TJPA - 0800228-30.2019.8.14.0221
2ª instância - Câmara / Desembargador(a) Desembargador Amilcar Roberto Bezerra Guimaraes
Processos Relacionados - Outras Instâncias
Polo Passivo
Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
-
14/02/2023 10:49
Remetidos os Autos (por julgamento definitivo do recurso) para Baixa ou Devolução de Processo
-
14/02/2023 10:49
Baixa Definitiva
-
14/02/2023 00:21
Decorrido prazo de MARIA LUCIA DE SOUSA BRAGA em 13/02/2023 23:59.
-
14/02/2023 00:21
Decorrido prazo de BANCO PAN S.A. em 13/02/2023 23:59.
-
14/02/2023 00:21
Decorrido prazo de MARIA LUCIA DE SOUSA BRAGA em 13/02/2023 23:59.
-
11/02/2023 00:08
Decorrido prazo de BANCO PAN S.A. em 10/02/2023 23:59.
-
04/02/2023 14:35
Publicado Acórdão em 23/01/2023.
-
16/01/2023 14:37
Juntada de Petição de petição
-
20/12/2022 00:02
Disponibilizado no DJ Eletrônico em 20/12/2022
-
19/12/2022 00:00
Intimação
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ APELAÇÃO CÍVEL (198) - 0800228-30.2019.8.14.0221 APELANTE: MARIA LUCIA DE SOUSA BRAGA APELADO: BANCO PAN S.A.
REPRESENTANTE: BANCO PAN S.A.
RELATOR(A): Desembargador AMILCAR ROBERTO BEZERRA GUIMARÃES EMENTA TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ 2ª Turma de Direito Privado APELAÇÃO CÍVEL: 0800228-30.2019.8.14.0221 APELANTE: MARIA LÚCIA DE SOUSA BRAGA Advogados do(a) APELANTE: BRENO FILIPPE DE ALCANTARA GOMES - PA21820-A, DIORGEO DIOVANNY STIVAL MENDES DA ROCHA LOPES DA SILVA - PA12614-A APELADO: BANCO PAN S.A.
Advogado do(a) APELADO: ANTONIO DE MORAES DOURADO NETO - PE23255-A DESEMBARGADOR RELATOR: AMILCAR ROBERTO BEZERRA GUIMARÃES EMENTA.
APELAÇÃO CÍVEL.
AÇÃO DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS E REPETIÇÃO DE INDÉBITO.
EMPRÉSTIMO CONSIGNADO.
CONTRATANTE ANALFABETO.
INOBSERVÂNCIA DO ART. 595 DO CC.
CONTRATO DECLARADO NULO.
REPETIÇÃO DO INDÉBITO NA FORMA DOBRADA.
OCORRÊNCIA.
VIOLAÇÃO DA BOA-FÉ.
DANO MORAL ARBITRADO NO IMPORTE DE R$2.000,00.
RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.
A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos, Acordam os Excelentíssimos Senhores Desembargadores membros componentes da Colenda 2ª Turma de Direito Privado do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Pará, por unanimidade de votos, em conhecer e dar provimento ao Recurso, nos termos do voto relatado pelo Exmo.
Desembargador Relator Amilcar Roberto Bezerra Guimarães.
RELATÓRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ 2ª Turma de Direito Privado APELAÇÃO CÍVEL: 0800228-30.2019.8.14.0221 APELANTE: MARIA LÚCIA DE SOUSA BRAGA Advogados do(a) APELANTE: BRENO FILIPPE DE ALCANTARA GOMES - PA21820-A, DIORGEO DIOVANNY STIVAL MENDES DA ROCHA LOPES DA SILVA - PA12614-A APELADO: BANCO PAN S.A.
Advogado do(a) APELADO: ANTONIO DE MORAES DOURADO NETO - PE23255-A DESEMBARGADOR RELATOR: AMILCAR ROBERTO BEZERRA GUIMARÃES Trata-se de Apelação Cível interposta por MARIA LÚCIA DE SOUSA BRAGA, inconformada com a r. sentença prolatada pelo MM.
Juízo responsável pelo Termo Judiciário de Magalhães Barata, que, nos autos da AÇÃO DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO c/c INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS COM PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA em face de BANCO PAN S/A, julgou improcedente a pretensão esposada na inicial.
Aduz a autora, ora apelante, na peça inicial que ao consultar o extrato de sua aposentadoria pelo INSS, constatou descontos relativos a empréstimos realizados em seu nome.
Afirma que não realizou a contratação, tratando-se de fraude efetuada pelo banco requerendo, assim, a inversão do ônus da prova para que o réu trouxesse aos autos os contratos indicados na exordial.
Requer, ao final, a devolução de todos os valores descontados referentes ao empréstimo indicado, bem como a condenação do réu ao pagamento de indenização por danos morais e a anulação do contrato.
O réu, ora apelado, apresentou contestação alegando que os descontos objeto da demanda são legítimos.
Afirma que não há que se falar em dano moral por não ter praticado ato ilícito.
Aduz não caber a declaração de inexistência dos contratos e muito menos a repetição do indébito.
Juntou contrato.
O feito seguiu tramitação até a prolação da sentença que julgou improcedente a pretensão esposada na inicial.
Em suas razões recursais, sustenta a apelante, em suma, que a sentença merece reforma.
Alega que o apelado não apresentou fato impeditivo ou modificativo do direito da autora.
Aduz, ainda, que é analfabeta e que o negócio deveria ter sido realizado por instrumento público e que é devida a devolução dos valores em dobro, assim como a condenação do recorrido ao pagamento de indenização por danos morais.
Contrarrazões apresentadas na qual o apelado rechaçou os argumentos lançados pela apelante e requer a manutenção da sentença. É o breve relatório com apresentação em pauta de julgamento, para a Sessão Ordinária – Plenário Virtual - Plataforma PJe.
AMILCAR ROBERTO BEZERRA GUIMARÃES Desembargador Relator VOTO DO RECEBIMENTO O presente recurso é cabível, visto que foi apresentado tempestivamente, por quem detém interesse recursal e legitimidade, tendo sido firmado por advogado legalmente habilitado nos autos.
Preparo dispensado em razão da justiça gratuita deferida.
DO CONHECIMENTO Tendo sido preenchidos os pressupostos recursais intrínsecos e extrínsecos, conheço do presente recurso.
DA ANÁLISE DO PEDIDO DA REFORMA A questão devolvida à apreciação nesta Instância Revisora cinge-se na necessidade em apurar se correta a aplicação do decisum proferido em primeiro grau, que julgou improcedente os pedidos contidos na inicial.
Passa-se à análise dos pedidos da apelante de reforma da sentença de mérito.
DA DECLARAÇÃO DE INEXISTÊNCIA DO DÉBITO Inicialmente, ressalto que se aplica ao caso o Código de Defesa do Consumidor, conforme disposto na Súmula nº 297 do Superior Tribunal de Justiça, in verbis: “Súmula 297: O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras”.
Pois bem, da detida análise dos autos, verifica-se que o banco apelado juntou a via contratual, porém não se desincumbiu de seu ônus de provar a validade do negócio jurídico.
A apelante é analfabeta e alega que o contrato não poderia ter sido firmado sem a assinatura a rogo devidamente acompanhada de instrumento público.
Tal afirmação não merece guarida.
O idoso, salvo aqueles declarados incapazes por meio de sentença de interdição, tem plena capacidade civil.
Igual modo, as pessoas que possuem pouca instrução processual.
O CC/02 estabelece em seu artigo 107 que: “A validade da declaração de vontade não dependerá de forma especial, senão quando a lei expressamente a exigir”.
Assim, não há nas normas que regem a relação contratual, seja no CC/02, seja no CDC, determinação que leve a obrigatoriedade de pessoa idosa e com pouca instrução realize contrato por instrumento público.
Aliás, de forma mais abrangente, até mesmo nos casos de pessoas analfabetas, tanto o STJ como este E.
TJPA vêm entendendo pela desnecessidade de realização da contratação por instrumento público: DIREITO CIVIL.
RECURSO ESPECIAL.
AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE NEGÓCIO JURÍDICO C/C PEDIDOS DE RESTITUIÇÃO DE VALORES E COMPENSAÇÃO POR DANOS MORAIS.
CONTRATO DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO FIRMADO POR IDOSO INDÍGENA ANALFABETO.
VALIDADE.
REQUISITO DE FORMA.
ASSINATURA DO INSTRUMENTO CONTRATUAL A ROGO POR TERCEIRO, NA PRESENÇA DE DUAS TESTEMUNHAS.
ART. 595 DO CC/02.
PROCURADOR PÚBLICO.
DESNECESSIDADE. 1.
Ação ajuizada em 20/07/2018.
Recurso especial interposto em 22/05/2020 e concluso ao gabinete em 12/11/2020. 2.
O propósito recursal consiste em dizer acerca da forma a ser observada na contratação de empréstimo consignado por idoso indígena que não sabe ler e escrever (analfabeto). 3.
Os analfabetos, assim como os índios, detêm plena capacidade civil, podendo, por sua própria manifestação de vontade, contrair direitos e obrigações, independentemente da interveniência de terceiro. 4.
Como regra, à luz dos princípios da liberdade das formas e do consensualismo, a exteriorização da vontade dos contratantes pode ocorrer sem forma especial ou solene, salvo quando exigido por lei, consoante o disposto no art. 107 do CC/02. 5.
Por essa razão, em um primeiro aspecto, à míngua de previsão legal expressa, a validade do contrato firmado por pessoa que não saiba ler ou escrever não depende de instrumento público. 6.
Noutra toada, na hipótese de se tratar de contrato escrito firmado pela pessoa analfabeta, é imperiosa a observância da formalidade prevista no art. 595 do CC/02, que prevê a assinatura do instrumento contratual a rogo por terceiro, com a subscrição de duas testemunhas. 7.
Embora o referido dispositivo legal se refira ao contrato de prestação de serviços, deve ser dada à norma nele contida o máximo alcance e amplitude, de modo a abranger todos os contratos escritos firmados com quem não saiba ler ou escrever, a fim de compensar, em algum grau, a hipervulnerabilidade desse grupo social. 8.
Com efeito, a formalização de negócios jurídicos em contratos escritos - em especial, os contratos de consumo - põe as pessoas analfabetas em evidente desequilíbrio, haja vista sua dificuldade de compreender as disposições contratuais expostas em vernáculo.
Daí porque, intervindo no negócio jurídico terceiro de confiança do analfabeto, capaz de lhe certificar acerca do conteúdo do contrato escrito e de assinar em seu nome, tudo isso testificado por duas testemunhas, equaciona-se, ao menos em parte, a sua vulnerabilidade informacional. 9.
O art. 595 do CC/02 se refere a uma formalidade a ser acrescida à celebração de negócio jurídico por escrito por pessoa analfabeta, que não se confunde com o exercício de mandato.
O contratante que não sabe ler ou escrever declara, por si próprio, sua vontade, celebrando assim o negócio, recorrendo ao terceiro apenas para um auxílio pontual quanto aos termos do instrumento escrito. 10.
O terceiro, destarte, não celebra o negócio em representação dos interesses da pessoa analfabeta, como se mandatário fosse.
Por isso, não é necessário que tenha sido anteriormente constituído como procurador. 11.
Se assim o quiser, o analfabeto pode se fazer representar por procurador, necessariamente constituído mediante instrumento público, à luz do disposto no art. 654, caput, do CC/02.
Nessa hipótese, típica do exercício de mandato, não incide o disposto no art. 595 do Código e, portanto, dispensa-se a participação das duas testemunhas. 12.
Recurso especial conhecido e provido. (STJ - REsp: 1907394 MT 2020/0205908-3, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 04/05/2021, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 10/05/2021).
Contudo, faz-se necessária a assinatura a rogo, conforme preconiza o art. 595 do Código Civil Brasileiro.
Em análise ao contrato juntado, constato que não consta a assinatura a rogo indicada pelo artigo.
Vejamos: Art. 595.
No contrato de prestação de serviço, quando qualquer das partes não souber ler, nem escrever, o instrumento poderá ser assinado a rogo e subscrito por duas testemunhas.
Referida assinatura a rogo se faz necessária em razão de que a parte contratante deve ter ciência dos termos do negócio realizado, pois, como é analfabeta, não terá como analisar as cláusulas contratuais estabelecidas.
Friso que o analfabeto não é incapaz e pode estabelecer contratos, desde que atenda aos requisitos necessários à realização do ato.
No contrato juntado consta somente a assinatura datiloscópica da apelante e as assinaturas das testemunhas, conforme ID nº. 4499904.
Assim, compreendo que a negociação entabulada não atendeu às formalidades exigidas, tornando-se, dessa forma, nula.
Neste sentido, colaciono os seguintes julgados: EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO ANULATÓRIA DE CONTRATO DE EMPRÉSTIMO BANCÁRIO - INCAPACIDADE RELATIVA DA PARTE - NÃO CONSTATAÇÃO - REALIZAÇÃO DE PERÍCIA MÉDICA NO ÂMBITO JUDICIAL - VÍCIO DE CONSENTIMENTO - NULIDADE DA CONTRATAÇÃO - CONSUMIDORA IDOSA E ANALFABETA - INOBSERVÂNCIA DOS REQUISITOS DO ART. 595 DO CÓDIGO CIVIL. - Ausente a constatação da alegada incapacidade relativa da parte, por meio de perícia médica realizada no âmbito judicial e demais documentações, deve ser mantida a validade do negócio jurídico - O art. 595 do Código Civil exige, para a validade do contrato de prestação de serviços firmado por pessoa que não sabe ler nem escrever, assinatura a rogo do contratante e a presença de duas testemunhas - Sendo incontroverso que a autora era analfabeta funcional e idosa, diante da inobservância das formalidades mínimas necessárias à validade do negócio jurídica, tem-se que a contratação deve ser considerada nula. (TJ-MG - AC: 10000171071665002 MG, Relator: Baeta Neves, Data de Julgamento: 04/02/2020, Câmaras Cíveis / 18ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 05/02/2020) RESPONSABILIDADE CIVIL.
AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZATÓRIA.
EMPRÉSTIMOS NÃO CONTRATADOS.
DESCONTOS EM BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO.
DANO MORAL CONFIGURADO.
CONTRATANTE ANALFABETO.
INOBSERVÂNCIA DO DISPOSTO NO ART. 595 DO CÓDIGO CIVIL.
A situação narrada nos autos, na qual foram cobrados valores por empréstimo não contratado pela parte autora, caracteriza dano moral e gera o dever de indenizar.
O valor do dano moral deve ser estabelecido de maneira a compensar a lesão causada em direito da personalidade e com atenção aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade.
Manutenção do valor arbitrado na sentença.
Apelos não providos. ( Apelação Cível Nº *00.***.*14-63, Décima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Marcelo Cezar Muller, Julgado em 21/02/2019). (TJ-RS - AC: *00.***.*14-63 RS, Relator: Marcelo Cezar Muller, Data de Julgamento: 21/02/2019, Décima Câmara Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 06/03/2019) Deste modo, inexistindo a assinatura a rogo, deve ser declarada nula a relação jurídica, em conformidade com o art. 166, IV, do Código Civil Brasileiro.
Lembro que as partes contratantes devem ter plena ciência das cláusulas estabelecidas no pacto.
Além disso, em se tratando relação consumerista, devem os termos estabelecidos ser claros e de prévio conhecimento, de modo que não dificultem a compreensão de seu sentido, consoante disciplina o art. 46 do CDC.
Quanto à entrega dos valores à apelante, deveria o apelado ter juntado comprovante do recibo de entrega dos valores devidamente assinado pela recorrida ou o comprovante de transferência à conta desta.
Dessa forma, teria o recorrido demonstrado que o valor do contrato firmado havia sido entregue.
Entretanto, conforme dito anteriormente, não há comprovação nos autos de que o valor foi de fato entregue.
Ressalto que cabia ao banco apelado comprovar que houve a realização da contratação nos termos legais e o devido depósito dos valores à apelante.
Logo, de imediato, verifica-se que não restou comprovada, nos autos, a contratação do serviço pela apelante e tampouco a utilização de modo a justificar as cobranças realizadas.
Isto posto, merece reparo a decisão de 1º grau no sentido de declarar a inexistência da relação jurídica e, por via de consequência, dos débitos dela decorrentes, no que se refere ao contrato objeto do litígio.
DA REPETIÇÃO DO INDÉBITO No tocante à condenação ao pagamento em dobro dos valores indevidamente descontados, entendo que a sentença deve ser reformada.
A inexistência do débito se dá em razão da clara irregularidade existente e ante a ausência de apresentação de contrato válido, razão pela qual tem-se que os descontos na conta da apelante foram realizados de forma indevida.
O CDC assim preconiza: Art. 42.
Na cobrança de débitos, o consumidor inadimplente não será exposto a ridículo, nem será submetido a qualquer tipo de constrangimento ou ameaça.
Parágrafo único.
O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável.
A condenação do apelado à repetição do indébito é consequência lógica da declaração da nulidade/inexistência do contrato.
Em verdade, o banco deveria ter agido com o cuidado necessário no momento da contratação do empréstimo, entretanto fora negligente e, portanto, violando a boa-fé objetiva.
Sobre a repetição do indébito, importante asseverar que recentemente o STJ modificou seu entendimento ao afirmar ser dispensada a comprovação da má-fé para que a repetição se dê na forma dobrada: A restituição em dobro do indébito (parágrafo único do artigo 42 do CDC) independe da natureza do elemento volitivo do fornecedor que cobrou valor indevido, revelando-se cabível quando a cobrança indevida consubstanciar conduta contrária à boa-fé objetiva.” (STJ.
Corte Especial.
EAREsp 676608/RS, Rel.
Min.
Og Fernandes, julgado em 21/10/2020). (Destaquei) EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL.
OMISSÃO, CONTRADIÇÃO, OBSCURIDADE E ERRO MATERIAL.
CARÁTER INTEGRATIVO.
EFEITOS INFRINGENTES.
NÃO CABIMENTO.
AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO CUMULADA COM INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS.
CONTRATO DE FINANCIAMENTO.
DÉBITO.
QUITAÇÃO.
RECONHECIMENTO JUDICIAL.
COBRANÇA.
ABUSIVIDADE.
INDÉBITO.
DEVOLUÇÃO EM DOBRO.
POSSIBILIDADE. 1.
Admite-se que os embargos, ordinariamente integrativos, tenham efeitos infringentes, desde que constatada a presença de um dos vícios do art. 1.022 do Código de Processo Civil de 2015, cuja correção importe alterar a conclusão do julgado. 2.
A jurisprudência firmada pela Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que a restituição em dobro do indébito independe da natureza do elemento volitivo do fornecedor que cobrou valor indevido, sendo cabível quando a cobrança indevida revelar conduta contrária à boa-fé objetiva. 3.
Embargos de declaração acolhidos, sem efeitos modificativos. (EDcl no AgInt no AREsp 1565599/MA, Rel.
Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 08/02/2021, DJe 12/02/2021) (Destaquei) Deste modo, compreendo que merece reforma a sentença a quo para condenar o apelado a devolver em dobro os valores descontados relativos ao contrato objeto da lide.
DA INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL Inicialmente, salienta-se a submissão do caso às regras do direito consumerista, pelo qual responde a empresa, na qualidade de prestadora de serviços, de forma objetiva pelos danos causados ao consumidor (art. 14 do CDC), independentemente da perquirição da existência de sua culpa.
Dispõe o art. 14, do CDC: O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos. § 1º.
O serviço é defeituoso quando não fornece a segurança que o consumidor dele pode esperar, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes, entre as quais: I - O modo de seu fornecimento; II - O resultado e os riscos que razoavelmente dele se esperam; III - A época em que foi fornecido. § 2º.
O serviço não é considerado defeituoso pela adoção de novas técnicas. § 3º.
O Fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar: I.
Que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste; II.
A culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.
Como se vê, a lei atribuiu expressamente a responsabilidade objetiva ao fornecedor de serviços e assim, para que haja o dever de indenizar, basta que se revele o defeito na prestação do serviço; o dano e o nexo de causalidade entre eles, independentemente da existência de culpa.
A lei previu apenas duas hipóteses em que é afastada a responsabilização do fornecedor: a prova da inexistência do defeito e a culpa exclusiva da vítima ou de terceiro, além da concorrente.
Ressalta-se que o mencionado artigo deixou claro que o ônus da prova de qualquer das circunstâncias supra, capazes de elidir a responsabilidade civil, é do fornecedor.
Por seu turno, no que se refere ao dano moral, pode-se concluir que restou devidamente configurado, e isso em razão do débito indevido descontado diretamente dos vencimentos da parte apelada.
O ato por si só causa o dano e coloca o consumidor em situação de impotência, frustração, incerteza, desvantagem, retira o sossego, constrange e toma seu tempo na tentativa de reverter de forma amigável a questão, enfim, o abalo moral é imensurável.
Importante lembrar que não se trata aqui de meros aborrecimentos, próprios da vida cotidiana, mas sim de conduta indevida e lesiva, capaz de gerar a qualquer pessoa sentimento de indignação e impotência social, de maneira que o dano se presume e deve ser reparado.
Daí o dever de indenizar.
No que se refere ao quantum, deve-se ter em conta a finalidade da condenação em danos morais, que é a de levar o ofensor a tomar atitudes que previnam a ocorrência futura de atos semelhantes; a de compensar a vítima pela dor e dissabores sofridos e, não menos importante, de punir quem pratica atos tidos como ilegais.
A maior dificuldade do dano moral é precisamente o fato de não encontrar correspondência no critério valorativo patrimonial.
Ou seja, como a repercussão do dano não ocorreu no plano material o estorvo de mensurá-lo em moeda é enorme e o arbitrium boni viri do Juiz deve se revelar adequado para estabelecê-la em valor não tão grande que se converta em fonte de enriquecimento e nem tão pequeno que se torne inexpressivo.
Alguns juristas entendem a reparação é exclusivamente compensatória enquanto outros, com os quais me alio, entendem que a condenação é também punitiva.
O principal objetivo da condenação então é compensar e punir, porém dentro de um critério que deve ser razoável e proporcional, a fim de evitar exageros e o dano se transforme em enriquecimento injustificável e indevido.
Neste contexto, inafastável o reconhecimento de que a fixação do montante indenizatório deve ter por parâmetro, dentre outros aspectos, as condições do ofensor, o grau de dolo ou culpa presente na espécie, as providências adotadas para amenizar ou reparar o dano, bem como os prejuízos morais alegados pela vítima.
Como já dito, a responsabilidade pelo fato do serviço ou do produto é objetiva e recai sobre a prestadora, nos termos dos preceitos do CDC, respondendo ela, independentemente de culpa, pelos danos causados aos consumidores por defeito ou falha na prestação dos serviços.
Por fim, lembro que a inércia quanto à solução do problema agrava a situação e gera o dano moral.
Dessa forma, avaliando o constrangimento sofrido pela parte, tenho que a condenação, a título de dano moral, no importe de R$ 2.000,00 (dois mil reais), é proporcional ao dano sofrido e se mostra razoável.
DISPOSITIVO Isto posto, voto no sentido de CONHECER E DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO PARA REFORMAR IN TOTUM A SENTENÇA DE PISO E JULGAR PROCEDENTE o pedido para declarar a inexistência da relação jurídica objeto da ação, condenar o réu/apelado ao pagamento de indenização por dano moral, que arbitro em R$ 2.000,00 (dois mil reais), acrescido de juros moratórios de 1% (um por cento) ao mês, a partir do evento danoso (data da contratação), e correção monetária a contar desta decisão (Súmulas 54 e 362 do STJ), bem como determino ainda o ressarcimento em dobro dos descontos efetivados nos vencimentos da autora/apelante, com juros e correção monetária que devem incidir a partir de cada desembolso (art. 398 CC).
Por fim, condeno ainda o réu/apelado ao pagamento integral das custas processuais e honorários advocatícios sucumbenciais, que arbitro em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação.
Advirto às partes, com base no art. 6º do CPC, que a matéria foi analisada com base nas alegações pertinentes à análise do caso, pois o juiz não está obrigado a responder todas as alegações das partes, quando já tenha encontrado motivo suficiente para fundamentar a decisão, nem se obriga a ater-se aos fundamentos indicados por elas e tampouco responder um a todos os seus argumentos, motivo pelo qual eventuais embargos de declaração poderão ser considerados protelatórios, sujeitando-se as partes à eventual condenação ao pagamento da multa prevista no art. 1.026, § 2º, do CPC. É O VOTO.
Des.
AMILCAR ROBERTO BEZERRA GUIMARÃES Desembargador Relator Belém, 16/12/2022 -
16/12/2022 13:06
Expedição de Outros documentos.
-
16/12/2022 13:06
Expedição de Outros documentos.
-
16/12/2022 12:06
Conhecido o recurso de #Não preenchido# e provido
-
15/12/2022 14:12
Deliberado em Sessão - Julgado - Mérito
-
25/11/2022 11:01
Expedição de Outros documentos.
-
25/11/2022 11:00
Inclusão em pauta para julgamento de mérito
-
09/02/2022 11:01
Conclusos para julgamento
-
09/02/2022 11:01
Cancelada a movimentação processual
-
07/02/2022 22:10
Redistribuído por sorteio em razão de Determinação judicial
-
17/10/2021 17:26
Redistribuído por sorteio em razão de Determinação judicial
-
06/07/2021 13:44
Redistribuído por prevenção em razão de modificação da competência
-
06/07/2021 13:30
Determinação de redistribuição por prevenção
-
09/02/2021 22:25
Recebidos os autos
-
09/02/2021 22:25
Conclusos para decisão
-
09/02/2021 22:24
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
07/02/2022
Ultima Atualização
16/12/2022
Valor da Causa
R$ 0,00
Detalhes
Documentos
Acórdão • Arquivo
Acórdão • Arquivo
Decisão • Arquivo
Despacho • Arquivo
Sentença • Arquivo
Sentença • Arquivo
Ato Ordinatório • Arquivo
Decisão • Arquivo
Informações relacionadas
Processo nº 0816083-28.2022.8.14.0000
Joao Carlos Moura da Silva Filho
Diretor-Superintendente Executiva de Mob...
Advogado: Francinaldo Fernandes de Oliveira
2ª instância - TJPA
Ajuizamento: 07/11/2022 17:17
Processo nº 0800416-89.2019.8.14.0005
Jose da Silva
Norte Energia S/A
Advogado: Marcelo Augusto Teixeira de Brito Nobre
1ª instância - TJPA
Ajuizamento: 06/02/2019 12:14
Processo nº 0012901-54.2016.8.14.0040
Edson Alves Rodrigues
Inss - Instituto Nacional do Seguro Soci...
Advogado: Gustavo Rossi Goncalves
1ª instância - TJPA
Ajuizamento: 24/08/2016 10:50
Processo nº 0819852-44.2022.8.14.0000
Adelci dos Santos Amaral de Souza
Alvaro Jose da Silva Sousa
Advogado: Leandro Aquino dos Santos Franca
2ª instância - TJPA
Ajuizamento: 07/12/2022 23:05
Processo nº 0023872-35.2015.8.14.0040
Jose Carlos Ferreira da Silva
Instituto Nacional da Seguridade Social ...
Advogado: Gustavo Rossi Goncalves
1ª instância - TJPA
Ajuizamento: 13/07/2015 10:56