TJCE - 0800055-54.2022.8.06.0049
1ª instância - 2ª Vara da Comarca de Beberibe
Processos Relacionados - Outras Instâncias
Polo Ativo
Partes
Advogados
Nenhum advogado registrado.
Polo Passivo
Assistente Desinteressado Amicus Curiae
Partes
Advogados
Nenhum advogado registrado.
Movimentações
Todas as movimentações dos processos publicadas pelos tribunais
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16/05/2025 11:03
Remetidos os Autos (em grau de recurso) para Instância Superior
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16/05/2025 11:02
Alterado o assunto processual
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13/05/2025 10:29
Juntada de Petição de petição
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25/04/2025 15:59
Expedida/certificada a intimação eletrônica
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25/04/2025 15:59
Expedida/certificada a intimação eletrônica
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25/04/2025 15:57
Juntada de ato ordinatório
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13/09/2024 00:17
Decorrido prazo de SUPERINTENDENCIA ESTADUAL DO MEIO AMBIENTE-SEMACE em 12/09/2024 23:59.
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02/08/2024 06:56
Juntada de Petição de petição
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17/07/2024 11:29
Juntada de Petição de petição
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17/07/2024 00:00
Publicado Sentença em 17/07/2024. Documento: 88751847
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16/07/2024 00:00
Intimação
PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO CEARÁ Comarca de Beberibe 2ª Vara da Comarca de Beberibe Rua Joaquim Facó, 244, Novo Planalto - CEP 62840-000, Fone: (85) 98111-1355, Beberibe-CE - E-mail: [email protected] SENTENÇA Processo: 0800055-54.2022.8.06.0049 Processos Associados: [] Classe: AÇÃO CIVIL PÚBLICA (65) Assunto: [Área de Preservação Permanente] AUTOR: PROCURADORIA GERAL DE JUSTICA, SUPERINTENDENCIA ESTADUAL DO MEIO AMBIENTE-SEMACE REU: RICARDO BARBOSA MAIA RELATÓRIO Trata-se de Ação Civil Pública envolvendo as partes em epígrafe, já qualificadas nos autos.
Narra o requerente que o demandado edificou sobre solo pertencente à Área de Preservação Permanente da Lagoa de Dentro, neste Município, culminando em auto de infração, assim como o embargo das obras, ainda no ano de 2012.
Entretanto, em 2019, em nova diligência, verificou-se que a determinação foi descumprida, constatando-se que a reforma feita no imóvel havia sido finalizada, com acréscimo de um alpendre com churrasqueira.
Requer a condenação do promovido a promover a demolição de todas as construções irregulares por ele erguidas no local, a recuperar a área degradada e a pagar indenização por danos materiais e morais coletivos.
Com a inicial, vieram os documentos de IDs 70697572 a 70697668.
Em contestação (ID 70697419), o demandado afirma que pagou todos os autos de infração e que não construiu em solo não edificável, nem invadiu a APP, ressaltando que é nativo do local e que não quis agredir a natureza, mas apenas fazer melhorias no imóvel e dar mais qualidade de vida e segurança à sua família, afirmando, portanto, que não cometeu nenhuma conduta ilícita.
Pugna pela improcedência da ação.
Em IDs 70697532 a 70697543, houve juntada de documentos e arguição de matérias de ordem pública.70697543.
Réplica em ID 70697527.
Decisão saneadora em ID 70697424, rejeitando a prescrição e a coisa julgada suscitadas nos autos, bem como deferindo o ingresso da SEMACE como assistente litisconsorcial do requerente. É o relatório do essencial.
Decido. FUNDAMENTAÇÃO Não havendo requerimento por produção probatória, passo ao julgamento antecipado do mérito, nos termos do artigo 355, I, do Código de Processo Civil. 1.
DO ATO ILÍCITO Cinge-se a questão à construção em Área de Preservação Permanente feita pelo autor.
Inicialmente, ressalto que o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado encontra amparo constitucional, razão pela qual o Poder Público zelará pela sua preservação, exigindo-se reparação de quem causa danos a ele: Art. 225.
Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo para as presentes e futuras gerações. § 1º Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público: I - preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico das espécies e ecossistemas; (Regulamento) III - definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção; (Regulamento) IV - exigir, na forma da lei, para instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade; (Regulamento) § 3º As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados.
Nesse contexto, a Lei 12.651/2012 regulamenta a situação da Área de Preservação Permanente, conceituando-a e estabelecendo obrigações para proprietários, possuidores ou ocupantes do local.
Destaco, nesse contexto, pela pertinência em relação ao tema tratado nos autos, os seguintes dispositivos: Art. 3º Para os efeitos desta Lei, entende-se por: II - Área de Preservação Permanente - APP: área protegida, coberta ou não por vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica e a biodiversidade, facilitar o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas; Art. 4º Considera-se Área de Preservação Permanente, em zonas rurais ou urbanas, para os efeitos desta Lei: II - as áreas no entorno dos lagos e lagoas naturais, em faixa com largura mínima de: a) 100 (cem) metros, em zonas rurais, exceto para o corpo d'água com até 20 (vinte) hectares de superfície, cuja faixa marginal será de 50 (cinquenta) metros; b) 30 (trinta) metros, em zonas urbanas; Art. 7º A vegetação situada em Área de Preservação Permanente deverá ser mantida pelo proprietário da área, possuidor ou ocupante a qualquer título, pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado. § 1º Tendo ocorrido supressão de vegetação situada em Área de Preservação Permanente, o proprietário da área, possuidor ou ocupante a qualquer título é obrigado a promover a recomposição da vegetação, ressalvados os usos autorizados previstos nesta Lei. § 2º A obrigação prevista no § 1º tem natureza real e é transmitida ao sucessor no caso de transferência de domínio ou posse do imóvel rural.
Art. 8º A intervenção ou a supressão de vegetação nativa em Área de Preservação Permanente somente ocorrerá nas hipóteses de utilidade pública, de interesse social ou de baixo impacto ambiental previstas nesta Lei.
Assim, caso haja supressão de vegetação na área preservada, deve o responsável pelo local promover a recomposição, obrigação que é passível de transmissão a seus sucessores, caso não sejam respeitadas as hipóteses legais.
Ressalto, ademais, que a responsabilidade ambiental é objetiva, independendo de dolo ou de culpa, o que pode ser extraído do artigo 14, § 1º, da Lei 6.938/1981, que trata da Política Nacional do Meio Ambiente: Art. 14, § 1º Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade.
O Ministério Público da União e dos Estados terá legitimidade para propor ação de responsabilidade civil e criminal, por danos causados ao meio ambiente.
No caso dos autos, o Ministério Público afirma que o demandado construiu em Área de Preservação Permanente sem obediência ao ordenamento jurídico.
Nesse contexto, considerando o princípio da precaução, que tem, como uma de suas aplicações, o fato de que o proponente da atividade demonstrar que suas ações não causaram dano ou risco ao meio ambiente, determinou-se a inversão do ônus da prova em ID 70697417, aplicando-se, ao caso, a Súmula 618 do Superior Tribunal de Justiça: "a inversão do ônus da prova aplica-se às ações de degradação ambiental".
Diante disso, entendo que o demandado não se desincumbiu de seu encargo probatório.
Primeiramente, ressalto que foi realizada apuração no local por equipe da SEMACE ainda em 2012 (ID 70697577 e seguintes).
Na ocasião, constatou-se que havia reforma de residência promovida pelo demandado às margens da Lagoa de Dentro, Área de Preservação Permanente segundo a Resolução nº 303/2002/CONAMA, fixando multa e embargo da obra.
Noto, nesse contexto, que o requerido apresentou justificativa em ID 70697620, na qual não nega o fato, apenas requerendo a diminuição ou a retirada das sanções impostas.
Posteriormente, conforme ID 70697647, a autarquia ambiental constatou que houve equívocos no auto de infração anterior, indicando que, na época, a equipe não tinha pleno conhecimento da legislação para aplicar o direito da forma correta em relação à reforma, ressaltando, ainda, a impossibilidade de elaborar alguma poligonal para indicar se, de fato, a residência seria abarcada pelo documento.
Diante disso, fez-se nova vistoria, em 2019 (ID 70697652 e seguintes), na qual obtiveram os pontos necessários para elaboração do mapa pertinente, verificando que, de fato, o imóvel estava inserindo em área protegida e constataram que o embargo anterior havia sido descumprido, inclusive com construção de um alpendre com churrasqueira.
Nesse contexto, verifico que o mapa elaborado em ID 70697662 é cristalino ao apontar a delimitação da Área de Preservação Permanente, delimitando faixa de 50 (cinquenta metros) em relação ao corpo d'água para aferição de seu perímetro, em consonância com o artigo 4º, II, a, da Lei 12.651/2012, indicando, precisamente, que o imóvel destacado nos autos, de fato, se encontra dentro da região preservada.
Sobre isso, o demandado apenas afirma que o local não está inserido em região protegida e que em nenhum momento quis degradar o meio ambiente, ressaltando que sua família se encontra no local há muito tempo.
Ocorre que há elementos suficientes nos autos que demonstram que seu imóvel foi construído em área preservada por lei.
Ainda, deixou de realizar as adequações necessárias, mesmo após ter sido autuado por autarquia estadual.
A situação persiste por mais de uma década, pelo menos, havendo duas vistorias, sem que haja registro, até o momento, de desfazimento da situação, afastando-se a alegação de desconhecimento.
No mais, ressalto que a responsabilidade pela reparação é transmitida aos sucessores de proprietários, possuidores ou ocupantes da área, conforme já mencionado.
Ainda, não nega a responsabilidade pelas obras, nem apresenta algo que possibilitasse a edificação no lugar.
Por fim, ressalto que houve oportunidade para produção de provas e, devidamente intimado, o requerido se manteve inerte (ID 70697526).
Constatado o ato ilícito, surge o dever de indenizar, o que não é afastado pelo pagamento das sanções administrativas, considerando a independência das esferas e devendo a situação retornar ao estado anterior, na medida do possível, nos termos do artigo 225, § 3º, da Constituição Federal e do artigo 7º, § 1º, da Lei 12.651/2012, permitindo-se, portanto, o reconhecimento da necessidade de demolição e de recuperação da área degradada (o que é possível, conforme ID 70697587). 2.
DOS DANOS Além das medidas acima indicadas, o Ministério Público pugna por indenização por danos materiais e morais coletivos.
Em relação aos primeiros, ressalto que não há nenhum documento, nos autos, que ateste alguma lesão dessa natureza, tampouco a narrativa autoral sugere algo nesse sentido.
Com efeito, ainda, ressalto que foi dada oportunidade para produção probatória para todos os envolvidos nestes autos.
Quanto aos danos morais coletivos, a jurisprudência já sedimentou a sua possibilidade quando há danos ambientais, os quais foram constatados pela SEMACE, conforme ID 70697587.
Nesse contexto, há precedente relativamente recente do Superior Tribunal de Justiça com o entendimento de que, por afetar direito difuso, não há necessidade de se perquirir acerca de eventual dor, sofrimento ou grau de impacto, uma vez que a lesão possui, por si só, repercussão geral, sendo imprescindível resguardar o direito das futuras gerações, sendo presumidos danos dessa natureza, portanto: AMBIENTAL E CIVIL.
AÇÃO CIVIL PÚBLICA.
DESMATAMENTO DE FLORESTA NATIVA DO BIOMA AMAZÔNICO.
INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS COLETIVOS.
AUSÊNCIA DE PERTURBAÇÃO À PAZ SOCIAL OU DE IMPACTOS RELEVANTES SOBRE A COMUNIDADE LOCAL.
IRRELEVÂNCIA.
PRECEDENTES DO STJ.
SIGNIFICATIVO DESMATAMENTO DE ÁREA OBJETO DE ESPECIAL PROTEÇÃO.
INFRAÇÃO QUE, NO CASO, CAUSA, POR SI, LESÃO EXTRAPATRIMONIAL COLETIVA.
CABIMENTO DE REPARAÇÃO POR DANO MORAL COLETIVO.
RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E PROVIDO.
I.
Trata-se, na origem, de Ação Civil Pública, proposta pelo Ministério Público do Estado de Mato Grosso, em decorrência do desmatamento de floresta nativa do Bioma Amazônico, objetivando impor, ao requerido, as obrigações de recompor o meio ambiente degradado e de não mais desmatar as áreas de floresta do seu imóvel, bem como a sua condenação ao pagamento de indenização por danos materiais e por dano moral coletivo.
II.
O Juízo de 1º Grau julgou parcialmente procedentes os pedidos, "para condenar o requerido à recomposição do meio degradado, apresentando PRADE junto ao órgão competente, no prazo de 60 dias, sob pena de conversão em multa pecuniária", bem como para lhe impor a obrigação de não desmatar.
III.
O Tribunal de origem deu parcial provimento à Apelação do Ministério Público, por reconhecer, além das já impostas obrigações de fazer e de não fazer, a exigibilidade da obrigação de indenizar os "danos materiais decorrentes do impedimento da recomposição natural da área".
Contudo, rejeitou a pretensão de indenização por dano moral coletivo.
IV. À luz do que decidido pelo acórdão recorrido, cumpre asseverar que, ao contrário do que ora se sustenta, não houve violação aos arts. 489, § 1º, IV, e 1.022 do CPC/2015, pois a prestação jurisdicional foi dada na medida da pretensão deduzida, de vez que os votos condutores do acórdão recorrido e do aresto proferido em sede de Embargos de Declaração apreciaram, fundamentadamente e de modo completo, todas as questões necessárias à solução da controvérsia, dando-lhes, contudo, solução jurídica diversa da pretendida.
Com efeito, "a solução integral da controvérsia, com fundamento suficiente, não caracteriza ofensa ao art. 1.022 do CPC/2015" (STJ, REsp 1.829.231/PB, Rel.
Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, DJe de 01/12/2020).
V.
Não se sustenta o fundamento adotado pelo Juízo a quo de que, no caso, não seria possível reconhecer o dano moral, porque, para isso, seria necessário que a lesão ambiental "desborde os limites da tolerabilidade".
Isso porque, na situação sob exame, também se consignou, no acórdão recorrido, que houve "desmatamento e exploração madeireira sem a indispensável licença ou autorização do órgão ambiental competente", conduta que "tem ocasionado danos ambientais no local, comprometendo a qualidade do meio ambiente ecologicamente equilibrado".
VI.
Constatando-se que, por meio de desmatamento não autorizado, causaram-se danos à qualidade do meio ambiente ecologicamente equilibrado, não tem pertinência, para a solução da causa, o chamado princípio da tolerabilidade, construção que se embasa, precisamente, na distinção feita pela legislação ambiental entre, de um lado, impacto ambiental - alteração do meio ambiente, benéfica ou adversa (Resolução CONAMA 001/86, arts. 1º e 6º, II) - e, de outro, degradação e poluição (Lei 6.938/81, art. 3º, II e III).
Como esclarece a doutrina especializada: "de um modo geral as concentrações populacionais, as indústrias, o comércio, os veículos, a agricultura e a pecuária produzem alterações no meio ambiente, as quais somente devem ser contidas e controladas, quando se tornam intoleráveis e prejudiciais à comunidade, caracterizando poluição reprimível.
Para tanto, a necessidade de prévia fixação técnica dos índices de tolerabilidade, dos padrões admissíveis de alterabilidade de cada ambiente, para cada atividade poluidora" (MEIRELLES, Hely Lopes.
Proteção Ambiental e Ação Civil Pública.
Revista dos Tribunais nº 611, São Paulo: RT, 1986, p. 11).
Especificamente quanto ao dano moral decorrente de ato lesivo ao meio ambiente, "há que se considerar como suficiente para a comprovação do dano extrapatrimonial a prova do fato lesivo - intolerável - ao meio ambiente.
Assim, diante das próprias evidências fáticas da degradação ambiental intolerável, deve-se presumir a violação ao ideal coletivo relacionado à proteção ambiental e, logo, o desrespeito ao direito humano fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado" (LEITE, José Rubens Morato.
Dano ambiental, do individual ao coletivo extrapatrimonial.
Teoria e prática. 5ª ed.
Editora Revista dos Tribunais, 2012, p. 288).
VII.
Assim, constatado o dano ambiental - e não mero impacto negativo decorrente de atividade regular, que, por si só, já exigiria medidas mitigatórias ou compensatórias -, incide a Súmula 629/STJ: "Quanto ao dano ambiental, é admitida a condenação do réu à obrigação de fazer ou à de não fazer cumulada com a de indenizar".
Trata-se de entendimento consolidado que, ao amparo do art. 225, § 3º, da Constituição Federal e do art. 14, § 1º, da Lei 6.938/81, "reconhece a necessidade de reparação integral da lesão causada ao meio ambiente, permitindo a cumulação das obrigações de fazer, não fazer e de indenizar, inclusive quanto aos danos morais coletivos" (STJ, EREsp 1.410.0698/MG, Rel.
Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIS FILHO, PRIMEIRA SEÇÃO, DJe de 03/12/2018).
VIII.
Afirmou o Tribunal de origem, ainda, que o reconhecimento do dano moral exige ilícito que venha a "causar intranquilidade social ou alterações relevantes à coletividade local".
Contra essa compreensão, tem-se entendido no STJ - quanto às lesões extrapatrimoniais em geral - que "é remansosa a jurisprudência deste Tribunal Superior no sentido de que o dano moral coletivo é aferível in re ipsa, dispensando a demonstração de prejuízos concretos e de aspectos de ordem subjetiva.
O referido dano será decorrente do próprio fato apontado como violador dos direitos coletivos e difusos, por essência, de natureza extrapatrimonial, sendo o fato, por si mesmo, passível de avaliação objetiva quanto a ter ou não aptidão para caracterizar o prejuízo moral coletivo, este sim nitidamente subjetivo e insindicável" (EREsp 1.342.846/RS, Rel.
Ministro RAUL ARAÚJO, CORTE ESPECIAL, DJe de 03/08/2021).
IX.
Segundo essa orientação, a finalidade do instituto é viabilizar a tutela de direitos insuscetíveis de apreciação econômica, cuja violação não se pode deixar sem resposta do Judiciário, ainda quando não produzam desdobramentos de ordem material.
Por isso, quanto aos danos morais ambientais, a jurisprudência adota posição semelhante: "No caso, o dano moral coletivo surge diretamente da ofensa ao direito ao meio ambiente equilibrado.
Em determinadas hipóteses, reconhece-se que o dano moral decorre da simples violação do bem jurídico tutelado, sendo configurado pela ofensa aos valores da pessoa humana.
Prescinde-se, no caso, da dor ou padecimento (que são consequência ou resultado da violação)" (STJ, REsp 1.410.698/MG, Rel.
Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, DJe de 30/06/2015).
E ainda: "Confirma-se a existência do 'dano moral coletivo' em razão de ofensa a direitos coletivos ou difusos de caráter extrapatrimonial - consumidor, ambiental, ordem urbanística, entre outros -, podendo-se afirmar que o caso em comento é de dano moral in re ipsa, ou seja, deriva do fato por si só" (STJ, AgInt no REsp 1.701.573/PE, Rel.
Ministro FRANCISCO FALCÃO, SEGUNDA TURMA, DJe de 02/09/2019).
Na mesma direção: STJ, REsp 1.642.723/RS, Rel.
Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, DJe de 25/05/2020; REsp 1.745.033/RS, Rel.
Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, DJe de 17/12/2021.
X.
No que se refere à inexistência de "situação fática excepcional" - expressão também usada no acórdão recorrido -, trata-se de requisito que, de igual forma, contraria precedente do STJ, também formado em matéria ambiental: "Os danos morais coletivos são presumidos. É inviável a exigência de elementos materiais específicos e pontuais para sua configuração.
A configuração dessa espécie de dano depende da verificação de aspectos objetivos da causa" (REsp 1.940.030/SP, Rel.
Ministro OG FERNANDES, SEGUNDA TURMA, DJe de 06/09/2022).
Na mesma direção, a doutrina ensina que os impactos materiais ou incômodos sobre a comunidade constituem, em verdade, dano da natureza patrimonial: "O dano ambiental patrimonial é aquele que repercute sobre o próprio bem ambiental, isto é, o meio ecologicamente equilibrado, relacionando-se à sua possível restituição ao status quo ante, compensação ou indenização.
A diminuição da qualidade de vida da população, o desequilíbrio ecológico, o comprometimento de um determinado espaço protegido, os incômodos físicos ou lesões à saúde e tantos outros constituem lesões ao patrimônio ambiental" (MILARÉ, Édis.
Direito do Ambiente. 9. ed. atual. ampl.
São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014. p. 326).
XI.
Dessa forma, a jurisprudência dominante no STJ tem reiterado que, para a verificação do dano moral coletivo ambiental, é "desnecessária a demonstração de que a coletividade sinta a dor, a repulsa, a indignação, tal qual fosse um indivíduo isolado", pois "o dano ao meio ambiente, por ser bem público, gera repercussão geral, impondo conscientização coletiva à sua reparação, a fim de resguardar o direito das futuras gerações a um meio ambiente ecologicamente equilibrado" (REsp 1.269.494/MG, Rel.
Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, DJe de 01/10/2013).
XII.
Nesse sentido, há precedentes no STJ reconhecendo que a prática do desmatamento, em situações como a dos autos, pode ensejar dano moral: "Quem ilegalmente desmata, ou deixa que desmatem, floresta ou vegetação nativa responde objetivamente pela completa recuperação da área degradada, sem prejuízo do pagamento de indenização pelos danos, inclusive morais, que tenha causado" (REsp 1.058.222/SP, Rel.
Ministro HERMAN BENJAMIN, DJe de 04/05/2011).
Adotando a mesma orientação: REsp 1.198.727/MG, Rel.
Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, DJe de 09/05/2013.
Consigne-se, ainda, a existência das seguintes decisões monocráticas, transitadas em julgado, que resultaram no provimento de Recurso Especial contra acórdão, também do Tribunal de Justiça do Estado do Mato Grosso, que adotou a mesma fundamentação sob exame: REsp 2.040.593/MT, Rel.
Ministro FRANCISCO FALCÃO, DJe de 07/03/2023; AREsp 2.216.835/MT, Rel.
Ministro FRANCISCO FALCÃO, DJe de 02/02/2023.
XIII.
Por fim, anote-se que, no caso, o ilícito sob exame não pode ser considerado de menor importância, uma vez que, consoante o acórdão recorrido, houve "exploração de 15,467 hectares de floresta nativa, objeto de especial preservação, na região amazônica, na Fazenda Chaleira Preta, com exploração madeireira e abertura de ramais, sem autorização do órgão ambiental competente".
Constatando esses fatos, o Tribunal a quo reconheceu, ainda, a provável impossibilidade de recuperação integral da área degradada.
XIV.
Recurso Especial conhecido e provido, para reconhecer a ocorrência de dano moral coletivo no caso, com determinação de retorno dos autos ao Tribunal de origem, para que, à luz das circunstâncias que entender relevantes, quantifique a indenização respectiva. (REsp n. 1.989.778/MT, relatora Ministra Assusete Magalhães, Segunda Turma, julgado em 19/9/2023, DJe de 22/9/2023.) Diante disso, constatada a degradação ambiental como no presente caso, uma vez que houve edificação em área de preservação permanente em descompasso com as normas vigentes, prejudicando direito difuso e, portanto, todos os que, de alguma forma, dele dependam, inclusive as futuras gerações, há dano moral coletivo ao caso, pois.
O valor da indenização por dano moral é de difícil quantificação, haja vista que o bem jurídico tutelado transcende a quantias pecuniárias, devendo o julgador definir a justa compensação, sem promover o enriquecimento sem causa.
Atinente à fixação do quantum indenizatório, deve o magistrado se orientar pelo princípio da razoabilidade, fixando um valor que promova compensação pelo prejuízo, tenha caráter pedagógico, sem permitir enriquecimento ilícito.
A indenização possui função reparadora ou compensatória do dano, bem como pedagógica.
Nesse contexto, avaliando que a lesão ao meio ambiente foi classificada como "leve" pela autarquia ambiental, bem como a situação econômica do demandado no ano de 2012 (ID 70697620) e o valor pago pela fatura constante em ID 70697543, pg. 03, indicando que possui algum lastro financeiro, reputo razoável e proporcional, não ensejadora de enriquecimento ilícito, considerando-se o dano causado, e a situação econômica das partes, a fixação de danos morais no valor de R$ 3.000,00 (três mil reais). DISPOSITIVO Ante o exposto, JULGO PROCEDENTE EM PARTE o pleito autoral, nos termos do artigo 487, I, do Código de Processo Civil, condenando o promovido ao seguinte: Promover a demolição de todas as construções pelas quais o promovido foi responsável, em área não-edificável, especificamente uma residência de 245,6m2 (duzentos e quarenta e cinco, vírgula seis metros quadrados) e muros que a circundam (coordenadas: 1-UTM = 9.524.624 N/ 612.579 E 2-UTM = 9.524.617 N/ 612.567 E 3-UTM = 9.524.599 N/ 612.585 E 4-UTM = 9.524.602 N/ 612.569 e Final de muro = UTM = 9.524.576 N/ 612.592, conforme mapa de ID 70697662, devendo remover todos os materiais e entulhos, decorrentes da demolição; Recuperar a área degradada, a partir de elaboração de plano específico para isso, no prazo de máximo de sessenta dias, sob pena de aplicação de multa de R$ 500,00 (quinhentos reais), limitada a R$ 15.000,00 (quinze mil reais); Pagar ao fundo especificado na inicial, indenização de R$ 3.000,00 (três mil reais) a título de danos morais coletivos, acrescidos de correção monetária, com base no IPCA-E e juros de 1% ao mês, na forma simples, a contar da citação, até a data do arbitramento, momento em que deverá incidir apenas o índice SELIC no tocante aos consectários legais (STJ - Súmulas 54 e 362).
Sem custas e sem honorários, nos termos do artigo 18 da Lei 7.347/1985.
Incumbe à parte interessada desencadear eventual procedimento de cumprimento de sentença, no prazo de 10 (dez) dias, após o esgotamento do prazo recursal.
Certificado o trânsito em julgado, ultrapassado o lapso temporal acima assinalado, arquivem-se os autos com baixa na distribuição.
Publique-se.
Registre-se.
Intimem-se. Beberibe/CE, data da assinatura eletrônica no sistema.
Wilson de Alencar Aragão Juiz de Direito -
16/07/2024 00:00
Disponibilizado no DJ Eletrônico em 16/07/2024 Documento: 88751847
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16/07/2024 00:00
Disponibilizado no DJ Eletrônico em 16/07/2024 Documento: 88751847
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15/07/2024 11:06
Expedida/certificada a comunicação eletrônica Documento: 88751847
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15/07/2024 11:06
Expedição de Outros documentos.
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15/07/2024 11:06
Julgado procedente em parte do pedido
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25/11/2023 04:17
Decorrido prazo de SUPERINTENDENCIA ESTADUAL DO MEIO AMBIENTE-SEMACE em 23/11/2023 23:59.
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23/10/2023 15:33
Conclusos para decisão
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23/10/2023 14:37
Juntada de Petição de resposta
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18/10/2023 16:04
Expedição de Outros documentos.
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17/10/2023 17:22
Mov. [28] - Migração de processo do Sistema SAJ, para o Sistema PJe: Remessa
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21/08/2023 21:09
Mov. [27] - Mero expediente [Obs: Anexo da movimentação em PDF na aba Documentos.]
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17/05/2023 09:56
Mov. [26] - Concluso para Despacho
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31/03/2023 20:10
Mov. [25] - Petição juntada ao processo
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17/03/2023 11:58
Mov. [24] - Petição: N Protocolo: WBEB.23.01300351-0Tipo da Peticao: Parecer do Ministerio PublicoData: 17/03/2023 11:43
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16/03/2023 21:37
Mov. [23] - Despacho: Decisão disponibilizado no Diário de Justiça Eletrônico/Relacao: 0075/2023Data da Publicacao: 17/03/2023Numero do Diario: 3037
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15/03/2023 02:13
Mov. [22] - Encaminhado edital: relação para publicação [Obs: Anexo da movimentação em PDF na aba Documentos.]
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14/03/2023 14:15
Mov. [21] - Certidão emitida
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14/03/2023 13:13
Mov. [20] - Certidão emitida
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26/02/2023 11:29
Mov. [19] - Decisão de Saneamento e Organização [Obs: Anexo da movimentação em PDF na aba Documentos.]
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08/02/2023 08:58
Mov. [18] - Encerrar análise
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08/02/2023 08:57
Mov. [17] - Decurso de Prazo
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08/02/2023 08:55
Mov. [16] - Petição juntada ao processo
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23/01/2023 11:59
Mov. [15] - Petição: N Protocolo: WBEB.23.01300040-6Tipo da Peticao: Parecer do Ministerio PublicoData: 23/01/2023 11:58
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08/12/2022 00:55
Mov. [14] - Certidão emitida
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06/12/2022 12:58
Mov. [13] - Concluso para Decisão Interlocutória
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25/11/2022 12:17
Mov. [12] - Certidão emitida
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21/11/2022 21:51
Mov. [11] - Petição: N Protocolo: WBEB.22.01808485-2Tipo da Peticao: Peticoes Intermediarias DiversasData: 21/11/2022 21:37
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19/11/2022 17:30
Mov. [10] - Mero expediente: Intime-se o Ministerio Publico para, no prazo de 30 dias, apresentar replica a contestacao e demais documentos anexados aos autos. Exp. Necessarios.
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18/11/2022 01:22
Mov. [9] - Certidão emitida
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07/11/2022 15:00
Mov. [8] - Concluso para Despacho
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07/11/2022 14:31
Mov. [7] - Certidão emitida
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07/11/2022 09:02
Mov. [6] - Petição: N Protocolo: WBEB.22.01808002-4Tipo da Peticao: AditamentoData: 07/11/2022 08:49
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03/11/2022 19:45
Mov. [5] - Petição juntada ao processo
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31/10/2022 16:07
Mov. [4] - Petição: N Protocolo: WBEB.22.01807853-4Tipo da Peticao: ContestacaoData: 31/10/2022 15:39
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20/10/2022 17:29
Mov. [3] - Decisão Interlocutória de Mérito [Obs: Anexo da movimentação em PDF na aba Documentos.]
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20/10/2022 16:01
Mov. [2] - Conclusão
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20/10/2022 16:01
Mov. [1] - Processo Distribuído por Sorteio
Detalhes
Situação
Ativo
Ajuizamento
20/10/2022
Ultima Atualização
25/04/2025
Valor da Causa
R$ 0,00
Detalhes
Documentos
Ato Ordinatório • Arquivo
Ato Ordinatório • Arquivo
Sentença • Arquivo
Sentença • Arquivo
Sentença • Arquivo
Sentença • Arquivo
Despacho de Mero Expediente • Arquivo
Despacho de Mero Expediente • Arquivo
Interlocutória • Arquivo
Interlocutória • Arquivo
Despacho de Mero Expediente • Arquivo
Despacho de Mero Expediente • Arquivo
Interlocutória • Arquivo
Interlocutória • Arquivo
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