TJPB - 0803490-48.2022.8.15.2001
1ª instância - Nucleo de Justica 4.0 - Saude Suplementar
Polo Ativo
Polo Passivo
Partes
Assistente Desinteressado Amicus Curiae
Advogados
Nenhum advogado registrado.
Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
-
02/09/2025 19:34
Juntada de Petição de petição
-
01/09/2025 01:55
Publicado Sentença em 01/09/2025.
-
01/09/2025 01:04
Juntada de Petição de resposta
-
01/09/2025 00:31
Redistribuído por competencia exclusiva em razão de incompetência
-
30/08/2025 01:21
Disponibilizado no DJ Eletrônico em 29/08/2025
-
29/08/2025 00:00
Intimação
Processo n. 0803490-48.2022.8.15.2001; PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7); [Reajuste contratual, Tratamento médico-hospitalar] AUTOR: BILGAI BERBERT FERREIRA.
REU: UNIMED-RIO COOPERATIVA DE TRABALHO MEDICO DO RIO DE JANEIRO LTDA, QUALICORP CONSULTORIA E CORRETORA DE SEGUROS S.A. .
SENTENÇA I.
RELATÓRIO Trata-se de Ação Revisional de Plano de Saúde c/c Pedido Liminar e Restituição de Valores, ajuizada por BILGAI BERBERT FERREIRA em desfavor de UNIMED RIO COOPERATIVA DE TRABALHO MÉDICO DO RIO DE JANEIRO LTDA e QUALICORP CONSULTORIA E CORRETORA DE SEGUROS S.A., ambas devidamente qualificadas nos autos do processo eletrônico.
A parte autora narrou, em sua exordial (ID 53755140), ser cliente da primeira ré desde 15 de novembro de 2005 e, desde o início da relação contratual, ter sido submetido a aumentos de mensalidade supostamente abusivos e desacompanhados de justificativa.
Sustentou que, em 15 de janeiro de 2021, foi surpreendido com uma notificação da Qualicorp Administradora de Benefícios informando um reajuste anual equivalente a 51,40% em sua mensalidade, elevando-a para R$ 1.232,20.
Adicionalmente, em 15 de setembro de 2021, sobreveio novo reajuste de 9,53%, resultando em uma mensalidade de R$ 1.349,70.
O autor enfatizou que tais percentuais de aumento eram desarrazoados e discrepantes em relação aos índices autorizados pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) para planos individuais, especialmente considerando a alegada queda na sinistralidade das operadoras de saúde durante o período da pandemia de COVID-19.
Afirmou que a ré jamais encaminhou qualquer esclarecimento sobre a real necessidade dos reajustes por sinistralidade nos importes fixados, configurando violação ao dever de transparência.
Postulou, assim, a declaração de nulidade dos reajustes aplicados, a adequação da mensalidade ao percentual máximo permitido pela ANS para planos individuais, com o estabelecimento do valor de R$ 655,66, a restituição em dobro dos valores pagos indevidamente desde janeiro de 2019 até janeiro de 2022, no montante de R$ 19.790,40, e a condenação das rés ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 27.000,00.
Requereu, ainda, a concessão do benefício da Justiça Gratuita e a inversão do ônus da prova, bem como a exibição do contrato celebrado entre as partes.
A decisão inicial (ID 60324442) indeferiu o pedido de gratuidade de justiça ao autor, concedendo, contudo, um desconto de 90% nas custas processuais, o qual foi devidamente recolhido (ID 60580592).
Na mesma oportunidade, a magistrada indeferiu o pedido de tutela antecipada, ao entender que os requisitos legais para sua concessão não estavam suficientemente demonstrados em sede de cognição sumária, destacando a necessidade de dilação probatória para averiguar as alegadas abusividades.
Em face disso, as rés foram intimadas a se manifestar sobre o pleito liminar e a apresentar informações detalhadas sobre os reajustes aplicados.
A parte ré QUALICORP CONSULTORIA E CORRETORA DE SEGUROS S.A. apresentou manifestação preliminar (ID 60599449) e, posteriormente, contestação (ID 61328137), alegando, em sede preliminar, sua ilegitimidade passiva.
Argumentou que sua atuação se restringe à condição de administradora de benefícios, sem acesso direto aos cálculos e à definição dos reajustes, que seriam de responsabilidade exclusiva da operadora (Unimed Rio).
No mérito, defendeu a legalidade dos reajustes, afirmando que o contrato em questão é coletivo por adesão e, portanto, não se submete aos mesmos índices de reajuste aplicados pela ANS aos planos individuais.
Sustentou que os reajustes são definidos pela variação dos custos médico-hospitalares (VCMH) e pela sinistralidade da carteira, fatores inerentes à natureza do plano coletivo, e que foram devidamente comunicados à ANS.
Impugnou o pedido de repetição do indébito em dobro, alegando ausência de má-fé, e refutou a pretensão de danos morais, qualificando-os como mero descumprimento contratual insuscetível de compensação.
A Qualicorp também suscitou a questão da proteção de dados (LGPD) para justificar a não apresentação de informações mais detalhadas sobre os cálculos atuariais, argumentando que tais dados são sensíveis e pertencem à operadora.
Por sua vez, a ré UNIMED RIO COOPERATIVA DE TRABALHO MÉDICO DO RIO DE JANEIRO LTDA apresentou contestação (ID 62025819), também arguindo preliminar de ilegitimidade passiva.
Asseverou que sua função é exclusivamente de operadora do plano de saúde, não tendo ingerência sobre as cobranças e reajustes, que seriam atribuições da administradora Qualicorp, conforme Resoluções Normativas da ANS.
No mérito, defendeu a validade dos reajustes anuais e por faixa etária, alegando que o plano é coletivo por adesão e que os aumentos são estabelecidos por negociação entre a estipulante (Qualicorp) e a operadora, com respaldo contratual e legal, em conformidade com as normas da ANS (RN 63, 195 e 309).
Ressaltou que o reajuste de 2020 foi suspenso pela ANS e aplicado em janeiro de 2021, e que o reajuste por faixa etária (32,29% para a faixa de 50 anos) é legal e previsto.
Impugnou os pedidos autorais, pleiteando a improcedência da demanda.
Em réplica (ID 62390094), a parte autora impugnou as contestações, reiterando a responsabilidade solidária de ambas as rés, com fundamento no Código de Defesa do Consumidor, dada a integração das empresas na cadeia de prestação de serviços.
Reafirmou a abusividade dos reajustes, alegando que, com a análise de novos documentos, os aumentos acumulados superaram 121,09%, não os 51,40% inicialmente calculados.
Manteve o argumento de "falso plano coletivo", buscando o tratamento idêntico ao de planos individuais.
Insistiu na falta de transparência e na omissão das rés em apresentar as justificativas atuariais, referenciando, inclusive, relatórios do Tribunal de Contas da União (TCU) que apontaram falhas na fiscalização da ANS.
Reiterou os pedidos de condenação à restituição em dobro dos valores e à indenização por danos morais, enfatizando o grave quadro de saúde de sua esposa e o comprometimento financeiro da família.
Após, as partes foram instadas a indicar as provas que pretendiam produzir (ID 67247471).
A ré Qualicorp manifestou desinteresse em novas provas e não se opôs ao julgamento antecipado da lide (ID 67973571).
O autor, por sua vez, requereu a realização de perícia contábil do contrato (ID 68752963).
Sobreveio despacho (ID 70865894) que, considerando os Temas Repetitivos 952 e 1016 do Superior Tribunal de Justiça (STJ), determinou que as partes rés apresentassem, no prazo de 15 dias, planilha com cálculos atuariais, especificando ano a ano os valores cobrados e os percentuais aplicados, bem como os percentuais de variação em cada mudança de faixa etária.
Em resposta, a Qualicorp (ID 71165238) reiterou que, como administradora, apenas repassa os índices da operadora, e que a documentação relativa aos cálculos estaria em posse da Unimed Rio.
A Unimed Rio (ID 72393519) apresentou um histórico de percentuais aplicados (ID 72393521), mas solicitou dilação de prazo para a apresentação dos cálculos atuariais completos.
A parte autora (ID 73223254) impugnou a dilação de prazo, reafirmando a omissão das rés em apresentar as informações solicitadas e a necessidade de equiparar o plano ao individual, com restituição desde 2005.
A decisão saneadora e organizadora do processo (ID 76834092) rejeitou as preliminares de ilegitimidade passiva das rés, reconhecendo a responsabilidade solidária em razão da cadeia de consumo.
Fixou os pontos controvertidos (previsão contratual de aumento por faixa etária, obediência às normas vigentes, abusividade do aumento, ocorrência e extensão de danos morais e materiais).
Determinando a distribuição do ônus da prova pela regra geral do artigo 373 do CPC, contudo, defendeu a produção de perícia atuarial e determinou que as rés apresentassem a tabela de custeio do plano de saúde, com valores de todas as faixas etárias, para os anos de 2010 a 2020.
Por fim, sanou o feito e intimou as partes para se manifestarem sobre os esclarecimentos ou ajustes.
Posteriormente, o perito nomeado (ID 89823063), Sr.
ANTÔNIO LEITE LOUREIRO NETO, apresentou proposta de honorários no valor de R$ 6.091,02 (ID 99288689).
A Qualicorp (ID 103463232) impugnou o valor, reputando-o excessivo e solicitando sua redução ou a substituição do perito.
O autor (ID 105015403), por sua vez, anuiu com os honorários, reiterou a necessidade da perícia para os cálculos e a aplicação das teses do STJ (Temas 952 e 1016), insistindo no marco temporal de 2005 para a análise dos reajustes, mas limitando a restituição ao período de 2019.
O perito, contudo, declinou do encargo por problemas de saúde (ID 107477410).
Em petição (ID 107869549), a parte autora requereu o chamamento do feito à ordem, destacando a inércia da ré em apresentar os cálculos atuariais e a inviabilidade da perícia sem tais documentos.
Reiterou a tese do "falso coletivo", a vulnerabilidade do consumidor e a necessidade de aplicação dos índices da ANS para planos individuais.
Pugnou pela conversão da perícia em diligência para oficiar a ANS e obter os índices.
Alertou para a transferência da carteira da Unimed Rio para a Unimed Ferj, que não comunicou a migração ao autor e gerou negativas de atendimento (ID 107869553).
A Unimed Rio, por meio de novos patronos, informou a este Juízo sobre a transferência integral de sua carteira de beneficiários para a UNIMED FERJ, com efeitos a partir de 01/04/2024, conforme autorização da ANS e Termo de Compromisso (ID 106423446, ID 106424100, ID 88518470, ID 88518474).
Argumentou que tal transferência impossibilita a Unimed Rio de cumprir decisões judiciais que envolvam prestação de assistência à saúde e solicitou sua substituição no polo passivo da demanda ou, ao menos, a inclusão da Unimed Ferj.
Em 10 de abril de 2025, novo despacho (ID 110810287) intimou a Unimed Rio para se manifestar sobre a petição do autor e se ainda havia interesse na produção de prova pericial.
Em resposta, tanto a Unimed Rio (ID 111493353) quanto a Qualicorp (ID 111346180) informaram não se opor ao julgamento antecipado da lide, sob o fundamento de que a causa estaria madura para julgamento e os elementos necessários para o deslinde da controvérsia já se encontravam presentes nos autos.
Vieram os autos conclusos. É o relatório.
II.
FUNDAMENTAÇÃO A presente demanda versa sobre a revisão de cláusulas contratuais de plano de saúde, com pedido de restituição de valores pagos a maior e compensação por danos morais.
A complexidade do tema exige uma análise aprofundada dos fatos e do direito aplicável, considerando as especificidades da relação jurídica estabelecida e as particularidades do setor de saúde suplementar.
A lide foi devidamente instruída com a petição inicial e documentos que a acompanham, contestações das partes rés, réplica autoral, manifestações diversas, incluindo a questão da perícia e a transferência de carteira.
A pretensão de ambas as partes rés pelo julgamento antecipado da lide, após diversas etapas processuais, indica que a matéria, a seu ver, prescinde de dilação probatória adicional, apesar das complexidades inicialmente apontadas.
A matéria em discussão impõe a aplicação dos princípios e normas do Código de Defesa do Consumidor, dada a natureza da relação jurídica entre o beneficiário do plano de saúde e as operadoras/administradoras.
A hipossuficiência do consumidor, a assimetria de informações e a essencialidade do serviço de saúde são elementos que fundamentam a incidência da legislação consumerista.
A distribuição do ônus da prova, embora inicialmente pautada pela regra geral do Código de Processo Civil, deve ser interpretada à luz da vulnerabilidade do consumidor e da capacidade de produção de provas pelas partes.
A análise exaustiva dos argumentos e documentos acostados aos autos é fundamental para a justa resolução do conflito, ponderando-se as alegações de abusividade dos reajustes, a conformidade com as normas regulatórias e as consequências jurídicas dos atos praticados pelas partes.
A.
Do Julgamento Antecipado da Lide A presente controvérsia processual, em sua fase atual, encontra-se apta para o julgamento imediato, em conformidade com o disposto no artigo 355, inciso I, do Código de Processo Civil.
As partes, em suas últimas manifestações (ID 111493353, ID 111491743 e ID 111346180), convergiram no entendimento de que a matéria em apreço é exclusivamente de direito ou, quando muito, os fatos controvertidos já se encontram suficientemente provados pelos elementos documentais presentes nos autos, tornando desnecessária a produção de outras provas, em especial a prova pericial que havia sido deferida em momento anterior. É imperioso observar que, em decisão saneadora proferida por este Juízo (ID 76834092), restou expressamente determinada a produção de prova pericial atuarial, com o custeio a cargo das rés, e com a imposição de que estas apresentassem a tabela de custeio do plano de saúde do autor para os anos de 2010 a 2020.
Tal determinação visava a elucidar os pontos controvertidos relacionados à abusividade dos reajustes aplicados à mensalidade do plano de saúde, em conformidade com as teses fixadas pelos Temas Repetitivos 952 e 1016 do Superior Tribunal de Justiça.
Contudo, a despeito da ordem judicial, as rés não apresentaram os cálculos atuariais detalhados e a tabela de custeio exigida, limitando-se a Unimed Rio a juntar um "Histórico de Reajustes" (ID 80697385, ID 80697386), desacompanhado da fundamentação atuarial necessária, e a Qualicorp a alegar que não detinha tais informações e que apenas repassava os índices.
O perito nomeado, inclusive, declinou do encargo por razões de saúde, e a substituição foi frustrada pela inércia das rés em efetuar o pagamento dos honorários, conforme narrado pela parte autora (ID 107869549).
A conduta das rés, ao não produzirem a prova pericial ou fornecerem os documentos imprescindíveis para sua realização, frustrou a fase instrutória conforme originalmente delineada na decisão saneadora.
Não obstante, a superveniente manifestação de ambas as rés, concordando com o julgamento antecipado, denota a desistência tácita da produção probatória que lhes incumbia, ou a convicção de que as provas já existentes seriam suficientes para o desfecho da lide.
A parte autora, embora tenha pugnado pela perícia, também apresentou pedidos alternativos, como a expedição de ofício à ANS para obtenção de índices, o que, em última instância, reflete a busca por uma solução do mérito sem a dilação probatória que não se concretizou.
Desse modo, a não produção da prova pericial, por inação das partes que foram incumbidas de seu custeio e fornecimento de dados, não pode obstar o prosseguimento do feito.
Ao contrário, a ausência de justificativa atuarial idônea por parte das rés para os reajustes, que deveriam ter sido demonstradas por meio da perícia, permite que este Juízo avalie a lide com base nos elementos já presentes e nas regras de distribuição do ônus da prova, bem como nas presunções daí decorrentes.
A causa, portanto, está madura para julgamento, e a pronta resolução do litígio atende aos princípios da celeridade processual e da razoável duração do processo, previstos nos artigos 4º e 6º do Código de Processo Civil.
B.
Das Preliminares Da Ilegitimidade Passiva da QUALICORP e da UNIMED RIO Em decisão anterior, este Juízo já se pronunciou em face de tal preliminar, que já havia estabelecido a solidariedade de todas as empresas que integram a cadeia de consumo.
Do Pedido de Chamamento do Feito à Ordem / Conversão da Perícia em Ofício à ANS A parte autora requereu o chamamento do feito à ordem para sanar irregularidades processuais, especialmente no que tange à não realização da perícia e à necessidade de obtenção dos índices de reajuste para planos individuais diretamente da ANS, por meio de ofício (ID 107869549).
Embora a parte autora tenha inicialmente pugnado pela perícia e posteriormente pela conversão para ofício à ANS, e diante da subsequente manifestação das rés em favor do julgamento antecipado, este Juízo compreende que o cerne da controvérsia probatória se resolve pela aplicação das regras do ônus da prova e das consequências da não produção probatória por parte das rés, como será detalhado adiante.
A solicitação de ofício à ANS, embora pertinente para obtenção de dados públicos, não se faz estritamente necessária para a decisão do mérito, uma vez que os índices de reajuste da ANS para planos individuais são informações públicas e a metodologia de cálculo deve ser aplicada independentemente de nova diligência judicial, especialmente quando a perícia foi frustrada pela inação das rés.
Assim, o pedido de chamamento do feito à ordem para essa finalidade específica é absorvido pela própria decisão de mérito.
C.
Da Aplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor A relação jurídica estabelecida entre o autor e as rés, Unimed Rio e Qualicorp, é, inequivocamente, uma relação de consumo, sujeitando-se, portanto, às normas e princípios do Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/1990).
O autor, na condição de beneficiário de plano de saúde, é o destinatário final dos serviços prestados, configurando-se como consumidor, nos termos do artigo 2º do CDC.
Por sua vez, as rés, como operadora e administradora de benefícios, respectivamente, são fornecedoras, conforme o artigo 3º do mesmo diploma legal.
A Unimed Rio, como operadora de planos de saúde, e a Qualicorp, como administradora de benefícios que intermedia e gerencia a relação entre a operadora e os beneficiários, atuam de forma concatenada para a disponibilização e gestão do serviço de assistência à saúde.
Essa atuação em cadeia de fornecimento justifica a aplicação da responsabilidade solidária, já afirmada na preliminar, e sublinha a importância da proteção consumerista.
A incidência do CDC é fundamental para reequilibrar a relação contratual, marcada pela notória vulnerabilidade técnica e informacional do consumidor.
As operadoras de planos de saúde e as administradoras de benefícios detêm o conhecimento técnico e o acesso a dados complexos, como planilhas atuariais e índices de sinistralidade, que são inacessíveis ao leigo.
Essa assimetria de informações foi, inclusive, reconhecida pelo Tribunal de Contas da União (TCU) em suas auditorias sobre o setor, que apontaram a "insuficiência de informações à disposição das pessoas jurídicas contratantes de planos coletivos para adequada avaliação dos valores de reajustes propostos pelas operadoras" (ID 61328141, Pág. 21, item 148).
O próprio TCU ressaltou que "a vulnerabilidade do contratante persistiria em decorrência da assimetria de informações existente entre contratante e operadora" (ID 61328141, Pág. 16, item 117).
Assim, a aplicação do CDC, com seus princípios basilares de transparência, boa-fé objetiva e proteção da parte vulnerável, é imprescindível para a justa solução da demanda.
D.
Da Distribuição do Ônus da Prova A distribuição do ônus da prova é um dos pilares do processo civil, orientando a atividade probatória das partes e a formação do convencimento do julgador.
O Código de Processo Civil, em seu artigo 373, estabelece a regra geral de que o ônus da prova incumbe ao autor quanto ao fato constitutivo de seu direito, e ao réu quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor.
Na decisão saneadora (ID 76834092), este Juízo determinou a aplicação da regra geral do artigo 373 do CPC, incumbindo às rés o ônus de provar a legalidade e a conformidade dos reajustes aplicados, notadamente por meio da apresentação de tabelas de custeio e cálculos atuariais, e deferiu a produção de perícia atuarial para tanto.
Contudo, conforme exaustivamente narrado no relatório, as rés, apesar da determinação judicial, não apresentaram a documentação completa e detalhada exigida para a realização da perícia atuarial.
A Unimed Rio limitou-se a juntar um histórico de reajustes sem o detalhamento atuarial, e a Qualicorp alegou não possuir os dados de cálculo, afirmando que apenas repassa os índices.
A perícia técnica, essencial para a elucidação da controvérsia sobre a abusividade dos reajustes, restou inviabilizada pela conduta das rés.
Diante da natureza consumerista da relação, e da manifesta hipossuficiência técnica e informacional do consumidor em relação às complexas planilhas atuariais que embasam os reajustes de planos de saúde, a inversão do ônus da prova, prevista no artigo 6º, inciso VIII, do CDC, revela-se plenamente aplicável.
Embora a decisão saneadora não tenha expressamente invertido o ônus, a impossibilidade prática de o autor produzir a prova da abusividade sem o acesso aos dados detidos pelas rés legitima a aplicação dessa regra protetiva.
A conduta das rés em não apresentar os documentos essenciais para a perícia, apesar de ordenado, equivale a uma recusa injustificada de exibição de prova, o que acarreta a presunção de veracidade dos fatos que se pretendia provar, nos termos do artigo 373, §1º, do CPC, e do artigo 400, inciso I, do CPC, que dispõe que o juiz admitirá como verdadeiros os fatos que, por meio do documento ou coisa, a parte pretendia provar, se a parte contrária injustificadamente se recusar a exibi-los.
Nesse diapasão, a falta de comprovação técnica por parte das rés de que os reajustes foram aplicados de forma atuarialmente idônea e em conformidade com a regulação aplicável faz operar em seu desfavor a presunção de abusividade, tornando incontroverso o fato constitutivo do direito do autor.
Assim, a ausência da prova que incumbia às rés, aliada à vulnerabilidade do consumidor e à recusa injustificada na apresentação dos dados, permite que o julgamento do mérito se dê com base nas alegações autorais e nos demais elementos probatórios disponíveis.
E.
Do Mérito Da Natureza do Contrato de Plano de Saúde (Individual vs.
Coletivo por Adesão) e dos Reajustes Anuais A controvérsia central do presente feito reside na qualificação do plano de saúde contratado pelo autor – se individual ou coletivo por adesão – e, consequentemente, na metodologia de reajuste aplicável.
As rés argumentam que o contrato é coletivo por adesão, vinculado ao Conselho Federal de Odontologia (CFO), e que, por isso, não se sujeita aos índices de reajuste anuais fixados pela ANS para planos individuais.
Defendem que os reajustes de planos coletivos são definidos pela negociação entre as pessoas jurídicas contratantes e as operadoras, baseando-se na variação dos custos médico-hospitalares (VCMH) e na sinistralidade da carteira.
De fato, o setor de saúde suplementar diferencia os planos individuais/familiares dos coletivos (sejam empresariais ou por adesão) em termos de regulação de reajustes.
Enquanto os reajustes dos planos individuais são submetidos à autorização prévia da ANS e a um teto máximo anual estabelecido pela agência (Lei nº 9.656/98, art. 35-E, §2º), os reajustes dos planos coletivos são resultantes da negociação entre as partes contratantes, com a ANS exercendo um papel de monitoramento posterior (Lei nº 9.961/2000, art. 4º, XXI).
Essa distinção se fundamenta na premissa de que as pessoas jurídicas contratantes de planos coletivos teriam maior poder de barganha e capacidade técnica para negociar os termos contratuais e fiscalizar os reajustes.
Entretanto, a realidade fática frequentemente revela uma distorção dessa premissa, especialmente nos chamados "falsos planos coletivos" ou "coletivos de fachada".
O autor alegou ser o "único beneficiário na residência" (ID 107869549, Pág. 3), o que, se comprovado, descaracteriza o elemento de mutualismo e diluição de risco inerente aos planos verdadeiramente coletivos.
Quando um plano é contratado formalmente como coletivo, mas de fato abarca um número reduzido de pessoas, muitas vezes de um mesmo núcleo familiar ou pessoa física, e não há uma genuína relação de coletividade que justifique a aplicação de regras diferenciadas, ele perde sua natureza e deve ser reequiparado ao plano individual para fins de aplicação das regras de reajuste.
Essa prática, visa a burlar a fiscalização da ANS e impor reajustes sem as limitações impostas aos planos individuais.
O próprio TCU, em seu relatório de auditoria (ID 61328141, Pág. 19, item 132), reconhece o problema da "falsa coletivização", onde operadoras "escapam da regulamentação mais rigorosa aplicada aos planos individuais", o que corrobora a tese autoral.
A falha das rés em apresentar a base atuarial idônea para justificar os reajustes aplicados, apesar de reiteradas determinações judiciais para tanto, é um fator determinante.
A alegação da Qualicorp de que apenas repassa os índices e a não apresentação dos cálculos completos pela Unimed Rio (ID 72393519) deixam o consumidor desprovido das informações necessárias para verificar a razoabilidade dos aumentos.
Essa ausência de transparência, aliada à vulnerabilidade informacional do consumidor, reforça a natureza abusiva dos reajustes, independentemente da classificação formal do contrato.
Dessa forma, diante da falta de comprovação da base atuarial e da veracidade da premissa de negociação paritária para o contrato em questão, e considerando os indícios de "falsa coletivização" evidenciados pela composição do grupo (autor como único beneficiário em sua residência), o contrato deve ser interpretado e tratado, para fins de reajuste, como se individual fosse.
A aplicação dos índices da ANS para planos individuais, que são públicos e regulados, é a medida que melhor se coaduna com os princípios de proteção ao consumidor e com a busca pelo equilíbrio contratual, afastando os aumentos unilaterais e desprovidos de justificativa transparente.
Da Legalidade dos Reajustes por Faixa Etária Os reajustes de mensalidade de planos de saúde por mudança de faixa etária são, em tese, legalmente previstos e válidos, desde que observados certos parâmetros.
A Lei nº 9.656/98 (art. 15) e a Resolução Normativa nº 63/2003 da ANS estabelecem a possibilidade de tais reajustes, desde que haja previsão contratual, que os percentuais sejam razoáveis e não discriminatórios, e que sejam observadas as normas expedidas pelos órgãos reguladores.
A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, consolidada no Tema Repetitivo 952 (REsp 1568244/RJ, constante de ID 105015405), reitera essa validade, mas impõe a condição de que não sejam aplicados "percentuais desarrazoados ou aleatórios que, concretamente e sem base atuarial idônea, onerem excessivamente o consumidor ou discriminem o idoso".
No caso em tela, embora o contrato preveja reajustes por faixa etária, e o autor tenha sofrido um aumento de 32,29% ao completar 50 anos (ID 62025819, Pág. 27), a fundamental questão é a ausência de base atuarial idônea para justificar tal percentual.
As rés, apesar de terem sido expressamente intimadas para apresentar os cálculos atuariais que fundamentassem os reajustes (ID 76834092), não o fizeram de forma satisfatória.
A Unimed Rio apresentou apenas percentuais (ID 72393521, ID 80697385, ID 80697386), sem a memória de cálculo atuarial que demonstrasse a proporcionalidade e a justificação econômica do aumento.
A Qualicorp, por sua vez, alegou não possuir essa informação.
A ausência de prova da base atuarial, cujo ônus recaía sobre as rés, conforme já discutido, faz presumir que os percentuais aplicados são desarrazoados e desproporcionais, onerando excessivamente o consumidor.
O fato de o plano ser formalmente "coletivo por adesão" não isenta as operadoras de demonstrar a conformidade dos reajustes com critérios técnicos e legais, especialmente quando a relação fática se assemelha a um plano individual, como é o caso do autor.
A falha na demonstração da justificação atuarial dos reajustes por faixa etária, mesmo em contratos coletivos, tem sido consistentemente interpretada como abusividade pela jurisprudência, dada a vulnerabilidade do consumidor.
Portanto, em que pese a previsão contratual e a legalidade abstrata dos reajustes por faixa etária, a falta de demonstração de sua base atuarial concreta e idônea pelas rés no curso processual leva à conclusão de que os aumentos aplicados ao autor, neste aspecto, são abusivos.
Da Transparência e o Dever de Informação O dever de informação, basilar nas relações de consumo (CDC, Art. 6º, III), impõe aos fornecedores a obrigação de disponibilizar ao consumidor dados claros, precisos e adequados sobre os produtos e serviços, incluindo a composição de preços e a metodologia de reajustes.
A parte autora reiteradamente alegou a falta de transparência das rés quanto à justificação dos reajustes (ID 53755140, Pág. 3-4), recebendo apenas notificações simples com percentuais, sem os dados atuariais que permitissem a compreensão e a verificação da legalidade dos aumentos.
As rés, em sua defesa, argumentaram que a complexidade dos cálculos atuariais e a existência de dados sensíveis (LGPD) impediriam a divulgação irrestrita de tais informações, e que a fiscalização da ANS seria suficiente (ID 61328137, Pág. 23-25).
No entanto, o próprio TCU, em sua auditoria sobre os reajustes de planos de saúde (TC 021.852/2014-6, Acórdão 679/2018-Plenário e Acórdão 1007/2021-Plenário, constantes de ID 61328141 e ID 61328142), apontou a "insuficiência de mecanismos para prevenção, identificação e correção de reajustes abusivos em planos coletivos" (ID 61328141, Pág. 13, item 99) e a "insuficiência de informações à disposição das pessoas jurídicas contratantes de planos coletivos para adequada avaliação dos valores de reajustes propostos pelas operadoras" (ID 61328141, Pág. 21, item 148).
O TCU, inclusive, recomendou que a ANS estabelecesse a obrigatoriedade de as operadoras disponibilizarem à pessoa jurídica contratante "a memória de cálculo do percentual de reajuste proposto, incluindo extrato de utilização dos planos de saúde contratados, com a discriminação dos procedimentos utilizados, como consultas, exames, cirurgias, internações e dos valores pagos aos prestadores de serviço, vedada a divulgação dos beneficiários responsáveis pelas despesas assistenciais realizadas ou de qualquer informação que possa comprometer a privacidade dos beneficiários" (ID 61328141, Pág. 23, item 161).
Isso demonstra que a ausência de transparência nos reajustes não é uma mera alegação do consumidor, mas uma falha sistêmica do mercado, reconhecida por órgãos de controle.
A invocação da LGPD pelas rés é, neste caso, desarrazoada, pois a lei permite o tratamento de dados para o exercício regular de direitos em processo judicial (LGPD, Art. 7º, VI), e a exigência de memória de cálculo pode ser feita de forma a preservar a identidade dos beneficiários, conforme o próprio TCU sugere.
A conduta das rés em não fornecerem as informações detalhadas sobre a composição dos reajustes, mesmo após determinação judicial para fazê-lo em sede de perícia, violou gravemente o dever de informação e a boa-fé contratual.
Essa omissão prejudicou a capacidade de defesa do consumidor e a apuração da verdade real nos autos, corroborando a abusividade dos aumentos.
Da Transferência da Carteira da UNIMED RIO para UNIMED FERJ e seus Impactos A Unimed Rio noticiou a este Juízo a transferência de sua carteira de beneficiários ativos para a Unimed Ferj, com efeitos a partir de 1º de abril de 2024, mediante autorização da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) e formalização por Termo de Compromisso (IDs 106423446, 106424100, 88518470, 88518474).
A Unimed Rio alegou que, com essa transferência, cessou integralmente suas atividades como operadora de planos de saúde, sendo a Unimed Ferj a única responsável pelas obrigações decorrentes dos contratos transferidos, especialmente quanto à prestação de assistência à saúde dos beneficiários migrados.
Solicitou, por conseguinte, a substituição no polo passivo ou a inclusão da Unimed Ferj.
Contudo, a análise cuidadosa da documentação e da legislação aplicável não corrobora a tese de total desoneração da Unimed Rio para todos os fins.
O Ofício nº 4/2024/RST PRESI/PRESI da ANS (ID 106424100, Pág. 3), que informou a transferência, e o comunicado da ANS aos beneficiários (ID 106424100, Pág. 9-10), bem como a cópia do Termo de Compromisso (ID 88518474), esclarecem que a Unimed Ferj assumirá a responsabilidade pela assistência à saúde de todos os beneficiários, devendo manter integralmente as condições vigentes dos contratos.
No entanto, o Termo de Compromisso (ID 88518474, Pág. 14, Cláusula Primeira, Parágrafo Nono) expressamente prevê que a "PRIMEIRA COMPROMISSÁRIA [Unimed Rio] continuará suas atividades na condição de rede prestadora de serviços, comprometendo-se a manter a responsabilidade por seus débitos, inclusive trabalhistas, decorrentes de sua atuação." Essa cláusula é crucial.
A responsabilidade da Unimed Rio por "débitos decorrentes de sua atuação" abrange, sem sombra de dúvidas, as obrigações relativas aos reajustes supostamente abusivos que se deram antes da transferência da carteira.
A ação revisional busca a restituição de valores pagos indevidamente desde janeiro de 2019, ou seja, em um período em que a Unimed Rio era a operadora plena do plano.
A transferência da carteira para a Unimed Ferj, embora relevante para a continuidade dos serviços, não tem o condão de eximir a Unimed Rio da responsabilidade por atos e obrigações passadas, especialmente aquelas que geraram prejuízos ao consumidor antes da migração.
A solidariedade na cadeia de consumo, já reconhecida, reforça essa conclusão, mantendo ambas as rés originais responsáveis.
Além disso, a petição da parte autora (ID 107869549, Pág. 1-2) trouxe a informação de que a Unimed Rio não comunicou a transferência ao autor, e que o autor tem recebido "NEGATIVAS DE ATENDIMENTOS" após a migração, o que se exemplifica pelos prints de tela anexados (ID 107869553), indicando "sua solicitação foi negada".
Essa situação, embora não seja o cerne da ação revisional, reforça a necessidade de manutenção da responsabilidade da Unimed Rio, garantindo a proteção do consumidor diante de eventual descontinuidade ou falha nos serviços, mesmo após a transferência.
Assim, a transferência da carteira para a Unimed Ferj não afasta a legitimidade passiva e a responsabilidade da Unimed Rio e da Qualicorp pelos danos e restituições pleiteadas, referentes ao período anterior à migração e decorrentes da atuação conjunta na cadeia de consumo.
Da Análise dos Reajustes Específicos e dos Valores Pleiteados O autor alegou que os reajustes anuais aplicados foram abusivos, resultando em um acréscimo acumulado de 121,09% entre 2016 e 2022, e que os valores deveriam ter seguido os índices da ANS para planos individuais.
Ele apresentou uma memória de cálculo (ID 53757151) que aponta um valor mensal correto de R$ 655,66 e um montante de R$ 19.790,40 a ser restituído em dobro, referente aos pagamentos indevidos de janeiro de 2019 a janeiro de 2022.
Conforme a análise anterior, a qualificação do contrato como "falso coletivo" para fins de reajuste, aliada à falha das rés em apresentar a devida justificação atuarial para os aumentos impostos, autoriza a aplicação dos índices da ANS para planos individuais.
O ônus da prova, que recaía sobre as rés para justificar a legalidade dos reajustes, não foi cumprido.
Apenas um "Histórico de Reajustes" (ID 80697385, ID 80697386) foi apresentado pela Unimed Rio, mas desacompanhado da complexa base atuarial e da memória de cálculo que permitiria verificar a conformidade dos aumentos com os critérios de sinistralidade e VCMH.
A falta dessa comprovação, após ordem judicial expressa (ID 76834092), leva à presunção de que os reajustes foram de fato abusivos.
A metodologia de cálculo proposta pelo autor, baseada nos índices regulados pela ANS para planos individuais, emerge como a solução mais equitativa e legalmente respaldada para recompor o equilíbrio contratual.
Para a aplicação dos reajustes, a tese do STJ (Tema 952 e 1016) é clara ao exigir a "base atuarial idônea" e que os percentuais não sejam "desarrazoados ou aleatórios".
A ausência dessa base, por culpa das rés, impede a validação dos reajustes por elas praticados.
Assim, a aplicação dos índices da ANS para planos individuais, desde o marco inicial da contratação (15/11/2005, conforme ID 53755140), mas com a restituição limitada ao período pleiteado na inicial pelo autor (janeiro de 2019 a janeiro de 2022), é a medida de justiça que se impõe.
O valor da mensalidade deve ser recalculado considerando a aplicação desses índices, e o excesso cobrado, apurado.
F.
Dos Danos Materiais (Repetição do Indébito) A parte autora requereu a restituição em dobro dos valores pagos a maior, com base no artigo 42, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor, que impõe a dobra quando a cobrança indevida não decorrer de "engano justificável".
As rés argumentaram que não houve má-fé, o que afastaria a dobra.
Contudo, a recalcitrância em apresentar os documentos cruciais para a justificação dos reajustes, a imposição de aumentos que se revelaram abusivos em um contexto de "falso coletivo" e a tentativa de evasão da fiscalização da ANS, conforme apontado pelo TCU (ID 61328141), caracterizam conduta que ultrapassa o "engano justificável".
A falta de transparência sistêmica e a omissão deliberada na produção de provas essenciais, que permitiriam ao consumidor aferir a correção das cobranças, demonstram uma conduta que não pode ser chancelada como mero equívoco.
A jurisprudência tem evoluído no sentido de flexibilizar a exigência de prova da má-fé, bastando o "engano injustificável", que se configura pela ausência de boa-fé objetiva por parte do fornecedor.
A conduta das rés, que se recusaram a fornecer a base atuarial para os reajustes e que operavam um contrato com características de "falso coletivo" para se eximir da regulação mais rigorosa, não se encaixa na figura do "engano justificável".
Pelo contrário, revela-se uma conduta que buscou, de forma consciente, onerar o consumidor em patamares superiores aos permitidos ou justificáveis, aproveitando-se da assimetria de informações.
Portanto, é cabível a condenação das rés à restituição em dobro dos valores pagos indevidamente.
O período de restituição será o expressamente pleiteado na petição inicial pelo autor, qual seja, de janeiro de 2019 a janeiro de 2022 (ID 53755140, Pág. 16), no valor de R$ 19.790,40, conforme planilha autoral (ID 53757151), devidamente corrigido.
G.
Dos Danos Morais O autor pleiteou indenização por danos morais no valor de R$ 27.000,00, alegando que os reajustes abusivos causaram-lhe transtornos e angústias, agravados pelo cenário de saúde de sua esposa e o comprometimento de sua renda familiar, conforme laudos médicos (ID 56058613).
As rés, por sua vez, sustentaram que a situação se configura como mero aborrecimento contratual, insuscetível de gerar danos morais, e que o valor pleiteado seria excessivo e configuraria enriquecimento sem causa. É certo que o mero descumprimento contratual, em regra, não enseja a condenação em danos morais.
Contudo, a situação em análise transcende o mero aborrecimento.
A imposição reiterada de reajustes abusivos em um serviço essencial como o plano de saúde, sem a devida transparência e justificativa, gera no consumidor uma profunda sensação de impotência e insegurança.
No caso concreto, essa situação foi agravada pelo contexto de grave doença da esposa do autor, que necessitava de cuidados contínuos e cuja saúde dependia diretamente da manutenção do plano, como os laudos médicos demonstram (ID 56058613, Págs. 4, 5, 8, 9, 17).
A preocupação com a incapacidade de arcar com as mensalidades e a possibilidade de descontinuidade do serviço essencial, em um momento de vulnerabilidade pessoal e familiar, configura um abalo que supera o dissabor cotidiano.
A narrativa da parte autora (ID 56058622, Pág. 2) sobre os gastos extras com o tratamento da esposa e a suspensão dos serviços (ID 107869553) reforça o sofrimento vivenciado.
A conduta das rés, de impor reajustes desarrazoados e de se omitir na apresentação das informações que justificassem tais aumentos, revelando uma "falsa coletivização" do plano para se eximir das regras da ANS, causou ao autor uma aflição significativa.
A incerteza quanto à continuidade de um serviço vital, somada ao impacto financeiro e ao desrespeito ao dever de transparência, é um fator de angústia que lesa a dignidade do consumidor e, portanto, é passível de reparação.
Quanto ao valor da indenização, a fixação deve pautar-se nos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, considerando a extensão do dano, a capacidade econômica das partes e o caráter punitivo-pedagógico da medida, sem, contudo, configurar enriquecimento ilícito do ofendido.
Entendo que o valor de R$ 5.000,00, mostra-se razoável, diante da gravidade da conduta das rés, a essencialidade do serviço e o impacto na vida do autor e de sua família em um momento de extrema fragilidade.
A privação da tranquilidade e a exposição a riscos desnecessários em relação à saúde e ao bem-estar familiar justificam a condenação.
Dito isso, considero que a conduta das rés gerou danos de natureza moral ao autor, que merecem ser compensados.
III.
DISPOSITIVO Ante o exposto e por tudo mais que dos autos consta, JULGO PROCEDENTES, EM PARTE, os pedidos formulados na presente Ação Revisional de Plano de Saúde c/c Pedido Liminar e Restituição de Valores ajuizada por BILGAI BERBERT FERREIRA em face de UNIMED RIO COOPERATIVA DE TRABALHO MÉDICO DO RIO DE JANEIRO LTDA e QUALICORP CONSULTORIA E CORRETORA DE SEGUROS S.A., para: DECLARAR a nulidade dos reajustes de mensalidade aplicados ao contrato de plano de saúde do autor desde janeiro de 2019, reclassificando o plano de saúde, para fins de reajuste, como individual, em razão da descaracterização fática de plano coletivo e da ausência de comprovação atuarial idônea e transparente dos reajustes aplicados pelas rés.
DETERMINAR que as rés recalculem as mensalidades devidas pelo autor desde janeiro de 2019, aplicando-se os índices de reajuste autorizados pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) para planos individuais, e os reajustes por faixa etária segundo a metodologia prevista na RN nº 63/2003 da ANS, sem a incidência de percentuais desarrazoados ou sem base atuarial comprovada, mantendo-se o valor da mensalidade do autor em R$ 655,66 (seiscentos e cinquenta e cinco reais e sessenta e seis centavos), a partir de fevereiro de 2022, valor que deverá ser reajustado anualmente pelos índices ANS para planos individuais.
CONDENAR as rés, solidariamente, à restituição em dobro dos valores pagos a maior pelo autor, no período compreendido entre janeiro de 2019 e janeiro de 2022, no montante de R$ 19.790,40 (dezenove mil, setecentos e noventa reais e quarenta centavos), conforme memória de cálculo acostada na inicial (ID 53757151), o qual deverá ser acrescido de correção monetária, com base na tabela do ENCOGE (Encontro Nacional dos Corregedores-Gerais da Justiça do Brasil), a partir de cada desembolso indevido, e juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, a contar da citação, nos termos do artigo 405 do Código Civil.
CONDENAR as rés, solidariamente, ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), a ser corrigido monetariamente pelo índice do ENCOGE a partir desta sentença e acrescido de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês a contar da citação, em conformidade com o artigo 405 do Código Civil.
Considerando a sucumbência mínima da parte autora, condeno as rés, solidariamente, ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, estes últimos que fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor total da condenação, nos termos do artigo 85, § 2º, do Código de Processo Civil.
Transitada em julgado, intime-se o credor para, no prazo de 5 (cinco) dias, requerer o que entender de direito, observando as regras processuais atinentes ao cumprimento de sentença.
Publicada e registrada eletronicamente.
Intime as partes.
João Pessoa/PB, data do protocolo eletrônico. [Documento datado e assinado eletronicamente - art. 2º, lei 11.419/2006] SHIRLEY ABRANTES MOREIRA RÉGIS Juíza de Direito -
19/08/2025 13:40
Julgado procedente em parte do pedido
-
07/05/2025 10:49
Conclusos para decisão
-
01/05/2025 04:20
Decorrido prazo de QUALICORP CONSULTORIA E CORRETORA DE SEGUROS S.A. em 29/04/2025 23:59.
-
24/04/2025 15:35
Juntada de Petição de petição
-
24/04/2025 15:32
Juntada de Petição de petição
-
22/04/2025 17:37
Juntada de Petição de petição
-
16/04/2025 00:35
Publicado Despacho em 14/04/2025.
-
16/04/2025 00:35
Disponibilizado no DJ Eletrônico em 11/04/2025
-
10/04/2025 11:40
Expedição de Outros documentos.
-
10/04/2025 11:40
Proferido despacho de mero expediente
-
16/02/2025 20:47
Juntada de Petição de petição
-
10/02/2025 14:51
Juntada de Petição de petição (3º interessado)
-
07/12/2024 19:19
Juntada de Petição de petição
-
03/12/2024 01:12
Decorrido prazo de QUALICORP CONSULTORIA E CORRETORA DE SEGUROS S.A. em 02/12/2024 23:59.
-
03/12/2024 01:12
Decorrido prazo de UNIMED-RIO COOPERATIVA DE TRABALHO MEDICO DO RIO DE JANEIRO LTDA em 02/12/2024 23:59.
-
13/11/2024 16:27
Conclusos para despacho
-
08/11/2024 13:22
Juntada de Petição de petição
-
06/11/2024 00:45
Expedição de Certidão.
-
05/11/2024 22:50
Expedição de Outros documentos.
-
05/11/2024 22:50
Expedição de Outros documentos.
-
05/11/2024 22:50
Expedição de Outros documentos.
-
17/10/2024 12:17
Proferido despacho de mero expediente
-
28/08/2024 11:04
Juntada de Petição de petição (3º interessado)
-
25/08/2024 19:34
Conclusos para despacho
-
25/08/2024 19:34
Juntada de Certidão de decurso de prazo
-
15/08/2024 01:36
Decorrido prazo de ANTONIO LEITE LOUREIRO NETO em 14/08/2024 23:59.
-
07/08/2024 08:14
Mandado devolvido entregue ao destinatário
-
07/08/2024 08:14
Juntada de Petição de diligência
-
03/08/2024 22:52
Mandado devolvido para redistribuição
-
03/08/2024 22:52
Juntada de Petição de devolução de mandado
-
29/07/2024 12:36
Expedição de Mandado.
-
29/07/2024 12:28
Juntada de Carta rogatória
-
23/07/2024 10:01
Juntada de Certidão
-
21/05/2024 02:20
Decorrido prazo de ANTONIO LEITE LOUREIRO NETO em 20/05/2024 23:59.
-
03/05/2024 12:29
Expedição de Outros documentos.
-
03/05/2024 08:48
Nomeado perito
-
09/04/2024 19:17
Juntada de Petição de petição de habilitação nos autos
-
06/02/2024 16:51
Conclusos para despacho
-
06/02/2024 16:51
Juntada de Certidão de decurso de prazo
-
30/01/2024 01:06
Decorrido prazo de UNIMED-RIO COOPERATIVA DE TRABALHO MEDICO DO RIO DE JANEIRO LTDA em 29/01/2024 23:59.
-
29/01/2024 17:34
Juntada de Petição de petição
-
20/12/2023 00:38
Decorrido prazo de QUALICORP CONSULTORIA E CORRETORA DE SEGUROS S.A. em 19/12/2023 23:59.
-
11/12/2023 18:47
Expedição de Outros documentos.
-
16/10/2023 16:21
Juntada de Petição de petição
-
27/09/2023 23:06
Decorrido prazo de UNIMED-RIO COOPERATIVA DE TRABALHO MEDICO DO RIO DE JANEIRO LTDA em 15/09/2023 23:59.
-
05/09/2023 03:11
Decorrido prazo de QUALICORP CONSULTORIA E CORRETORA DE SEGUROS S.A. em 04/09/2023 23:59.
-
27/08/2023 14:42
Expedição de Outros documentos.
-
22/08/2023 01:19
Decorrido prazo de UNIMED-RIO COOPERATIVA DE TRABALHO MEDICO DO RIO DE JANEIRO LTDA em 21/08/2023 23:59.
-
21/08/2023 22:57
Juntada de Petição de petição
-
07/08/2023 17:40
Juntada de Petição de petição
-
01/08/2023 17:35
Expedição de Outros documentos.
-
01/08/2023 17:35
Decisão de Saneamento e de Organização do Processo
-
29/06/2023 11:51
Conclusos para despacho
-
13/05/2023 01:22
Juntada de Petição de petição
-
26/04/2023 18:40
Juntada de Petição de petição
-
25/04/2023 02:31
Decorrido prazo de QUALICORP CONSULTORIA E CORRETORA DE SEGUROS S.A. em 19/04/2023 23:59.
-
30/03/2023 12:07
Juntada de Petição de petição
-
24/03/2023 13:01
Expedição de Outros documentos.
-
24/03/2023 13:01
Proferido despacho de mero expediente
-
10/02/2023 09:34
Conclusos para despacho
-
09/02/2023 01:39
Decorrido prazo de UNIMED-RIO COOPERATIVA DE TRABALHO MEDICO DO RIO DE JANEIRO LTDA em 06/02/2023 23:59.
-
06/02/2023 20:06
Juntada de Petição de petição
-
03/02/2023 01:42
Decorrido prazo de QUALICORP CONSULTORIA E CORRETORA DE SEGUROS S.A. em 31/01/2023 23:59.
-
16/01/2023 16:39
Juntada de Petição de petição
-
13/12/2022 11:47
Expedição de Outros documentos.
-
20/09/2022 01:59
Decorrido prazo de UNIMED-RIO COOPERATIVA DE TRABALHO MEDICO DO RIO DE JANEIRO LTDA em 09/09/2022 23:59.
-
18/08/2022 21:44
Juntada de Petição de réplica
-
18/08/2022 20:55
Juntada de Petição de réplica
-
16/08/2022 09:32
Juntada de Petição de petição
-
11/08/2022 16:57
Juntada de Petição de contestação
-
09/08/2022 12:58
Juntada de Petição de aviso de recebimento
-
08/08/2022 15:27
Expedição de Outros documentos.
-
08/08/2022 15:27
Não Concedida a Medida Liminar
-
28/07/2022 09:24
Conclusos para despacho
-
26/07/2022 17:37
Juntada de Petição de petição
-
25/07/2022 16:55
Juntada de Petição de contestação
-
08/07/2022 01:52
Decorrido prazo de QUALICORP CONSULTORIA E CORRETORA DE SEGUROS S.A. em 06/07/2022 23:59.
-
06/07/2022 20:14
Juntada de Petição de petição
-
06/07/2022 13:32
Juntada de Petição de petição
-
01/07/2022 10:22
Expedição de Aviso de recebimento (AR).
-
30/06/2022 12:05
Expedição de Outros documentos.
-
30/06/2022 12:05
Assistência Judiciária Gratuita não concedida a BILGAI BERBERT FERREIRA - CPF: *83.***.*44-15 (AUTOR).
-
29/06/2022 20:06
Conclusos para despacho
-
23/03/2022 15:26
Juntada de Petição de resposta
-
10/03/2022 12:06
Expedição de Outros documentos.
-
09/03/2022 14:08
Proferido despacho de mero expediente
-
09/03/2022 08:59
Conclusos para despacho
-
07/03/2022 11:09
Redistribuído por sorteio em razão de incompetência
-
11/02/2022 19:44
Juntada de Petição de resposta
-
08/02/2022 09:29
Expedição de Outros documentos.
-
07/02/2022 17:37
Proferido despacho de mero expediente
-
04/02/2022 11:59
Conclusos para despacho
-
04/02/2022 11:59
Declarada incompetência
-
30/01/2022 11:29
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
01/09/2025
Ultima Atualização
28/08/2025
Valor da Causa
R$ 0,00
Documentos
Sentença • Arquivo
Sentença • Arquivo
Despacho • Arquivo
Despacho • Arquivo
Despacho • Arquivo
Decisão • Arquivo
Documento de Comprovação • Arquivo
Decisão • Arquivo
Decisão • Arquivo
Despacho • Arquivo
Despacho • Arquivo
Decisão • Arquivo
Decisão • Arquivo
Despacho • Arquivo
Despacho • Arquivo
Despacho • Arquivo
Decisão • Arquivo
Informações relacionadas
Processo nº 0801685-89.2024.8.15.0061
Assiluci da Silva e Souza
Municipio de Araruna
Advogado: Ivana Samara Alcantara de Lima
1ª instância - TJPB
Ajuizamento: 01/07/2024 20:44
Processo nº 0800249-45.2025.8.15.0131
Cristovao Jonas de Farias Maciel
Transportes Aereos Portugueses SA
Advogado: Juliana Cristina Martinelli Raimundi
1ª instância - TJPB
Ajuizamento: 16/01/2025 13:49
Processo nº 0804976-86.2021.8.15.0131
Municipio de Cajazeiras
Instituicao de Educacao Infantil Santa T...
Advogado: Edilson Tavares de Sousa
1ª instância - TJPB
Ajuizamento: 29/12/2021 15:18
Processo nº 0806052-88.2025.8.15.0331
Jose Antonio de Assis
Banco Bradesco
Advogado: Jefferson Fernandes dos Santos
1ª instância - TJPB
Ajuizamento: 12/08/2025 16:23
Processo nº 0805499-69.2025.8.15.2003
Luciana Costa dos Santos
Hapvida Assistencia Medica S.A.
Advogado: Maria Lisieux Lima Lopes Peronico
1ª instância - TJPB
Ajuizamento: 04/09/2025 07:54