TJDFT - 0710042-61.2024.8.07.0000
2ª instância - Câmara / Desembargador(a) Gabinete do Exmo. Sr. Desembargador Renato Rodovalho Scussel
Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
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09/09/2024 16:43
Arquivado Definitivamente
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09/09/2024 16:42
Expedição de Certidão.
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09/09/2024 13:51
Transitado em Julgado em 06/09/2024
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08/09/2024 02:16
Decorrido prazo de BRB BANCO DE BRASILIA S.A. em 06/09/2024 23:59.
-
28/08/2024 02:15
Decorrido prazo de CARTÃO BRB S/A em 27/08/2024 23:59.
-
08/08/2024 02:17
Publicado Ementa em 08/08/2024.
-
08/08/2024 02:17
Disponibilizado no DJ Eletrônico em 07/08/2024
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06/08/2024 14:47
Expedição de Outros documentos.
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02/08/2024 17:55
Conhecido o recurso de MARIA HELENA TRINDADE - CPF: *79.***.*04-15 (AGRAVANTE) e provido
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02/08/2024 17:37
Deliberado em Sessão - Julgado - Mérito
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04/07/2024 16:53
Expedição de Outros documentos.
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04/07/2024 16:53
Inclusão do processo para julgamento eletrônico de mérito
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01/07/2024 16:59
Recebidos os autos
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03/05/2024 02:47
Decorrido prazo de MARIA HELENA TRINDADE em 02/05/2024 23:59.
-
23/04/2024 12:29
Conclusos para Relator(a) - Magistrado(a) RENATO RODOVALHO SCUSSEL
-
22/04/2024 17:48
Juntada de Petição de contrarrazões
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18/04/2024 02:16
Decorrido prazo de CARTÃO BRB S/A em 17/04/2024 23:59.
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11/04/2024 17:07
Mandado devolvido entregue ao destinatário
-
11/04/2024 17:07
Mandado devolvido entregue ao destinatário
-
10/04/2024 02:18
Publicado Despacho em 10/04/2024.
-
10/04/2024 02:18
Disponibilizado no DJ Eletrônico em 09/04/2024
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08/04/2024 14:58
Recebidos os autos
-
08/04/2024 14:58
Proferido despacho de mero expediente
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04/04/2024 16:50
Conclusos para Relator(a) - Magistrado(a) RENATO RODOVALHO SCUSSEL
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04/04/2024 15:04
Juntada de Petição de petição
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26/03/2024 02:18
Publicado Decisão em 26/03/2024.
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25/03/2024 02:17
Disponibilizado no DJ Eletrônico em 25/03/2024
-
25/03/2024 00:00
Intimação
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO DISTRITO FEDERAL E TERRITÓRIOS GABINETE DO DESEMBARGADOR RENATO RODOVALHO SCUSSEL AGRAVO DE INSTRUMENTO (202) 0710042-61.2024.8.07.0000 AGRAVANTE: MARIA HELENA TRINDADE AGRAVADO: BRB BANCO DE BRASILIA S.A., CARTÃO BRB S/A DECISÃO Trata-se de Agravo de Instrumento com pedido de antecipação dos efeitos da tutela interposto por MARIA HELENA TRINDADE contra a decisão ID origem 187001537, proferida pelo Juízo da 1ª Vara Cível de Ceilândia nos autos da Ação de Repactuação de Dívidas por Superendividamento n. 0738914-14.2023.8.07.0003, ajuizada em face de BANCO DE BRASILIA S/A – BRB e CARTÃO BRB S/A, ora agravados.
Na ocasião, o Juízo deferiu a gratuidade da justiça à autora e indeferiu a tutela antecipada, vindicada para limitar os descontos efetuados pelos requeridos no contracheque e conta corrente a 40% (quarenta por cento) dos seus rendimentos, nos seguintes termos: Concedo à parte autora a gratuidade de justiça ante a sua aparente condição financeira, nos termos do artigo 98 e seguintes do Código de Processo Civil.
Trata-se de ação de repactuação de dívidas por superendividamento, alegando a autora que possui 5 empréstimos consignados e 3 contratos de adiantamento de parcela do 13° salário, que totalizam R$ 212.393,84, mais duas dividas de cartão de crédito, e que a instituição financeira vem procedendo a descontos diretos da quantia que é recebida.
Aduz que a quantia remanescente mensal é insuficiente para as suas despesas.
Pede liminarmente a redução dos descontos para o limite de 40% dos seus rendimentos brutos. É o breve relato.
Decido.
Com efeito, não existe manifesta ilegalidade no contrato arregimentado entre as partes.
A existência de juros compostos e patamar acima da média do mercado não constituem elementos aptos a tornar nulo os termos formalizados, notadamente porque o feito precisa ser melhor instruído, com a real averiguação dos índices e condições.
Analisando detidamente o feito, vê-se que a situação financeira do autor não se encontra completamente comprometida, uma vez que sua renda final disponível é superior ainda a mais de R$ 2 mil reais (ID 186777864).
Ainda, sobreleva notar que o Judiciário só pode intervir para readequar os termos contratuais quando estiver diante de flagrante desproporcionalidade ou em situações onde estejam comprometidos o princípio da dignidade da pessoa humana e a nulidade absoluta do negócio jurídico.
Também urge observar que a alegação da necessidade de suspensão dos bloqueios por ser tratar de penhora de verba alimentícia não encontra respaldo jurídico, uma vez que os descontos em contracheque é uma prática lícita e encontra embasamento legal e jurisprudencial.
De fato, a jurisprudência do TJDFT vem compreendendo que a intervenção judicial só deve ocorrer excepcionalmente.
Nesse sentido: [...] Aqui, impende destacar o recente entendimento firmado pelo STJ em sede de recursos repetitivos (Tema 1.085), o desconto direto em conta bancária, ainda que utilizada para recebimento de salários, não é ilegal, quando houver autorização e enquanto esta perdurar.
Nada impede que, com a resposta das instituições financeiras, a situação seja reavaliada, procedendo a uma readequação dos descontos.
Por fim, impende destacar que a viabilidade do plano para repactuação das dívidas só é viável após a realização da audiência com tal finalidade.
Em sendo assim, com base nos fundamentos anteriormente expostos, deixo de conceder a antecipação dos efeitos da tutela.
Designe-se audiência com os credores, a ser realizada no 3 NUVIMEC. [...] Nas razões recursais, a agravante informa que recebe proventos de aposentadoria e pensão vitalícia da Secretaria de Estado de Educação do Distrito Federal – SEE/DF, os quais totalizam o montante líquido de R$ 3.532,06 (três mil, quinhentos e trinta e dois reais e seis centavos) mensais.
Alega que toda a sua renda é totalmente comprometida com o pagamento das seguintes dívidas, contraídas perante os agravados: “[...] 5 (cinco) empréstimos consignados e 3 (três) contratos de adiantamento de parcela do 13° salário, que totalizam R$ 212.393,84 (duzentos e doze mil, trezentos e noventa e três reais e oitenta e quatro reais), mais duas dividas de cartão de crédito.”.
Noticia ter mais de 80 (oitenta) anos e que está em situação de extrema vulnerabilidade, pois tem enfrentado dificuldades para pagar as despesas básicas, estando, inclusive, com contas de água, energia e telefone atrasadas.
Cita julgado para amparar a sua tese.
Assim, a agravante requer, em suma: a) a antecipação dos efeitos da tutela de forma liminar, para que os descontos efetuados no contracheque e na conta corrente pelos agravados sejam limitados a 40% (quarenta por cento) da sua remuneração, até o trânsito em julgado da demanda ou até a aprovação do plano de pagamento; b) no mérito, o provimento do recurso na forma assinalada.
Preparo não recolhido, haja vista a gratuidade da justiça concedida na origem. É o relatório.
DECIDO.
Presentes os demais pressupostos de admissibilidade, conheço o recurso.
Passo, então, a avaliar a presença das condições que autorizam o deferimento da antecipação dos efeitos da tutela no âmbito recursal.
O art. 1.019, inciso I, do Código de Processo Civil – CPC prevê ser possível ao relator do Agravo de Instrumento “[...] atribuir efeito suspensivo ao recurso ou deferir, em antecipação de tutela, total ou parcialmente, a pretensão recursal, comunicando ao juiz sua decisão”.
E, nos termos do art. 300, caput, do mesmo Diploma Normativo dispõe que “A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo”, inclusive liminarmente, sem prejuízo do exercício do contraditório diferido ao agravado.
Pois bem.
A controvérsia posta em debate cinge-se à possibilidade de limitação dos descontos efetuados no contracheque e na conta corrente da agravante, a título de pagamento de empréstimos e dívidas oriundas do cartão de crédito, a 40% (quarenta por cento) dos seus rendimentos – compostos por proventos de aposentadoria e pensão vitalícia recebidos da SEE/DF.
Conforme consta na decisão recorrida, o Juízo de 1º Grau indeferiu o pleito de limitação dos descontos por não ter vislumbrado manifesta ilegalidade nos contratos nem o comprometimento total da renda da agravante – pois o montante total disponível ainda era superior a R$ 2.000,00 (dois mil reais) –, além de ter consignado que “[...] a viabilidade do plano para repactuação das dívidas só é viável após a realização da audiência com tal finalidade.” (decisão ID origem 187001537) – a qual foi designada para 24/4/2024.
Sobre o procedimento do Superendividamento, o Código de Defesa do Consumidor – CDC (Lei n. 8.078/1990) estabelece, entre outras, as seguintes regras: Art. 54-A. [...] § 1º Entende-se por superendividamento a impossibilidade manifesta de o consumidor pessoa natural, de boa-fé, pagar a totalidade de suas dívidas de consumo, exigíveis e vincendas, sem comprometer seu mínimo existencial, nos termos da regulamentação § 2º As dívidas referidas no § 1º deste artigo englobam quaisquer compromissos financeiros assumidos decorrentes de relação de consumo, inclusive operações de crédito, compras a prazo e serviços de prestação continuada § 3º O disposto neste Capítulo não se aplica ao consumidor cujas dívidas tenham sido contraídas mediante fraude ou má-fé, sejam oriundas de contratos celebrados dolosamente com o propósito de não realizar o pagamento ou decorram da aquisição ou contratação de produtos e serviços de luxo de alto valor. [...] Art. 104-A.
A requerimento do consumidor superendividado pessoa natural, o juiz poderá instaurar processo de repactuação de dívidas, com vistas à realização de audiência conciliatória, presidida por ele ou por conciliador credenciado no juízo, com a presença de todos os credores de dívidas previstas no art. 54-A deste Código, na qual o consumidor apresentará proposta de plano de pagamento com prazo máximo de 5 (cinco) anos, preservados o mínimo existencial, nos termos da regulamentação, e as garantias e as formas de pagamento originalmente pactuadas. [...] Art. 104-B.
Se não houver êxito na conciliação em relação a quaisquer credores, o juiz, a pedido do consumidor, instaurará processo por superendividamento para revisão e integração dos contratos e repactuação das dívidas remanescentes mediante plano judicial compulsório e procederá à citação de todos os credores cujos créditos não tenham integrado o acordo porventura celebrado. § 1º Serão considerados no processo por superendividamento, se for o caso, os documentos e as informações prestadas em audiência. § 2º No prazo de 15 (quinze) dias, os credores citados juntarão documentos e as razões da negativa de aceder ao plano voluntário ou de renegociar § 3º O juiz poderá nomear administrador, desde que isso não onere as partes, o qual, no prazo de até 30 (trinta) dias, após cumpridas as diligências eventualmente necessárias, apresentará plano de pagamento que contemple medidas de temporização ou de atenuação dos encargos § 4º O plano judicial compulsório assegurará aos credores, no mínimo, o valor do principal devido, corrigido monetariamente por índices oficiais de preço, e preverá a liquidação total da dívida, após a quitação do plano de pagamento consensual previsto no art. 104-A deste Código, em, no máximo, 5 (cinco) anos, sendo que a primeira parcela será devida no prazo máximo de 180 (cento e oitenta) dias, contado de sua homologação judicial, e o restante do saldo será devido em parcelas mensais iguais e sucessivas. [...] (Grifou-se).
Ocorre que a observância do procedimento do Superendividamento não afasta a possibilidade de se examinar a legalidade dos descontos efetuados no contracheque da agravante, notadamente diante da necessidade de preservar a sua subsistência digna.
Isso porque a Lei Distrital n. 7.239/2023, que estabelece o crédito responsável e assegura a garantia do mínimo existencial para os endividados do Distrito Federal, com medidas necessárias para dar cumprimento e efetividade aos arts. 6º, XI e XII; 52, § 2º; e 54-D da Lei Federal n. 8.078/1990, estabelece, na parte que interessa, que: Art. 2º Fica vedado, nos termos do art. 7º, VI e X, da Constituição Federal e do art. 833 do Código de Processo Civil, às instituições financeiras descontar da conta corrente do devedor percentual superior ao previsto no art. 116, § 2º, da Lei Complementar nº 840, de 23 de dezembro de 2011, ou no art. 5º do Decreto Federal nº 8.690, de 11 de março de 2016. § 1º Quando há empréstimos consignados em folha de pagamento, a soma entre esses descontos e os efetuados diretamente em conta-corrente não pode exceder ao limite previsto no caput. (Grifou-se) Confira-se, pois, o limite fixado na Lei Complementar n. 840/2011, que dispõe sobre o regime jurídicos dos servidores públicos civis do Distrito Federal, das autarquias e das fundações públicas distritais, para as consignações em folha de pagamento dos servidores distritais: Art. 116.
Salvo por imposição legal, ou mandado judicial, nenhum desconto pode incidir sobre a remuneração ou subsídio. § 1º Mediante autorização do servidor e a critério da administração pública, pode haver consignação em folha de pagamento a favor de terceiros, com reposição de custos, na forma definida em regulamento. § 2º A soma das consignações de que trata o § 1º não pode exceder o limite mensal de 40% da remuneração, subsídio ou proventos, sendo 5% reservados para saque com cartão de crédito ou amortização de despesas contraídas nessa modalidade. (Parágrafo Alterado(a) pelo(a) Lei Complementar 1015 de 05/09/2022) § 3º A consignação em folha de pagamento não traz nenhuma responsabilidade para a administração pública, salvo a de repassar ao terceiro o valor descontado do servidor. § 4º As consignações de que trata este artigo devem resguardar, em todos os casos, a garantia ao mínimo existencial para a dignidade do servidor público do Distrito Federal. (Grifou-se) Digno de registro que a constitucionalidade formal e material da Lei Distrital supracitada está sendo discutida nos autos da Ação Direita de Inconstitucionalidade n. 0721303-57.2023.8.07.0000, ajuizada pelo Governador do Distrito Federal.
No entanto, enquanto não houver pronunciamento que determine, ao menos, a suspensão da vigência da norma – o que não ocorreu –, tenho por bem aplicar as regras nela fixadas.
Nessa linha, entendo que os descontos realizados diretamente na folha de pagamento e na conta corrente dos servidores distritais deve ser limitada a 40% (quarenta por cento) da remuneração, subsídio ou proventos, sendo 5% (cinco por cento) destinados para saque com cartão de crédito ou amortização de despesas contraídas nessa modalidade.
E, apesar de as normas em evidência não mencionarem se, para a apuração do limite, deve ser considerada a retribuição pecuniária bruta ou líquida, adiro ao entendimento que considera o valor líquido, resultante do abatimento dos descontos compulsórios, a fim de garantir o mínimo existencial, consoante disposto no § 4º do art. 116 da Lei Complementar n. 840/2011.
Sobreleva registrar, ainda, que, apesar de não caracterizar retenção indevida – nos termos do posicionamento do col.
Superior Tribunal de Justiça – STJ consolidado no Tema Repetitivo n. 1.085[1] –, o abatimento de parcelas referentes a contrato de empréstimo, precedido de autorização do titular da conta corrente por ocasião da celebração, não pode ocasionar a privação do devedor de um patrimônio mínimo para o seu núcleo familiar.
Isso porque os descontos incidem sobre o numerário existente sem que a instituição financeira diferencie a origem, podendo, pois, abarcar a remuneração recebida pelo devedor.
Com base nesses fundamentos, tenho que o princípio da autonomia da vontade pode ser relativizado para resguardar o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana.
A propósito, confira-se ementa de julgado da eg. 2ª Turma Cível deste Tribunal de Justiça nesse sentido: CONSTITUCIONAL.
CONSUMIDOR.
CIVIL.
PROCESSUAL CIVIL.
APELAÇÃO.
AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER.
LIMITAÇÃO DE PRESTAÇÕES DE EMPRÉSTIMOS CONSIGNADOS E EM CONTA CORRENTE.
TEMA 1085, STJ.
ANÁLISE DO CASO CONCRETO.
PRINCÍPIOS DA FUNÇÃO SOCIAL DO CONTRATO, PROBIDADE, BOA-FÉ OBJETIVA E GARANTIA DO MÍNIMO EXISTENCIAL, SOB O PRIMADO CONSTITUCIONAL FUNDAMENTAL DA DIGNIDADE DA PESSOA.
APELO PROVIDO. 1.
Apelação interposta contra sentença que julgou improcedentes os pedidos de ação de obrigação de fazer concernente à limitação de descontos em conta corrente relativos a empréstimos não quitados. 1.1.
Pretensão da autora de reforma da sentença para que sejam limitados os descontos realizados pelo réu, tanto de consignação em pagamento quanto os de desconto em conta-corrente, ao patamar de 35% dos seus rendimentos brutos, sendo 5% para dívidas do cartão, descontadas as rubricas obrigatórias. 2.
A questão debatida nos autos está sujeita às normas previstas no Código de Defesa do Consumidor, uma vez que as partes se enquadram nos conceitos previstos nos artigos 2º e 3º do aludido diploma legal. 3.
Não se desconhece que a previsão normativa de limitação de descontos de empréstimo bancário ao percentual de 30% é dirigida à consignação em folha de pagamento, na regência do art. 10 do Decreto nº 28.195/07 (que regulamentou, no âmbito do Distrito Federal, o art. 45, parágrafo único, da Lei Federal nº 8.112/1990), combinado com a Lei Complementar Distrital nº 840/11, §2º, do art. 116. 3.1.
Ocorre que o Código de Defesa do Consumidor e o Código Civil contemplam limites à liberdade de contratar, impondo observância quanto à função social do contrato e os deveres de boa-fé objetiva, probidade e lealdade pelas partes. 3.2.
Impende ressaltar que a autonomia privada não é um princípio absoluto.
No confronto com outros valores, prevalecem a dignidade da pessoa humana, a boa-fé objetiva e a função social do contrato. 3.2.1 Destarte, O princípio da dignidade da pessoa humana se refere à garantia das necessidades vitais de cada indivíduo, ou seja, um valor intrínseco como um todo. É um dos fundamentos do Estado Democrático de Direito, nos termos do artigo 1º, III da Constituição Federal, sendo fundamento basilar da República.3.3 Os numerosos casos de superendividamento que aportam aos Tribunais suscitaram a atenção do Poder Público para a premente necessidade de observância aos princípios da função social do contrato, probidade e boa-fé objetiva (art. 421 e 422 do CC e Enunciado 23 do CJF), e garantia do mínimo existencial, sob o primado constitucional fundamental da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da Constituição Federal), os quais, à toda evidência, preponderam sobre a autonomia da vontade privada, desprovida de caráter absoluto. 3.4.
Justo neste quadro de superendividamento, para o qual inclusive concorrem os bancos, facilitando enormemente a concessão de crédito ao consumidor sem observar a capacidade de pagamento, é que o desconto ilimitado na conta corrente na qual o servidor recebe seus vencimentos, verba de natureza alimentar, pode comprometer a sua própria subsistência e de sua família, gerando situação de evidente afronta aos princípios antes referidos. 3.5 A voracidade das instituições bancárias em busca de lucro fácil, em sacrifício de assalariados que ficam indefesos diante da oferta de empréstimos fáceis de serem contraídos, porque garantido o pagamento, efetuado diretamente em conta-corrente onde o mesmo recebe o salário, afasta, definitivamente, qualquer alegação de má-fé do consumidor. 4.
O STJ firmou, em sede dos repetitivos, o tema 1.085, o qual aduz que: "São lícitos os descontos de parcelas de empréstimos bancários comuns em conta-corrente, ainda que utilizada para recebimento de salários, desde que previamente autorizados pelo mutuário e enquanto esta autorização perdurar, não sendo aplicável, por analogia, a limitação prevista no § 1º do art. 1º da Lei n. 10.820/2003, que disciplina os empréstimos consignados em folha de pagamento." (REsp 1863973/SP, Rel.
Ministro Marco Aurélio Bellizze, Segunda Seção, DJe 15/03/2022). 4.1.
A despeito do recente entendimento do STJ no Tema 1.085, há que se analisar, no presente caso, a necessidade de modificação das cláusulas contratuais de empréstimo, no que tange a forma de pagamento das parcelas, baseado no princípio da modificação das prestações desproporcionais. 4.2. É direito do consumidor, independentemente da má-fé do fornecedor, a modificação das cláusulas contratuais que fixem prestações desproporcionais ou a revisão daquelas que, por fato superveniente, se tornaram excessivamente onerosas, de maneira a preservar o equilíbrio econômico-financeiro do contrato. 4.3.
Jurisprudência: "(...) 3. É direito básico do consumidor modificar cláusulas contratuais que estabeleçam prestações desproporcionais, ou a sua revisão em face de eventos supervenientes que tornem a prestação excessivamente onerosa, nos termos do art. 6º, V, do CDC. (...)" (07192341920188070003, Relatora: Soníria Rocha Campos D'assunção, Primeira Turma Recursal dos Juizados Especiais do Distrito Federal, DJE: 6/6/2019.) 5.
Assim, a limitação dos descontos no presente caso é necessária, uma vez que o débito integral das parcelas na conta corrente da autora acaba por criar uma obrigação abusiva e demasiadamente onerosa, incompatível com a boa-fé contratual, nos termos do artigo 51, inciso IV do Código de Defesa do Consumidor. 6.
Apelo provido. (Acórdão 1734456, 07141215120228070001, Relator: JOÃO EGMONT, 2ª Turma Cível, data de julgamento: 19/7/2023, publicado no PJe: 15/8/2023.
Pág.: Sem Página Cadastrada.) (Grifou-se).
Diante desse panorama, reputo presente a probabilidade do direito vindicado, bem como o perigo da demora, pois, conforme se observa nos contracheques, nas cópias de faturas de cartão de crédito e nos extratos bancários juntados na origem, os descontos efetuados pelos agravados referentes aos empréstimos contraídos pela agravante – que incluem saque via cartão de crédito – parecem ultrapassar o limite de 40% (quarenta por cento) dos seus rendimentos líquidos – compostos por proventos de aposentadoria e pensão vitalícia recebidos da SEE/DF.
Pelas razões expostas, DEFIRO a antecipação dos efeitos da tutela para determinar aos agravados que suspendam os descontos efetuados a título de empréstimos, tanto no contracheque quanto na conta corrente, que ultrapassem o limite de 40% (quarenta por cento) dos rendimentos líquidos mensais da agravante – resultado do abatimento dos descontos compulsórios –, até o julgamento Colegiado do presente recurso ou até a eventual homologação de acordo na audiência de conciliação ou fixação de plano judicial compulsório – o que ocorrer primeiro –, sob pena de multa de R$ 1.000,00 (mil reais) por desconto mensal irregular.
Intimem-se os agravados, nos termos do art. 1.019, inciso II, do CPC.
Oficie-se ao Juízo de 1º Grau, nos termos do art. 1.019, inciso I, do CPC, sem necessidade de informações.
Publique-se.
Brasília, 21 de março de 2024.
RENATO RODOVALHO SCUSSEL Desembargador Relator [1] Tema Repetitivo n. 1.085 do STJ: São lícitos os descontos de parcelas de empréstimos bancários comuns em conta-corrente, ainda que utilizada para recebimento de salários, desde que previamente autorizados pelo mutuário e enquanto esta autorização perdurar, não sendo aplicável, por analogia, a limitação prevista no § 1º do art. 1º da Lei n. 10.820/2003, que disciplina os empréstimos consignados em folha de pagamento. -
21/03/2024 18:16
Expedição de Mandado.
-
21/03/2024 18:15
Expedição de Mandado.
-
21/03/2024 17:54
Expedição de Outros documentos.
-
21/03/2024 17:54
Expedição de Outros documentos.
-
21/03/2024 17:44
Concedida a Antecipação de tutela
-
14/03/2024 19:06
Recebidos os autos
-
14/03/2024 19:06
Remetidos os Autos (outros motivos) da Distribuição ao 2ª Turma Cível
-
14/03/2024 18:50
Remetidos os Autos (outros motivos) para Distribuição
-
14/03/2024 18:50
Distribuído por sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
14/03/2024
Ultima Atualização
09/09/2024
Valor da Causa
R$ 0,00
Documentos
Acórdão • Arquivo
Despacho • Arquivo
Despacho • Arquivo
Ofício • Arquivo
Decisão • Arquivo
Decisão • Arquivo
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