Além disso, a conduta do Banco de prevalecer-se da condição de agente administrador da conta bancária para efetuar descontos sem contratação, respaldo legal ou autorização do cliente configura comportamento contrário à boa-fé objetiva, eis que o consentimento inexistiu.
Dessa forma, cumprirá ao requerido ressarcir em dobro os valores descontados dos vencimentos do requerente.
No que concerne ao pedido de danos morais, o mesmo merece procedência.
Com certeza, os descontos mensais em seu benefício previdenciário causaram angústia superior ao mero aborrecimento, ainda mais sabendo que não havia avençado o mesmo.
Estão presentes, pois, os elementos caracterizadores da responsabilidade civil da empresa, ou seja, ato ilícito (cobrança de contrato não contratado validamente, já que não foi apresentado), nexo causal e o dano.
A presente ação foi proposta nos limites da reparação de danos morais puro, isto é, a reparação do dano em relação à reputação, a vergonha e a honra da pessoa, que uma vez violados, em qualquer circunstância, ferem sentimentos íntimos de caráter subjetivo do indivíduo, provocando sofrimento, sem conexão com o dano material.
Considera-se dano moral, segundo nosso mestre des.
ARTUR DEDA: “a dor resultante da violação de um bem jurídico tutelado, sem repercussão patrimonial.
Seja a dor física – dor/sensação, como denomina Carpenter – nascida de uma lesão material; seja a dor moral- dor/sentimento- de causa material”.
Difícil tarefa é sobre o que configura o dano moral, por isso, cumpre-se seguir a trilha da lógica do razoável em busca da sensibilidade do homem-médio.
A regra é que o dano não se presume, havendo, inclusive decisões que desaconselham a pretensão indenizatória por falta de prova.
Entendo, entretanto, como outros, entre eles o Desembargador Sérgio Cavalieri Filho, que por se tratar de algo imaterial ou ideal ele não pode ser provado pelos meios utilizados para a comprovação do dano material, pois o dano está ínsito na própria ofensa, decorre de gravidade do ilícito em si.
Sendo a ofensa grave ou de repercussão, por si só justifica a concessão de uma satisfação de ordem pecuniária ao lesado.
Em outras palavras, como diz o desembargador retromencionado, “o dano moral existe in re ipsa, deriva inexoravelmente do próprio fato ofensivo, de tal modo que, provada a ofensa, ipso facto, está demonstrado o dano moral à guisa de uma presunção material, uma presunção hominis in factus, que decorre das regras de expressão comum”. É sabido que o conceito reparatório dos transtornos sofridos pela parte autora tem dois caracteres, um punitivo e um compensatório: a) caráter punitivo: objetiva-se que o causador do prejuízo sofra uma condenação e se veja castigado pela ofensa que praticou; b) caráter compensatório: para que a vítima receba certa quantia que lhe proporcione prazer em contrapartida ao mal sofrido, tendo, assim, a condenação pecuniária, função meramente satisfativa.
Não se pode confundir, entretanto, na necessidade de restabelecer a situação quo ante, pois a dor não tem preço.
Não se pode ainda perder de vista que a reparação por dano moral deve ser arbitrada moderadamente, evitando-se assim a perspectiva de lucro fácil e generoso, o locupletamento indevido.
Como sustenta Antônio Jeová Santos, ainda sobre o arbitramento do quantum indenizatório, “Não se pode taxar a Magistratura de ora egoísta, ora generosa.
Juízes avaros e outros pródigos.
Ninguém do povo entenderá essa disparidade e tudo contribui para o descrédito da justiça.
Não está sendo apregoada a uniformidade, para não vulnerar a independência do juiz, mas critério que evite indenizações díspares em situações assemelhadas.
Os advogados não sabem responder quando um cliente pergunta: quanto receberei pelo dano que sofri? E quanto ao pedido? A regra é pedir muito, porque será oferecido na audiência de conciliação somente um mínimo.
O consenso quanto a certas indenizações em casos parelhos, servirá para estimar cifras que parecem inamovíveis”.
Tendo em conta os paradigmas colhidos de julgados de casos similares e de tabelas sugeridas na doutrina, bem como as variáveis do caso concreto, pois de um lado estão as condições sócio/econômicas da parte lesada, presumidas de sua qualificação, a ausência de prova de contribuição sua para o resultado, a existência de outras demandas indenizatórias pelo mesmo fato, o grau de culpa da requerida, empresa de grande porte, destaque e aceitação no meio, comercial e social, e, ainda, o valor e o tempo em que o benefício foi incorretamente descontado, estima-se razoável, e compatível com suas finalidades reparatória e punitiva, o valor da indenização em R$ 3.000,00 (três mil reais).
III – DISPOSITIVO Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE O PEDIDO DA PARTE AUTORA PARA: a) DECLARAR A NULIDADE DA COBRANÇA DE ANUIDADE DE CARTÃO DE CRÉDITO entre as partes que fundamente o desconto questionado. b) CONDENAR o requerido, ao pagamento do que foi descontado, em dobro e não prescritas até o momento, a ser apurado por simples cálculo aritmético, com correção monetária nos termos da Tabela de Correção adotada na Justiça Federal (Provimento Conjunto nº 06/2009 do Egrégio TJPI), acrescentado o percentual de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, atendendo ao disposto no art. 406, do Código Civil vigente, em consonância com o art. 161, §1º, do Código Tributário Nacional, a contar da data de cada desconto indevido (súmulas 43 e 54 do STJ). c) CONDENAR, ainda, o réu no pagamento de danos morais em favor da parte autora no valor de R$ 3.000,00 (três mil reais).
Sobre tal valor a ser pago deverá incidir também a correção monetária nos termos da Tabela de Correção adotada na Justiça Federal (Provimento Conjunto nº 06/2009 do Egrégio TJPI), a contar da data de publicação desta sentença, acrescentado o percentual de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês a contar da citação, atendendo ao disposto no art. 406, do Código Civil vigente, em consonância com o art. 161, §1º do Código Tributário Nacional.
Condeno a Requerida ao pagamento de custas e honorários advocatícios fixados em 10% (dez por cento) do valor da condenação.
Em caso de não pagamento, determino a inclusão do devedor no Sistema SERASAJUD.
Após o trânsito em julgado, arquivem-se os autos dando-se baixa.
Publique-se.
Registre-se.
Intimem-se.
Expedientes necessários.
Porto-PI, datado e assinado eletronicamente.
Dr.
Leon Eduardo Rodrigues Sousa Juiz de Direito da Vara Única da Comarca de Porto -
15/07/2025 07:46
Decorrido prazo de BENEDITA CARDOSO LOURENCO em 14/07/2025 23:59.
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25/06/2025 06:00
Publicado Decisão em 23/06/2025.
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18/06/2025 00:02
Disponibilizado no DJ Eletrônico em 18/06/2025
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17/06/2025 16:41
Conclusos para decisão
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17/06/2025 16:41
Expedição de Certidão.
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17/06/2025 16:41
Expedição de Outros documentos.
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17/06/2025 16:41
Expedição de Outros documentos.
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02/05/2025 20:14
Juntada de Petição de petição
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29/04/2025 03:22
Decorrido prazo de BANCO BRADESCO S.A. em 25/04/2025 23:59.
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29/04/2025 03:19
Decorrido prazo de BANCO BRADESCO S.A. em 25/04/2025 23:59.
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03/04/2025 09:30
Juntada de Petição de petição
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28/03/2025 17:19
Expedição de Outros documentos.
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28/03/2025 17:19
Expedição de Outros documentos.
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28/03/2025 17:19
Decisão de Saneamento e de Organização do Processo
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24/03/2025 10:21
Conclusos para decisão
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24/03/2025 10:21
Expedição de Certidão.
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24/03/2025 10:20
Expedição de Certidão.
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20/03/2025 17:50
Juntada de Petição de petição
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14/02/2025 13:49
Expedição de Outros documentos.
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14/02/2025 13:47
Ato ordinatório praticado
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14/02/2025 13:47
Expedição de Certidão.
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12/02/2025 05:24
Decorrido prazo de BENEDITA CARDOSO LOURENCO em 11/02/2025 23:59.
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12/02/2025 05:24
Decorrido prazo de BANCO BRADESCO S.A. em 11/02/2025 23:59.
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07/01/2025 18:42
Expedição de Outros documentos.
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07/01/2025 18:42
Recebida a emenda à inicial
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14/11/2024 03:31
Decorrido prazo de BENEDITA CARDOSO LOURENCO em 12/11/2024 23:59.
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08/11/2024 11:38
Conclusos para despacho
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08/11/2024 11:38
Expedição de Certidão.
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09/10/2024 20:24
Expedição de Outros documentos.
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09/10/2024 20:23
Expedição de Certidão.
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19/08/2024 22:21
Juntada de Petição de petição
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19/07/2024 15:59
Expedição de Outros documentos.
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19/07/2024 15:59
Determinada a emenda à inicial
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18/07/2024 16:23
Conclusos para despacho
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18/07/2024 16:23
Expedição de Certidão.
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18/07/2024 13:57
Expedição de Certidão.
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16/07/2024 23:04
Juntada de Petição de certidão de distribuição anterior
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16/07/2024 10:27
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
16/07/2024
Ultima Atualização
05/09/2025
Valor da Causa
R$ 0,00
Detalhes
Documentos
Decisão • Arquivo
Decisão • Arquivo
Ato Ordinatório • Arquivo
Decisão • Arquivo
Decisão • Arquivo
Decisão • Arquivo
Decisão • Arquivo
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