TJPI - 0800970-53.2024.8.18.0032
1ª instância - 1ª Vara de Picos
Processos Relacionados - Outras Instâncias
Polo Ativo
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Polo Passivo
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Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
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20/08/2025 00:00
Intimação
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PIAUÍ ÓRGÃO JULGADOR : 1ª Câmara Especializada Cível APELAÇÃO CÍVEL (198) No 0800970-53.2024.8.18.0032 APELANTE: FRANCISCO DEMETRIO SANTANA Advogado(s) do reclamante: VILCLENIA DE SOUSA BEZERRA APELADO: CREFISA SA CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTOS Advogado(s) do reclamado: LAZARO JOSE GOMES JUNIOR REGISTRADO(A) CIVILMENTE COMO LAZARO JOSE GOMES JUNIOR RELATOR(A): Desembargador DIOCLÉCIO SOUSA DA SILVA EMENTA DIREITO CIVIL E CONSUMIDOR.
APELAÇÃO CÍVEL.
AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO DE EMPRÉSTIMO PESSOAL C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS.
INÉPCIA DA INICIAL AFASTADA.
CAUSA MADURA PARA JULGAMENTO.
JUROS REMUNERATÓRIOS ABUSIVOS.
TAXA CONTRATADA SUPERIOR À MÉDIA DE MERCADO.
REVISÃO DE CLÁUSULA CONTRATUAL.
DANOS MORAIS CONFIGURADOS.
PROCEDÊNCIA.
I.
CASO EM EXAME 1.
Apelação cível interposta contra sentença que indeferiu a petição inicial e extinguiu o processo sem resolução do mérito, ao fundamento de inépcia da inicial.
Pretensão de revisão da taxa de juros remuneratórios fixada em contrato de empréstimo pessoal, devolução dos valores pagos em excesso e indenização por danos morais.
II.
QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2.
Há duas questões em discussão: (i) saber se a petição inicial é apta e preenche os requisitos do art. 319 do CPC; e (ii) verificar a existência de cláusula abusiva referente aos juros remuneratórios, passível de revisão judicial, com eventual condenação em danos morais.
III.
RAZÕES DE DECIDIR 3.
A petição inicial contém narrativa lógica, pedidos certos e compatíveis, além de planilha com valor incontroverso. 4.
Inexistência de indícios de litigância predatória.
Inobservância do contraditório e da ampla defesa.
Error in procedendo. 5.
Aplicação da teoria da causa madura. 6.
Verificada a abusividade da taxa de juros remuneratórios (22% ao mês e 987% ao ano), superior à taxa média de mercado informada pelo BACEN (6,91% ao mês e 123,07% ao ano). 7.
Reconhecimento da prática abusiva e condenação à readequação dos juros remuneratórios no contrato e indenização por dano moral.
IV.
DISPOSITIVO E TESE 8.
Apelação cível conhecida e provida.
Sentença reformada.
Petição inicial considerada apta.
Aplicação da teoria da causa madura.
Ação julgada procedente.
Tese de julgamento: “A petição inicial que contém pedidos certos, claros e acompanhada de planilha com valor incontroverso não pode ser considerada inepta. É abusiva a cobrança de juros remuneratórios manifestamente superiores à média de mercado, o que enseja a revisão do contrato, a restituição dos valores pagos a maior, em caso de quitação do débito, e a condenação em danos morais.” ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os presentes autos “Acordam os componentes do(a) 1ª Câmara Especializada Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Piauí, por unanimidade, conhecer e dar provimento ao recurso, nos termos do voto do(a) Relator(a).” SESSÃO ORDINÁRIA DO PLENÁRIO VIRTUAL DA 1ª CÂMARA ESPECIALIZADA CÍVEL DO EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PIAUÍ, em Teresina/PI, realizada no período de 01 a 08 de agosto 2025.
Des.
Hilo De Almeida Sousa Presidente Des.
Dioclécio Sousa da Silva Relator RELATÓRIO Trata-se, no caso, de Apelação Cível interposta por FRANCISCO DEMETRIO SANTANA contra sentença prolatada pelo Juízo de Direito da 1ª Vara Cível da Comarca de Picos/PI, nos autos da Ação Declaratória de Inexistência de Relação Jurídica c/c Repetição do Indébito e Indenização por Danos Morais ajuizada pela parte Apelante, em face de CREFISA S/A CRÉDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO S.A/Apelado.
Na sentença recorrida (id nº 21608317), o Juízo de origem reconheceu a inépcia da inicial e indeferiu a petição inicial, extinguindo o feito, sem resolução do mérito, nos moldes dos arts. 330, I e §1º, I, c/c art. 485, I, do CPC.
Nas suas razões recursais (id nº 21608319), a parte Apelante aduz, em suma, a necessidade de reforma da sentença, tendo em vista a inexistência de inépcia da inicial e de litigância predatória, bem como ante a ausência de oportunização à parte Recorrente de emenda à inicial, incorrendo, pois, em ofensa ao contraditório e devido processo legal.
Intimado, o Apelado apresentou contrarrazões de id nº 21608322, pleiteando pela manutenção da sentença, em todos os seus termos.
Na decisão de id nº 23452116, a Apelação Cível foi conhecida, pois preenchidos os seus requisitos legais de admissibilidade.
Encaminhados os autos ao Ministério Público Superior este deixou de emitir parecer de mérito, ante a ausência de interesse público que justifique a sua intervenção. É o Relatório.
VOTO I – DO JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE Presentes os requisitos de admissibilidade recursal, RATIFICO o Juízo de admissibilidade positivo realizado na decisão id nº 23452116.
II – DA EXTINÇÃO DA AÇÃO POR INÉPCIA DA INICIAL Consoante relatado, o Juiz a quo reconheceu a inépcia da inicial e extinguiu o feito, sem resolução do mérito, com fulcro no art. 330, §1º, I e art. 485, I, ambos do CPC.
Sobre o tema, consoante determina o artigo 319 do CPC, cumpre ao Autor da ação apontar os fatos e os fundamentos jurídicos de sua pretensão, com a indicação do pedido e de suas especificações, além dos demais requisitos formais de identificação (nome das partes, juízo a que é dirigida, entre outros).
Nesse contexto, petição inicial inepta é aquela considerada não apta a produzir efeitos jurídicos em decorrência de vícios que a tornem confusa, contraditória, absurda ou incoerente, somente sendo possível seu indeferimento por inépcia quando impossível seu aproveitamento.
A referida questão vem disciplinada no art. 330, inciso I, §1º, do CPC, que indica em que circunstâncias a inépcia de uma inicial pode ser reconhecida, senão vejamos: "Art. 330.
A petição inicial será indeferida quando: I - for inepta; (...); §1º Considera-se inepta a petição inicial quando: I - lhe faltar pedido ou causa de pedir; II - o pedido for indeterminado, ressalvadas as hipóteses legais em que se permite o pedido genérico; III - da narração dos fatos não decorrer logicamente a conclusão; IV - contiver pedidos incompatíveis entre si." No caso concreto, ao examinar os autos, em especial a petição inicial, verifico que a parte Apelante apresentou pedidos claros, determinados e compatíveis, quais sejam, de revisão dos juros remuneratórios arbitrados em contrato de empréstimo pessoal, devolução dos valores pagos em excesso em função dos juros remuneratórios, totalizando a quantia de R$ 12.137,06 (doze mil, cento e trinta e sete mil reais e seis centavos), bem como ao pagamento de R$ R$ 10.000,00 (dez mil reais) a título de danos morais.
Ademais, a narração dos fatos apresentados é clara e coerente, não apresentando informações confusas ou contraditórias, de modo a configurar a inépcia da petição inicial.
Além disso, por se tratar de Ação Revisional, é cediço que a petição inicial deve atender aos requisitos no art. 330, §2º, do CPC, que assim dispõe: “Art. 330.
A petição inicial será indeferida quando: (...); § 2º Nas ações que tenham por objeto a revisão de obrigação decorrente de empréstimo, de financiamento ou de alienação de bens, o autor terá de, sob pena de inépcia, discriminar na petição inicial, dentre as obrigações contratuais, aquelas que pretende controverter, além de quantificar o valor incontroverso do débito.” No caso concreto, constata-se que a petição inicial da Recorrente também atende aos supracitados requisitos, na medida em que discriminou na sua inicial a obrigação contratual que pretende controverter – juros remuneratórios – e quantificou o valor incontroverso do débito, juntando inclusive planilha de cálculo no id nº 21608105, de modo que inexiste qualquer vício na petição inicial, hábil a configurar a inépcia da inicial.
Nesse sentido: “EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL.
REVISÃO DE CONTRATO BANCÁRIO.
VALOR INCONTROVERSO.
PLANILHA DE CÁLCULO.
INÉPCIA DA INICIAL.
INOCORRÊNCIA.
NULIDADE DE SENTENÇA.
SENTENÇA CASSADA. - Constatando-se que fora delineado de maneira bastante precisa as matérias inquinadas, as quais foram explicitadas na fundamentação e devidamente mencionadas no pedido, não há que se falar em inépcia da inicial, nos termos do art. 330, § 1º do CPC. (TJ-MG - Apelação Cível: 5003140-27.2023 .8.13.0514, Relator.: Des.(a) Amauri Pinto Ferreira, Data de Julgamento: 03/04/2024, 17ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 03/04/2024).” – grifos nossos. “EMENTA: APELAÇÃO - PETIÇÃO INICIAL - PEDIDOS CERTOS E DETERMINADOS - ATENDIMENTO DOS REQUISITOS PREVISTOS NO CPC - INÉPCIA DA INICIAL NÃO CONFIGURADA.
Não é inepta a petição inicial que contém pedidos certos, determinados, que decorrem logicamente dos fatos nela expostos e que atendem aos requisitos do Código de Processo Civil. (...) (TJ-MG - Apelação Cível: 50204632620228130079 1 .0000.23.279792-8/001, Relator.: Des.(a) Lúcio de Brito, Data de Julgamento: 20/06/2024, 15ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 26/06/2024).” - grifos nossos.
Noutro lado, no que concerne as considerações do Magistrado quanto à possível litigância abusiva da causídica da parte Recorrente, não se ignora que é permitido ao Julgador, utilizando-se do Poder Geral de Cautela que lhe é conferido pela legislação processual cível, adotar as medidas que entende cabíveis, para os fins de zelar pela boa-fé processual e prevenir o abuso da litigância em massa e o uso abusivo da máquina judiciária, com base no art. 139, III, do CPC.
Inclusive, neste e.
TJPI, restou publicada a Nota Técnica nº 06, pelo CIJEPI, a qual dispõe acerca de diligências cautelares que o Juiz pode/deve adotar, diante de indícios concretos de demanda predatória, em consonância com a Recomendação nº 127/2022 do CNJ, que recomenda aos tribunais a adoção de cautelas visando a coibir a judicialização predatória que possa acarretar o cerceamento de defesa e a limitação da liberdade de expressão.
Não obstante, em que pese a legitimidade do poder/dever do Juiz em adotar as medidas que entende necessárias para garantir a lisura e boa-fé processual, é cediço que tais diligências não podem ser realizadas de forma indiscriminada, a despeito dos princípios do contraditório e ampla defesa, do devido processo legal, bem como ao da Inafastabilidade da Jurisdição, que é a hipótese dos autos, em que não restou demonstrado a existência de indícios de litigância abusiva, tampouco a inépcia da petição inicial.
Como se não bastasse, verifica-se que o Magistrado não observou a disposição do art. 10 do CPC, extinguindo o processo com base em fundamento a respeito do qual não oportunizou à parte o direito de se manifestar, o que viola os princípios do contraditório, ampla defesa e proibição à decisão surpresa.
Desse modo, a reforma da sentença é medida que se impõe, para os fins de AFASTAR o reconhecimento da inépcia da inicial.
Por fim, ressalte-se que a causa versa sobre questão exclusivamente de direito, sem necessidade de dilação probatória, de modo que o processo se encontra devidamente instruído, tendo sido apresentado nos autos contestação oportunizado à parte adversa o contraditório e ampla defesa, restando evidenciada a causa madura, devendo, pois, ser aplicado ao caso em espécie, o artigo 1.013, § 4º, do CPC, que assim dispõe, veja-se: “Art. 1.013.
A apelação devolverá ao tribunal o conhecimento da matéria impugnada. (…); § 3º Se o processo estiver em condições de imediato julgamento, o tribunal deve decidir desde logo o mérito quando: I - reformar sentença fundada no art. 485;” Assim, passo à análise do mérito da Ação.
III – DO MÉRITO DA AÇÃO Na hipótese, cinge-se a controvérsia acerca da suposta abusividade na cobrança de juros remuneratórios na relação contratual firmada entre as partes.
De início, cumpre ressaltar que o caso em exame deve ser apreciado à luz do Código de Defesa do Consumidor, ante a nítida relação de consumo entre as partes, em virtude da perfeita adequação aos conceitos de consumidor (art. 2º), fornecedor (art. 3º, caput) e serviço (art. 3º, §2º), contidos na Lei nº 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor), ressaltando-se, mais, que o art. 14 do CDC, estabelece a responsabilidade objetiva do fornecedor pela prestação do serviço de forma defeituosa.
Quanto ao tema, destaque-se que no contrato de empréstimo pessoal não há variação do valor das parcelas pactuadas, eis que são fixas e pré-determinadas, de modo que não tendo sido alegado qualquer vício de vontade, conclui-se, pois, que o contrato firmado era de conhecimento do contratante, não se podendo olvidar que a parte Apelada detinha ciência da obrigatoriedade do pagamento dos encargos pela utilização do empréstimo.
Ademais, o exame da taxa de juros é realizada pelo julgador, mediante comparação entre o valor contratado e a taxa média de mercado, consoante verificado pelo julgador de 1º grau na sentença requestada.
O STJ, em julgamento do leading case representeado pelo REsp 1.061.530/RS (Temas 24 a 27 do STJ), de Relatoria da Ministra NANCY ANDRIGHI, passou a entender que a taxa de juros remuneratórios em contratos bancários poderá, em casos excepcionais, ser revisto em juízo, desde que fique caracterizada, além da relação de consumo, a ocorrência de abusividade, consubstanciada na prática de juros bem acima da taxa média de mercado, veja-se: “DIREITO PROCESSUAL CIVIL E BANCÁRIO.
RECURSO ESPECIAL.
AÇÃO REVISIONAL DE CLÁUSULAS DE CONTRATO BANCÁRIO.
INCIDENTE DE PROCESSO REPETITIVO.
JUROS REMUNERATÓRIOS.
CONFIGURAÇÃO DA MORA.
JUROS MORATÓRIOS.
INSCRIÇÃO/MANUTENÇÃO EM CADASTRO DE INADIMPLENTES. (...) ORIENTAÇÃO 1 – JUROS REMUNERATÓRIOS “a) As instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios estipulada na Lei de Usura (Decreto 22.626/33), Súmula 596/STF; b) A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade; c) São inaplicáveis aos juros remuneratórios dos contratos de mútuo bancário as disposições do art. 591 c/c o art. 406 do CC/02; d) É admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada art. 51, §1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante as peculiaridades do julgamento em concreto. (...) Recurso especial parcialmente conhecido e, nesta parte, provido, para declarar a legalidade da cobrança dos juros remuneratórios, como pactuados, e ainda decotar do julgamento as disposições de ofício. Ônus sucumbenciais redistribuídos. (REsp 1061530/RS, Rel.
Ministra NANCY ANDRIGHI, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 22/10/2008, DJe 10/03/2009).” Com isso, a posição majoritária do STJ é no sentido de que a taxa de juros remuneratórios somente se caracteriza como abusiva quando substancialmente discrepante da média de mercado, apurada pelo Banco Central do Brasil, à época da contratação.
Nesse sentido, cite-se o precedente abaixo, à similitude: “AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL.
CONTRATOS BANCÁRIOS.
EMPRÉSTIMO.
JUROS.
TAXA MÉDIA.
ABUSIVIDADE.
SÚMULA 7/STJ. 1.
A jurisprudência desta Corte é assente no sentido de que os juros remuneratórios cobrados pelas instituições financeiras não sofrem a limitação imposta pelo Decreto nº 22.626/33 (Lei de Usura), a teor do disposto na Súmula 596/STF, de forma que a abusividade da pactuação dos juros remuneratórios deve ser cabalmente demonstrada em cada caso, com a comprovação do desequilíbrio contratual ou de lucros excessivos. 2.
A verificação da abusividade dos juros não é taxativa, não observa critérios genérico e universais, de modo que o fato de a taxa de juros remuneratórios contratada ser o dobro ou triplo ou outro múltiplo da taxa apurada pelo Banco Central não determina o reconhecimento de abusividade. 3.
Inviabilidade de afastar a conclusão do Tribunal de origem de que os juros remuneratórios não são abusivos, quando comparados à taxa de mercado, pois demanda rever cláusulas do contrato e de provas, providência vedada nos termos das Súmulas 5 e 7/STJ. 4.
Agravo interno não provido. “(AgInt no REsp n. 1.949.441/SP, relator Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 23/8/2022, DJe de 9/9/2022.)” Logo, seguindo-se a linha perfilhada pelo STJ, não mais se deve aplicar o entendimento de que os juros remuneratórios estão delimitados em 12% (doze por cento) ao ano, mas, sim, devem ser havidos como os da taxa média de mercado.
Todavia, consoante se extrai do voto condutor do julgamento do AgInt no AREsp 956.985/SP, “a redução dos juros dependerá de comprovação da onerosidade excessiva - capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada - em cada caso concreto, tendo como parâmetro a taxa média de mercado para as operações equivalentes” (AgInt no AREsp 956.985/SP, Rel.
Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 14/03/2017, DJe 27/03/2017).
E no caso concreto em exame, analisando o contrato pactuado entre as partes (id nº 21608266), verifica-se que a taxa de juros mensal foi fixada em 22% e a taxa de juros anual em 987,22%, ao passo em que, conforme consta no sítio eletrônico do BACEN, a taxa média mensal de juros atribuído ao tipo de contratação à época era de 6,91% e anual de 123,07% (https://www3.bcb.gov.br/sgspub/localizarseries/localizarSeries.do?method=prepararTelaLocalizarSeries).
Desse modo, é possível vislumbrar, induvidosamente, que a taxa de juros fixada no contrato está demasiadamente superior à taxa média de mercado apurada pelo Banco Central do Brasil, à época da contratação, configurando, portanto, manifesta abusividade na relação contratual, uma vez que gera uma desvantagem exagerada ao consumidor.
Ademais, a jurisprudência do STJ tem considerado abusivas taxas “superiores a uma vez e meia (voto proferido pelo Min.
Ari Pargendler no REsp 271.214/RS, Rel. p.
Acórdão Min.
Menezes Direito, DJ de 04.08.2003), ao dobro (REsp 1.036.818, Terceira Turma, minha relatoria, DJe de 20.06.2008) ou ao triplo (REsp 971.853/RS, Quarta Turma, Min.
Pádua Ribeiro, DJ de 24.09.2007) da média.” No caso, em um simples cálculo aritmético, é possível verificar que o percentual mensal contratado pelas partes excede sobremaneira ao patamar adotado pelo STJ e, por conseguinte, restando inconteste a abusividade dos juros remuneratórios adotados na contratação, de modo que é devida a revisão contratual, para os fins de limitar os juros remuneratórios à taxa média de mercado, à época da contratação.
Nesse sentido, é o entendimento adotado pela jurisprudência deste TJPI, inclusive desta e. 1ª Câmara Especializada Cível, consoante o precedente a seguir colacionado, veja-se: “APELAÇÃO.
PROCESSUAL CÍVEL.
BUSCA E APREENSÃO.
RECONVENÇÃO.
REVISÃO CONTRATUAL.
POSSIBILIDADE.
NULIDADE DAS CLÁUSULAS ABUSIVAS.
JUROS EXORBITANTES.
SENTENÇA MANTIDA EM TODOS OS SEUS TERMOS.
RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. 1.
Não há óbice à revisão contratual, com fundamento no CDC (Súmula n. 297/STJ), nos casos em que, após dilação probatória, ficar cabalmente demonstrada a abusividade da cláusula de juros, sendo insuficiente o fato de o índice estipulado ultrapassar 12% (doze por cento) ao ano (Súmula n. 382/STJ) ou de haver estabilidade inflacionária no período. 2. É admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que a abusividade fique cabalmente demonstrada, ante as peculiaridades do julgamento em concreto. 3.
Tendo em vista que a taxa anual de juros cobrada (51,53 % ao ano) supera uma vez e meia a taxa média apurada pelo BACEN (26,01%), entendo que há significativa discrepância entre a taxa média de mercado apurada pelo Banco Central e o índice pactuado entre as partes, dando por manifesta a existência de juros exorbitantes. 4.
Apelação conhecida e não provida. (TJPI | Apelação Cível Nº 2016.0001.012145-5 | Relator: Des.
Aderson Antonio Brito Nogueira | 1ª Câmara Especializada Cível | Data de Julgamento: 15/10/2019).” Quanto aos danos morais, é cediço que para configuração do dever de responsabilização civil, Maria Helena Diniz aponta a existência de três elementos, a saber: “a) a existência de uma ação, comissiva ou omissiva qualificada juridicamente, isto é, que se apresenta como ato ilícito ou lícito, pois, ao lado da culpa como fundamento da responsabilidade civil há o risco; b) ocorrência de um dano moral ou patrimonial causado à vítima; c) nexo de causalidade entre o dano e a ação, o que constitui o fato gerador da responsabilidade.”[1] No caso em análise, entendo que o dano moral e o dever de responsabilização civil restaram perfeitamente configurados, uma vez que a responsabilidade civil do fornecedor de serviços é objetiva, independentemente da existência de culpa (art. 14 do CDC), assim como o evento danoso e o nexo causal estão satisfatoriamente comprovados nos autos, ante a ilegalidade da cobrança de juros remuneratórios em valores exacerbadamente abusivos, impondo, assim, uma arbitrária redução dos rendimentos do Apelante.
Nesse contexto, há conduta abusiva em se praticar juros elevados, completamente fora da realidade de mercado, configurando ato ilegal passível de indenização, mormente pelos percentuais deduzidos, que, além de não atender a função social do contrato, visto que visam outorgar vantagem extremamente exagerada, frustram as legítimas expectativas do aderente e, ainda, atentam contra a dignidade do ser humano, tendo em vista que a cobrança excessiva pode levar a pessoa natural à condição de miserabilidade.
Caracteriza ainda efetiva prática abusiva, na forma do artigo 39, incisos IV e V, do Código de Defesa do Consumidor, uma vez que a Apelada exigiu vantagem excessivamente exagerada (art. 51, § 1º, inciso III, do CDC) e se prevaleceu da condição do consumidor para impingir-lhe seus serviços.
Nesse sentido, é o entendimento adotado por este e.
TJPI, consoante precedente a seguir colacionado, veja-se: “APELAÇÃO CÍVEL. consumidor e PROCESSUAL CIVIL.
AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO COM REPETIÇÃO DO INDÉBITO C/C DANOS MORAIS.
ABUSIVIDADE NA TAXA DE JUROS.
CONFIGURADA. repetição do indébito. danos morais.
Recurso conhecido e provido. 1.
De acordo com a orientação adotada no julgamento repetitivo do REsp. 1.061.530/RS, sob o rito do art. 543-C do CPC/73, "é admitida a revisão das taxas de juros remuneratórios em situações excepcionais, desde que caracterizada a relação de consumo e que a abusividade (capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada - art. 51, § 1º, do CDC) fique cabalmente demonstrada, ante as peculiaridades do julgamento em concreto.”. 2.
O simples fato de a taxa efetiva cobrada no contrato estar acima da taxa média de mercado não significa, por si só, abuso, no entanto, constatada a abusividade, deve ser revisado o contrato. 3.
No caso a taxa de juros cobrada do consumidor aproxima-se dos 1.000%, situação que atesta a abusividade e impõe a revisão contratual. 4. É devida a restituição em dobro, vez que caracterizada a má-fé, na medida em que a instituição financeira efetuou os descontos no benefício da parte Apelante, cobrando taxas já declaradas abusivas pelo Superior Tribunal de Justiça, bem acima da Taxa Média de Mercado. 5.
No que se refere aos danos morais, evidente a incidência na hipótese.
E, considerando as particularidades do caso concreto e o parâmetro já adotado pela Câmara julgadora, arbitrados os danos morais em R$ 5.000,00 (cinco mil reais). 6.
Deixo de arbitrar honorários recursais, em conformidade com o Tema 1.059 do STJ. (TJPI | Nº | Relator: Agrimar Rodrigues de Araújo | 3ª CÂMARA ESPECIALIZADA CÍVEL | Data de Julgamento: 12/07/2024).” Assim, configurados os danos morais, passo à análise do quantum indenizatório.
No que pertine à responsabilização civil por danos morais, o Brasil adota a Teoria Pedagógica Mitigada, que aduz ter tal instituto um duplo viés: a) o caráter compensatório da vítima; e b) o aspecto pedagógico-punitivo do ofensor.
Assim, na fixação do valor da indenização por danos morais, tais como as condições pessoais e econômicas das partes, deve o arbitramento operar-se com moderação e razoabilidade, atento à realidade da vida e às peculiaridades de cada caso, de forma a não haver o enriquecimento indevido do ofendido e, também, de modo que sirva para desestimular o ofensor a repetir o ato ilícito.
Portanto, em relação ao quantum indenizatório, considerando as circunstâncias do caso concreto, no qual restou comprovada a cobrança de juros remuneratórios em valores extremamente abusivos, entendo que o montante de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) é suficiente para compensar a parte Recorrente quanto ao dano extrapatrimonial sofrido, eis que atende aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, bem como se mostra adequado para atender a dupla finalidade da medida e evitar o enriquecimento sem causa da parte Recorrente.
Desse modo, constata-se que o recurso merece provimento, para os fins de afastar o reconhecimento da inépcia da inicial e, aplicando-se a teoria da causa madura, para julgar totalmente procedente a Ação, nos moldes da fundamentação exposta.
IV – DO DISPOSITIVO Ante o exposto, CONHEÇO da APELAÇÃO CÍVEL, por atender aos seus requisitos legais de admissibilidade, e DOU-LHE PROVIMENTO para REFORMAR a SENTENÇA RECORRIDA, a fim de afastar o reconhecimento da inépcia da inicial e, aplicando-se a teoria da causa madura, nos termos do art. 1.013, §4º, do CPC, para JULGAR TOTALMENTE PROCEDENTE a Ação, para: a) REVISAR a taxa de juros remuneratórios fixada no contrato de empréstimo pessoal firmado entre as partes, para adequar ao patamar médio do mercado à época da contratação, qual seja, 6,91% ao mês e 123,07% ao ano.
Por conseguinte, em caso de eventual quitação do débito em decorrência da revisão contratual, que seja procedida a devida devolução do valor em excesso à parte Recorrente, incidindo correção monetária desde o desembolso de cada parcela, nos moldes do art. 884 do CC, observando-se o indexador adotado pela Tabela Prática de Justiça do Estado do Piauí (Provimento Conjunto nº 06/2009); b) CONDENAR o APELADO ao pagamento de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a título de compensação por danos morais à parte Apelante, acrescida dos juros legais de que trata o art. 406, §1º, do Código Civil, ou seja, a SELIC, deduzido o IPCA do período, a partir da citação (art. 405 do CC), calculado até a data do arbitramento da indenização, momento em que deverá incidir a apenas a Taxa Selic, e c) CONDENAR o Apelado ao pagamento de honorários sucumbenciais arbitrados em 15% (quinze por cento) sobre o valor atualizado da condenação, nos moldes do art. 85, §§1º e 2º, do CPC.
Custas de lei. É o VOTO.
Teresina/PI, data da assinatura eletrônica. [1] DINIZ, Maria Helena.
Curso de direito civil brasileiro. 19. ed.
São Paulo: Saraiva, 2005. v. 7, p. 42. -
27/11/2024 17:34
Remetidos os Autos (em grau de recurso) para à Instância Superior
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27/11/2024 17:33
Expedição de Certidão.
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27/11/2024 16:55
Juntada de Petição de petição
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18/11/2024 18:22
Expedição de Outros documentos.
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05/11/2024 11:00
Juntada de Petição de apelação
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25/10/2024 03:09
Decorrido prazo de CREFISA SA CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTOS em 24/10/2024 23:59.
-
02/10/2024 06:48
Expedição de Outros documentos.
-
02/10/2024 06:48
Expedição de Outros documentos.
-
01/10/2024 21:05
Expedição de Outros documentos.
-
01/10/2024 21:05
Indeferida a petição inicial
-
03/07/2024 11:37
Conclusos para despacho
-
03/07/2024 11:37
Expedição de Certidão.
-
03/07/2024 11:36
Juntada de Certidão
-
06/06/2024 05:07
Decorrido prazo de FRANCISCO DEMETRIO SANTANA em 05/06/2024 23:59.
-
06/06/2024 05:07
Decorrido prazo de VILCLENIA DE SOUSA BEZERRA em 05/06/2024 23:59.
-
12/05/2024 03:36
Decorrido prazo de LAZARO JOSE GOMES JUNIOR em 10/05/2024 23:59.
-
09/05/2024 18:38
Juntada de Petição de petição
-
07/05/2024 15:14
Juntada de Petição de manifestação
-
02/05/2024 10:11
Expedição de Outros documentos.
-
02/05/2024 10:09
Expedição de Outros documentos.
-
03/04/2024 12:16
Expedição de Outros documentos.
-
03/04/2024 12:16
Concedida a Antecipação de tutela
-
15/03/2024 13:40
Conclusos para decisão
-
15/03/2024 13:40
Expedição de Certidão.
-
07/03/2024 10:09
Juntada de Petição de manifestação
-
23/02/2024 17:45
Juntada de Petição de contestação
-
14/02/2024 11:35
Juntada de Petição de manifestação
-
07/02/2024 18:10
Expedição de Outros documentos.
-
07/02/2024 18:10
Proferido despacho de mero expediente
-
06/02/2024 13:25
Conclusos para decisão
-
06/02/2024 13:25
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
06/02/2024
Ultima Atualização
20/08/2025
Valor da Causa
R$ 0,00
Documentos
Sentença • Arquivo
Decisão • Arquivo
Documentos • Arquivo
Documentos • Arquivo
Documentos • Arquivo
Documentos • Arquivo
Despacho • Arquivo
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